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Principais desgastes de ferramentas na usinagem de aço inoxidável duplex e super

2.3 Desgaste e vida de ferramenta

2.3.1 Principais desgastes de ferramentas na usinagem de aço inoxidável duplex e super

a) Desgaste de Entalhe:

Figura 2.6 - Desgaste de Entalhe. Fonte: (SANDVIK COROMANT, 2010)

De acordo com Santos e Sales (2007), o desgaste de entalhe aparece nas regiões coincidentes com as laterais do cavaco (fig. 2.6 e 2.7). Ainda não existe um consenso na literatura que explique exatamente o mecanismo que provoca o desgaste de entalhe. É comum tratar essa forma de desgaste como um mecanismo que ocorre, principalmente, na usinagem de materiais resistentes a altas temperaturas (como ligas de níquel, titânio e aço inoxidável).

Figura 2.7 - Detalhe de desgaste de entalhe (E1 TS2000 kr 0) testado pastilha intercambiável com líquido refrigerante a uma velocidade de corte de 70 m/min.

Fonte: (CANTERO et al, 2013)

O desgaste do tipo entalhe, no fim do contato da ferramenta com a peça (fim da profundidade de usinagem), ocorre na usinagem destes aços devido ao contato com as rebarbas do corte altamente encruadas. A alta ductilidade faz com que o material comprimido do cavaco, forme uma rebarba ao fim da profundidade de usinagem. Como alta taxa de encruamento é também uma das propriedades deste tipo de material, esta rebarba é bastante dura e cria um efeito de sulcamento nesta região da ferramenta, gerando grande desgaste de entalhe (BIERMANN, HEILMANN, 2009). Oliveira (2013) concluiu, usando resultados de ensaios de torneamento em aço super duplex, que o sulcamento gerado pela dura rebarba na região do fim da profundidade de usinagem, acaba por remover a camada de cobertura naquela região, o que propicia a extrusão do cavaco sendo gerado por este sulco e sua posterior aderência, gerando desgaste de entalhe por attrition.

A figura 2.8 mostra o princípio da ligação entre a formação de rebarbas e o desgaste do tipo entalhe separado em três etapas. As etapas individuais do processo são ilustradas durante o torneamento de aço inoxidável de microestrutura duplex.

Figura 2.8 - Fases de formação de rebarbas e o desenvolvimento de desgaste tipo entalhe em aço inoxidável duplex.

Fonte: (BIERMANN, HEILMANN, 2009)

A zona de contato linear entre material da peça e da ferramenta no fim da área de atrito gera uma carga de ranhuramento ou sulcamento. Na usinagem de materiais que apresentam tendência de encruamento, o efeito descrito é reforçado pelo aumento de dureza do material.

Essas cargas podem desenvolver desgaste do tipo entalhe na pastilha, mesmo se o material da ferramenta e da cobertura apresentarem alta resistência ao desgaste. Numa primeira fase, uma área deformada plasticamente na aresta principal de corte, na parte final da zona de contato entre o material e a ferramenta, é criada. Uma rebarba surge do lado da peça usinada, porém o crescimento é pequeno. Na segunda etapa, a rebarba causa um aumento do desgaste que ultrapassa as camadas de cobertura, chegando ao substrato. Isso resulta na fadiga do metal duro. Portanto, há uma interação entre a formação de rebarbas e o aparecimento do desgaste de tipo entalhe, assim como o aumento de ambos. A consequência desse efeito é o crescimento progressivo da rebarba. Os altos valores de entalhe e cargas induzidas pela formação de rebarbas levam a pastilha a danos significativos. O mecanismo descrito gera uma área deformada plasticamente no final da zona de contato da aresta principal de corte. O início e o desenvolvimento da formação de rebarbas dependem de forma significativa das propriedades do material da peça, da ferramenta e dos parâmetros de corte. Devido à alta tenacidade à fratura e baixa condutividade térmica, alta ductilidade e alta taxa de

encruamento, a formação de rebarbas é característica da usinagem de aços inoxidáveis de microestrutura austenítica e duplex (BIERMANN, HEILMANN, 2009).

b) Aresta Postiça de Corte (APC):

Figura 2.9 - Aresta Postiça de Corte. Fonte: (SANDVIK COROMANT, 2010)

A aresta postiça de corte (APC) é um acúmulo de material encruado da peça que pode se formar na superfície de saída da ferramenta de corte durante a usinagem. Sua ocorrência está intimamente ligada às condições de corte, e às características microestruturais do material da peça (figura 2.9).

Quando se usina em baixas velocidades de corte, a aresta postiça de corte pode se formar. Existem evidências de que a APC é contínua com o material da peça e do cavaco, ao invés de ser um corpo separado de material encruado, sobre o qual o cavaco escoa (TRENT, WRIGTH, 2000). A fig. 2.10 mostra um desenho esquemático da APC, evidenciando ser esta um corpo solidário ao material da peça e do cavaco.

