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Ponto de partida: Os alunos e a poesia – opiniões e capacidade interpretativa

CAPÍTULO IV – APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

A. Ponto de partida: Os alunos e a poesia – opiniões e capacidade interpretativa

Tal como já foi referido, antes e após a intervenção em contexto foram aplicados dois testes diagnósticos, o primeiro teste tinha como por objetivo proceder ao levantamento das ideias pré-concebidas dos alunos acerca da poesia e a sua forma de interpretação face a um poema.

Dados relativos ao primeiro teste diagnóstico aplicado aos participantes deste estudo, permitem perceber que grande parte das conceções acerca do termo poesia, derivavam do convívio quase inexistente com este tipo de texto, sendo que as respostas obtidas permitem concluir que o termo é já objeto de mal-entendidos, mesmo em tenra idade.

Deste modo, quando questionados acerca de poesia, grande parte dos alunos, para além de afirmarem serem leitores regulares deste tipo de texto, associaram, ainda, o termo à presença da rima, do sonho e do que é belo. De facto, face a esta pergunta surgiram respostas como: “(…) para ler poesia é preciso rimas e eu gosto muito de as ler”; “(…) acho

que é engraçada e divertida e a poesia é pequena para ler.”. Tais conceções vão desde logo

ao encontro do que é criticado por Siméon (2015), acerca dos preconceitos e mal- entendidos que a poesia, todavia é vítima. Estas ocorrências refletem nas palavras do mesmo autor “(…) uma representação restrita do que poderia ser a poesia, reduzida a uma forma fixa e regular – (…) – e isso traduz a permanência de um corpus restritivo, isto é, de um certo número de textos que encontramos sempre e que congelam a representação que temos da poesia” (p.21).

Contudo, os alunos consideram que a exploração do texto poético nas aulas de Português é importante, argumentando que com a sua leitura adquirem “mais

conhecimentos e a nossa imaginação aumenta.” Apesar de não se encontrar explícito, os

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de rimas, mas que também pode ser portador e objeto de saberes. Tal conceção vai ao encontro do que é defendido por autores como Siméon (2015), Guedes (1990) e Ribeiro (2007), segundo os mesmos o trabalho com a poesia permite à criança experienciar, comparar e decifrar sentidos, ao mesmo tempo que envolve um questionamento e uma reflexão constante. Este modo de exploração permite, assim, descobrir e/ ou ampliar novos significados, que conduzem, por sua vez, à obtenção de novos conhecimentos.

A respeito da importância do tratamento de temas considerados difíceis, como a guerra e a paz, nas aulas de Português, os dados permitiram averiguar que na sua grande maioria os participantes consideram importante a exploração desses assuntos. Nas respostas dadas constatou-se que em alguns casos as crianças demonstram alguma sensibilidade perante os temas mencionados, tal como sucedeu no exemplo a seguir de resposta de um dos alunos: “Sim, porque ao trabalhar com esses textos aprendemos a não

entrar em “guerra” com os outros.”

Quanto ao seu nível interpretativo podemos asseverar que os alunos, nesta fase inicial, se depararam com diversas dificuldades tanto na compreensão do poema em si, como na formulação das respostas às questões colocadas. Com efeito, os resultados obtidos servem de exemplo para as críticas tecidas por Siméon (2015) e por Toré (2010), acerca do modo como o pensamento lógico-racional impede a realização de inferências e a busca de sentidos. De facto, é necessário aqui apontar que o modo como os alunos construíram a sua interpretação do poema foi baseada na literalidade das palavras, o que os levou a recolher informações parciais sobre o poema.

Desta maneira, a construção da sua interpretação ficou, desde logo, castrada pelo 1º verso do poema – “Nos meus sonhos de menina”. Efetivamente, grande parte dos alunos associaram a mensagem do poema ao sonho de uma menina, como são exemplos de resposta as seguintes afirmações: “(…) queria-nos transmitir a mensagem de que nós não

devemos desistir dos nossos sonhos”; “Todos podemos sonhar”. Esta associação do poema

à presença do sonho, condicionou e conduziu a uma interpretação errónea da última estrofe – Tenho o sonho em estilhaços: / fiquei sem pernas, sem braços”. Confrontados com os dois versos, várias foram as crianças que alegaram que o mesmo explanava a efetiva

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destruição dos sonhos da menina, como sucedeu no exemplo a seguir: “Significa que os

seus sonhos morreram”.

Contudo, nem todos os participantes tomaram a mesma posição face à última estrofe do poema, uma pequena minoria conseguiu perceber que o poema era um alerta para as guerras atuais e com as quais muitas pessoas lidam.

Outro facto que contribuiu e conduziu para uma interpretação básica do poema, caraterizou-se pelo desconhecimento dos alunos face à palavra “mina”. As respostas obtidas permitem concluir que uma grande fatia dos participantes não percebeu e, tampouco ouvira o termo antes. No entanto, apesar das respostas pouco esclarecedoras que os alunos deram, estes conseguiram perceber que a palavra variava de sentido, conseguindo fazer a distinção do seu valor positivo e negativo. Em outros casos os alunos associaram a palavra “mina” ao termo brasileiro de menina, o que não lhes permitiu compreender as diferenças de significado, como sucedeu no caso do aluno seguinte: “Sim,

porque mina é o significado de menina.”

Na última questão foi pedido aos alunos que nomeassem, para além da guerra, outro tipo de situações problemáticas por eles conhecidas e que preocupavam o mundo e a sociedade em geral. As respostas foram variadas, sendo que estes conseguiram formular respostas coerentes e que provinham dos seus próprios conhecimentos. Na maior parte das respostas surgiu a referência aos incêndios, à poluição, ao acesso à educação e a fome.

Após a primeira análise aos questionários, constatou-se que era necessário fazer uma abordagem pedagógica que permitisse não só desconstruir os preconceitos dos participantes acerca do termo poesia, mas, também, que possibilitasse a este grupo um contacto mais estimulante e significativo com este tipo de texto. Desta forma, foi desenvolvido um projeto de leitura que permitiu aos alunos contactar com diversos textos poéticos, para, assim, também, despertar e fomentar a sua capacidade de interpretação.