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2.4 Método da pesquisa-ação: uma opção epistemológica

2.4.2 Procedimentos metodológicos da pesquisa-ação

A opção e a proposição do desenvolvimento de uma pesquisa-ação com/no coletivo em que estamos inseridos surgiram a partir de debates em momentos de formação, em que o coletivo de educadores questionava alguns tipos de pesquisas realizadas na EEMC, no Assentamento e na ARPA, em que o pesquisador ou pesquisadora coletava os dados nesses espaços e nunca mais aparecia. Esse procedimento indignava o coletivo, pois não contribuía em

nada com a realidade que viviam. Outra razão foi que, no período de estudo na especialização em Políticas Públicas e Economia Solidária, foram possibilitados estudos que se referiam às pesquisas que utilizavam como método a pesquisa-ação, e nos traziam outra forma de fazer pesquisa com a comunidade. Assim, tivemos a certeza que era esse tipo de pesquisa que buscávamos.

Desse modo, na busca pela continuidade dos estudos no Mestrado em Educação, ponderamos que a pesquisa-ação seria o método no qual nos embasaríamos para estruturar e desenvolver nossa investigação, sobretudo por eu ser camponesa e estar inserida nesta realidade. No entanto, a escolha dessa metodologia e o desenvolvimento das ações não são algo simples, exigem muita dedicação, estudos, diálogos e, sobretudo, o olhar da esperança e da amorosidade, assim, nesta subseção constam os procedimentos e a sistemática para o seu desenvolvimento.

Nesse sentido, afirmam Franco, Carmo e Medeiros (2013, p. 92), “a opção por uma abordagem ou outra se dá compulsoriamente diante da disposição e disponibilidade do pesquisador e do seu envolvimento com o objeto de estudo, além da intencionalidade da pesquisa”. Portanto, utilizamos, nesta pesquisa, a abordagem qualitativa, pelo fato de a mesma não se preocupar com a representatividade numérica, mas sim com o aprofundamento da compreensão de um grupo social, em que os dados e informações são coletados através da fala e compreensão da realidade. Essa abordagem, segundo Chizzotti (2003, p. 221), procura tanto encontrar o sentido desse fenômeno quanto interpretar os significados que as pessoas dão a eles, e o autor destaca que o termo qualitativo

[...] implica uma partilha densa com pessoas, fatos e locais para extrair desse convívio os significados visíveis e latentes que somente são perceptíveis a uma atenção sensível e, após esse tirocínio o autor interpreta e traduz em um texto, zelosamente escrito, com perspicácia e competência científicas, os significados patentes ou ocultos do seu objeto de pesquisa.

De acordo com o autor supracitado, esse tipo de pesquisa se preocupa com aspectos da realidade que não podem ser quantificados, centrando-se na interpretação a partir do fenômeno estudado, em que “o ambiente natural torna-se a fonte de pesquisa, num contato direto e prolongado entre o pesquisador e o objeto de pesquisa. Normalmente, os dados coletados são dotados de descrições de pessoas, situações e acontecimentos que aparecem na forma de extratos da vida social riquíssimos em símbolos” (FRANCO; CARMO; MEDEIROS, 2013, p. 93), a partir da perspectiva das pessoas nele envolvidas, considerando todos os pontos de vista relevantes.

Nesse sentido, esta pesquisa foi elaborada mediante procedimentos de pesquisa bibliográfica, documental e pesquisa de campo, organizados através dos princípios da Pesquisa- Ação no movimento dialético do conhecimento de ação-reflexão-ação.

Inicialmente, realizamos a pesquisa bibliográfica por meio de revisão de literatura que abordava as temáticas da Docência Camponesa, Pedagogia do Trabalho Associado Camponês e a auto-organização da juventude, iniciada no balanço de produção, apresentado em seção anterior. Como ressalta Fonseca (2002, p. 32), a pesquisa bibliográfica “é feita a partir do levantamento de referências teóricas já analisadas, e publicadas por meios escritos e eletrônicos, como livros, artigos científicos, páginas de web sites”.

Também realizamos estudos documentais que, de acordo com Gil (2002), são “fontes de informações”. Assim, consultamos atas das reuniões pedagógicas da escola e da Igreja Santa Luzia, relatórios das ações desenvolvidas durante a pesquisa relativas ao Projeto da Juventude Camponesa e do Projeto Pedagogia da Cooperação, portarias, resoluções e pareceres relacionados ao EMIEP, o lotacionograma dos docentes camponeses da EEMC e o Projeto Político-Pedagógico - PPP da EEMC. Também buscamos os projetos internos e externos à escola que foram realizados com a juventude do Assentamento, em parceria com a FASE, o CTA, e o Núcleo Unitrabalho, no período de 2015 a 2020, que tinham como foco a auto- organização da Juventude Camponesa para o desenvolvimento da Pedagogia do Trabalho Associado Camponês. Utilizamos também o acervo fotográfico da escola, do Núcleo Unitrabalho e dos autores da pesquisa.