Figura 2.10 – Aresta postiça de corte. Fonte: (TRENT; WRIGHT, 2000)

A literatura explica a ocorrência da aresta postiça de corte da seguinte forma: devido às altas tensões de compressão desenvolvidas durante o corte, o escorregamento do cavaco sobre a superfície de saída da ferramenta não é mais possível e o cavaco se forma por deformação plástica acima dos pontos A e B (fig. 2.10). O encruamento sucessivo de camadas do material faz com que estes pontos se afastem da superfície de saída da ferramenta. Um dos problemas da APC é que ela pode não ser estável e alguns fragmentos podem ser arrancados da mesma e passarem entre a superfície de folga e a peça (o que piora o acabamento superficial) ou arrastarem-se sobre a superfície de saída, aumentando o desgaste da ferramenta (TRENT, WRIGHT, 2000). Além disso, estes fragmentos da APC levam consigo partículas da aresta de corte, incentivando bastante a formação do desgaste de flanco.

Bandyopadhyay (1984) mostrou que a APC pode ser eliminada apenas com o pré- aquecimento da ferramenta de corte. Quando o material é aquecido acima da temperatura de recristalização, esse aumento de temperatura gera recristalização da porção de material deformada, eliminando o encruamento necessário para formação da APC. Este fato explica também porque a APC não se forma em velocidades de corte altas (maiores temperaturas de corte).

A velocidade de corte é o parâmetro de maior influência na formação da APC. Para velocidades de corte muito baixas não há formação de APC e o cavaco simplesmente desliza sobre a superfície de saída da ferramenta. Com o aumento da velocidade de corte a APC começa a se formar e irá aumentar de tamanho conforme a velocidade aumenta. O tamanho da APC atinge um máximo e então começa a diminuir até desaparecer. Esta característica é ilustrada na fig. 2.11.

Figura 2.11 - Variação das dimensões da APC com a velocidade de corte com identificação dos regimes estável e instável e da velocidade de corte crítica.

Nota-se que a dimensão de APC cresce até atingir um valor máximo, a partir do qual começa a diminuir até o valor de velocidade de corte critica (vc-critica), na qual a APC desaparece completamente.

Um aumento do avanço leva a uma redução da vc-critica, ou seja, o desaparecimento da APC será conseguido com menores velocidades de corte. O aumento da profundidade de corte tem influência análoga ao aumento do avanço na redução da vc-critica, porém esta influência é muito menos acentuada. A geometria da ferramenta afeta a formação da APC, sendo o ângulo de saída o mais influente. Com aumento do ângulo de saída, a curva da figura 2.11 se desloca para esquerda (FERRARESI, 2006).

Na usinagem com APC, se esta for estável, ela protege a superfície de saída da ferramenta. O desgaste, nesse caso, é provocado apenas por adesão e abrasão na superfície de folga, causada por partes da APC que se arrastam por entre a superfície de folga da ferramenta e a peça. No caso da APC ser instável, ou seja, formar e desaparecer com determinada frequência, outro importante mecanismo de desgaste, que envolve a aderência e o arrastamento de micro partículas (attrition wear), estará presente e acelerará o desenvolvimento de desgaste na superfície de saída (MACHADO et al., 2015).

De acordo com Trent (2000), a taxa de geração de calor na parte superior da APC aumenta de acordo com o aumento da velocidade de corte, assim como sua temperatura. O cálculo da temperatura em relação à velocidade de corte ou avanço é extremamente difícil por causa da forma e do tamanho da aresta postiça, que estão em constantes mudanças. É improvável que um método de cálculo preciso para estas condições será alcançado.

Mais recentemente, pesquisadores têm verificado que, no processo de usinagem, fragmentos da peça usinada podem aderir à ferramenta de corte de duas formas durante a usinagem. Em primeiro lugar, fragmentos da peça usinada podem soldar-se à aresta de corte, levando à formação daquilo que é conhecido como Aresta Postiça de Corte (APC) ou Built-

Up Edge (BUE), mencionado anteriormente. Em segundo lugar, esses fragmentos da peça

usinada podem distribuir-se e acumular-se sobre uma grande parte da superfície de saída da ferramenta de corte, que conduz à formação daquilo que é conhecido como Built Up Layer (BUL). Estas situações podem surgir em separado sobre uma aresta de corte, ou podem ocorrer simultaneamente (BILGIN, 2015).

Como mencionado anteriormente, o material da peça adere sobre a superfície de saída da ferramenta de duas formas diferentes, e quase simultaneamente, conforme figura 2.12. A

primeira é a mais conhecida e envolve a formação de uma aresta postiça de corte (APC-BUE) por aderência do material da peça de trabalho para a aresta de corte da ferramenta, figura 2.12(a). Na segunda, o material transferido é vertido para áreas mais largas na superfície de saída da ferramenta, dando origem à chamada built-up layer (BUL) ou “deposição de camadas”, figura 2.12(b).

Figura 2.12 – (a) Mecanismo de formação de APC (BUE) e desgaste por adesão; (b) Ferramenta com BUE e BUL.

