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Na região que temos vindo a analisar, nota-se claramente um hiato cronológico entre os finais do Calcolí- tico e o Bronze Final. Fábregas Valcar- ce e Richard Bradley utilizam inclusive a expressão uma "Idade das Trevas que teria tido lugar no NW da Península Ibérica por volta de 1600 a.C. (em da-

tas de calendário/' expressão essa que, segundo os mesmos autores, se baseia nas escassas evidências funerárias e do- mésticas deste período (FÁBREGAS VALCARCE e BRADLEY, 1995, 153).

Nestes primeiros períodos da Idade do Bronze é comum falar-se do decrés- cimo dos lugares de habitat em relação ao período anterior, facto que se tem explicado pelo recurso ao uso de indica- ções de "ruptura populacional" derivada de uma crise demográfica, causada pela deterioração das condições climáticas (SILVA et alii, 1993, 250). Devemos referir, no entanto, que em Castelo Vel- ho de Freixo de Numão (Vila Nova de Foz Côa) existe continuidade entre o Calcolítico e o Bronze Inicial.

No entanto, e voltando aos primeiros autores, estes referem que a alegada re- dução de sítios será mais aparente do que real. De facto estes autores expli- cam esta "invisibilidade" das comuni- dades deste período através da mudança nas estratégias de subsistência ao longo do IIo Milénio AC, que se baseia numa

maior ênfase dada à criação de gado, na redução do tamanho das unidades soci- ais e numa redução da circulação de ob- jectos de prestígio (FÁBREGAS VAL- CARCE e BRADLEY, 1995, 157). Um dos autores anteriormente citado formu- la uma hipótese interessante: "a frag- mentação do habitat (...) pode corres- ponder a um período de maior estabili- dade em que a concentração ou a dis- posição defensiva do habitat não fosse

necessária e até em última instância, antieconómica" (FÁBREGAS VAL- CARCE, 1995, 109-110).

O que verificamos ao observar o re- gisto arqueológico da zona em estudo é que não se detectaram (por ora) vestígi- os das comunidades do Bronze Inicial e Médio, ao passo que se detectaram ves- tígios das comunidades da fase final da Idade do Bronze.

Pensamos que os indícios que regis- tamos de fluxo e refluxos, avanços e re- cuos nos povoados (por exemplo nas muralhas), pode bem indiciar a conti- nuação da operacionalidade de muitos sítios do IIIo Milénio AC durante as eta-

pas iniciais do IIo Milénio AC, embora

com deslocações. Existem de facto, co- mo afirma Susana Oliveira Jorge, mu- danças locativas (JORGE, 1999, 112), pelo aparecimento de novos povoados, embora a mesma autora afirme a perma- nência de antigos povoados Calcolíticos (idem).

Pensamos que nestas fases iniciais da Idade do Bronze, no Douro Sul, se aperta a malha de povoamento com a expansão para zonas diferentes em res- posta a estímulos económicos distintos. Vislumbramos aliás já no Calcolítico um sistema de deslocação para zonas não ocupadas anteriormente, por povoa- dos abertos de clara vocação agro-pas- toril (Graíl). O estabelecimento nessas zonas será possivelmente potenciador da evolução subsequente de alguns po- voados da Idade do Bronze.

Quando analisamos as aptidões dos solos dos povoados verificamos que essas aptidões são mais claramente pas- toris do que agrícolas, o que poderia apoiar o padrão económico baseado nu- ma economia basicamente pastoril de cariz transumante, característico, segun- do Fábregas Valcarce e Ruíz-Galvez Priego, das fases iniciais da Idade do Bronze (FÁBREGAS VALCARCE e RUÍZ-GALVEZ PRIEGO, 1997, 204), que se apoiam nas evidências da bacia do Médio e Alto Mondego.

