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Principais obstáculos epistemológicos encontrados no ensino da Evolução

4 CRIACIONISMO X EVOLUCIONISMO: UMA BATALHA QUE PARECE ESTAR

5.1 CONHECIMENTOS PRÉVIOS E OBSTÁCULOS EPISTEMOLÓGICOS

5.1.2 Principais obstáculos epistemológicos encontrados no ensino da Evolução

Conforme Bachelard (2005), os obstáculos epistemológicos constituem-se em acomodações ao que já se conhece. Para que um novo conhecimento se estabeleça, às vezes é preciso romper com certos conceitos que podem estar barrando o processo de aprendizagem. O ato de conhecer desafia o conhecimento atual, destruindo conhecimentos mal formulados, superando o que o autor denomina como obstáculo à formação do espírito científico.

Bachelard (2005, p. 23) afirma ainda que:

Os professores de ciências imaginam que o espírito começa como uma aula, que é sempre possível reconstruir uma cultura falha pela repetição da lição, que se pode fazer entender uma demonstração repetindo-a ponto por ponto. Não levam em conta que o adolescente entra na aula de física com conhecimentos empíricos já constituídos: não se trata, portanto, de adquirir uma cultura experimental, mas sim de mudar de cultura experimental, de derrubar os obstáculos já sedimentados pela vida cotidiana.

O autor faz essa análise referindo-se ao ensino de Física, mas podemos muito bem transpor essa idéia ao ensino de Biologia, e mais especificamente ainda ao ensino da evolução biológica. Além desse tema ter pouco espaço em sala de aula, ou de ser trabalhado de forma independente dos outros conteúdos da disciplina, o que acontece na maioria das vezes é que este assunto é apresentado como sendo um aparato de teorias elaboradas há séculos. Discussões sobre trabalhos atuais ou contrapontos dessas teorias passam pelo ensino, na maioria das vezes, de forma pouco significativa para os estudantes, sendo abordadas tão rapidamente que os alunos não têm a oportunidade de formar uma idéia consistente e com o mínimo possível de clareza sobre o assunto.

Carneiro (2004) indica problemas como a desarticulação com os demais temas das ciências biológicas e a influência das concepções religiosas, assim como os inúmeros equívocos conceituais, como sendo os principais fatores que comprometem um ensino efetivo sobre a evolução. Cabe lembrar que os livros didáticos também

podem se tornar um problema, na medida em que geralmente não se preocupam com o histórico das teorias evolutivas. Eles trazem sempre os mesmos exemplos já conhecidos sobre cada teoria, como se o assunto não sofresse transformações com o passar dos tempos. Deixam de incluir os inúmeros estudos existentes que apontam outras possibilidades e novidades sobre o assunto.

Pacheco e Oliveira5 (1997 citado por CARNEIRO, 2004) realizaram um estudo onde foi analisada a abordagem do tema evolução biológica nos livros didáticos. Este estudo detectou diversos problemas como equívocos históricos e abordagens pouco claras, que colaboram para confundir os estudantes, e afastá-los não só do estudo da evolução e da biologia, mas das ciências como um todo.

Estas confusões formadas fazem com que as crenças que cada um possuía antes de entrar em contato com os estudos de evolução saiam fortalecidas, visto que é muito mais lógico e fácil ficar com conhecimentos que estão “claros” a ter de (re)construir novos conhecimentos a partir de um emaranhado de informações equivocadas apresentadas por professores e materiais mal formulados.

O fato do ensino da evolução biológica ser trabalhado apenas na etapa final do ensino médio, como indica a distribuição do currículo na maioria das escolas, contribui para aumentar as dificuldades enfrentadas pelos alunos e professores no decorrer do processo de ensino. Os alunos acabam não tendo um tempo hábil para refletir sobre questões complexas que envolvem a origem da vida e as transformações que ocorrem com os organismos.

