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1. Da “escola do mingau” ao Instituto Federal: contextualização da pesquisa na política de Educação

1.2 Política educacional brasileira

Investigar acerca de qualquer espaço sócio-ocupacional do Serviço Social implica o estudo da política social ao qual está vinculada mais diretamente. Compreendemos, nesta pesquisa, a política educacional brasileira enquanto direito social. Faremos um breve apanhado da trajetória histórica, com marcos do que tem

34 maior impacto na história da educação no Brasil, tendo como foco de abordagem a educação profissional no Brasil, relacionando-a com o contexto da Bahia (principais aspectos da história do IFBA, onde esta pesquisa será desenvolvida). O objetivo destas informações é refletir acerca da inserção e consolidação do Serviço Social no âmbito da educação profissional, bem como a expansão desta na contemporaneidade.

Podemos afirmar que a construção da política educacional brasileira não pode ser compreendida sem levar em consideração a formação da nossa sociedade a partir da colonização de exploração que vivemos e os “atrasos” de seu desenvolvimento socioeconômico decorrentes deste processo. Da mesma forma, não podemos omitir a perspectiva de análise aqui presente, pois se situa a educação no bojo da estrutura do sistema capitalista, com suas contradições e interesses.

Orso (2008) define os tipos de educação como formal e informal, sendo que a primeira é a que é ministrada nas instituições de forma sistemática e a segunda, a que ocorre cotidianamente, em diferentes espaços, a partir dos costumes, leis, lutas e aprendizagem da vida.

A evolução histórica da educação enquanto política básica e universal sempre teve e sempre terá ideologias fundantes, haja vista a impossibilidade de haver neutralidade na educação, pois esta sofre influências e disputa na correlação de forças sociopolíticas. É assim que, desde o século XV, estudiosos apontam a gestação da educação liberal a partir do Renascimento, caracterizado pelas mudanças no comércio, expansão marítima, “descobertas” de continentes e iminência da formação da classe burguesa. (CAMINI, 2009).

No Brasil, desde os primórdios da colonização, a partir de meados do século XVI, a educação era de responsabilidade da Igreja Católica. No período jesuítico (1549 a 1759), as principais características da educação eram os princípios da cristandade com caráter humanístico. A educação era elementar para os índios e homens brancos, a educação média apenas para a classe dominante e a educação superior, disponível apenas na Europa, de forma religiosa aos sacerdotes. Importante destacar a quem servia a educação, do ponto de vista de classes sociais e sua função estratégica: formação das classes dirigentes da sociedade. A este respeito, Camini (2009, p. 61), afirma que:

35 Os recursos pedagógicos usados pelos jesuítas eram especialmente de dominação [...] é preciso considerar que o século XVII foi marcado pela ascensão da burguesia, pela implantação do capitalismo e pela intensificação das empresas coloniais que conquistavam e usufruíam as riquezas da América, da África e da Índia.

O mesmo autor baliza o período pombalino (1760 a 1807) e joanino (1808 a 1821). O primeiro, a partir de suas reformas educacionais, quando o Estado assume a centralidade do processo educacional no lugar da Igreja, e o segundo, o Joanino, que ocorre na conjuntura de vinda da família real para o Brasil e apresenta um objetivo educacional extremamente utilitarista, de preparar a defesa militar da colônia e burocracia do Estado a serviço do reino. Já no período Imperial (1822 a 1889), o objetivo da educação passa a ser a formação da personalidade e desenvolvimento da nação. São estabelecidas algumas legislações, como a constituição de 1824, apontando a instrução primária gratuita e universal, a lei de 1827 (única sobre ensino elementar), o ato adicional de 1834 e, finalmente, a implantação da primeira escola normal do país em 1835, em Niterói – RJ. Tais legislações instituem a educação primária e secundária sob responsabilidade das províncias. Ainda não havia plano nacional de educação no Brasil.

Com o advento da república (a partir de 1889), a influência positivista12 se faz presente em um contexto de pós-revolução francesa e intensa industrialização em todo o mundo. O surgimento das fábricas suprime as corporações de artes e ofícios13, a aprendizagem artesanal e ordem dos jesuítas. Conforme análises de Camini (2009), a relação entre a educação e o trabalho começa a se mostrar ainda mais estreita – aos ricos: a escola; aos pobres: a fábrica – bem como a relação de exclusão da classe explorada, já que era evidente que o modelo burguês não atendia às necessidades das massas.

A primeira república brasileira (1889 a 1929) apresenta à educação a descentralização do ensino com a Constituição de 1891, cabendo ao Estado o

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O pensamento positivista explica e justifica ideologicamente a ordem burguesa e uma de suas peculiaridades reside em seu tratamento moral dos conflitos e contradições sociais. Seu conservadorismo, expresso em sua defesa da ordem e da autoridade, aliado à idéia de uma ordem social naturalmente “harmônica”, possibilita que as lutas sociais sejam vistas como “desordem” que a educação moral pode superar. A articulação entre a “harmonia” social e a ação moral tem como fundamento a valorização do altruísmo e persuasão em busca da coesão social (BARROCO, 2006, p. 77).

