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Possibilidades na Educação Superior democrática frente à diversidade

CAPÍTULO 1: UNIVERSIDADE, CONTEXTO SOCIAL E O ACESSO À

1.3 Possibilidades na Educação Superior democrática frente à diversidade

É imprescindível destacar alguns temas que interferem, ao longo da história, no sucesso acadêmico11 das pessoas que constituem as camadas subalternizadas da sociedade.

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Nos referimos a superação das dimensões da ―universidade destinada a reproduzir recursos humanos, via mero ensino‖ (DEMO, 2001, p. 142).

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A concepção de sucesso acadêmico de uma proposta democrática de educação não se limita ao desempenho do/da estudante. Antes, significa a garantia do direito à educação, que implica, dentre outras coisas, uma trajetória escolar sem interrupções, o respeito ao desenvolvimento humano, à diversidade e ao conhecimento. Além disso, implica a consolidação de condições dignas de trabalho, formação e valorização dos/das profissionais da educação e a construção de projetos político-pedagógicos (PPP) e planos de desenvolvimento institucional (PDI) articulados com a comunidade e as demandas dos movimentos sociais. Significa, também, reconhecer o peso das desigualdades sociais nos processos de acesso e permanência à educação e a necessidade da construção de políticas e práticas de superação desse quadro. A efetivação do sucesso escolar implica a superação de uma visão que atribui exclusivamente ao indivíduo a responsabilidade pelo seu desempenho escolar (CONAE, 2010, p. 85).

Um desses temas que apontamos como de suma importância para se pensar em democracia da Educação Superior refere-se ao respeito e à compreensão da diversidade. Nesses termos, acreditamos que diversidade é compreender as diferenças, sexual, étnica e social de homens e mulheres, de modo que estes tenham o direito de ser diferentes na busca pela igualdade de direitos. A diversidade não pode ser considerada como desvio, algo que precisa ser corrigido, nem mesmo como algo a ser tolerado. A diversidade também não é o espaço do exótico, porque pensar nesses termos significa outra vez nos filiarmos a um pensamento único, que nos diz aquilo que é o normal e, a partir dele, o que é diferente. Empreendemos aqui um pensamento de diversidade enquanto incluso no campo político, situado em relações de poder e resistência, pois, em nossa sociedade encontramos diferentes visões de mundo. No entanto essas relações são assimétricas, uma vez que há os que possuem o poder de expor, de classificar, de impor verdades, e também aqueles que resistem, em seus diferentes contextos.

Não se pode tratar de forma genérica as camadas subalternizadas da sociedade, pois este contingente pode ser abordado a partir de diversos recortes, como, por exemplo, étnico- racial, indígena, gênero, pessoas oriundas da zona rural, das pessoas com algum tipo de necessidade específica, educação ambiental, crianças, adolescentes e jovens em situação de risco, educação de jovens e adultos e educação profissional. Portanto é importante destacar que cada um deles possui especificidades históricas, políticas, de lutas sociais e ocupam lugares distintos na constituição e na consolidação das políticas educacionais. Além disso, realizam-se de forma diferenciada, no contexto das instituições públicas e privadas da Educação Superior.

Cada um desses recortes mereceria uma ampla discussão sobre suas especificidades. Cada um desses assuntos ganha ao longo da história da educação um grau de enraizamento nas políticas educacionais. Por essa razão não é nosso objetivo esgotá-los e sim refletir sobre a temática no seu conjunto, qual seja, camadas subalternizadas. Até porque acreditamos que as especificidades, às vezes, diluem e desmantelam as lutas de classe quando subalternizadas no seu conjunto pela camada dominante homogênea na manutenção dos seus privilégios. Portanto a busca é por direitos que atendam o conjunto para que seja especificada ou particularizada a sua aplicabilidade.

O atual momento histórico pode ser encarado como ponto de partida para uma sociedade mais justa e igualitária, ou seja, equânime na igualdade de direitos e deveres. As questões de reconhecimento, justiça social, igualdade, diversidade e inclusão são postas na pauta social e política enquanto questões de ordem. Embora tais questões sempre fizessem

parte do desenvolvimento da própria educação brasileira, nem sempre elas foram valorizadas pelo poder público na vanguarda das políticas públicas de acesso à Educação Superior.

As mudanças que hoje assistimos nesse quadro, Educação Superior, devem, e muito, à ação política dos movimentos sociais à luta dos trabalhadores em educação que, aos poucos, conseguiram introduzir tais questões na agenda das políticas educacionais12. É de suma importância que as questões ligadas à esfera do direito, ao trabalho e à diversidade social estejam presentes nas diversas instituições educativas e em todos os níveis e modalidades de educação. Ao discorrer sobre essas questões, os movimentos sociais podem explicitar ao Estado, à sociedade e à Universidade a luta de forças e de relações de poder (que passa pela luta por reconhecimento) nos quais se apóiam, historicamente, algumas discussões hegemônicas sobre os direitos humanos. Denunciam que, por detrás de muitos desses discursos, prevalece a concepção de sociedade que nega a diversidade e reforça um determinado padrão de humano: branco, masculino, de classe média ou alta, heterossexual e ocidental. É preciso compreender a diversidade, na sociedade, como uma construção histórica, cultural, social e política das diferenças (HALL, 2003). Ela é construída no processo histórico-cultural do homem e da mulher, no meio social e no contexto das relações de luta e de poder.

A produção social, cultural e histórica das diferenças não é problemática em si. A questão que se coloca é que, no contexto das relações de poder, os grupos humanos não só classificam as diferenças como, também, hierarquizam-nas, colocam-nas em escalas de valor e, nesse processo, subalternizam uns em relação a outros. Quando os vínculos sociais se quebram, devido a processos autoritários, ao uso da força e à colonização, o poder se exacerba, a ponto de um grupo (país, nação, etnia etc) excluir, discriminar e segregar o outro, devido a suasdiferenças. Nesse processo, as diferenças são transformadas em desigualdade (CONAE, 2010, p. 128).

As discussões da diversidade étnico-racial e de gênero, em especial, visam à superação de práticas pedagógicas discriminatórias e excludentes e almeja a justiça social colocada em todas as instâncias de educação, principalmente na Educação Superior, independentemente da sua natureza e do seu caráter. É a partir do pensamento de democratização e do entendimento sobre a diversidade que podemos lutar pelos direitos sociais. Nessa perspectiva, buscamos uma inclusão social em todos os âmbitos sociais que pode ser proporcionado pela inserção acadêmica.

12 Essa discussão pode ser melhor explanada a partir do texto de Aguiar e Bollmann (2011, p. 61-80) intitulado, Movimentos sociais em educação e suas contribuições à política educacional brasileira.

Vale ressaltar que a luta pelo reconhecimento e o direito à diversidade não se opõe à luta pela superação das desigualdades sociais em diversas ordens. Pelo contrário, ela coloca em questão a forma desigual pela qual as diferenças vêm sendo historicamente tratadas na sociedade, na Universidade e nas políticas públicas em geral. Esse tema é aprofundado no próximo capítulo.