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NÃO-ALFABETIZADO ALFABETIZAÇÃO INCOMPLETA INTERMEDIÁRIO SUFICIENTE DESEJÁVEL

2 ANÁLISE DA INCIDÊNCIA DAS POLÍTICAS DE RESPONSABILIZAÇÃO DO ESTADO DO CEARÁ NAS AÇÕES PEDAGÓGICAS EM ÂMBITO MUNICIPAL A

2.1 Políticas de accountability: em busca de um conceito

A discussão envolvendo políticas de accountability remete a uma reflexão sobre a própria reforma do Estado que se tornou imperiosa em todo o mundo a partir

da década de 1970 e o surgimento, neste contexto, do modelo gerencial12 no setor

público, em substituição ao modelo weberiano13 (ABRUCIO, 1997).

Segundo Schneider (s/d, p. 2) o termo accountability não tem uma tradução exata para o português, embora alguns autores, ainda que sem consenso, o empreguem como sinônimo de responsabilização. Citando Pinho e Sacramento (2009), a autora informa que o termo está presente na literatura americana desde antes da década de 1970, sendo que sua introdução no Brasil remonta ao início dos anos de 1990, coincidindo com o início do processo de redemocratização do país, cuja base do discurso empregado naquele momento no contexto da administração pública assentava-se sobre os princípios da descentralização, desconcentração dos serviços públicos e da autonomia dos entes federados.

Campos (1990) escreveu um polêmico artigo intitulado Accountability: quando poderemos traduzi-la para o português?, no qual, entre outras abordagens, manifesta sua inquietação quanto ao fato de que no final dos anos de 1980, início da década de 1990, na literatura brasileira, não se encontrava o termo accountability. Segundo a pesquisadora, esse fato se explica devido à falta do próprio conceito entre os administradores brasileiros naquele momento, o que se torna compreensível se considerarmos que o conceito de accountability remete a uma intrínseca relação com os processos democráticos, ou seja, com a participação dos cidadãos no acompanhamento das políticas desenvolvidas pelos poderes públicos, o que, naquele período da história política brasileira, não acontecia devido ao regime ditatorial que acabara de ser rompido.

Naquele momento, a autora elencou alguns fatores fundamentais para que a administração pública do Brasil pudesse tornar-se accountable, o que, para ela, não aconteceria fora de um contexto democrático. Um dos fatores diz respeito ao controle social por parte dos cidadãos, ou seja, à capacidade destes de se organizarem para exercerem o controle político do governo. Outro fator é a descentralização e a transparência como princípios norteadores das ações

12 O modelo gerencial seria utilizado no setor público para diminuir os gastos em uma era de escassez e para aumentar a eficiência governamental. Em suma, o gerencialismo puro tinha como eixo central o conceito de produtividade (POLLITT, 1990, p. 2).

13 Dimensão do estado de bem-estar (Welfare State), ao qual cabia o papel de manter a impessoalidade, a neutralidade e a racionalidade do aparato governamental, em um contexto cujo objetivo primordial era a produção de políticas públicas na área social (educação, saúde, previdência social, habitação, etc.) para garantir o suprimento das necessidades básicas da população.

governamentais, o que, conforme já exposto anteriormente, permite a construção de maior autonomia por parte dos entes federados, como os estados e os municípios. E elenca, ainda, a emergência de novos valores sociais como importantes para que os processos democráticos se consolidem (CAMPOS, 1990).

Em 2009, passados mais de vinte anos da produção do artigo de Campos, tendo em vista que este, embora publicado em 1990, fora escrito em 1987, Pinho e Sacramento publicam Accountability: já podemos traduzi-la para o português?, por meio do qual revisitam Campos (1990) na perspectiva de verificar as mudanças ocorridas na sociedade brasileira ao longo dos anos, nos aspectos social, político e institucional que pudessem propiciar o desenvolvimento da accountability. No entanto, interessa aos objetivos deste trabalho, apenas a discussão que os autores promovem sobre o conceito de accountability.

De início, os autores admitem a falta de um consenso entre os estudiosos da área quanto a uma palavra em português que remeta ao significado exato de accountability, embora, segundo eles, alguns pesquisadores assumam com segurança uma tradução exata do termo para o português, como responsabilização, por exemplo.

Na dificuldade de encontrar em português uma palavra que traduza de forma clara o termo de origem inglesa, Pinho e Sacramento (2009) sintetizam:

[...] accountability encerra a responsabilidade, a obrigação e a responsabilização de quem ocupa um cargo em prestar contas segundo os parâmetros da lei, estando envolvida a possibilidade de ônus, o que seria a pena para o não cumprimento dessa diretiva. (PINHO e SACRAMENTO, 2009, p. 1348)

Schedler (1999, apud Pinho e Sacramento, 2009, p. 1350), no entanto, reforçando Campos (1990), retoma a importância de um contexto democrático para a instalação da accountability, ao reafirmar que “[...] é maior o interesse pela accountability em sociedades que apresentam avançado estágio democrático”. Segundo Schedler, a verdadeira razão de ser da accountability é o controle social.

Ainda segundo Pinho e Sacramento (2009), o Centro Latino-Americano de Administração para o Desenvolvimento (CLAD) alertou para o fato de que:

[...] a realização do valor político da accountability depende do desenvolvimento da capacidade dos cidadãos de agir na definição das metas coletivas de sua sociedade e da construção de mecanismos institucionais que garantam o controle público das ações dos governantes ao longo de todo o seu mandato (2006:27). (PINHO e SACRAMENTO, 2009, p. 1353)

Como se pode deduzir da transcrição acima, e relacionando-a às ideias sobre o conceito de accountability, fica clara a estreita relação entre os aspectos que a envolvem e um contexto de democracia para que a sua eficácia se efetive.

Até aqui, tratou-se o conceito de accountability no âmbito da administração pública de forma geral, sem especificá-la a nenhuma área específica. No entanto, para relacioná-lo com a educação, reporta-se aqui a Afonso (2012) quando, à luz do pensamento de Schedler (1999), trata das variáveis que compõem a accountability em educação: avaliação, responsabilização e prestação de contas.

Para o autor, a prestação de contas pode ser entendida como o pilar que sustenta o direito de pedir informações e de exigir justificações. A responsabilização, embora mais diretamente relacionada com o reconhecimento do mérito ou com sanções punitivas em relação aos atores envolvidos nos sistema de accountability, não deixa de, na visão de Afonso (2012), estar relacionada ao processo de prestação de contas enquanto ato impositivo por uma exigência da sociedade, e não como uma benéfice dos agentes públicos. E, por fim, a avaliação, como instrumento de recolha de dados e informações para subsidiar os juízos de valor sobre uma determinada realidade.

Andrade (2008), a partir da análise da experiência americana com sistemas de accountability e com o objetivo de iluminar a discussão sobre a realidade brasileira no que tange à accountability em educação, elenca, ainda que em linhas gerais, algumas características da política de accountability em educação. Segundo o autor, definir padrões educacionais mínimos para cada ano escolar; realizar testes de proficiência junto aos alunos; divulgar os resultados dos testes por escola; declarar como objetivo explícito a melhoria do desempenho dos estudantes nos testes e responsabilizar professores/diretores das escolas pelo sucesso ou fracasso dos estudantes nos testes de proficiência são os pilares sobre os quais se assentam a accountability nas escolas americanas e que influenciaram a desenho de modelos de accountability nos demais países.