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2 TEORIA DA ATIVIDADE

2.5 PRINCÍPIOS BÁSICOS DA TEORIA DA ATIVIDADE

Como já mencionado, a Teoria da Atividade vem sendo estudada por uma diversa gama de autores e sua aplicação vem ocorrendo nas mais distintas áreas. No decorrer deste tópico serão apresentados os princípios básicos da Teoria da Atividade identificados nos trabalhos de Vygotsky (2007), Leontiev (1978), Engeström (1987), Kaptelinin e Nardi (2012). Tais princípios explanam conceitos importantes para o entendimento da atividade humana nas mais diversas áreas.

2.5.1 Mediação

Este princípio explana que a ação humana é mediada, seja por ferramentas psicológicas, seja por ferramentas materiais, ou por ambas concomitantemente. As ferramentas materiais são os diversos tipos de artefatos com os quais interagimos diariamente, já as ferramentas psicológicas envolvem os sistemas de signos, como a fala.

A Teoria da Atividade incorpora a abordagem de Vygotsky sobre mediação, mas a utiliza a partir de um outro contexto teórico, uma vez que o enfoque de Leontiev era a

atividade em si, "entendida como a interação proposital de sujeitos ativos como o mundo objetivo" (KAPTELININ E NARDI, 2012, pag. 31). Ou seja, enquanto Vygotsky mantém sua abordagem focada nas funções mentais superiores – em especial o pensamento e a linguagem – e no desenvolvimento humano, a Teoria da Atividade preocupa-se com as "ferramentas como meios que medeiam a atividade como um todo" (KAPTELININ E NARDI, 2012, pag. 32). Ao serem usadas pelos sujeitos em atividade as ferramentas acumulam e transferem conhecimento social e cultural.

De acordo com Engeström (1999, p. 29), “a mediação por instrumentos e signos não é meramente uma ideia psicológica. É a quebra das paredes cartesianas que isolam a

mente do indivíduo da cultura e da sociedade”. A mediação é um princípio-chave para entender a Teoria da Atividade. É a partir da mediação que todos os demais princípios se constroem.

2.5.2 Orientação a objeto

De acordo com esse princípio, as atividades humanas são direcionadas para seus objetos. São também de acordo com seus respectivos objetos que uma atividade humana se diferencia de outra (KAPTELININ E NARDI, 2012).

Na Teoria da Atividade o termo "objeto" guarda uma aproximação conceitual com o termo "objetivo". Assim, toda atividade humana é mediada por artefatos e direcionada a objetivos específicos.

Entender o objeto e seus significados no contexto da Teoria da Atividade contribui para a análise do sujeito e suas práticas.

2.5.3 Estrutura Hierárquica da Atividade

Como visto anteriormente, a atividade humana possui três níveis hierárquicos:

atividade, ação e operação. As atividades são divididas em ações; as ações são divididas em operações. A atividade é dirigida por um motivo, as ações por metas e as operações pelas condições instrumentais da ação desempenhada pelo sujeito (LEONTIEV, 1978). A atividade é a unidade de análise composta por ações e operações (figura 12). Ao passo que ações são processadas conscientemente pela mente humana, as operações são processos inconscientes, ou seja, são desempenhadas automaticamente pelos seres humanos. Uma operação pode se originar de uma ação que foi automatizada ou pode ser também o resultado de uma improvisação, “um ajuste espontâneo de uma ação em tempo real, como, por exemplo, agir instintivamente em uma situação de emergência” (KAPTELININ E NARDI, 2012, p. 30).

Figura 12: Estrutura Hierárquica da Atividade.

Fonte: a autora.

Os três níveis da atividade humana são integrados e estão em constante transformação. Esta distinção torna possível tanto uma análise contextual como análises direcionadas a cada um dos níveis.

2.5.4 Internalização e Externalização

Internalização e Externalização são também paradigmas derivados dos estudos de Vygotsky. A separação em dois conceitos existe apenas para fins didáticos, pois um não existe sem o outro. Dialogam dialeticamente e transformam-se mutuamente.

As atividades internas acontecem na mente do indivíduo e as atividades externas são aquelas que ocorrem sobre os objetos materiais. A internalização ocorre

gradativamente e se dá a partir do contato com componentes externos. “Por exemplo, as crianças costumam usar seus dedos para aritmética simples, mas ao longo do tempo o uso dos dedos normalmente torna-se redundante” (KAPTELININ E NARDI, 2012, p. 31). Já na externalização as atividades internas transformam-se em externas e são as

responsáveis por exteriorizar o pensamento e a ação humana. Falar, escrever, desenhar – exemplos de exteriorização do pensamento humano – são instrumentos

2.5.5 Desenvolvimento

Este princípio explicita a importância da análise da continuidade na atividade humana. Para a Teoria da Atividade o termo ‘desenvolvimento’ pode ser tanto uma estratégia de pesquisa quanto um objeto de estudo.

