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5.1 Processo eletrônico, princípios processuais constitucionais e princípios processuais

5.1.2 Princípios processuais constitucionais

5.1.2.5 Princípio da isonomia

O princípio processual constitucional da isonomia, ou da igualdade, encontra-se descrito no caput do art. 5º da CF. Tal princípio garante igualdade de tratamento a todos os indivíduos, bem como viabiliza a criação de critérios, para eventual distinção entre os mesmos, que não sejam atentatórios à dignidade da pessoa humana, fonte da qual emanam todos os demais princípios.

De acordo com Bandeira de Mello, haverá violação ao princípio em tela: quando a norma fizer alusão a um destinatário determinado, ao invés de abranger uma categoria de pessoas; a norma adotar como critério discriminador qualquer elemento não residente nos fatos, nas situações ou nas pessoas desequiparadas; a norma atribuir tratamentos jurídicos diferentes, considerando critério discriminador que não guarda relação de pertinência lógica com a desigualdade de regimes outorgados; quando a norma supor a existência abstrata de relação de pertinência lógica, mas, no entanto, o critério discriminador conduzir a efeitos contrários aos objetivos constitucionais; quando a interpretação da norma extrair dela desequiparações que não foram descritas de forma explicita, ainda que presentes de forma implícita.83

Levando em consideração as diretrizes supracitadas, a questão mais relevante, no contexto do processo judicial informatizado, refere-se à possibilidade jurídica de se estabelecer a adoção do processo eletrônico de forma obrigatória, com o conseqüente cadastramento obrigatório, pelos causídicos e entes estatais, nos órgãos do Poder Judiciário, tendo em vista que a Lei 11.419/06 não traz, em seu bojo, nenhuma disposição quanto à obrigatoriedade de adesão ao processo eletrônico.

Um dos óbices à implantação obrigatória do processo eletrônico, atualmente, são os altos índices de exclusão digital no país. Segundo Almeida Filho, “Os que mais têm necessidade de acesso à justiça, conforme relatório da ONU, se encontram excluídos digitalmente pela sociedade da informação.”84

A exclusão digital no Brasil se dá em razão da situação de hipossuficiência econômica da população. Grande parcela do povo brasileiro não é proprietário ou não possui acesso a um computador e, conseqüentemente, à internet. Não obstante tal fato, verifica-se que, nos casos em que a tramitação do processo judicial demandar a intervenção obrigatória de um advogado, tal fato acaba por nivelar as partes no processo.

O êxito da implantação do processo judicial eletrônico encontra-se intimamente ligado à implementação e sucesso de políticas públicas de inclusão digital, evitando a criação de uma justiça dúplice, uma destinada às classes de maior poder aquisitivo, informatizada e mais célere, e outra relegada às classes economicamente hipossuficientes, não informatizada e, portanto, tradicionalmente mais lenta, maculando o princípio da igualdade.

Cumpre ressaltar que existem iniciativas legislativas com o escopo de minimizar os efeitos sociais que a exclusão digital pode ocasionar. Dentre elas, podemos citar o Fundo de

83 MELLO, Celso Antônio Bandeira. O conteúdo jurídico do princípio da igualdade. 3. ed. São Paulo:

Malheiros, 1995. p. 47-48 apud CLEMENTINO, Edilberto Barbosa. Op. cit. p. 135.

Universalização dos Serviços de Telecomunicações (FUST), instituído pela Lei nº 9.998, de 17 de agosto de 2000.

Os recursos do FUST são destinados a projetos e atividades de universalização dos serviços de telecomunicações e, com base na idéia de solidariedade social, o fundo visa reduzir os efeitos que a carência de recursos acarreta às classes economicamente menos favorecidas da população, fazendo com que aqueles que tenham recursos custeiem o acesso daqueles desprovidos dos mesmos.85

Além do diploma que instituiu o FUST, existem, ainda, os Decretos nº 3.753 e 3.754, ambos de 19 de fevereiro de 2001, que estabeleceram, respectivamente, os Planos de Metas para a Universalização de Serviços de Telecomunicações em Escolas Públicas de Ensino Profissionalizante e de Ensino Médio, impondo às referidas unidades estudantis a implantação do acesso, e dos equipamentos, à utilização de serviços de redes digitais de informação, destinadas ao acesso público, inclusive da internet, no âmbito das instituições públicas de ensino profissionalizante localizadas em suas áreas geográficas, até a data limite de 31 de dezembro de 2002.86

Ana Amélia de Castro Ferreira, em artigo sobre o processo judicial informatizado, não considera a exclusão digital como um obstáculo para a disseminação do procedimento eletrônico, defendendo, outrossim, que, com esta política, o Poder Judiciário poderá se transformar em um importante protagonista na marcha pela inclusão digital da sociedade brasileira.87

Neste momento inicial de implementação do processo eletrônico, a obrigatoriedade do cadastro, perante os órgãos judiciários, das pessoas jurídicas de Direito Público, para recebimento de citações, notificações e intimações encontra-se em perfeita consonância com o princípio da igualdade, pois implica em desequiparação que se baseia na capacidade estrutural desses entes públicos para efetuar a modernização que o processo eletrônico demanda, razão pela qual deve exigir-se dos mesmos as primeiras iniciativas necessárias à plena implementação da informatização judicial.

O tratamento privilegiado da não-obrigatoriedade ao processo eletrônico deve ser conferido somente àqueles que não possuam condições técnicas e econômicas para ingressar imediatamente no novo modelo processual informatizado.

85 CLEMENTINO, Edilberto Barbosa. Op. cit. p.138. 86 Loc. cit.

87 FERREIRA, Ana Amélia Menna Barreto de Castro Ferreira. Questões sobre o processo judicial

Dessa forma, apresenta-se como totalmente plausível a obrigatoriedade da utilização do processo eletrônico, desde que sejam disponibilizados os equipamentos e demais recursos eletrônicos necessários ao ajuizamento e tramitação dos processos àqueles que não disponham de tais utensílios, para que possam deles utilizar-se sem quaisquer embaraços, em consonância com o previsto no art. 10, § 3º, da Lei 11.419/06.

Esta diferença de tratamento aos que possuem ou não condições de utilizar-se do processo eletrônico prestigia sobremaneira o princípio da isonomia real, segundo o qual os iguais devem ser tratados igualmente pelo Estado e os desiguais, desigualmente, na medida em que se desigualam. Não haveria, portanto, ofensa ao princípio em tela.

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