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CAPÍTULO II. A POLÍCIA DE SEGURANÇA PÚBLICA E A FORMAÇÃO

2. Polícia de Segurança Pública: conceito, natureza e missão

“La Police est instituée pour mantenir l’ordre et la tranquilité publique, la liberte, la proprieté, la sûreté individuelle.” (artº. 16.º do Código dos Delitos e Penas, publicado ao 3 de Brunário do ano IV, citado por Clemente, 2000, p. 141).

O termo policia surge-nos, na linguagem comum ou científica, numa diversidade de sentidos e de significações. Do ponto de vista etimológico, o conceito “policia” (tal como a política) tem as suas origens no termo grego “politeia” (o qual encontra correspondência no termo latino “politia”), que se encontra associado à polis – a forma de governo ou regime da cidade-estado, conforme as palavras de Aristóteles (1980):

“La cité est une société établi, par maisons et familles, pour vivre bien, c’est-à-dire pour mener une vie parfaite et qui se suffise. (…).

La fin de la société civile est donc de vivre bien; toutes ses institutions n’en sont que les moyens de la Cité même, qu’une grande communauté de familles e de bourgades, où la vie trouve tous ces moyens de perfection et suffisance”(p.55).

O conceito “policia”, na sua utilização comum, pode designar, quer os agentes de autoridade, os serviços de polícia, quer ainda a atividade que uns e outros desenvolvem “(…) com o fim de garantir a tranquilidade e a segurança públicas, condições necessárias ao pleno exercício dos direitos, liberdades e garantias” (Raposo, 2006, p. 23).

Clemente (2005) por sua vez referiu que: “o conceito de polícia contém em si mesmo vários sentidos. Para além do polícia em sentido orgânico ou material e da polícia em sentido funcional, existe ainda a polícia em sentido formal” (p.30). Ainda segundo o mesmo autor, polícia no sentido funcional, poderá ser a própria forma de atuação da administração pública; por sua vez, num sentido formal ou lei de polícia, poderá ser o conjunto de normas da ordem pública; finalmente, polícia num sentido

orgânico, será uma instituição pública responsável pela manutenção da ordem pública e pelo cumprimento da lei (p.30).

A polícia é tanto um modo de agir da administração pública – polícia em sentido funcional -, como um conjunto de normas reguladoras da ordem pública – polícia em sentido formal ou lei de polícia -, como ainda uma instituição pública encarregada de manter a ordem pública (e não a privada) e de velar pelo cumprimento das leis – polícia em sentido orgânico”(p.30).

Por sua vez, Gonçalves (2011), citando Castro (2002), considerou que, ainda que a expressão ‘polícia’ possa significar, na maior parte dos casos, o conjunto de serviços e autoridades que exercem as funções policiais, “(…) não tem um sentido unívoco. Mesmo na linguagem corrente, umas vezes designa a actividade administrativa exercida por um determinado corpo administrativo, outras vezes o modelo de actuação desse mesmo corpo (…)” (p.85).

Reiterando a dificuldade em definir o conceito ‘policia’, face à sua polissemia, Clemente (2005) considerou ser eventualmente impossível a definição definitiva e consensual do conceito, não apenas devido à dinâmica mas também “(…) à complexidade do fenómeno policial, que abrange desde a formação cívica até á repressão da micro-criminalidade, isto é, desde o acto informativo à acção coactiva” (pp.19-20). E acrescentando, “o conceito de polícia não preenche toda a realidade policial, porque a função policial não coincide totalmente com o serviço policial e este prossegue também outras funções”. O mesmo autor, mais adiante, e corroborando as palavras de Aristóteles, afirmou: “A polícia é a principal depositária da função policial, distinguindo-se das demais funções públicas, por ter um núcleo activo de coacção. A finalidade última da função de polícia é a promoção do bem-comum” (p. 37).

Mas se o conceito polícia é ele próprio polissémico, também as atividades policiais têm vindo a evoluir na sua esfera de competências. Hoje, e conforme escreveu Clemente (2000), cada vez com maior frequência as atividades policiais traduzem-se num crescente prestar de serviços de índole não criminal, “(…) a par da segurança contra a acção delituosa, aliando-se assim a prevenção social à prevenção criminal, o que aumenta a capacidade de comunicação e o nível de empatia entre o público e o serviço policial” (p.150).

No Portugal atual, e cumprindo em pleno um dos direitos mais elementares e fundamentais do Homem, o direito fundamental à segurança, e conforme se encontra explícito no nº. 1 do artigo 272º. da Constituição da República Portuguesa [doravante CRP], a “Polícia tem por função defender a legalidade democrática e garantir a Segurança Interna e os direitos dos cidadãos”.

Assumindo o Estado o dever de proteger os cidadãos contra a agressão aos seus direitos por parte de terceiros, deverá haver articulação entre a defesa dos direitos dos cidadãos com o direito à segurança (artº. 27º., CRP de 1976). Conforme o artº. 273º. desta mesma CRP, é da competência dos serviços da polícia garantir, não apenas a segurança interna como ainda assumir a defesa nacional contra agressões e ameaças externas.

Por segurança interna entende-se então toda a atividade levada a cabo pelo estado no sentido de garantir a ordem, a segurança e a tranquilidade públicas, proteger pessoas e bens, prevenir a criminalidade e contribuir para assegurar o normal funcionamento das instituições democráticas, o regular exercício dos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos e o respeito pela legalidade democrática. Esta é então a missão da Polícia. E que a define.

A PSP tem um efetivo de cerca de 23000, conforme o Balanço Social da PSP de 2011. As missões que lhe estão atribuídas pela lei, englobam um vasto conjunto de atividades. Deste fato, decorre um intenso, quotidiano e inevitável contato entre os elementos policiais e os cidadãos. Resultado da evolução tecnológica, há uma utilização crescente das novas tecnologias, que se manifestam em aplicações distintas e em todos os setores da atividade policial (Estratégia para as Tecnologias de Informação e Comunicação na PSP: 2013-2016 [doravante, ETIC-PSP]). Assumindo essas tecnologias como instrumentos que potencializam a eficácia policial, numa instituição com as caraterísticas e a missão da PSP, são nos recursos humanos que reside o seu mais importante e estratégico recurso, não apenas pela capacidade de utilizar, inovar e potenciar em seu próprio benefício essas tecnologias nas quais houve inteligência e sentido de oportunidade em investir, mas também porque grande parte da eficiência e eficácia policial depende em grande medida da qualidade do desempenho e do contato interpessoal que se desenvolve entre os efetivos da PSP entre si e com o cidadão, para a defesa e proteção do qual esta instituição procura servir.

A PSP tem como sua entidade tutelar, o Ministério da Administração Interna, sendo a sua organização única a nível nacional e abrangendo todo o território português. Carateriza-se pela sua organização hierárquica e respeita a diferenciação entre aquelas que são as funções policiais e as que correspondem às funções gerais de gestão e administração públicas, em todos os níveis da sua estrutura; as primeiras obedecem à hierarquia de comando e as segundas às regras gerais da hierarquia da função pública (Lei nº. 53/2007 de 31 de agosto).