• Nenhum resultado encontrado

FAMILIAR COM CÂNCER

Amostra 03- Pov Maria Correia 0,890 mg N-NO 3 /L

Amostra 04 – Pov. Salgadinho 2,59 mg N-NO3/L

Amostra 05 -Pov. Salgadinho (cisterna) 1,69 mg N-NO3/L

Fonte: dados da pesquisadora, 2019.

Entende-se por risco a probabilidade de ocorrência de um efeito adverso durante um certo período de tempo, como resultado de uma determinada exposição. Assim, um fator de risco para o câncer, quando presente, aumenta a probabilidade de ocorrência da doença numa dada população e, quando removido, torna este efeito menos provável (CARNEIRO, 2015).

Conforme os resultados expostos, foram encontrados nitratos em todas as áreas de pesquisa, reforçando a hipótese traçada através da problematização, diante das relações entre contaminação da água e risco neoplásico na população feminina. Tendo em vista que os parâmetros que o definem, assim como seus valores limite, são continuamente revistos e atualizados em função da detecção de novos contaminantes e do uso de tecnologias mais recentes.

O contaminante inorgânico de maior preocupação em águas subterrâneas é o íon nitrato, NO3-, que, normalmente, ocorre em aquíferos de zonas rurais e suburbanas. O nitrato em águas

subterrâneas origina-se, principalmente, de quatro fontes: aplicação de fertilizantes com nitrogênio, bem como inorgânicos e de esterco animal, em plantações; cultivo do solo; esgoto humano depositado em sistemas sépticos e deposição atmosférica (BAIRD; CANN, 2011).

Neste contexto, discute-se a questão da saúde ambiental relacionada à água e salienta- se que o aumento da contaminação das águas por compostos nitrogenados vem merecendo atenção especial, uma vez que está se tornando um problema mundial, devido a sua ampla e diversificada procedência. No Brasil, as nascentes constituem uma fonte importante de abastecimento, e destaca-se que a legislação federal vigente (BRASIL, 1990) não estabelece

limites para as concentrações de nitrogênio amoniacal, nitrogênio albuminoide e nitrito, porém, devido aos efeitos adversos à saúde, causados pelos compostos nitrogenados, considera-se importante à inclusão desses compostos.

No organismo humano, o nitrato se converte em nitrito e, quando presente na água de consumo humano, tem um efeito mais rápido e pronunciado do que o nitrato. Se o nitrito for ingerido diretamente, pode ocasionar metahemoglobinemia independente da faixa etária do consumidor. As nitrosaminas e nitrosamidas podem surgir como produtos de reação entre o nitrito ingerido ou formado pela redução bacteriana do nitrato, com as aminas secundárias ou terciárias e amidas presentes nos alimentos. O pH ótimo para a reação de nitrosaminação é entre 2,5 a 3,5, faixa semelhante à encontrada no estômago humano após a ingestão de alimentos. Tanto as nitrosaminas como as nitrosamidas estão relacionadas com o aparecimento de tumores em animais de laboratório (SILVA; ARAUJO, 2003; BAIRD, 2002).

Além disso, observa-se a relação com agrotóxicos, quando a presença de nitrogênio concerne ao seu uso junto ao fósforo como fatores limitantes do crescimento de vegetais e, por isso, tornaram-se alguns dos principais fertilizantes na agricultura. O nitrogênio ainda desempenha importante papel na constituição das moléculas, de proteínas, ácidos nucléicos, vitaminas, enzimas e hormônios, elementos vitais aos seres vivos (BRAGA et al., 2005). A partir disso, ressalta-se que a água foi coletada no período de 90 dias após o uso de agrotóxicos das lavouras da região, demonstrando o poder de permanência desses compostos na água.