Fonte: (CARRILERO at al., 2002)

A formação de tais built-up layers sobre a ferramenta de corte depende de muitos parâmetros, isto é, da geometria da ferramenta, do material da ferramenta, das condições de corte.

A built-up layer (BUL) corresponde a uma camada seletiva de transferência ou deposição, tornando-se presente quando inclusões, principalmente inclusões de sulfuretos e/ou de óxidos, são transferidos a partir do material da peça usinada sobre a superfície de saída ou a superfície de folga da ferramenta na forma de uma camada fina. Assim, dois pontos principais diferenciam estes dois fenômenos (BUE e BUL), são a morfologia e a composição (DESAIGUES at al., 2016).

Na superfície de saída, a built-up layer (BUL) é depositada na direção de fluxo dos cavacos e está localizado na região central da interface cavaco-ferramenta. A formação de

built-up layer (BUL), como todos os fenômenos que se produzem na zona de fluxo (zona de

corte secundária), depende das condições locais de tensão, cisalhamento, taxa de deformação e temperatura, e das propriedades da ferramenta e da peça a ser usinada.

A maioria dos estudos experimentais sobre a formação da BUL foi realizada utilizando ferramentas de corte com face plana/lisa (sem quebra cavacos), mesmo em recentes experimentos. Somente alguns autores conduziram experimentos usando pastilhas com

quebra cavacos, por exemplo, Essel (2006) para os aços de corte livre e Nordgren e Melander (1990) para os aços para construção mecânica. Quebra cavacos sinterizados modificam em grande parte a distribuição de tensão na interface cavaco-ferramenta, e assim, a localização da BUL é alterada. Camadas de sulfureto foram observadas, em ferramentas com quebra cavacos sinterizados, muito próximas da aresta de corte e no fim da zona de contacto cavaco- ferramenta, quando BUL é normalmente observada no meio da interface cavaco-ferramenta com ferramentas de superfície plana, ou seja, sem quebra cavacos (NORDGREN, MELANDER, 1990; ESSEL, 2006).

Muitos estudos ressaltam que a espessura da BUL e até mesmo sua composição se alteram com diferentes velocidades de corte, em particular a BUL começa a aparecer quando a BUE desaparece. Inclusões de sulfureto podem induzir a uma primeira camada com velocidade de corte baixa e inclusões de óxidos estão envolvidos na geração de BUL com velocidade de corte superior. Foi observado que a espessura da BUL aumenta e atinge um valor máximo de até 30 µm, diminuindo progressivamente e levando a um desgaste rápido da ferramenta. Esta tendência foi encontrada na usinagem de aços de corte livre, aços para construção mecânica e até mesmo aços inoxidáveis (DESAIGUES at al., 2016).

Estudos mais recentes já apresentam built-up layers (BUL) ou “deposição de camadas” sobre a ferramenta de corte como uma proteção à ferramenta contra o desgaste, aumentando a vida da mesma e melhorando sua produtividade.

Hartung e Kramer (1982) observaram a formação de built-up layer (BUL) e built-up

edge (BUE), na usinagem da liga de titânio Ti6Al4V com ferramentas de corte de diferentes

classes de material. Eles observaram que o desgaste das ferramentas é consideravelmente reduzido em certas condições, com uma camada que protege o deslizamento na interface cavaco-ferramenta e limita a taxa de difusão dos elementos que constituem as ferramentas, já em altas velocidades, esta camada de proteção é removida e o desgaste das ferramentas aumenta rapidamente. A espessura desta camada é determinada pelo balanceamento entre a taxa de difusão do material da ferramenta, e da taxa de dissolução e reação do material da peça na camada em formação (HARTUNG, KRAMER, 1982; OLIAEI, 2016).

A Aresta Postiça de Corte (APC) é muito comum na usinagem do aço inoxidável, particularmente nos aços austeníticos, duplex e super duplex. Pode aparecer mesmo em velocidades de corte mais elevadas devido à alta resistência à fratura, alta ductilidade e altas taxas de encruamento desses aços. Inevitavelmente, isto leva à redução da vida da ferramenta com alto desgaste da mesma, devido às altas forças de corte. Frequentemente, pequenos

pedaços de material são removidos da ferramenta, devido à alta adesão na superfície de saída, levando consigo fragmentos da ferramenta (KORKUT et al., 2004). Os cavacos assim soldados na superfície de saída da ferramenta desgastam camadas da cobertura e até partes do substrato quando se soltam da aresta de corte; também provocam um acabamento superficial inadequado da peça. É recomendado que a velocidade de corte seja aumentada (acima da vc-critica) para que se obtenha uma temperatura superior à da área de formação desta aresta indesejável e que seja usada uma ferramenta com uma aresta de corte viva juntamente com uma classe de cobertura com baixo coeficiente de atrito, que reduz a aderência do cavaco na superfície de saída da ferramenta. Isto irá reduzir a tendência de soldagem dos cavacos sobre a aresta de corte (SANDVIK COROMANT, 1996).

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