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2.3. Teoria da agência e dos direitos de propriedade

2.3.1. Problemas de eficiência nas sociedades cooperativas

a) Problema do carona

Deriva-se de ações oportunistas dos cooperados, tirando proveito dos bens e direitos coletivos da organização. O problema está no fato de as ações individuais dos associados poderem afetar negativamente toda a cooperativa (Condon e Vitaliano, 1983).

Esse problema é decorrente do aspecto coletivista implícito na limitação dos direitos de propriedade em uma sociedade cooperativa. Isso porque, se um produtor se associa à cooperativa, por meio de uma integralização mínima de capital estabelecida em estatuto – chamada quota-parte –, ele passa a ter acesso a todos os bens e direitos oriundos da sociedade, inclusive aqueles acumulados ao longo dos anos.

Via de regra, a utilização potencial dos ativos fixos da cooperativa não está vinculada a obrigações de integralização de novas quotas-parte. Desse modo, sempre que surge a necessidade de investimentos em novos ativos, a maior parte dos cooperados prefere se omitir da responsabilidade, visto que não há obrigação de realizá-lo, sendo que, posteriormente, poderão fazer uso dos ativos adquiridos nas mesmas condições daqueles que o financiaram. Por isso, Nilsson (1999) concluiu que o investimento na cooperativa é tão baixo. A agravante está no fato

de a distribuição dos resultados líquidos se dar em função das transações com a cooperativa e não do capital investido.

Quanto ao capital, cabe ressaltar que o cooperado não pode transferir para terceiros suas quotas-parte e, no caso de demissão, recebe de volta apenas o seu capital integralizado corrigido, o que inibe qualquer manifestação especulativa.

Como ilustração, em uma cooperativa de leite a distribuição das sobras líquidas se dá em função da quantidade de leite repassada à sociedade e não da quantidade de capital subscrito e integralizado. Assim, o cooperado conclui que se torna mais oportuno investir em sua própria fazenda, por meio da aquisição de gado, aumentando a produção, o repasse de leite à cooperativa e a sua participação nas sobras operacionais no final do exercício. Dessa forma, como alternativa de capitalização, resta à cooperativa o incentivo à adesão de novos membros ou a tomada de capital em condições desvantajosas7.

De acordo com Chukwu (1990), é notória a dificuldade que as cooperativas têm de levantar capital para investimentos, mesmo aqueles com alta rentabilidade. Isso porque, no desejo de usufruir sem contribuir para tal, os associados preferem emprestar o seu capital a investir no empreendimento produtivo cooperativo, deprimindo os indicadores de capital próprio da sociedade. Nisto consiste o problema do carona: a ação oportunista que acarreta a utilização subótima de capital.

Esse problema conduz a organização, de acordo com as citadas correntes teóricas, à ineficiência técnica, alocativa e econômica, devido à dificuldade de realização de investimentos produtivos e tecnológicos capazes de garantir competitividade e rentabilidade no mercado.

b) Problema de horizonte

O problema do horizonte ocorre em função da limitação do horizonte de planejamento da cooperativa e do fato de os direitos de propriedade serem intransferíveis quando os membros se retirarem da sociedade (Nilsson, 1999).

7 As cooperativas incorrem, normalmente, em uma taxa de juros maior na tomada de capital, atribuída ao spread pelo risco financeiro decorrente da impossibilidade de falência.

O fato de nas cooperativas os associados estarem se renovando a todo instante faz com que a sociedade admita certa heterogeneidade, fazendo com que membros de idades distintas tenham diferentes perspectivas de investimento e de retorno no tempo, não sendo possível a realização de investimentos ótimos, inibindo o desenvolvimento da firma e fazendo com que esta opere em escala inadequada (Sogaard, 1994).

