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Princípios solidários e sua incorporação a valores pessoais

6 RESULTADOS

6.5 GRUPO PERSONALIDADE ÉTICA: DEMAIS ENTREVISTAS

6.5.3 Princípios solidários e sua incorporação a valores pessoais

Vemos, nos três fragmentos de Valquíria, expostos a seguir, que os princípios da economia solidária são seus também, e que respeitar o outro e trabalhar pela cooperação é para ela um valor pessoal, que aparece como central em sua personalidade. Esses valores pautam a entrevista e o posicionamento de Valquíria do começo ao fim da entrevista.

Fragmento 53

Então, eu acredito muito nessa questão da agroecologia que a gente tem que trabalhar, aí eu falo que a partir dessa visão de trabalho, da economia solidaria, das relações com as pessoas, de que nós, a gente tem um dever muito grande com as comunidades, e aí pra mim eu tenho um compromisso muito grande e eu acho que um compromisso de obrigação, não só um compromisso assim: ah, eu me comprometo, mas eu acho que uma carga de obrigação com a comunidade pela formação que eu tive, por tudo que eu passei, pelas pessoas que investiram, que acreditaram, e que eu preciso dá um retorno de qualquer uma forma, mesmo que seja pequeno, mais eu

preciso dar um retorno, então por isso que eu sempre tenho essa coisa do comprometimento. Comprometimento com todas as pessoas do campo, principalmente na área onde a gente atua e de que todas as comunidades ela é possível de se desenvolver e que nós que temos um pouco de formação técnica, a gente tem que saber trabalhar, buscar formas de trabalhar o conhecimento das pessoas porque todas pessoas elas têm conhecimento e elas sabem o que elas querem [...] (VALQUÍRIA, 2013).

Fragmento 54

[...] eu não acredito que eu pensar apenas na empresa e não pensar lá nas famílias seja solidário, seja um trabalho solidário, pra mim solidariedade dentro do trabalho é a gente pensar a partir deles e não a partir do que eu quero, inclusive aqui na CPT, mesmo a gente também tem a nossa missão dentro dessa questão da solidariedade [...] porque uma coisa que eu sempre acreditei desde quando eu comecei iniciar o processo de formação, é que o nosso papel é tornar as pessoas autônomas, protagonistas da sua história, eu V. não tenho que ser protagonista da história, quem tem que ser são eles por que nem sempre eu vou está no mesmo cenário, eu não quero minha vida ficar sempre no mesmo cenário, então se eu fico deixando as pessoas dependentes de mim, quando eu sair desse cenário as pessoas ficam perdidas (VALQUÍRIA, 2013).

Fragmento 55

[...] eu acho que é um processo gradual, de formação que tem que partir deles, não tem que nós ou qualquer cooperativa chegar dizendo que tem que ser uma associação porque tem que ter um CNPJ pra fazer isso, aquilo ou outro, mas eu acho que tem que partir deles, aí sim, eu acredito que não vai perder os valores, agora quando é aquela coisa que vem de cima para baixo colocada como uma obrigação, aí você quebra os valores porque as pessoas vão começar a se relacionar a partir daquela estrutura ali que foi imposta [...] (VALQUÍRIA, 2013).

Nos fragmentos que apresentaremos a seguir, vai ser possível percebemos que os princípios da economia solidária foram incorporados por Dorival, reforçando o quanto se tornam valores e práticas cotidianos. Na fala dos três entrevistados, Antonio, Valquíria e Dorival, existe referência ao direito, à autonomia, a alimentos saudáveis, ao manejo adequado dos recursos naturais e aos conhecimentos tradicionais típicos de comunidades rurais. Dorival é um propagador de sonhos, acredita na juventude e na capacidade desta de mudar a ordem vigente pela compreensão de que os valores imputados pelo capitalismo são contrários à vida e ao bem estar social. Cita, inclusive que, à revelia da opinião de outras pessoas, utiliza seus horários de lazer para incentivar práticas cooperativas, uma vez que isso está à frente em sua escala de valores.

Fragmento 56

[...] a economia capitalista esta voltada para o lucro, para o consumo, para a destruição da natureza, a economia solidaria não, ela está preocupada com as pessoas, com o desenvolvimento do ser humano como um todo, com redes, formação de redes, formação de laços, de cooperação e preocupada também com a sustentabilidade da vida, com a perspectiva da vida, então assim se pensa quando a gente trabalha com grupos solidários, de economia solidaria, a gente não trabalha com essa ideia da riqueza, de enricar por enricar, não, a gente trabalha com a ideia de você ter o seu barco, o seu rendimento, o seu desenvolvimento. Eu tenho falado muito isso com os grupos de jovens na região do Bico, e aqui também sempre quando tenho uma oportunidade com meus alunos da escola [...] (Dorival, 2013).

