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2 JUSTIFICATIVA E OBJETIVO

3.5 Procedimentos de coleta dos dados

Com a colaboração da equipe de saúde e por meio da observação do registro dos pacientes internados, foram identificados potenciais participantes do estudo e, em seguida, fez-se contato primeiramente com o responsável e, posteriormente, com a criança ou o adolescente, como já mencionado. Neste momento, eram apresentados o objetivo do estudo e os procedimentos para coleta de dados, em linguagem simples e compreensível, deixando claro que a adesão era voluntária, estando, o possível participante, livre para recusa, sem qualquer prejuízo de seu tratamento, primando pela preservação de sua integridade. Após a

assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido pelo responsável e de assentimento, pela criança ou adolescente, realizou-se uma cuidadosa revisão dos prontuários de cada participante, com o objetivo de caracterizá-los com base nas informações neles disponíveis. Para tanto, elaborou-se um instrumento no qual constavam informações demográficas e clínicas. As informações não encontradas no prontuário foram solicitadas diretamente à criança e ao adolescente.

Outra estratégia de coleta de dados além da fonte secundária, os prontuários, foi a entrevista, realizada entre março e dezembro de 2016, em horário determinado tanto pela equipe de saúde quanto pela criança ou adolescente, de modo a não interferir nas suas atividades e no seu tratamento. Assim, as entrevistas ocorreram em diversos períodos: manhã, tarde e noite.

A coleta de dados foi realizada no setor de pediatria do HCFMRP- USP, sendo que 17 delas ocorreram no refeitório da unidade, três na sala de espera ou no quarto (dez entrevistas) quando estavam sozinhos, a fim de manter o sigilo e liberdade de respostas. A mãe ou o acompanhante, quando desejavam, permaneciam com a criança ou o adolescente durante as entrevistas, embora não pudessem ajudá-los nas repostas, pois o objetivo era identificar necessidades com base na visão dos próprios participantes. Em parte das entrevistas houve interrupções breves para alguns procedimentos, as quais, no entanto, não comprometeram a continuidade deste processo.

Optou-se pela entrevista semiestruturada, por facilitar a compreensão do fenômeno estudado, uma vez que permite ao entrevistado dialogar sobre as experiências vivenciadas (GERHARDT; SILVEIRA, 2009). No início da entrevista, utilizou-se o desenho, pois, segundo Driessnack (2006), o ato de desenhar desloca o foco do pesquisador, um adulto, de fazer perguntas diretas, aproximando-o do entrevistado, neste caso crianças e adolescentes. Para o autor, recursos como o uso de desenho podem atuar como facilitadores da coleta de dados por meio de entrevistas, por potencializarem a inter-relação com crianças e adolescentes e, consequentemente, favorecerem que melhor expressem seus sentimentos. Tal estratégia facilita a comunicação e a interação entre participante e entrevistador, bem como aumenta a confiança e motivação dos participantes.

Para a realização dos desenhos, foram oferecidos lápis de cor, canetinhas, giz de cera e folha sulfite. A coleta de dados iniciava-se com a seguinte abordagem (Apêndice C): Gostaria que você fizesse um ou vários desenhos mostrando o

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que você gostaria de ter aqui no hospital. Em seguida, solicitou-se que criança ou adolescente descrevesse o seu desenho e, após, foram introduzidas as seguintes questões norteadoras: Do que você está sentido falta neste momento? Como é ficar internado aqui no hospital? Quais seus sentimentos? Se aparecesse aqui o gênio da lâmpada mágica e você pudesse fazer um pedido, o que pediria? As respostas foram gravadas e, posteriormente, transcritas na íntegra. A duração das entrevistas foi de aproximadamente 30 minutos, porém, este tempo foi determinado pelos próprios participantes, de acordo com suas necessidades.

Após cada entrevista, foram registradas anotações no diário de campo, como forma de explicitar a linguagem não verbal (postura dos entrevistados, interações sociais, lágrimas, sorrisos, facilidades e dificuldades durante cada encontro), para fins de complementar os dados coletados de forma verbal (VÍCTORA; KNAUTH; HASSEN, 2000). Segundo Minayo (2012), devem ser registradas no diário de campo as impressões pessoais que resultam das conversas informais e dos comportamentos observados.

Logo no primeiro mês de coleta de dados, algumas situações suscitaram reflexões. Apesar dos entrevistados aceitarem participar do estudo, mostraram-se tímidos, respondiam às questões com respostas breves, em geral do tipo sim ou não, o que dificultava a real compreensão de suas necessidades. Percebemos que o vínculo entre o pesquisador e o participante poderia não estar sendo eficaz, pois as crianças e os adolescentes não se sentiam confiantes para falar sobre o processo de hospitalização. Segundo Wayhs e Souza (2002), a ausência de vínculo pode inibi-los e Paula et al. (2016) argumentam que, diante do estabelecimento de vínculos efetivos, crianças e adolescentes podem se mostrar mais falantes e ativos.

