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Antes de analisarmos a política do estado relativamente à imigração, cabe aqui introduzir um singelo panorama de algumas das perspectivas que procuram enquadrar teoricamente o papel dos imigrantes na constituição (de acção) política, de forma a melhor clarificarmos quais as condicionantes e consequências que pautam o envolvimento da imigração no contexto sociopolítico.

Segundo Ireland & Soysal (1994, referidos por Horta, 2008), são três as principais abordagens teóricas que sublinharam a análise dos padrões de participação política dos imigrantes.

A primeira refere-se à “teoria das classes”. Esta defende que as estruturas organizacionais dos imigrantes e as suas formas de participação política dependem muito dos “interesses comuns de classes” dos imigrantes. O argumento central é o de que as forças económicas capitalistas criaram, através da mão-de-obra barata dos imigrantes, subproletariados étnicos/raciais. Isto é, o Estado conjuntamente com as elites económicas, utilizaram diferenciadores raciais e étnicos para dividir a classe trabalhadora, entre população estrangeira e nativa conseguindo, desta forma, manipular com mais facilidade uma força de trabalho fragmentada que, em última análise, suporta os custos da reestruturação industrial. Segundo esta perspectiva, é através da mobilização e da acção colectiva da classe trabalhadora que se constituem solidariedades e que se delineiam estratégias políticas capazes de superar a segregação e a exclusão social das populações imigrantes. Além disso, para estes autores, os padrões de participação política dos imigrantes são vistos como parte de um processo global de acção reivindicativa da classe dos trabalhadores que assenta em interesses comuns.

A “teoria da etnicidade/raça” tem como premissa fundamental a noção de que as identidades étnicas, raciais e religiosas dos imigrantes tem uma importância capital na sua organização colectiva e na mobilização política. Ao centralizar-se nas políticas étnicas dos imigrantes, esta abordagem prevê que um grupo particular de imigrantes, dada a especificidade das suas características nacionais, culturais e religiosas, tende a desenvolver padrões semelhantes de mobilização política em diferentes sociedades de acolhimento.

Para esclarecer a variação transnacional da mobilização política dos imigrantes, alicerçando- se numa “perspectiva institucional”, propõe-se ainda uma “teoria de canalização institucional” para as políticas de imigração. Central desta abordagem sociológica é a noção de que o comportamento político dos imigrantes depende, em grande medida, “da estrutura de oportunidades políticas” da sociedade de acolhimento.

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Soysal (1994, 1998, citado por Horta, 2008), na sua análise sobre a imigração e a cidadania, afirma que os ambientes institucionais das sociedades de acolhimento têm uma importância decisiva para as organizações e o activismo político dos imigrantes. Isto é, as formas organizativas, objectivos, tácticas e estratégias políticas, bem como os níveis de integração e participação na sociedade de acolhimento, reflectem-se directamente na natureza das políticas de imigração do Estado. O autor refere, a título de exemplo, que na Suécia e na Holanda as políticas e os discursos do “Estado Central” promoveram a participação política dos imigrantes segundo linhas étnicas ou nacionais. Assim, os canais oficiais para a participação colectiva dos imigrantes salientaram o carácter nacional e étnico das organizações dos mesmos. Contrariamente, na Alemanha, Suíça e Grã-Bretanha, a carência de políticas oficiais e institucionais centralizadas resultou em padrões de organização dos imigrantes relativamente mais fragmentados ou localizados, relevando um “Estado Central” que não exerce um papel directo na integração dos imigrantes.

Em França e Portugal, o enfoque na cidadania e na nacionalidade configuraram as políticas de imigração em domínios mais extensos. A mobilização dos imigrantes centrou-se no reagrupamento familiar, na legalização e no direito da cidadania (Horta, 2008).

Em Portugal, é notável o esforço feito no sentido de promover a integração e melhoria das condições de vida dos imigrantes, sobretudo ao nível da habitabilidade. A implementação de políticas sociais na década de 1990, visando a erradicação das barracas, a renovação urbana, a reabilitação e a legalização de bairros clandestinos foi decisiva na melhoria das condições de habitação, tanto da população autóctone como dos imigrantes africanos.

Neste contexto, e sem podermos analisar exaustiva e criticamente a questão, é de se realçar a importância dos programas de realojamento nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto, que permitiu a mudança de milhares de famílias que residiam anteriormente em barracas, independentemente do seu estatuto jurídico. Claro que esta política não garante, por si só, uma plena integração dos imigrantes (ilegais ou não), nem tão pouco, uma irrefutável melhoria de vida, mas potencia a existência de algumas condições indispensáveis à construção de uma vida digna por aqueles que vivem à beira da exclusão social.

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Quadro 4. Evolução das políticas portuguesas de imigração

Fases Principais Aspectos Políticos Grupos de Imigrantes

Fase I 1960-1973

Recrutamento de força de trabalho africano (cabo-verdianos); imigração de substituição. Fluxos de profissionais e empresários europeus.

Britânicos, franceses, alemães, brasileiros e cabo-verdianos

Fase II 1974-1990

Políticas de Laissez-faire, regresso dos emigrantes portugueses; repatriação dos portugueses a residir nas ex-colónias; migração de refugiados (PALOP); fluxo de migração de mão-de-obra dos africanos das ex-colónias.

Africanos das ex-colónias portuguesas (Cabo Verde, Angola, Moçambique, São Tomé e Príncipe, Guiné Bissau; brasileiros; europeus; norte-americanos. Também europeus de Leste

Fase III 1990-1994

Políticas integracionistas/assimilacionistas e de exclusão diferencial. Restrições mais apertadas em relação aos cidadãos não europeus (ex: africanos). Harmonização de políticas nacionais com as directivas da UE. Legislação mais restritiva sobre imigração e asilo. Primeiro período de regularização extraordinária de imigrantes. Introdução de medidas de inclusão ao nível local. Migração de mão-de-obra e de refugiados.

Influxos africanos, asiáticos e europeus

Fase IV

1995 até ao presente

Políticas integracionistas/ inclusivas. Controlo mais apertado dos influxos dos países terceiros (africanos e da Europa de Leste). Alargamento dos direitos sociais e políticos aos imigrantes. Vários períodos de regularização extraordinária de imigrantes. Novos dispositivos legais sobre imigração e lei de nacionalidade mais inclusiva. Migração de mão-de-obra.

Brasileiros, europeus de Leste, africanos, asiáticos.

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