• Nenhum resultado encontrado

2. Fotonovelas: muitas histórias para contar

2.3. Primeiras reflexões

Com base no “raio-X” apresentado, é possível constatar que, com relação ao espaço ocupado pelas fotonovelas dentro das revistas, entre os anos de 1956 e 1968, elas ocupavam, em média, de 30 a 40% do total de páginas de cada edição analisada. A exceção fica com a edição de 1956, na qual a fotonovela se distribuiu ao longo de 66% da revista. É possível verificar um aumento do espaço ocupado pelas fotonovelas no ano de 1969. As seis edições analisadas, pertencentes a esse ano, apontam para uma média de 50% de ocupação com relação ao restante da revista. Como hipótese, imagino que tal fato esteja associado à melhora nas condições técnicas para a realização destas histórias, uma vez que os avanços na área fotográfica, por exemplo, possibilitavam a presença de mais fotografias e em melhor qualidade. Penso, também, que a quantidade de fotos exibida em uma mesma história era sinal de status: quanto mais fotos, mais atenção a história despertaria. Faço tal reflexão baseada, especialmente, nas chamadas presentes nas capas de três edições de 1969, onde elas destacam a grande quantidade de fotografias presentes em uma única fotonovela (entre 450 e 600 fotos).

Com relação, também, ao espaço ocupado pelas fotonovelas na revista, é interessante destacar que até o ano de 1962, de acordo com as vinte edições que compuseram o meu corpus de análise, as histórias tinham início entre a página de número 10 e de número 20, e terminavam bem próximo da última página da edição. Ou seja, a fotonovela estava espalhada ao longo de toda a revista. Neste mesmo período, as histórias sofriam uma grande interrupção: as histórias paravam na página 37 e continuavam na página 81. Este intervalo era recheado por matérias sobre beleza, culinária, contos, horóscopo. Ainda acerca desse período, entre 1956 e 1962, o número de anúncios publicitários presente ao longo das fotonovelas era bem inferior se comparado com os anos subseqüentes, eles giravam em torno de oito anúncios por edição. É um número

relativamente baixo se pensarmos que nestas edições, entre 1956 e 1962, o número total de anúncios chegava a 60 por revista.164

De 1964 em diante, a distribuição das fotonovelas nas páginas da Capricho é modificada. Elas passam a começar entre as páginas de número 30 e 50, terminando, como anteriormente, próximo ao fim da revista. Outra mudança é que as histórias deixam de ser interrompidas e elas passam a dividir espaço com a publicidade. Em uma mesma página se encontra, com freqüência, alguns quadrinhos da fotonovela e um anúncio publicitário. Sendo que estes, por sua vez, aumentam, em quantidade, significativamente em páginas próximas às fotonovelas, tendo uma média de 30 propagandas dividindo espaço, lado a lado, com a história apresentada. Vale destacar que no período de 1964 a 1969 cada edição trazia, em média, 40 anúncios.

A este respeito, é possível conjecturar que com o passar dos anos, especialmente após 1964, as fotonovelas confirmaram a sua posição como o grande chamariz da revista. Atentos a este fato, os anunciantes passam a comprar espaço ao lado das fotonovelas, e não ao longo das outras matérias, como nos anos anteriores. A fotonovela, de fato, era o grande filão. Outra questão que não pode ser esquecida é, mais uma vez, as possibilidades que se abrem com a modernização das técnicas de produção. Falo isso, pois, certamente, ao longo da década de 1960 havia mais recursos financeiros e técnicos para a diagramação de uma revista, do que na década anterior. Facilitando, assim, que em uma mesma página, pudessem ter uma propaganda e trechos da fotonovela. O fato é que a partir de 1964 os anúncios publicitários passaram a se concentrar ao lado das fotonovelas.

