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2.1 Redes de Empresas e Arranjos Produtivos Locais

2.1.1 O Precursor: Alfred Marshall

As concentrações de indústrias especializadas em determinados territórios foram estudadas por Marshall, no final do século XIX, em seu livro Princípios de Economia, tratando o tema com profundidade no Capítulo X, do quarto livro, que aborda a organização industrial e a concentração de indústrias especializadas em certas localidades.

Em suas observações, Marshall identificou economias de aglomeração localizadas na Inglaterra, as quais tinham vantagens competitivas derivadas de uma eficiência coletiva e englobavam aspectos como: empresas especializadas, territorialização, cooperação e mercado de trabalho (MARSHALL, 1982).

Em sua visão, um distrito industrial poderia incluir uma ou mais cidades manufatureiras, com indústrias centrais e suas subsidiárias, ligadas a um segmento específico, onde se desenvolviam atividades de

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A RedeSist é uma rede de pesquisa interdisciplinar, sediada no Instituto da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) – para maiores informações: www.redesist.ie.ufrj.br.

apoio àquela principal, na forma de oferta de matéria-prima, componentes, serviços, entre outros.

O ressurgimento da idéia, de acordo com Amorim, Moreira e Ipiranga (2004) se deu basicamente devido ao esgotamento dos modelos de produção fordista e taylorista, que ocasionaram um aumento do desemprego formal, a precarização do trabalho, o crescimento das economias informais, bem como o aumento da geração de empresas de pequeno porte. O distrito marshalliano preconizava a cooperação entre as empresas, baseada na confiança e em aspectos sócio-culturais, através da interação entre os agentes da rede (GUERRIERI; PIETROBELLI, 2004).

Os ganhos oriundos da concentração territorial de um determinado segmento são expostos por Marshall (1892, p. 234):

São tais as vantagens que as pessoas que seguem uma mesma profissão especializada obtêm de uma vizinhança próxima, que desde que uma indústria escolha uma localidade para se fixar, aí permanece por longo espaço de tempo. Os segredos da profissão deixam de ser segredos e, por assim dizer, ficam soltos no ar, de modo que as crianças absorvem inconscientemente grande número deles. Aprecia-se devidamente um trabalho bem feito, discutem-se imediatamente os méritos de inventos e melhorias na maquinaria, nos métodos e na organização geral da empresa. Se um lança uma idéia nova, ela é imediatamente adotada por outros, que a combinam com sugestões próprias e, assim, essa idéia se torna uma fonte de outras idéias novas. Acabam por surgir, nas proximidades deste local, atividades subsidiárias que fornecem à industria principal instrumentos e matérias-primas, organizam seu comércio e, por muitos meios, lhe proporcionam economia de material.

As vantagens originadas pela concentração geográfica de empresas foram denominadas por Marshall (1982) de externalidades, as quais podem ser entendidas como diferenciais que são essenciais principalmente para as empresas de pequeno porte, que se aproveitam da atmosfera industrial e do conhecimento tácito que circunda e envolve o local. Aspectos estes que são gerados através do aprendizado coletivo,

do desenvolvimento de novas competências, bem como a formação de uma mão-de-obra especializada2.

Garcia, Motta e Amato Neto (2004) destacam que as externalidades encontradas por Marshall, foram chamadas posteriormente de retornos crescentes de escala, fatores intrínsecos ao local. Tais fatores consistiam em um amplo processo de divisão do trabalho, a especialização dos produtores, um mercado de mão-de-obra especializada e a continua aprendizagem decorrente das interações entre eles (learning-by-interacting). Para Marshall (1982), as vantagens provenientes da concentração territorial estão associadas principalmente aos ganhos decorrentes da interação entre os atores, a troca e geração de conhecimentos.

O clima propício fomenta a vinda de outras empresas que atuam no mesmo segmento industrial, atraindo novas atividades para o sistema local. A formação de outras empresas nas proximidades do distrito amplia a divisão do trabalho gerando economias de escala e tornando-o cada vez mais completo (MOLINA-MORALES, 2005). Marshall (1982, p. 234) atenta ainda para a concentração de empreendedores que estão a busca de mão-de-obra especializada, bem como profissionais que buscam locais onde há uma grande necessidade de operários dotados de sua especialização: “Aqui as forças sociais cooperam com as econômicas [...]”. Como uma via de duas mãos, a eficiência da mão-de- obra é beneficiada com as inovações, especializações e concentração das indústrias, do outro lado estas ganham com o aprimoramento de conhecimento dos operários, formando assim um ciclo virtuoso.

Ratificam a idéia, Lastres e Cassiolato (2003) destacando que as pequenas firmas inglesas, concentradas na manufatura de produtos específicos, de atividades como têxtil, gráfica e cutelaria, aglomeravam- se em centros produtores. Para os autores, os distritos marshallianos destacavam-se pelo alto grau de especialização e forte divisão de trabalho; contavam ainda com acesso a mão-de-obra qualificada, existência de uma ampla cadeia de fornecedores locais, além da comercialização e troca de informação entre os agentes. Vantagens que foram consideradas importantes, sobretudo, para empresas de pequeno porte.

Para Suzigan et al (2006), a análise de Marshall sobre os distritos industriais ingleses inspirou uma extensa literatura relacionada

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Estes aspectos foram analisados pelo autor em especial nos segmentos de cutelaria e manufaturas têxteis inglesas.

a compreender o fenômeno das aglomerações de pequenas empresas reunidas geograficamente. O conceito de economias externas são oriundas dos transbordamentos (spillovers) de conhecimento, por sua vez originados pelo trabalho qualificado e pelas interações no mercado local. Lopes e Lugones (1999) afirmam que as economias externas marshallianas enfatizam a capacidade do ambiente de facilitar a aprendizagem coletiva e reduzir as incertezas. Na abordagem de Pietrobelli e Rabelotti (2005) tais economias explicam a competitividade das empresas inseridas em concentrações industriais.

Para concluir a abordagem dos distritos industriais marshallianos, pode-se afirmar que sua característica essencial está centrada na capacidade de gerar economias externas, geralmente incidentais, que fomentam a competitividade das empresas e do arranjo como um todo. Tais economias são decorrentes da existência de uma especializada mão-de-obra derivadas da vocação regional, presença e atração de fornecedores especializados de matéria-prima, componentes, serviços e assessorias, e a grande geração e disseminação de conhecimentos, habilidades e informações inerentes ao ramo de atividade local.