Em relação ao câncer gástrico, observa-se que compostos N-nitrosos podem ser formados no estômago, atuando como fator inicial para a carcinogênese, ou podem ser formados, endogenamente, a partir da ingestão de nitratos e nitritos, que são utilizados em larga escala pela indústria de alimentos e na agricultura. Estados de hipo ou acloridria permitem a colonização da mucosa gástrica por bactérias capazes de reduzir nitratos a nitritos, aumentando a produção in situ (CARNEIRO, 1997). Já Scorsafava (2011) corrobora que o nitrato é tóxico aos seres humanos e, se ingerido em excesso, também pode ser transformado em nitrosaminas e nitrosamidas, ambas carcinogênicas. Além disso, os compostos N-nitrosos e, em particular, as N-nitrosaminas, são considerados potentes carcinógenos, além de apresentarem ação teratogênica e mutagênica em animais de laboratório. Efeitos carcinogênicos de N-nitrosaminas já foram observados em mais de 40 espécies de animais, inclusive em macacos (BARTSH, 2009).

Outro fator que chama a atenção nas entrevistas e na coleta está no fato de que as moradias estão cercadas de grandes hectares de plantação e, mesmo sem utilizar agrotóxicos

diretamente, estão expostas à poeira e aos resíduos dos produtos que se deslocam das demais propriedades. Para Cabrera (2008), muitos resíduos de agrotóxicos permanecem no ambiente após aplicação, sendo o problema agravado, pois a pulverização dos agrotóxicos nas lavouras não atinge apenas a plantação, ou seja, não é pontual. Eles podem atingir diferentes compartimentos ambientais, ser transportados pelo vento, carregados pela água da chuva, atingir as águas subterrâneas por lixiviação, entre outros transportes, de acordo com as características de mobilidade de cada composto.

Além disso, Barbosa (2005) aponta que o aumento dos níveis de íon nitrato na água potável, particularmente em água de poços em localidades rurais, a principal fonte deste nitrato é a lixiviação de terras cultivadas para os rios e fluxos de água. Dezenas de milhões de toneladas de nitrogênio são aplicadas anualmente como fertilizantes na agricultura, e alguns outros milhões com a produção de esterco. Inicialmente, o resíduo animal oxidado (esterco), o nitrato de amônio, NH4NO3, não absorvido e outros fertilizantes com nitrogênio foram considerados

os culpados pela contaminação de nitrogênio em águas subterrâneas, já que o nitrogênio reduzido, não utilizado pelas plantas, é convertido naturalmente a nitrato, o qual é altamente solúvel em água e pode facilmente ser lixiviado para a água subterrânea.

Atualmente, parece que o cultivo intensivo de terras, ainda que sem a aplicação de fertilizantes ou estercos, facilita a oxidação do nitrogênio reduzido para nitrato em matéria orgânica em decomposição no solo pelo aumento da aeração e umidade. A original forma reduzida de nitrogênio torna-se oxidada no solo para nitrato, a qual, sendo móvel, migrará para a água subterrânea, onde dissolve-se na água e é diluída. A desnitrificação de nitrato para nitrogênio gasoso, N2, e o consumo de nitrato pelas plantas podem ocorrer em áreas florestadas

que separam as fazendas de agricultura dos fluxos de água, portanto, baixando o risco de contaminação em áreas com significativa vegetação. Áreas rurais com alto aporte de nitrogênio, solos bem drenados e de pouca vegetação são um risco particular para a contaminação de nitrato em águas subterrâneas.

Assim, em relação ao câncer, trabalhos publicados mostram que mulheres que beberam água de abastecimento público com elevado nível de nitrato (> 2,46 mg/L) apresentam três vezes mais probabilidade de serem diagnosticadas com câncer de mama do que as menos expostas (< 0,36 mg/L na água potável) (BAIRD; CANN, 2011).

Corroborando com tais dados, um estudo da Universidade Federal da Paraíba apontou relações entre as alterações no teor de nitratos e nitritos em alguns mananciais de água da zona canavieira e a possibilidade de crianças menores de 6 meses serem acometidas de anemia por

formação de metamoglobina e de formação de nitrosamina (agente cancerígeno) em adultos, a partir da ingestão de água, legumes ou verduras ricas em nitratos e nitritos.