Outra questão interessante diz respeito às chamadas de capa. Nas edições analisadas pertencentes aos anos 1950, duas edições traziam apenas a fotonovela como chamada de capa e outras duas não tinham chamada alguma.165 A partir das edições de 1960, todas trouxeram a fotonovela destacada em suas capas, sempre junto com pelo menos mais uma chamada sobre alguma matéria presente no interior da revista, sobre assuntos variados como moda, beleza ou principalmente sobre um/a artista famoso/a. Até

164 Ver capítulo sobre publicidade.

165 Acredito ser interessante uma pesquisa a respeito dos títulos das fotonovelas. Uma análise lingüística se

deliciaria com o conteúdo destes títulos. Apesar deste não ser o objetivo desta pesquisa, pude perceber que se procura passar, através do título, o tom da história a ser narrada. Eles, em geral, referem-se ao amor, são impactantes e instigantes, despertando a curiosidade de seu público alvo.

o ano de 1967 predominavam matérias, destacadas nas capas, com atores e atrizes estrangeiros. A partir deste ano, prevaleciam chamadas de matérias com atores, atrizes, cantores ou cantoras nacionais. É perceptível, não apenas através das chamadas de capa, como também ao observar o conteúdo interno da revista que, paralelamente ao sucesso das fotonovelas, estavam as matérias sobre a vida de famosos, sejam eles nacionais ou internacionais. Lídia, uma das leitoras por mim entrevistadas, por exemplo, disse que entre as coisas que ela mais gostava de ler na Capricho estavam as fotonovelas e as “fofoquinhas” a respeito dos atores e atrizes famosos. Tal fato vai ao encontro do que foi dito a respeito da estreita relação existente entre a televisão e as fotonovelas, ou, indo além, a relação da televisão com as revistas de fotonovelas.

Com relação à ficha técnica apresentada no início de cada fotonovela, não existe regra. Na primeira edição examinada ela sequer aparece. Nas demais, ora são citados os nomes do diretor e fotógrafo, ora apenas dos atores e atrizes principais. O dado encontrado com maior regularidade é o nome dos intérpretes principais, o que aponta para a importância dada, pela leitora, ao ator, ou atriz, que estivesse fazendo parte da história. As fotonovelas italianas veiculadas na Capricho construíram ídolos que iam além dos personagens que interpretavam. O atores e atrizes que interpretavam as histórias tornavam-se celebridades, passando a fazer parte dos sonhos e do imaginário de suas leitoras e leitores.

Durante das décadas de 1950 e 1960, pouco foi alterado nas fotonovelas publicadas pela Capricho com relação à maneira como os quadrinhos e as legendas eram dispostos. Elas se mantiveram em preto e branco, a distribuição (em média12 quadrinhos por página), o tamanho dos quadrinhos e das legendas mantiveram-se semelhantes. No que tange ao linguajar empregado pelos atores e atrizes, predominavam falas muito mais próximas da língua escrita, obedecendo a regras gramaticais, fazendo uso de expressões literárias; do que uma fala coloquial. De acordo com Habert,166 à medida em que as revistas de fotonovelas vão se modernizando, utilizando menos textos traduzidos, a linguagem vai se tornando mais próxima de um diálogo cotidiano, desenvolvido entre pessoas comuns. No caso da revista Capricho, na maior parte das histórias percebe-se a presença desta linguagem mais formal, uma vez que ela publica, predominantemente,

fotonovelas italianas. Exceções aparecem a partir do ano de 1966, quando algumas histórias empregam expressões “moderninhas”, como relatado na fotonovela “Uma canção para você”. Ainda com relação à linguagem, Habert chama a atenção para o fato de que todos os personagens falam uma mesma linguagem, uma “linguagem de fotonovela”. Ou seja, apenas através da leitura dos diálogos não é possível identificar a posição social ou qualquer outra característica individual de um personagem.

Penso ser interessante essa análise relacionada à forma, pois ela nos possibilita entender um pouco do lugar, não apenas físico, ocupado pelas fotonovelas dentro da revista examinada. A importância de voltar o olhar para estas questões estruturais e de forma, já forma destacadas por Mc Luhan167, ao enfatizar a relevância do meio em si, de sua forma.