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Capítulo 5: Conclusões e recomendações

5.1 Principais conclusões do estudo

Se a campanha “Um colchão, um coração” aqueceu muitos corações, foi também uma involuntária chamada de atenção para aquilo que os hotéis poderiam fazer em conjunto. Perceberam que, juntos, poderiam ser mais fortes, mais responsáveis e mais sustentáveis. Muitos destes hotéis já fariam doações, mas com um maior enfoque na relação de proximidade.

O que o programa Hospes, da AHP, trouxe de inovador foi essa capacidade de os hotéis expandirem o horizonte daquilo que poderiam doar, a quem poderiam doar e como poderiam doar. Na realidade, este projeto tornou-se uma referência no âmbito dos programas de RS das unidades hoteleiras, dada a intermediação que consegue fazer entre quem precisa e quem tem para doar. Dada a quantidade de hotéis que aderiram a este hotel e a quantidade de bens doados desde 2013, consegue depreender-se do potencial que este programa contém. Analisar este modelo de distribuição permite perceber que os hotéis têm consciência da sua responsabilidade diante da sociedade e procuram estar presentes nas iniciativas de relevo.

Através da entrevista realizada à AHP, constatou-se que este projeto está em fase de crescimento e ainda a ganhar maturidade, daí a menção à criação de uma plataforma que irá tornar as doações mais transparentes. Este modelo está, assim, a ser melhorado, de forma a dissipar qualquer tipo de dúvida ou distribuição injusta que pudesse vir a ensombrar um processo de doação. A análise deste modelo de distribuição permitiu percecionar que é efetivamente um programa que está a chegar a cada vez mais hotéis e a cada vez mais instituições e que, por isso, está a contribuir ara um aumento da noção de RS no setor da hotelaria em Portugal.

Sendo a AHP a maior associação hoteleira em Portugal, consegue, desta forma, demostrar a importância que este tipo de iniciativas pode ter para a comunidade em que os hotéis se inserem. O Hospes fomenta a noção de devolução à sociedade. Se, por um lado, os hotéis referem a consciência social como motivo, por outro, têm a noção que não se trata apenas da sua consciência, mas da responsabilidade que têm de ter enquanto empresa.

A esta maior noção de RSC associam-se, também, os excedentes que existem nas unidades hoteleiras, ou as remodelações que causam um grande volume de bens que, apesar de já não servirem o propósito dos hotéis, estão em condições de utilização que podem servir a população mais carenciada de uma forma eficaz. Por outro lado, importa salientar que a maioria dos hotéis que praticam a doação de bens também estão orientados para um pensamento de preservação do meio ambiente, que promove a reutilização dos materiais e que luta contra o desperdício. Tendo em conta a sustentabilidade ambiental, muitos dos hotéis inquiridos referem a noção de economia social como uma motivação para as doações.

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Trata-se, assim, de uma lógica de reciprocidade. A lógica defendida pela TTS aplica-se a este contexto das doações. Tendo esta teoria em mente, o que se retém das entrevistas a uns e outros é que ambos reconhecem os benefícios inerentes a este acontecimento. Estabelece-se, assim, uma relação de confiança entre os diferentes stakeholders, sendo que os resultados destas trocas sociais são tanto mais fortes, quanto maior for a relação de confiança que têm entre si. Este é um fenómeno que se observa parte a parte ao longo das entrevistas realizadas.

Desta reciprocidade, fica claro que as instituições beneficiam desta relação não só pelos bens que recebem e que tanta falta lhes fazem, mas também pelo alívio financeiro provocado por estas doações. Ao não terem de gastar dinheiro em determinado tipo de bens, têm a possibilidade de adquirir outros que não lhes são doados.

Por outro lado, os hotéis que doam reconhecem que também eles beneficiam desta troca. São mencionadas algumas razões, mas a principal delas passa pela satisfação dos colaboradores. Os hotéis inquiridos são unânimes em reconhecer que este tipo de iniciativas torna as suas equipas mais fortes e mais coesas. Conclui-se, assim, que existe efetivamente uma aplicação da Teoria das Trocas Sociais nesta relação entre as unidades hoteleiras e as instituições de solidariedade sociais.

Outra das conclusões que se pode retirar da análise às entrevistas realizadas no âmbito deste estudo é que o programa Hospes contribui para a melhoria da qualidade de vida das populações de uma forma significativa e significante. Ao estimular as doações, o Hospes faz com que mais dos seus hotéis associados se aliem a este tipo de doações e, dessa forma, que haja mais bens para doar a mais instituições. Há mais pessoas a ter colchões e menos a dormir no chão. Há mais doentes ou acamados que têm lençóis ou chinelos. Há mais pessoas que podem tomar banho sem ser apenas com água, graças à doação de amenities ou sabonetes. O programa Hospes não põe fim à população carenciada, mas traz-lhe mais dignidade e reduz as necessidades dessa população.