Sexton (1997, citado por Zylbersztajn, 2002, p. 59), discute esse problema, destacando que os cooperados tendem a rejeitar estratégias que visem à imobilização de capital por longos períodos de tempo, em decorrência de não haver a valorização da quota-parte na mesma proporção que a valorização da riqueza, diferentemente de uma sociedade de capital aberto, em que as ações acompanham a valorização da empresa, sendo um atrativo para investimentos de longo prazo.

c) Problema de portfólio

Normalmente, as empresas são motivadas a construírem portfólios de negócios diversificados, como forma de reduzir os riscos operacionais e financeiros advindos de intempéries de mercados específicos.

Nas sociedades de capital, a construção desse portfólio é motivada pelo desejo de maximizar o valor da empresa no longo prazo, enquanto na cooperativa existe o desejo de maximizar o valor de remuneração do produto dos cooperados e, quando muito, das sobras operacionais do exercício seguinte.

Nilsson (1999) acrescentou que a construção desse portfólio nas cooperativas não segue a ótica capitalista, que visa se apropriar das oportunidades do mercado, mas representa interesses específicos de grupos de cooperados. Corroborando essa observação, Ferreira e Braga (2003) constataram que 46% das cooperativas agropecuárias de Minas Gerais e São Paulo diversificam-se no intuito de atender aos objetivos específicos do cooperado; apenas 2% diversificam visando diminuição de risco e 10% visando aproveitar oportunidades do mercado. Logo, as cooperativas não seguem a ótica de investimento consagrada na literatura de finanças, como a construção de

portfólios diversificados visando minimizar o risco e maximizar a riqueza da sociedade.

Essa situação é agravada, em alguns casos, pela diferença de propósitos entre agentes (diretores eleitos para administrar a cooperativa) e principal (associados), levando a investimentos subótimos, conflitantes, conduzindo a cooperativa à ineficiência econômica (Nilsson, 1999).

d) Problema de controle

O problema do controle refere-se à qualidade da gestão do agente, sendo que nas cooperativas esse problema admite uma peculiaridade, qual seja: o agente é escolhido por meio de um processo eleitoral que exige, na maior parte das vezes, mais relacionamento social do que qualificações profissionais para o pleito do cargo. Somado a isso, Nilsson (1999) ressaltou que, uma vez assumida a liderança em uma cooperativa, é difícil para os cooperados avaliar a contribuição dos diretores, e em boa parte dos casos há a manutenção do cargo por longo período.

De acordo com Zylbersztajn (2002), quando a gestão é exercida por um agente não-especializado, surgem problemas de eficiência, que são facilmente detectados pelo mercado, no caso de sociedades de capital aberto, seja por meio da queda do valor das ações, seja pela posição de risco do empreendimento.

O fato é que a empresa procurará se reestruturar sob pressão dos acionistas e do conselho de administração, papel não exercido na sociedade cooperativa, que tem em sua estrutura um conselho fiscal que não está apto, na maioria dos casos, a corrigir as assimetrias de informação, bem como monitorar as ações oportunistas do agente.

e) Problema dos custos de influência

O fato de o conselho de administração das cooperativas ser eleito pelos cooperados gera um custo de influência derivado da parcialidade desse processo. Assim, os diretores administram a cooperativa mais em função da satisfação do interesse dos associados do que da maximização do crescimento do empreendimento produtivo e da valorização da organização no longo prazo. Mais

uma vez, a agravante está na limitação dos direitos de propriedade, que imputa aos cooperados uma visão míope de curto prazo.

Diante do cenário de diferentes opiniões a respeito dos investimentos, das consolidações e dos resultados nas cooperativas, torna-se difícil para os diretores da cooperativa implementarem uma decisão efetiva (Richards et al., 1998).

Como os administradores querem normalmente se reeleger, a satisfação do interesse dos cooperados passa a conduzir a cooperativa para uma alocação ineficiente de recursos e uma ingerência administrativa. A esse respeito, Ferreira e Braga (2003) constataram que mais de 80% das cooperativas agropecuárias de Minas Gerais e São Paulo, que atuam em negócios e produtos com prejuízos sistemáticos, permanecem nessas atividades como forma de satisfazer a interesses específicos dos cooperados.