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Os problemas da substituição

No documento Tributao do Rendimento: IRC 2019 (páginas 160-162)

TRIBUTAÇÃO DO RENDIMENTO: IRC –

2. O IRC NAS REORGANIZAÇÕES EMPRESARIAIS 1 Nota introdutória

4.3. Os problemas da substituição

4.3.1. Na óptica do ordenamento jurídico

No nosso ordenamento jurídico, em particular ao abrigo do princípio da liberdade contratual consagrado no artigo 405.º do Código Civil, os agentes económicos têm o poder de decidir livremente entre contratar ou não contratar, conforme melhor lhes aprouver e, optando por contratar, têm o direito de livre escolha do tipo e da forma do contrato que pretendem celebrar, podendo adoptar as formas que, servindo os seus interesses, lhes sejam mais convenientes.

87 Neste contexto, “substituição” tem um sentido mais restrito do que o seu habitual sentido económico. Cf. Rocha Mendes & Correia, “As Alterações …”, cit. , p 67 e seguintes. Sobre esta aproximação teórica, conhecida como Microeconomic Approach to Tax Planning, veja-se Lamb, M. & Lymer, A. “Interdisciplinary Research in Taxation: Research Approaches and Bibliographic Survey”, The Institute of Chartered Accountants in England and Wales. 1999, p. 111 e Scholes, et al. “Taxes…”, cit., a “bíblia” deste movimento. Cf. também Schenk, Deborah H. “An Efficiency Approach to Reforming a Realization-Based Tax”, 57 Tax L. Rev. 503 (2004) e Weisbach, David A., “An Efficiency Analysis of Line Drawing in the Tax Law”.

88 Cf. Rocha Mendes & Correia, “As Alterações aos Mecanismos…”, cit., p 89.

89 Ibidem. Cf. também Schenk, “An Efficiency…”, cit. p. 509; Schizer, David M. “Frictions as a Constraint on Tax Planning”, 101 Columbia Law Review 1312 (2001) e Scholes, e al. “Taxes…”, cit., p. 90.

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4. IRC e as reorganizações empresariais

Ao abrigo desse princípio, portanto, os agentes económicos podem optar por uma forma contratual que, obtendo os mesmos resultados económicos, é fiscalmente menos onerosa que as demais alternativas disponíveis. Ou seja, perante uma situação de ausência de neutralidade do sistema fiscal (i.e. uma assimetria), os contribuintes não estão obrigados a optar pela via que maximiza a receita pública90, podendo, portanto, substituir o comportamento (i.e. o negócio jurídico) inicialmente previsto por outro que lhes seja fiscalmente menos oneroso. A questão quanto à legitimidade da substituição surge, no entanto, quando a utilização da forma jurídica alternativa visa, e permite, obter um certo resultado (um benefício fiscal, por exemplo) ou a utilização de um certo meio (como seja um regime favorável) que se considera contrário aos valores estruturantes do ordenamento jurídico ou ao propósito específico desses benefícios ou desses regimes91.

Não está em causa a violação de normas concretamente consideradas, mas sim uma actuação que, cumprindo formalmente a lei, é contrária à intenção normativa expressa na ordem jurídica92. Nestes casos, a substituição, visando principalmente furtar o negócio à incidência de uma norma tributária, frustra uma intenção normativa expressa (i.e. a sujeição a imposto da capacidade contributiva que tipicamente se manifesta nesse negócio) e, em consequência, desvirtua um propósito normativo específico e a aplicação de princípios estruturantes (sendo o mais relevante o princípio da justa distribuição dos encargos tributários)93.

4.3.2. Na óptica da eficiência económica

Além da potencial violação dos princípios estruturantes do sistema fiscal, a adopção de comportamentos de substituição pode levar os contribuintes a adoptarem estruturas ou negócios jurídicos menos eficientes e que só têm sentido na medida em que proporcionam vantagens fiscais que compensam essas ineficiências. Ou seja, a diminuição do valor económico, fruto da adopção de uma estrutura ou de um negócio jurídico menos apto, é compensada pela poupança fiscal obtida94.

Nesses casos, substitui-se a forma adequada e mais eficiente pela forma que proporciona maior economia fiscal, levando a uma constante distorção do mercado, com o negócio ou a estrutura menos eficiente a substituir o negócio mais eficiente em termos puramente económicos95.

90 Saldanha Sanches, “Reestruturação…”, cit., pág. 41.

91 Saldanha Sanches, “Abuso de direito em matéria fiscal: natureza, alcance e limites”, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, n.º 398, 2000, p. 20.

92 Veja-se, a título meramente exemplificativo, Saldanha Sanches “Manual…”, cit., p. 116 a122; Menezes Leitão, L., “A Evasão e Fraude Fiscais Face à Teoria da Interpretação da Lei Fiscal” em Estudos de Direito Fiscal, Almedina 1999, p. 9 a 45; Gonçalo Avelãs Nunes, “Cláusula Geral Anti-abuso de Direito em Sede Fiscal – Art. 38º, N.º 2, da Lei Geral Tributária – à Luz dos Princípios Constitucionais do Direito Fiscal”, Fiscalidade n.º 3, Lisboa, Julho 2000, p. 39 a 62, ou ainda Lopes Courinha, Gustavo, “A Cláusula Geral Anti-Abuso no Direito Tributário – Contributos para a sua compreensão“, (Almedina 2004).

93 Cf. Saldanha Sanches, “Abuso de direito…”, cit., p. 21. 94 Ibidem p. 25.

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4. IRC e as reorganizações empresariais

Neste sentido, a adopção de comportamentos de substituição é negativa por duas ordens de razões. Primeiro, pelos custos directos do planeamento fiscal (consultoria, etc.). De uma perspectiva económica, estes custos são considerados ineficientes, ou seja, geradores de “deadweight loss”. Segundo, pelos custos indirectos associados à substituição. Num mundo em que contratar tem custos, a implementação de estratégias de planeamento fiscal pode resultar em ineficiências significativas de natureza não fiscal. Por exemplo, as empresas poderão ser induzidas a implementar estruturas societárias e funcionais que não são as ideais de um ponto de vista operacional. As manobras de substituição podem igualmente resultar na transferência de recursos para uma sociedade que não assegure a maximização económica dos mesmos; na adopção de transacções mais complexas do que o necessário; e, bem assim, na implementação de transacções fora do seu período ideal de um ponto de vista operacional e económico (i.e., os chamados efeitos de lock-in e lock-out) ou, inclusivamente, no seu cancelamento. Todos estes efeitos comportamentais levantam sérias preocupações de uma perspectiva económica96.

4.4. A reacção à substituição no âmbito do regime de neutralidade fiscal

No documento Tributao do Rendimento: IRC 2019 (páginas 160-162)