36 ensino primário e profissional, nível médio para moças e escolas técnicas14 aos rapazes. É oriunda deste período a cadeira de moral e cívica para combater protestos políticos. Após este período, caracterizado como “República Velha”, adentramos no primeiro Governo Vargas (1930 a 1945), demarcado pela consolidação do “processo de substituição de importações de produtos manufaturados pelos da indústria nacional, dando início a segunda fase da constituição do capitalismo brasileiro” (SANTOS, 2012, p. 72).

No aspecto político-ideológico, Camini (2009) pondera que as primeiras décadas do século XX são consideradas ricas para a educação, com muitos debates, criação da Associação Brasileira de Educação – ABE – e o manifesto dos pioneiros da educação nova para a reconstrução educacional no Brasil. Tal movimento pedagógico reformador, denominado de “Escola Nova”, teve como pioneiros da representação no Brasil Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo e Lourenço Filho.

Significou um avanço em relação à pedagogia tradicional inspirada na visão jesuítica; entretanto, não resolveu os problemas educacionais que havia se proposto [...] no sentido de alterar o panorama organizacional dos sistemas escolares. Ambas as perspectivas continuam voltadas para a classe burguesa em detrimento das camadas populares. (CAMINI, 2009, p. 79).

É à luz da conjuntura do início de século XX que se apresentam, a seguir, os principais aspectos da história da educação profissional no Brasil, relacionando-a, inevitavelmente, com a conjuntura política e sócio-econômica do país. Ressaltamos, nesta trajetória, os períodos mais peculiares, como: desenvolvimentismo (década de 1950) e a ditadura militar (1964 a 1985).

No governo do presidente João Goulart, na iminência da ditadura militar, a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional foi criada. A LDB de 1961 teve posições de otimismo pela conquista, inclusive: “a tacharam de „carta de libertação da educação nacional‟, passando pela reserva de outros, até o pessimismo extremado dos que se debateram contra ela” (ROMANELLI, 1998, p. 179).

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Ver-se-á mais detalhadamente nos próximos tópicos sobre a educação técnica profissional, a quem servia e seus objetivos.

37 A verdade é que a Lei já nasce defasada, conforme análises de Aranha (1996, p. 204), pois “envelhece no decorre dos debates e do confronto de interesses”. A autora pontua que não há alteração na estrutura do ensino, apesar de permitir equivalência dos cursos; apresenta fins genéricos, com a vantagem de não estipular currículo fixo e rígido para todo país; a Lei atende também as escolas privadas e continua a não dar atenção especial ao ensino técnico (ARANHA, 1996, p. 204-205).

No contexto da ditadura militar o Brasil recebia fomento e assessorias internacionais para pensar os moldes da educação nacional. Neste bojo, importantes decretos e Leis de Diretrizes e Bases da Educação foram instituídos. Não trataremos de suas análises neste estudo, mas indicamo-los como principais marcos:

 A Lei 5.540, de 28 de novembro de 1968, que instituiu os princípios para a organização e funcionamento do ensino superior e sua articulação com a escola média;

 A Lei 5.692 de 11 de agosto de 1971, que fixou as diretrizes e bases para o ensino de 1º e 2º graus;

 Decreto 68.908, de 13 de julho de 1971, que dispôs sobre o vestibular.

A década de 1980 teve grande importância na nossa história, pois é marcada pela efervescência dos movimentos sociais no processo de redemocratização do Brasil, mobilizando o país para a democracia e a garantia de legislações na perspectiva do direito social. Apesar das conquistas, houve perversas consequências das políticas econômicas mundiais, adotadas pelos últimos governos brasileiros, quando a política neoliberal foi intensamente implantada no Brasil.

Como se pode constatar, a política educacional sempre está associada às diferentes conjunturas e acompanha as transformações políticas do sistema capitalista. No Brasil, as legislações e reformas educacionais, em dados contextos históricos, refletem o embate de projetos presentes na luta pela educação como direito e as principais diretrizes destas políticas, como a constituição federal de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei nº 9.394 de 1996), dentre outros documentos oficiais.

A educação formal – tratada nesse estudo – “se parece mais com uma forma de adestramento, disciplinarização, treinamento e docilização dos indivíduos, do que como meio de transformação e de revolução social” (ORSO, 2008, p. 50-51). Desta

38 forma, o autor questiona a possibilidade real de a educação formal contribuir na transformação da sociedade haja vista o papel de reprodução desta, assumido constantemente. De fato, o estudo ora apresentado vai demarcando momentos em que a gestão da educação reflete a sociedade que a produz, de acordo e a serviço da etapa de desenvolvimento do capital financeiro e das relações sociais estabelecidas, mas concordando ainda com Orso (2008), as instituições de educação são também espaços de produção social.

A seguir apresentam-se elementos que fazem apreender como a educação, mais especificamente a educação profissional, foi gestada e se desenvolveu durante o século XX, com destaque para a Bahia.