Gil (2002, p. 45) destaca que o estudo documental “vale-se de materiais que não receberam ainda um tratamento analítico, ou que ainda podem ser reelaborados de acordo com os objetos da pesquisa”, e além de analisar os documentos de primeira mão, existem também aqueles que já foram processados, mas podem receber outras interpretações — relatórios, atas, ofícios, pareceres e etc.

Os procedimentos da Pesquisa de Campo se constituíram a partir da vivência do dia a dia, das visitas in loco no território do Assentamento Roseli Nunes, principalmente nos locais onde foram organizadas as ações da pesquisa: na EEMC, na ARPA, nas igrejas, nos sítios das famílias dos jovens participantes da pesquisa e de Educadores Camponeses, procedimentos compostos por diálogos, organização das ações, visitas às hortas agroecológicas e entrevistas. Ressalta-se que essa etapa ocorreu em diversos momentos e espaços formais e não formais do Assentamento Roseli Nunes, ocupados por Docentes Camponeses, por formadores e juventude durante a formação-interação: nos grupos familiares, nas reuniões da comunidade e da Igreja, na escola, nos seminários, em conversas informais, acompanhamentos à FEISOL, festas

religiosas e sociais, oficinas de formação em parceria com o Núcleo Unemat-Unitrabalho, com a FASE e com o CTA. Enfim, nos espaços de encontros em que os atores da pesquisa estavam presentes e complementaram as informações obtidas na análise da entrevista conforme destacamos no Quadro 6:

Quadro 6 - Atores, Ações e Técnicas de Pesquisa utilizadas para a produção de dados

Atores participantes da

Pesquisa

Ações de pesquisa Técnicas realizadas para produção de dados

Docentes Camponeses

Ações de formação: Encontros.

Ações de mobilização: rodas de conversa e reuniões.

Questionário de caracterização; Entrevista semiestruturada;

Observação Participante nos momentos de reunião interna e no Trabalho da Horta Agroecológica- EMIEP;

Juventude Camponesa

Ações de formação: Encontros.

Ações de mobilização: rodas de conversa, oficinas e reuniões.

Entrevista semiestruturada;

Observação Participante das experiências de organização coletiva — no Grupo Jovens Apicultores, no Trabalho no viveiro, nas Hortas e no EMIEP.

Formadores

Ações de formação: Encontros.

Ações de mobilização: rodas de conversa e reuniões.

Entrevista semiestruturada;

Observação Participante das experiências de organização coletiva — no Grupo Jovens Apicultores, no trabalho no viveiro, nas hortas e no EMIEP.

Fonte: Elaborado pela autora (2019).

As rodas de conversa foram utilizadas como instrumento para mobilização, como momentos de diálogo, que possibilitaram captar as percepções, opiniões, visões e expectativas dos participantes relacionadas: à Docência Camponesa, aos Formadores, à Juventude Camponesa, sobre as condições de vida e trabalho no campo, à Pedagogia do Trabalho Associado Camponês, às políticas públicas voltadas a esses segmentos sociais, às expectativas de atuação desses sujeitos no território do Assentamento, visando enfocar as relações sociais, políticas, econômicas e culturais desenvolvidas.

Corroboramos com a percepção de Zart (2012, p. 352) quando afirma que “a pesquisa de campo foi um processo de imersão, que buscou compreender nas atitudes, nas percepções e nas ações dos sujeitos sociais do campo os significados que são construídos para o estabelecimento de determinadas relações sociais e a confirmação ou contestação de estruturas sociais”. É, portanto, por meio das ações que podemos observar as atitudes e o esforço das pessoas para a organização do coletivo, seja no Grupo de Jovens Apicultores, na Igreja e na EEMC, no enfrentamento de controvérsias, na cooperação em busca do bem viver e pela permanência em seu lote.

Conforme destacamos no Quadro 6, realizamos a observação participante que, segundo El Andaloussi (2004), como qualquer outro instrumento de pesquisa, tem seus próprios limites à medida que o observador não está impedido de projetar seus próprios valores e de se deixar levar por uma leitura errônea dos fatos que está observando. Nesse sentido, a partir das ações as atividades relacionadas à Pedagogia do Trabalho Associado Camponês, observamos a relação entre os docentes, os formadores e a Juventude Camponesa organizada e o Assentamento.