Ao ser empregado como objeto de estudo, o desenvolvimento é entendido como “um fenômeno complexo que pode ser analisado em diferentes níveis”. Como estratégia de pesquisa, o desenvolvimento entende que qualquer objeto a ser estudado precisa ser analisado a partir da sua dinâmica de transformação, ou seja, “a teoria da atividade prioriza experiências formativas sobre experimentos controlados tradicionais” (KAPTELININ E NARDI, 2012, p. 32). As atividades são sistemas dinâmicos e estão em contínua mudança.

2.5.6 Sistema de Atividade

Segundo Engeström (1999), a atividade deve ser observada dentro de um sistema social mediado por artefatos e orientado para objetos. O Sistema de Atividade é formado pelos elementos: sujeito, artefato, objeto, comunidade, regras e divisão do trabalho. Em seu modelo de análise é possível estudar cada um de seus elementos isoladamente, mas também a partir de suas tensões.

Os sistemas de atividade ocorrem ao produzirem ações e operações, possibilitando reconhecer as transformações coletivas ao longo de seu desenvolvimento.

2.5.7 Multivocalidade

Um sistema de atividade tem como premissa a multivocalidade, ou seja, deve-se observar as visões e abordagens de todos os seus participantes. A divisão de trabalho em uma atividade é reconhecida de maneira diferente por cada um de seus membros, eles observam e constroem a atividade a partir de seu próprio arcabouço social,

histórico e cultural. A multivocalidade é responsável por dar voz aos problemas do sistema, contribuindo, inclusive, para possíveis soluções (ENGESTRÖM, 1999).

2.5.8 Contradições

Para Engeström (1999), as contradições são as principais responsáveis pelas mudanças e desenvolvimento de uma atividade. Não se pode confundir contradições com

dificuldades ou conflitos. Elas são reconhecidamente tensões que ocorrem

cumulativamente entre os elementos de um sistema ou até mesmo entre sistemas. Os dilemas em um sistema são vivenciados individualmente por cada sujeito, no entanto, as contradições de um sistema precisam ser solucionadas coletivamente, a partir do contato contínuo com os sujeitos, ações e operações (BLACKLER, 2009).

2.5.9 Transformações Expansivas

As transformações expansivas ocorrem quando é possível identificar uma

transformação qualitativa de um sistema de atividade. Para que a transformação expansiva ocorra é necessário um esforço coletivo a favor das mudanças no sistema. Segundo Engeström (1987, p. 174), um ciclo completo de transformações expansivas “é a distância entre as ações diárias atuais dos sujeitos e a nova forma da atividade da sociedade que pode ser produzida coletivamente como soluções para o dilema potencialmente embutido nas ações diárias”.

O percurso entre o início e o fim de uma transformação expansiva pode ser considerado como a incursão dos diversos atores do sistema em uma zona de desenvolvimento proximal da atividade.

2.5.10 Historicidade

Por fim, tem-se o princípio da Historicidade. Deixamos para abordá-lo por último devido a sua importância central nesta tese de doutorado. Entende-se por historicidade a análise histórica das atividades em observação. Assim, a fim de identificar as falhas e suscitar soluções para o sistema, é necessário investigar como foi moldada a atividade, a partir da história localizada da atividade e seus elementos.

Engeström (1999, p. 25) aponta algumas preocupações sobre o modo como se deve investigar a historicidade. Para ele,

é certamente apropriado evitar impor sequências rígidas e unidimensionais sobre a realidade social [...]. Qualquer estrutura conceitual que postula uma seqüência pré-determinada de estágios de desenvolvimento sócio-histórico implicará facilmente noções suspeitas do que é "primitivo" e do que é "avançado", o que é atrasado e o que é bom. Essas noções reduzem a rica diversidade de formas socioculturais de vida a uma escala unidimensional.

É necessário evitar generalizações históricas, buscando sempre identificar as diferenças culturais, sociais e características específicas do público estudado.

Outra consideração feita por Engeström (1999) refere-se ao tamanho do sistema a ser estudado. Se muito pequeno, não ultrapassa a biografia dos indivíduos, se muito grande, mais complexo e generalista será o mapeamento histórico. No entanto, ao se trabalhar com sistema de atividade manejável é possível fazer a adequada leitura da história dos componentes da atividade.

Há ainda a necessidade de dividir o fluxo de eventos históricos por períodos que possuam características similares. Os fluxos históricos podem ser formados por ciclos repetitivos ou expansivos (ENGESTRÖM, 1999). Quando se tem um ciclo expansivo, há, naturalmente, a melhoria ou o surgimento de um novo sistema da atividade.

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