Não excluímos de modo algum essa possibilidade. No entanto assinalemos que alguns dos sítios do Bronze Final, da zona em análise, podem eventual- mente conter ocupações das fases inter- médias do Bronze, como é o caso de N3

Sr3 de Lurdes (também com vestígios

do Calcolítico) encastoada sobre o Dou- ro, o povoado aberto do Cabeço de S. João (que denuncia o aproveitamento de terrenos agrícolas) e a Citânia de Longa, onde o povoado do Bronze Final poderá ter vestígios de uma fase intermédia do Bronze, e ainda outro local situado igualmente sobre o Douro, Quinta da Abelheira, que poderá ter vestígios do Bronze Médio. Ou seja temos alguns sí- tios, implantados em locais estratégi- cos, uns sobre o Douro, que desde sem- pre deve ter potenciado contactos a ní- vel supra-regional (Quinta da Abelhei- ra, S. Salvador do Mundo e N3 Sr3 de

Lurdes) e, outros que pela sua posição estratégica em locais proeminentes na paisagem, desde cedo, podem ter con- trolado a passagem e o fluxo de bens e pessoas por essas áreas.

No entanto, convém desde já, frisar, bem, a posição de Susana Oliveira Jorge que afirma, e passamos a citar, que "Ao contrário do que alguns autores crêem estes povoados da Idade do Bronze não estão sistematicamente ligados a gru- pos itinerantes cuja economia assentas-

se preferencialmente no pastoreio" (JORGE, 1999, 112). Ou seja, uma po- sição que contraria a afirmação referida atrás de Fábregas Valcarce e Ruíz-Gal- vez Priego.

Também as sepulturas parecem reve- lar algumas permanências e transforma- ções. Quer pela possível (mas não pro- vada) reutilização dos sepulcros megalí- ticos que vêm do IVo Milénio AC, como

a necrópole de Areita, situada dentro dos Territórios Teóricos de alguns po- voados: Castelinhos (?); Castelos Vel- hos de Trevões; Na Sr3 da Assunção;

Reboledo; Quinta dos Pinheiros e Coc-

heira, que domina a necrópole da Sr3 do

Vencimento.

Embora no único dólmen de Areita escavado (Dólmen 1) não existam ves- tígios de deposições funerárias do Bron- ze, não significa que elas não tenham ti- do lugar nos outros.

Na margem direita do Douro, não muito distante da área em estudo, deve- mos fazer referência ao Dólmen 1 de Madorras, onde se registam reutiliza- ções em momentos já adiantados do Calcolítico ou princípios da Idade do Bronze (GONÇALVES e CRUZ, 1994, 212).

Falámos de transformações, de facto possuímos no interflúvio, Torto/Távora monumentos que poderão (como já referimos) ser atribuíveis ao Calcolíti- co/Bronze. Trata-se do núcleo de S. Do- mingos, em que ao lado de um dólmen clássico surgem outros de pequenas di- mensões e pouco relevados no terreno, a que Domingos Cruz (embora não espe- cificamente para estes) atribui uma cro- nologia de finais do Calcolítico, inícios da Idade do Bronze, embora o mesmo autor afirme que os "cairns" possam ter sido construídos em meados da Idade do Bronze (CRUZ, 1995, 84).

Estes monumentos poderão corres- ponder a um controlo dos rios Torto e Távora, por onde circulariam itens de várias proveniências (por exemplo itens metálicos), que por sua vez eram con- trolados por determinadas comunida- des. Desconhecemos se de facto estas sepulturas, que pela sua dimensão suge- rem inumações individuais, são Calcolí- ticas ou da Idade do Bronze, embora a sua posição entre estes dois rios possa fazer-nos afirmar essa possibilidade, de que no entanto não temos dados sufici- entes para o afirmar com certezas.

No que concerne aos povoados pare- ce que no Bronze Antigo e Médio e de- vido à circulação insistente de metais (JORGE, 1999, 107), se vão desenvol- vendo fermentos de uma maior estratifi- cação social que conduzirá ao apareci-

mento de hierarquias que manipulam por exemplo cerâmicas de caracte- rísticas excepcionais tipo "Baiões-Sta

Luzia" e objectos em bronze, igualmen- te excepcionais (por exemplo o penden- te de xorca exumado em Reboledo) que denuncia o paulatino desenvolvimento de povoados centrais como parecem ser Reboledo, Chã do Murganho, Castelos Velhos de Trevões, S. Salvador do Mundo e talvez Na Sr3 de Lurdes. Tam-

bém a Citânia de Longa o é, provavel- mente, "marcando", mesmo este último, os seus Territórios através de estátuas (armadas) e santuários de Arte Rupestre - Cabeço das Pombas.

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