Relativamente ao impacto causado pelas doações, ele é percetível por quem doa e por quem recebe. No entanto, importa distinguir entre três conceitos distintos, que fazem a diferença quando se estuda o impacto, ou não, de uma ação: o impacto, a quantificação de bens doados e a perceção de que se está a fazer o bem, uma perceção de impacto. Nas respostas dadas pelos hotéis e as instituições há uma mistura entre estes três conceitos. Todos concordam que as doações causam impacto, mas nem os hotéis, nem as instituições, nem a AHP fazem uma mensuração clara e objetiva do impacto social. Existem várias quantificações de uns e de outros, mas não se pode afirmar que se conheça o real impacto social destas doações.

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Conclui-se assim, que falta aplicar um modelo que permita ter objetividade. Acredita-se que a Teoria da Mudança tenha as características necessárias para servir de modelo, neste caso em particular. Através da aplicação desta teoria, conseguir-se-ia definir um plano de atuação mais exato e mais objetivo. Como? Ao traçar um conjunto de suposições e ao definir os objetivos que se pretende alcançar, abre-se caminho para que a mudança ocorra. O uso desta teoria fará sentido tendo, também, em conta que se avalia o sucesso tendo por base objetivos claros e definidos à partida. O que se conclui é que se esta teoria fosse aplicada ao programa Hospes e as trocas sociais por ele promovidas, conseguir-se-ia obter uma real noção de impacto, para além da perceção de impacto ou da mera quantificação de bens.

Uma outra forma de medir o impacto social seria através do recurso à ISO 26000. Este normativo permitiria que as organizações tivessem uma noção de gestão mais clara relativamente à RSC. O facto de nenhum dos hotéis inquiridos mencionar esta norma é revelador de que a RS em Portugal, neste setor, ainda não é prática generalizada, mas que começa a dar os primeiros passos.

A medição de impacto é mais facilmente conseguida quando se fala da sua vertente económica, do que quando se fala da sua vertente social. Efetivamente, quer as instituições, quer os hotéis inquiridos conseguem ter a noção do impacto financeiro causado por estas doações. Tratando- se de uma área objetiva, por natureza, o processo é simples e não tem a complexidade inerente à avaliação do impacto social.

Conclui-se, também, que a perceção de impacto que os inquiridos têm está interrelacionada com o alívio financeiro que promove um impacto. Ou seja, é porque os hotéis doam determinados bens que as instituições conseguem adquirir outros bens ou ter bens que nunca teriam a capacidade de comprar para os seus utentes. Conclui-se, assim, que neste caso das doações de bens na hotelaria o impacto social é indissociável do impacto financeiro.

Através das entrevistas realizadas constata-se que a RS na hotelaria é uma tendência crescente e que começa a ter os efeitos desejados, sendo eles a melhoria da qualidade de vida das populações carenciadas. Os números das doações são bastante reveladores de que há vontade de mudar, há vontade de fazer mais por quem rodeia os hotéis, há uma maior consciência social e uma noção cada vez mais clara de que não se trata de uma opção, mas de uma responsabilidade.

Há ainda um longo caminho a percorrer nesta área, mas o caminho efetuado ao longo destes últimos anos é revelador dessa vontade das empresas hoteleiras não viverem exclusivamente orientadas para o lucro financeiro. São cada vez mais os hotéis que percebem o poder de mudança que têm nas mãos e que têm a perceção do que podem ganhar sendo responsáveis, não perdendo nem um cêntimo por causa disso. Na realidade, é disso que se trata: perceber que

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a sustentabilidade e a responsabilidade contêm em si mesmas um tremendo retorno social e também financeiro e ambiental. Das entrevistas realizadas a alguns dos maiores grupos hoteleiros em Portugal, conclui-se que a tendência relativamente a essa visão é crescente e que o programa Hospes é exemplo disso mesmo.

A hotelaria é um setor de pessoas que trabalha para pessoas e que nunca se pode esquecer da dignidade das pessoas que o rodeiam. Com este estudo, consegue ter-se a real perceção de que a hotelaria pode ser colocada ao serviço da comunidade. Essa forma de estar, orientada para o bem-estar da comunidade em que os hotéis se inserem, não os torna economicamente mais frágeis. Pelo contrário, a RSC na hotelaria faz com que os hotéis se tornem mais sustentáveis ao nível económico, não só pelo retorno que estas medidas trazem ao nível interno, mas também ao nível externo.

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