Assim, já no segundo mês, ou seja, na sexta entrevista, mudou-se a estratégia, a fim de favorecer a aproximação mais gradual do pesquisador com a criança ou o adolescente, desde os primeiros dias de internação até a data da coleta de dados (após o quinto dia). Desse modo, mediante aceite dos pais e da própria criança ou adolescente, o pesquisador participava dos momentos de recreação, por exemplo, jogos e demais atividades conduzidas pela psicopedagoga da instituição, a fim de se aproximar gradativamente dos potenciais participantes do estudo.

Válido mencionar que o celular do pesquisador foi uma ferramenta importante para a construção de vínculo, pois, por meio dele, crianças e adolescentes pesquisavam na internet desenhos que seriam reproduzidos pela

psicopedagoga no isopor para posterior pintura. Nesse momento, na maioria das vezes, solicitavam a opinião do pesquisador e/ou de seu acompanhante, quando próximo, sobre a figura a ser reproduzida e assim faziam suas escolhas. Os adolescentes escolhiam preferencialmente desenhos do pintor Romero Britto e as crianças, em geral, optavam por personagens infantis, como super-heróis.

Ao longo da atividade de pintura, eram frequentes também as conversas sobre as cores que deveriam utilizar. Esta aproximação facilitou sobremaneira a coleta de dados, pois, além de favorecer a construção de vínculo, permitiu apreender aspectos sobre a hospitalização. Às vezes, enquanto pintavam, embora não diretamente questionados, comentavam sobre seu processo de hospitalização e suas necessidades durante a estadia no hospital.

Apesar dos participantes se interessarem pela pintura, foi possível observar que o fato de desenharem como estratégia de aproximação não foi tão eficaz quanto a interação realizada durante as atividades de recreação. As crianças e, sobretudo os adolescentes, referiram que não sabiam e não gostavam de desenhar e, portanto, poucos se interessavam por esta atividade. Dois participantes, inclusive, preferiram escrever sobre o hospital em vez de desenhar, e outros dois apenas aceitaram conversar.

Durante a entrevista, alguns adolescentes fizeram perguntas que gostariam de dirigir aos profissionais, a respeito, por exemplo, de sua doença e tratamento. Nesse sentido, a escuta atenta destes questionamentos contribuiu para o estabelecimento de vínculos.

Observou-se que, para a construção de vínculos com a criança ou o adolescente, foi necessário primeiramente identificar temas sobre os quais gostariam de conversar e, em seguida, introduzir gradativamente as questões norteadoras do estudo. Uma das participantes comentou o seu sonho de ser bailarina, outro conversou sobre o jogo de futebol; à pesquisadora, questionaram também sobre o mestrado, o que era e para que servia. Segundo Rodrigues et al. (2013), o diálogo é a ferramenta que permite a criação de vínculos.

Às vezes, mesmo diante de perguntas breves, as crianças ou os adolescentes dispersavam-se, ou mesmo não as compreendiam; então, as questões eram reformuladas de modo a facilitar sua compreensão.

Dois adolescentes mostraram-se receosos com a gravação das entrevistas, porém concordaram, após esclarecidos novamente da finalidade única de

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transcrição das falas e cientes de que seus anonimatos seriam preservados, sendo a gravação ouvida apenas pelo pesquisador. Foram também informados da possibilidade de lerem as transcrições, se assim o desejassem. Ao final da entrevista, a maioria deles se interessou em ouvir as respectivas gravações.

Em todas as entrevistas os acompanhantes foram convidados a estarem presentes, como mencionado anteriormente, sendo que alguns demonstraram este interesse. Neste caso, diante de dúvidas dos participantes, eram orientados a não interferir na entrevista, pois isto poderia influenciar os resultados do estudo.

A fase de coleta de dados foi encerrada após a saturação dos dados empíricos. Segundo Minayo (2017), a saturação não se traduz simplesmente na repetição de palavras, sem a devida valorização da qualidade do conteúdo, reportando poucos significados. De acordo com a autora, o número de entrevistas não pode ser o principal critério na decisão de finalizar a coleta, pois o pesquisador deve se preocupar menos com a generalização e as generalidades e conferir maior importância ao aprofundamento, à abrangência e à diversidade no processo de compreensão do objeto de estudo. Dessa forma, a coleta de dados encerrou-se quando dos dados emergiu a lógica interna do objeto de estudo em todas as suas conexões e interconexões, o que se refletiu na totalidade, nas múltiplas dimensões do fenômeno investigado. Foram realizados cerca de 100 encontros com os participantes, que aconteceram desde os primeiros dias de internação até a data da coleta de dados (após o quinto dia).

Destaca-se que, no processo de transcrição, foram realizadas as correções gramaticais para tornar o texto mais compreensível e de fácil leitura, embora sem prejuízo das especificidades dos relatos dos participantes.

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