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EMPRESA DE TRANSPORTE AÉREO DE PASSAGEIROS, DECORRENTE DA AÇÃO DO AGENTE REGULADOR

5 UM CASO PRÁTICO

Para corroborar, refutar ou, pelo menos, complementar os achados da revisão de literatura apresentada nos capítulos anteriores, foi feita uma consulta a uma empresa de transporte aéreo regular de passageiros. A empresa consultada é nacional, possui porte médio e predominância de voos regionais. Sua escolha deveu-se à facilidade de acesso do autor à sua diretoria e ao fato de possuir em sua frota dois dos modelos de aeronaves contemplados no estudo Cook et al (2004). As informações foram prestadas pela empresa na qualidade de respostas a um questionário submetido pelo autor. O questionário encontra-se no Apêndice C. Para preservar a confidencialidade da empresa, não será utilizado seu verdadeiro nome. Neste trabalho ela é identificada pelo nome fictício AEROBRÁS.

A elaboração do questionário submetido à empresa seguiu a lógica desenvolvida ao longo da revisão de literatura e fundamentação teórica, exatamente para buscar informações práticas que ilustrassem aquilo que foi encontrado nessas fases da pesquisa. As respostas da empresa encontram-se no Apêndice D.

Resumindo as informações obtidas, a AEROBRÁS não possui um sistema para registrar o custo dos atrasos de seus voos no plano tático. Para garantir que os índices de pontualidade almejados sejam alcançados, a empresa insere tempo adicional, a título de custo estratégico, ao que seria teoricamente necessário às suas operações. Entretanto, não sabe exatamente quanto custam esses atrasos, tanto no plano tático quanto estratégico, bem como desconhece sua importância relativa face às suas despesas operacionais e às suas receitas. A empresa também não soube precisar o peso que o poder sancionador da agência reguladora tem sobre a operação da empresa no que se refere à pontualidade de seus voos.

Atualmente a AEROBRÁS trabalha com uma meta de 85 %, buscando condições para operar com um índice de até 92 % de pontualidade para os seus voos. Para o estabelecimento deste último índice utiliza, principalmente, os dados históricos de suas operações.

No que se refere às razões dos atrasos de seus voos, a AEROBRÁS reconhece que as causas principais residem em suas próprias operações. Em seguida vêm os atrasos decorrentes das operações de seus fornecedores e prestadores de serviços e da reação em cadeia causada pelos

atrasos de voos anteriores. O controle de tráfego aéreo e a administração aeroportuária foram classificados como os fatores que menos impacto possuem nos atrasos dos voos.

Pelas respostas fornecidas, resta claro que os atrasos de voos e a busca de altos índices de pontualidade se constituem em preocupação importante da AEROBRÁS, tanto devido aos custos diretos que eles implicam, quanto à imagem negativa que eles produzem junto aos usuários. Entretanto, a empresa não tem um sistema para computá-los assim como não sabe precisar seu peso relativo face às suas despesas operacionais e demais índices financeiros.

6 CONCLUSÕES

O objetivo principal deste trabalho foi tentar demonstrar que as empresas de transporte aéreo regular de passageiros desconhecem a eficácia da ação sancionadora da agência que regula o setor - como fator de indução de pontualidade dos voos -, face aos demais prejuízos nos quais estas incorrem quando seus voos atrasam. Também buscou produzir conhecimento que pode ser utilizado para uma reflexão acerca de como melhorar as políticas de regulação de forma a aumentar a eficácia do órgão regulador como agente indutor de pontualidade das empresas de transporte aéreo regular de passageiros. As conclusões da pesquisa são apresentadas a seguir.

A importância da pontualidade no transporte aéreo de passageiros

O estudo demonstrou que o nível de importância da pontualidade no transporte aéreo é alto para seus usuários, independentemente do perfil demográfico ou grupo social pesquisado, e que, do ponto de vista das empresas aéreas, há evidências que correlacionam altos índices de pontualidade com maior rentabilidade.

A pontualidade nas relações entre indivíduos e agentes sociais é resultado de um estado de equilíbrio de Nash

A pesquisa determinou que, apesar de sua reconhecida importância para o alcance de um maior bem estar total de um grupo social, a existência ou não de pontualidade como um traço cultural do grupo depende de qual estado de equilíbrio de Nash é atingido depois de inúmeras interações nas relações entre seus indivíduos ou agentes sociais. Se, nessas relações, houver predominância da percepção que a sociedade ganha mais se houver cooperação entre todos, a pontualidade nas relações tenderá a se tornar um atributo cultural importante. Se, ao contrário, houver predominância do individualismo em detrimento da noção de pertinência a uma coletividade maior, com a consequente falta de cooperação entre indivíduos e agentes sociais em suas relações, a falta de pontualidade é que tenderá a se tornar uma característica cultural desse grupo social.

O órgão regulador como agente potencial de indução de pontualidade das empresas aéreas

O trabalho examinou, então, a relação entre o conjunto das empresas aéreas e o conjunto dos usuários à luz da Teoria dos Jogos. Segundo a Teoria, uma das estratégias que podem ser utilizadas para induzir a cooperação entre indivíduos ou agentes sociais de uma determinada coletividade se dá pela atuação de uma autoridade que governe a forma como interagem entre si esses indivíduos ou agentes. A pesquisa mostrou que a ANAC, na qualidade de órgão regulador de aviação civil no país, atua como esta autoridade, governando as relações entre o conjunto de empresas aéreas, de um lado, e o conjunto de seus usuários, de outro. O estímulo à cooperação entre esses dois grupos, principalmente do primeiro em relação ao segundo, é produzido pelo mecanismo da multa, que desencoraja a conduta das empresas aéreas em inconformidade com a lei, onerando-as financeiramente, alterando as recompensas que recebem de sua atividade econômica.