A abordagem escolar equivocada de um assunto tão polêmico e possuidor de um dinamismo intenso não é recente. Gould (2002, p. 110) afirma:

Os editores de livros didáticos, o braço mais covarde da indústria editorial, geralmente capitularam e excluíram a evolução, ou então relegaram o assunto a um pequeno capítulo no final do livro. Possuo um exemplar do livro didático que usei em 1956 num colégio público em Nova York, uma publicação liberal sem pudores quanto ao ensino da evolução. [...] A evolução ocupa apenas 18 das 662 páginas do livro – capítulo 58, numa obra de sessenta capítulos.

5 PACHECO, R. B. C.; OLIVEIRA, D. L. O homem evoluiu do macaco?: Equívocos e distorções nos livros

didáticos de Biologia. In: VI Encontro de Perspectivas do Ensino de Biologia. Anais. São Paulo: FEUSP, 1997.

O autor ainda complementa dizendo que na maioria das escolas esse capítulo nem chegava a ser visto, e, que neste livro, a palavra “evolução” sequer era mencionada. Pode-se pensar que este foi um caso isolado e antigo, fruto de uma nação onde o movimento criacionista apresenta uma organização estruturada. Entretanto, como já referido anteriormente, a evolução só não foi abolida dos currículos italianos devido a manifestações da comunidade local (SEPULVEDA, 2007).

Para Almeida e Falcão (2005), o conceito de evolução apresenta-se repleto de obstáculos epistemológicos, de fundo ideológico, filosófico e teológico, refletindo em sua abordagem na sala de aula. O que acaba acontecendo é que professores ficam inseguros ao tratar do assunto, dificultando assim, a compreensão dos alunos. Em escolas privadas confessionais esse assunto pode sofrer ainda mais repressões.

Tendo em vista que esse é um tema centralizador, cabe lembrar a importância da compreensão dos processos evolutivos para um efetivo entendimento da importância da biologia. No entanto, as pesquisas sobre o tema envolvendo as concepções de alunos a respeito da evolução biológica, no Brasil, ainda são recentes.

Estudos realizados sobre este tema têm mostrado que os estudantes do ensino médio possuem conhecimentos relacionados ao senso comum que persistem mesmo após anos de (re) construções na tentativa de atingir o conhecimento científico (BIZZO, 1991).

A evolução biológica não poderia ser trabalhada como se fosse apenas mais um conteúdo a ser desenvolvido nas escolas e universidades. Questões relativas à evolução aparecem vinculadas a diversos meios de comunicação, como jornais, revistas, internet, livros e, inclusive, a mídia televisiva, com seu caráter, muitas vezes, sensacionalista. Um fator preocupante é como este assunto é abordado e como está sendo entendido pelo público em geral. A mídia traz este assunto em forma de novelas, quando trata dos “perigosos” mutantes, documentários, desenhos animados e outros programas sensacionalistas que, muitas vezes, provocam uma visão distorcida. Se entrarmos em uma livraria, iremos nos deparar com inúmeros materiais abordando o tema, como revistas, histórias em quadrinhos, almanaques, e livros didáticos. Estas questões poderiam ser levadas para a sala de aula na tentativa de ampliar a visão dos estudantes sobre a abrangência do ensino da evolução.

Dificuldades no ensino da evolução, muitas vezes originadas de concepções ligadas a crenças religiosas, são fatores que podem transformar-se em obstáculos para a construção de um conhecimento científico. Tais obstáculos poderiam ser levados em conta pelo professor, em um trabalho conjunto com os alunos, numa caminhada rumo à superação de dificuldades para o entendimento do assunto em questão.

É importante, também, refletir sobre a possibilidade do desenvolvimento de um ensino de Biologia integrado a outras áreas do conhecimento, com as questões envolvendo o ensino de evolução trabalhadas de forma permanente, juntamente aos outros conteúdos abordados em Ciências e Biologia, e não somente no final da terceira série do ensino médio, como o que vem ocorrendo em grande parte das escolas. Com esta abordagem, a construção do conhecimento sobre a origem da vida e sobre a evolução biológica talvez pudesse ser realizada de forma menos conflitante. Neste contexto a pesquisa foi realizada, conforme a metodologia apresentada no próximo capítulo.

6 METODOLOGIA

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