3.3 ENTRE DIÁLOGOS E NARRATIVAS
3.3.2 Políticas ambientais
Aliadas a esses fatos estão as políticas ambientais que são recentes no cenário brasileiro. Embora inovadoras (FERREIRA, 1998; SOUSA, 2006), conservam a obediência para com a agenda 21 e as convenções ratificadas em nível internacional, como as Convenções de Roterdã (1998), Basiléia (1988), Estocolmo (2001). No entanto, implementar as exigências das leis ambientais nessas regiões é uma dificuldade maior a ser contornada.
Isso remete não à região do entrono do PNI em particular, apesar do conflito com o fechamento da estrada, que acirra a relação adversa entre meio ambiente e desenvolvimento. A política ambiental brasileira, formalizada a partir da década de 70 e 80 sob pressão de grupos ambientalistas internacionais, se constitui em desajuste com a realidade prática do país. Quando relacionada desde a criação, ao que me parece, se mostra como falta de compromisso do Estado frente às questões ambientais, como pode-se perceber ao analisar a criação de alguns órgãos ambientais, como a SEMA que
(...) se dedicava ao avanço da legislação e aos assuntos que demandavam negociação em nível nacional, tais como a produção de detergentes biodegradáveis, a poluição por veículos, a demarcação de áreas críticas de poluição e a criação de unidades nacionais de conservação. De fato, as medidas de Governo se concentravam na agenda de comando e controle, normalmente em resposta a denúncias de poluição industrial e rural134.
O modelo da política ambiental brasileira elaborado a partir da Conferência de Estocolmo teve como pilares principais o controle da poluição e a criação de unidades de conservação.
O crescimento populacional e o saneamento básico, componentes de políticas setoriais de impactos sobre o meio ambiente, ficaram excluídos desse modelo, constituindo, cada um, objeto de política própria, não articuladas à questão ambiental, o que evidenciou o desenvolvimento isolado deste setor135.
Desenvolvimento e proteção ambiental entram em choque também no PNI. E elaborar uma gestão participativa dos recursos do Parque depende também de administrar as leis sob os moldes das necessidades individuais dessas localidades.
134
Sousa, 2006. Disponível online em http://www.achegas.net/numero/vinteeseis. Acesso em 15.02.2009. 135
Zona de amortecimento é um problema, é de 10 km. Na zona de amortecimento não dá pra ter tilápia, mas e se não está na bacia na zona de amortecimento? A cidade de Capanema está na zona de amortecimento. Precisamos redesenhar tecnicamente essa área. Floriano é a única bacia hidrográfica totalmente inserida em uma floresta, salvaguardado, é um testemunho para qualquer análise. Só que eu tenho na BR 277 uns 14 pontos vulneráveis. Outro dia deu um acidente com um caminhão com álcool, mas se for ácido sulfúrico, e outro tóxico? (Cedro, em 19.03.08)
Conforme citado no capítulo I, Serranópolis do Iguaçu possui cerca de 90% dos seus domínios na zona de amortecimento do PNI136. Qualquer atividade a ser realizada no município dependeria de autorização da administração do PNI. Essa situação se estende a outros municípios do entorno, tendo em vista a forte urbanização dessa região.
Nós temos praticamente todo o município dentro dos 10 Km. E brigamos pra não fazer mata ciliar em tudo. Lutamos pra não fazer essa averbação dos 20%. Apenas dois mil hectares não estão dentro dos 10 km. E não podemos fazer a reserva legal em outro município. Vamos perder 11 mil hectares de lavoura. (Palmito, em 12.02.2008)
Essa situação preocupa também a administração do PNI. Os parques nacionais sofrem hoje forte pressão para adequação às metas do governo federal, e o PNI está na lista de Unidades de Conservação a serem atingidas pelo PAC137. Nas conversas com a administração do mesmo, esse assunto foi destaque, já que está diretamente ligado às possíveis políticas de integração com as comunidades. Atento às questões que eu estava pesquisando ficou visível o interesse em saber porque eu precisava das informações e então me disse:
136
10 km de perímetro conforme estabelecido no plano de manejo atual. 137
Plano de Aceleração do Crescimento sendo efetivado no governo Lula. Dentre as políticas a serem implementadas destacam-se a construção de usinas hidrelétricas em bacias que influenciam diretamente as unidades de conservação de uso integral. No caso do PNI, há projeto em fase de licenciamento ambiental que prevê mais uma usina a ser construída no rio Iguaçu, principal rio relacionado ao PNI.
essa zona é mais abrangente, vai pegar a área de influência. Então, onde a bacia do rio Silva Jardim passa, toda a bacia deve estar na zona de amortecimento, então o que era 10 km, pode passar pra 20 km. E há outras coisas, como áreas urbanas que não podem entrar na área da zona de amortecimento; então Matelândia complica e Céu Azul vai sumir. O município não pode crescer no sentido do parque. (Jequitibá, em 16.03.2008)
O estabelecimento das Zonas de Amortecimentos, além de obedecer ao marco inicial de um raio de 10 km estabelecidos pela Resolução CONAMA 13/90, deve estar ajustado aos limites geográficos de acordo com as características ambientais regionais e, principalmente, considerando as bacias hidrográficas e o potencial para a formação de corredores ecológicos. Para o mesmo agente, demonstrando tensão sobre o assunto, não há simplicidade nos fios que enredam o fechamento da Estrada do Colono, por isso, afirma:
tenho medo quando eu for mexer com isso. Vai dar uma “pauleira”, até mesmo política. Até falei na reunião dos chefes: como vocês vão falar para um prefeito que o município dele não pode crescer mais? Quer mexer, chama o pessoal de Brasília, eu é que não quero mexer com isso... (Jequitibá, em 19.03.2008)
Essa aparente necessidade de conciliação entre as possibilidades de “desenvolvimento” dos municípios, com a preservação ambiental tal qual reza a legislação, é dificultada não apenas pelo histórico das políticas de meio ambiente adotadas pelo Brasil, num viés de resposta aos apelos e pressões externas, deixando a área ambiental como isolada dos outros setores do governo. Um fato que mais se destaca, no caso dos municípios do entorno do PNI é que, conservar a estrutura econômica e fundiária desses municípios, impede o cumprimento ipsis literis das leis ambientais.
Este é um problema de gestão que se mostra de solução imprevisível, como pude perceber na estada nessas regiões. O ter que falar ao prefeito que o município dele não vai
crescer mais reflete o tipo de desenvolvimento que se espera ainda hoje para o país, de
levar o progresso às matas, com o mesmo sentido que move alguns discursos para a reabertura da Estrada. Imbricadas na dinâmica social mais ampla, essas regiões cogitam as prioridades às quais são dadas ao progresso que se espera para o país. Por outro lado, tendo
esse viés como norteador, essas cidades parecem não perceber outras formas de administração.