O impacto do atraso nos custos operacionais das empresas aéreas

O autor não teve acesso a indicadores financeiros como receita e rentabilidade das empresas aéreas brasileiras, mas logrou encontrar estudos acerca dos custos operacionais nos quais as empresas aéreas incorrem quando seus voos atrasam. Desse modo, para medir a eficácia da ação do órgão regulador, comparou-se o ônus financeiro imposto pela Agência aos custos operacionais dos atrasos dos voos de empresas aéreas, e não a suas receitas ou rentabilidade.

A pesquisa demonstrou que o cálculo dos custos operacionais dos atrasos de voos é extremamente complexo e que não há uma cultura setorial acerca de como o assunto deve ser tratado. As empresas aéreas, em geral, não sabem como e não determinam esses custos, que podem ser completamente diferentes conforme as circunstâncias e pressupostos considerados em seu cálculo. Não há curvas que permitam determiná-los simplesmente utilizando-se sua duração como principal critério. Então, para estimar o impacto que os atrasos dos voos têm sobre os custos operacionais de algumas empresas aéreas brasileiras, foram selecionadas aquelas que realizam voos regulares e que operam aeronaves contempladas no estudo de Cook

O ônus que a ação da agência reguladora impõe às empresas aéreas por conta dos atrasos de seus voos

Para calcular o custo dos atrasos para as empresas aéreas decorrente da atuação da agência reguladora, ou seja, de seu poder de modificação das recompensas, foi feito um levantamento dos voos que tiveram origem no aeroporto de Brasília e que registraram atrasos na partida de 60 minutos ou mais no período compreendido entre janeiro e setembro de 2009.

Com base na legislação que rege a aviação civil no país, em especial a pontualidade dos voos regulares, e nos processos operacionais de fiscalização da agência reguladora, foram calculados os valores totais das multas que as empresas selecionadas teriam que pagar pelos atrasos registrados ao fim de todas as etapas dos respectivos processos administrativos e de possibilidades de recurso.

O estudo comparou, então, os custos operacionais incorridos pelas empresas aéreas quando seus voos atrasam com o ônus imposto pela agência reguladora pelo mesmo motivo. Os resultados, já apresentados no corpo da pesquisa, são reapresentados abaixo.

Tabela 6.1 - Custo total operacional dos atrasos, em reais, versus montante de multas recebidas da agência reguladora pelos mesmos atrasos, de quatro empresas brasileiras de

transporte aéreo regular de passageiros Jan a Set 2009

Valores (R$) Empresa

Custo total operacional dos atrasos

Montante total de multas

% (multas em relação ao custo dos atrasos)

A 5.573.789,00 944.000,00 16.94

B 4.218.780,80 736.000,00 17.45

C 912.600,00 208.000,00 22.79

D 76.573.90 48.000,00 62.68

O autor não teve acesso a informações relativas às receitas e à rentabilidade das empresas. Assim, não foi possível estabelecer o impacto da atuação do órgão regulador face esses indicadores. Adicionalmente, o autor desconhece a existência de trabalhos que discutam os resultados líquidos, para a sociedade, da equação que mede os benefícios dos serviços prestados

pelas empresas aéreas contra os custos sociais decorrentes do descumprimento, por essas mesmas empresas, de determinadas normas regulatórias. Desse modo, não foi possível avaliar a adequação da multa como instrumento da política de regulação.

Consulta a uma empresa de transporte aéreo regular de passageiros

As informações prestadas pela empresa consultada serviram para confirmar dois elementos de destaque da revisão de literatura. Em primeiro lugar, corroborou que a empresa desconhece o custo exato no qual incorre quando seus voos atrasam. Portanto, ignora o peso que as multas aplicadas pela agência reguladora têm frente a esse custo. Em segundo lugar, confirmou a aparente dificuldade de obtenção de índices de pontualidade superiores a 85 %. Este índice é sua meta para 2009. A empresa informou que busca o índice de 92 % de pontualidade em seus voos sem, contudo, revelar o prazo no qual pretende atingi-lo.

Considerações sobre a hipótese

A hipótese do estudo era “a indústria do transporte aéreo regular de passageiros desconhece a eficácia do poder sancionador atribuído à ANAC”.

A pesquisa sinalizou que o poder da agência reguladora de incentivar a pontualidade das empresas aéreas através da aplicação de multas não é desprezível. Também foram encontradas evidências apontando tanto para o desconhecimento das empresas quanto aos custos operacionais em que incorrem quando seus voos atrasam quanto ao peso que as multas recebidas do órgão regulador, e efetivamente pagas, têm sobre seus custos e suas receitas. Ou seja, os indícios apontam para a confirmação da hipótese. Entretanto, devido às simplificações empregadas na construção do modelo apresentado ao longo da pesquisa, recomenda-se ao leitor que os resultados apresentados sejam considerados com cautela.

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