Essas observações, que foram realizadas a partir das experiências de organização coletiva — no Grupo Jovens Apicultores, no trabalho no viveiro, nas hortas e no EMIEP — envolviam os atores da pesquisa e eram registradas no caderno de campo. A relação de quem observa não é de alguém invisível, mas de uma pessoa que busca, a partir da participação na atividade, elementos que contribuam para a compreensão de alguns fatores, por exemplo, como é a participação do Juventude Camponesa nos espaços de organização coletiva, nas reuniões e no trabalho associado.

Também utilizamos para a produção de dados o questionário com os docentes camponeses, pois este instrumento é “um conjunto de questões que são respondidas por escrito pelo pesquisado” (GIL, 2002, p. 114). O questionário da pesquisa continha questões abertas e fechadas (conforme exposto no Apêndice A) para que pudéssemos conhecer o perfil dos docentes e se desenvolvem ou desenvolveram alguma atividade relacionada à Pedagogia do Trabalho Associado Camponês com a Juventude do Assentamento. Aplicamos os questionários aos docentes, e a partir das respostas obtidas foi possível definir os critérios de escolha para a realização da entrevista semiestruturada.

Assim, após o questionário utilizamos a entrevista semiestruturada que tem como característica questionamentos básicos apoiados em teorias e hipóteses relacionadas ao tema da pesquisa e “[...] favorece não só a descrição dos fenômenos sociais, mas também sua explicação e a compreensão de sua totalidade [...]” (TRIVIÑOS, 1987, p. 146), além de “manter a presença consciente e atuante do pesquisador no processo de coleta de informações” (TRIVIÑOS, 1987, p. 152).

Na entrevista, o respondente pôde expressar verbalmente suas opiniões e sugestões a respeito do assunto que porventura não tivesse sido tratado nas rodas de conversa, durante as ações de formação e mobilização realizadas com os atores envolvidos. Todas as entrevistas foram gravadas, assim elaboramos um roteiro de questões, que nos orientaram a conduzir a entrevista, evitando que nos desviássemos dos objetivos e do problema da pesquisa, mas com a possibilidade de adequações durante a entrevista caso houvesse necessidade.

Outro procedimento de pesquisa utilizado foi a análise dos dados produzidos durante todo o processo da investigação, que, conforme Goldenberg (2004), é iniciada após a realização e aplicação dos instrumentos de produção de dados, definindo-se como o momento de organizar os dados e iniciar a análise de todo material produzido durante a etapa de pesquisa a campo. Esse é o momento mais importante do processo da pesquisa, pois é nessa etapa que se analisa toda a produção de dados. A análise, portanto, aconteceu a partir dos dados produzidos, após a transcrição das ações realizadas, da elaboração dos relatórios dessas ações, das entrevistas, dos depoimentos e documentos coletados. De acordo com Flick (2009, p. 291), “o objetivo da análise de conteúdo é compreender criticamente o sentido das comunicações, o seu conteúdo manifesto ou latente, as significações explícitas ou ocultas”, ou seja, trazer para a pesquisa maior profundidade quanto aos dados produzidos, visando alcançar os objetivos propostos.

A partir da pesquisa exploratória, das leituras e da produção de dados, iniciamos as interpretações das informações produzidas, relacionando-as às observações, às anotações no caderno de campo, ao questionário, às entrevistas. Assim, à luz da pesquisa documental e bibliográfica, possibilitar a “triangulação, ou seja, checagem de um dado obtido através de diferentes informantes, em situações variadas e em momentos diferentes” (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p. 52), imprimindo maior confiabilidade e visibilidade aos resultados da pesquisa.

Cabe mencionar que a pesquisa de campo foi perpassada por estudos bibliográficos e documentais constantes, contribuindo para a significação dessa etapa de pesquisa. Desse modo, consideramos que esta pesquisa contribui para a construção de uma relação implicada com os sujeitos da pesquisa, nela denominados atores participantes, no território onde eles estão inseridos, permitindo a interação entre pesquisadores e os pesquisados, numa relação propositiva para o desenvolvimento da investigação, tornando a pesquisa significativa, de caráter formativo e emancipatório. Destacamos que nesse momento da pesquisa mantivemos atitudes flexíveis e abertas, cientes de que as ações têm continuidade e sempre podem surgir novas contribuições no processo de produção social do conhecimento.

Nesse sentido, depois de contextualizarmos os percursos teórico-metodológicos da pesquisa, as aproximações, contextualizações científicas, método, ações e atores, na próxima seção nos debruçamos sobre o lócus da pesquisa.

3 O ASSENTAMENTO ROSELI NUNES E A ESCOLA ESTADUAL MADRE