Observa-se que a média de valores de nitrato ficou em 4,15 entre as amostras, valores considerados de risco, e embora a legislação estabeleça que a água destinada ao abastecimento humano não deva conter mais que 10 mg/L de nitrato, devido à capacidade do organismo em reverter o processo, produzindo nitrito por redução de nitrato, tem-se conhecimento que, acima de 4 ppm, por meio de uso contínuo, o organismo humano sofre devido ao efeito acumulativo (MIGLIORINI, 2002).

Os dados, inclusive, permitem a evidência dos riscos, que promovem a tomada de consciência, frente à problematização. Assim, entende-se que a tomada de consciência, representada pelo diálogo no grupo, parece ter relação com o conceito de conscientização discutido por Freire (2010b), pois este não é apenas um instrumento, mas pode ser uma forma de ver e intervir no meio; “Daí que seja a conscientização o aprofundamento da tomada de consciência, característica, por sua vez, de toda emersão” (FREIRE, 2010b, p. 118). Essa emersão possibilita aos sujeitos enxergarem a realidade problemática em que estão inseridos. O distanciamento da realidade vivida é uma condição para a tomada de consciência que deverá levar à conscientização.

Ou, conforme destaca Silva (2004), primeiro convém denunciar a situação para, depois, anunciá-la, com vistas à problematização, na busca por soluções que levem a novos problemas. Desse modo, entende-se que a problematização como tomada de consciência acerca de um problema pode levar a níveis de conscientização e ação dos sujeitos.

Assim, para Freire (2010), conscientização é óbvio que não para estoicamente no reconhecimento puro, de caráter subjetivo, da situação, mas, pelo contrário, que prepara os homens, no plano da ação, para a luta contra os obstáculos à sua humanização.

6 PRODUTOS DIDÁTICOS

Diante da problematização, os seguintes produtos foram obtidos, cumprindo, assim, as etapas iniciais: diagnóstico situacional, tempestade de ideias, formulação de problemas e objetivos de aprendizagem, consolidando na fundamentação teórico-científica aliada ao saber popular para o avanço das demais etapas do método.

6.1 Simpósio Interdisciplinar em Saúde e Ambiente: relações da contaminação da água e câncer

A concepção do processo de saúde/doença, tendo como referência os determinantes sociais da saúde, aponta para um desafio em estabelecer uma hierarquia de determinações entre os fatores mais gerais de natureza social, econômica, política e as mediações, através das quais, esses fatores incidem sobre a situação de saúde de grupos e pessoas, já que a relação de determinação não é uma simples relação direta de causa-efeito. Para dar conta deste pressuposto, há que se buscar o aporte dos diferentes saberes e das diferentes disciplinas e o pressuposto do reconhecimento dos múltiplos saberes, já não é suficiente (MENDES, 2008).

Assim, frente aos preceitos do Método Ativo de Ensino e Aprendizagem, baseando-se nas ações prévias realizadas pela Liga Acadêmica em Saúde e Ambiente, após visita à zona rural de Paripiranga, formulação de problemas e palavras-chave, perguntas de aprendizagem, objetivos e hipóteses de solução culminaram na formação do tema gerador para o I SIMPÓSIO

INTERDISCIPLINAR EM SAÚDE E AMBIENTE: Relações da Contaminação da Água e Câncer.

O evento organizado pelos ligantes cumpriu as etapas da metodologia ativa concernentes à tempestade de ideias e teorização. A partir dos diálogos estabelecidos, foram traçadas novas hipóteses explicativas e de solução para a problemática apresentada.

Diante de tal temática, buscou-se, de forma geral, realizar o I Simpósio Interdisciplinar em Saúde e Ambiente e, especificamente, promover discussões teórico-metodológicas em saúde e ambiente a partir da ótica interdisciplinar além de dialogar sobre o eixo saúde e ambiente através de atividades de pesquisa e extensão. O local de realização foi o Centro Universitário