Fragmento 57

[...] então acho que estudar é bom, embora a situação nossa não reforça muito essa ideologia, essa maneira de pensar, mas os movimentos ajuda a gente pensar um pouco por essa lógica de que é possível você se desenvolver, crescer, mais crescer pensando no seu grupo, pensando na sua comunidade, pensando no ambiente que você está vivendo, pensando em ter uma saúde boa, em ter alimento bom, alimento não contaminado, você ter uma renda que seja constate mesmo que seja pouco, mas que lhe garante uma sobrevivência boa (DORIVAL, 2013).

Fragmento 58

[...] porque é uma confrontação, eu acho que o modelo econômico ele leva também a uma quebra de muitos valores, de valores solidários, até ético mesmo, de valores como de cooperação. Enquanto a economia capitalista ela reporta o individual, quando você foca no coletivo isso cria outros embaraços, então a economia na verdade e as práticas que se tem elas são animadores de outros valores que vão se agregando a essas práticas, por isso que é muito mais difícil o jovem entender, por exemplo, que é importante ele fazer um grupo de jovens pra ele começar a compartilhar as ansiedades deles e os sonhos deles, quando ele saca isso, quando ele percebe que ele, que tem uma força muito forte, que quer ele mesmo é sozinho, isolado, é ele na depressão, ele no álcool, é ele na droga, existe uma força que empurra ele pra isso, quando ele percebe que existe outra força que traz ele pra uma outra dimensão do que é a vida e do que se quer da vida, ele passa a ser um propagador também dessa nova ideologia, dessa maneira de ver o mundo (DORIVAL, 2013).

Fragmento 59

porque existe uma escala de valores que as pessoas até questionam, por que isso? Por que você se importa com isso? Por que você que deixa de se importar com isso? Então, eu, por exemplo, não tenho preguiça de ir em uma comunidade dia de domingo, dia de sábado, no feriado, me dar prazer de ir reunir com os jovens, reunir com os adultos, reunir com as pessoas, quando as pessoas me chamam pra ir pra uma reunião às vezes sacrifico o meu lazer em função, às vezes ate um lazer familiar em função desse desejo meu de

contribuir com desenvolvimento de alguém ou de um grupo (DORIVAL, 2013).

Assim como os demais entrevistados desse grupo, Jorge também defende valores que foram acoplados a seu modo de ser, pois fala sobre sustentabilidade, defesa do meio ambiente, cuidado urbano, reciclagem e auxílio ao próximo por medidas simples, como a separação de lixo em casa.

Fragmento 60

foi criado na prefeitura passada, nos primeiros meses da prefeitura passada, um projeto chamado coleta seletiva, que todos nós sabemos e conhecemos bem como deve funcionar. Então, passaram-se 8 anos e não funcionou, fizeram um projeto piloto em duas quadras e tal, só que não se faz coleta seletiva dentro do projeto que eles propuseram, sem educação não consegue realizar o processo. Então, por que que eu citei a coleta seletiva dentro dessa argumentação? Porque também faz parte da cultura. Então, nesse exato momento, passado mais de 14 meses de uma nova prefeitura, não funciona a coleta seletiva também e não funciona os projetos do meio ambiente voltado pra essa questão da sustentabilidade, então, quando você vai argumentar não existe resposta (JORGE, 2014).

Fragmento 61

O importante é que você tenha esse entendimento, tenha esse conhecimento e faça a pulverização dele dentro da sociedade, é esse trabalho que eu faço. Olha, a cooperativa existe só que vocês que estão de fora, vocês precisam ajudar. De que forma você pode ajudar? Se não pode contribuir com valor, que faça o mínimo, pegue a sua garrafinha em casa de óleo, pega sua caixa treta, pega sua sacolinha plástica e embala, limpa e leva pra cooperativa. Você tá fazendo um trabalho social adequado. Então é essa filosofia que eu procuro falar sempre e buscar fazer com que as pessoas entendam, né, essa minha filosofia de vida (JORGE, 2014).

Fragmento 62

Engraçado, ninguém quer ver o lixo na rua, né? Mas será que você parou pra fazer a separação, a reciclagem na sua casa do lixo? Que é o que dar sustentabilidade pra cooperativa, que dar a sustentabilidade pros catadores, que leva o alimento até às casas dessas pessoas. Será que a gente para pra pensar o quão é importante isso e por que então que o projeto não sai do papel? Então, a pergunta que se faz é essa, dentro dessa perspectiva de consumo, de capitalismo existe espaço pra esse grupo atuar de forma digna dentro desse ciclo que fatalmente não vai acabar tão cedo? É isso (JORGE, 2014).

Jorge demonstra ainda a percepção da importância do trabalho do catador para a sociedade e o quanto a falta de educação e uma cultura de reciclagem dificultam a vida dessas pessoas. Pois existe um ciclo de funcionamento, e cada pessoa, em sua residência, que participa desse ciclo, separando em sacolas diferenciadas aquilo que vai para reciclagem, colabora com o processo todo.