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PRISÕES DE MENDIGOS NA CIDADE DA PARAHYBA –

Nome Motivo Local da Prisão

João Rosário Gatunice Não foi informado José Pereira Gatunice Não foi informado Alfredo da Penha Gatunice Não foi informado Sebastião Simão Gatunice Não foi informado Simeão de tal Gatunice Não foi informado Jacob da Silva Gatunice Não foi informado José da Silva Gatunice Não foi informado Francisco Viegas Gatunice Não foi informado

Fonte: Jornal A União (1920) – Coluna O Dia da Polícia; Jornal A Imprensa (1920) – Coluna Notícias da Polícia.

O número de mendigos presos por furto/gatunice é pequeno, mas acreditamos que ocorresse muito mais ato dessa natureza do que os declarados nos jornais visto que esses ganharam mais visibilidade e representavam apenas os casos registrados na delegacia. No entanto, muitos roubos certamente ocorreram sem terem sido denunciados em função da insignificância do objeto, ou por se tratar de alimentos, elemento difícil de ser recuperado. Segundo Ariosvaldo da Silva Diniz, havia, por parte das elites, certa margem de tolerância para com os atos ilegais praticados pelos mendigos, pela impossibilidade de fazê-los cumprir a lei com todo rigor, ou pela obstinada resistência que eles opunham às leis.281 A ordem que os delegados desejavam fazer perdurar ainda estava por ser alcançada. Na tentativa de evitar que o furto/gatunice se mantivesse e a ordem superasse a desordem, o 1º delegado da Capital passou a inserir os mendigos na implementação dos serviços de infra-estrutura e manutenção da limpeza das vias públicas.

Em 1920, o Dr. João Franca, 1º delegado de polícia da Capital, ao invés de recolher a prisão os mendigos que circulavam pelas ruas, passou a empregá-los nos

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serviços de limpeza e de manutenção dos equipamentos urbanos, a exemplo das praças e jardins públicos.Na compreensão do Delegado da Capital, a ociosidade era um vício que deveria ser combatido através de mecanismos disciplinadores, voltados para a promoção do interesse pelo trabalho. Assim, seria mantida a ordem social e pública. A partir de 1920, trabalhar na limpeza das ruas e coletar o lixo passou a ser a função dos mendigos que perambulavam nas ruas da Capital, em busca de sobrevivência. A proposta do trabalho como medida disciplinadora visava à incorporação ao cotidiano dos desfavorecidos dos hábitos saudáveis, a exemplo do apego ao trabalho. Essa medida, “por mais que pareça fruto de um planejamento centralizado e racional, portanto moderno, se conectava às expectativas construídas dentro do modelo paternalista de ordenamento das relações sociais“ 282. Contraditória a idéia de cidadania, tal ordem não reconhecia os mendigos como detentores de direitos, mas um grupo pelo qual se poderia prestar algum favor.

Essa medida ecoou entre os paraibanos, sendo recebida como eficaz e positiva. Nesse sentido, os jornalistas não pouparam palavras ao tecerem elogios ao delegado autor da iniciativa, sobretudo porque ela significava não só o fim da sujeira nas ruas, mas, principalmente, porque punha fim à vadiagem, conforme as expressões do jornalista de A União:

o Dr. João Franca, adotou a excelente medida de agarrar os vagabundos e desocupados que perambulam em seu distrito, empregando-os na limpeza das ruas. A providência da zelosa autoridade produziu excelentes resultados e já hoje não se vêem mais nos lugares públicos os amigos da ociosidade... Tendo o esforçado delegado do 1º distrito lhes causado um bem, impondo- lhes o trabalho regenerador, os meliantes estão brilhando agora pela ausência, o que priva as ruas de sua eficaz colaboração na respectiva limpeza.283

Conforme se percebe, a ociosidade entre os pobres era um problema, sobretudo porque os delegados temiam que eles pudessem desencadear algum motim e desestabilizar a propalada ordem pública. Por isso, a adoção da medida acima descrita não significou incorporá-los à sociedade, mas mantê-los sob controle

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NEVES, Frederico de Castro. “Getúlio e a seca: políticas emergenciais na era Vargas”. In: Revista Brasileira de História. São Paulo: ANPUH/Humanitas, vol. 21, nº 40, p. 115, 2001.

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através do trabalho, como se a ociosidade fosse uma opção, e não uma decorrência das relações sociais e de exploração a que estavam submetidos. Por outro lado, incorporar os mendigos aos serviços de limpeza da cidade significou mantê-la salubre. Além dos serviços de limpeza que os mendigos executavam, a Prefeitura mantinha o controle sobre seus corpos ao ocupá-los, uma vez que condicionava a presença deles nas ruas ao exercício do trabalho, evitando assim os furtos. Essa medida fez parte da racionalidade técnica e tinha o objetivo de alocar as peças ociosas no sentido de contribuírem para o processo de melhoramento da cidade. Incorporou-se a esse processo os mendigos, tidos como ameaça à ordem e a manutenção da civilização. Eles foram distribuídos em obras e serviços definidos pela Divisão de Obras Públicas a executarem funções que não dominavam tecnicamente, mas eram consideradas as que melhor condiziam com suas condições e correspondiam às necessidades desse órgão. Assim, além de limparem as ruas e recolherem o lixo, sentaram paralelepípedos nas ruas e carregaram pedras, tijolos, barro e areia para a sustentação dos prédios dos órgãos públicos. Embora a perspectiva dos técnicos e delegados de polícia fosse evitar a esmola desmoralizante, essas tarefas não significaram cidadania para os mendigos, uma vez que esse tipo de ação não fugiu ao “modelo paternalista de relações sociais” nas quais os sujeitos são apenas utilizados nos serviços demandados.284 Mesmo assim, não cessaram os elogios ao Dr. João Franca, 1º delegado da Capital, que foi encorajado a seguir adiante em sua proposta, principalmente porque estava livrando os citadinos de um mal antigo. As recomendações eram de que a referida autoridade não esmorecesse “na salutar campanha contra os vagabundos de seu distrito, trancafiando-os caso se atrevessem a voltar ao teatro de sua indolência”. 285 Por sua vez, o delegado não se limitou à proposta de inserção do mendigo no trabalho, mas reforçou o policiamento das ruas com o intuito de recolher os reincidentes à prisão. Tratavam-se daqueles que já tendo sido indicados ao exercício das funções demandadas pelo serviço de urbanização fugiam.286

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NEVES, Frederico de Castro. op. cit. p. 119

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A União – 18/01/1920, p. 01.

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Foto 9 – Mendigos asilados executando o calçamento de ruas