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4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.2 Repercussões do “novo Enem” na UFLA

4.2.4 Processos internos

Neste tópico, analisou-se qual a percepção dos entrevistados quanto às mudanças institucionais provocadas pela implantação do “novo Enem”. Vale ressaltar que nas entrevistas foram abordados temas relacionados tanto a práticas administrativas quanto a práticas acadêmicas.

Questionados se a adoção da política implicou em alguma alteração na condução das disciplinas, grande parte dos entrevistados garantiu que sim, pois mesmo quando esse comportamento não era adotado pelo próprio professor, eles sabiam de outros docentes que estavam tomando medidas nesse sentido. Eles alegaram também que algumas disciplinas básicas dos cursos que, antes da mudança do processo seletivo, reprovava nenhum ou pouquíssimos discentes, se tornaram “problemáticas” e com altos índices de retenção. Nesses casos, ao indagarem os alunos sobre o motivo de suas dificuldades a resposta comumente recebida era que no ensino médio quase não aprenderam nada sobre o assunto.

Alguns entrevistados chegaram a afirmar que tiveram que diminuir a quantidade de teoria das disciplinas, porque perceberam que os alunos, de uma forma geral, não se interessavam e não liam os conteúdos propostos. Relatos contendo expressões como: “eu tive que abaixar o nível das minhas questões”, “o nível de exigência diminuiu”, “eu não, mas outros professores comentaram que abaixaram o nível” e “tivemos que diminuir um pouco a cobrança, porque se não poucos alunos conseguiriam passar”, foram comuns nas entrevistas.

Essa é uma queixa geral (...) antes dava certo aquele esqueminha de aula teórica, aula prática, prova, agora você tem que fornecer estudos dirigidos, disponibilizar um material mais prático, tem que dar uma diversificada aí, ter bastante criatividade para estimular a estudar, dar umas coisas mais mastigadas. (...) Mesmo o nível da cobrança, estamos tendo que ter mais tolerância até na hora de corrigir (...) se a gente continuar naquela filosofia antiga teremos muita retenção (Entrevistado 6).

É importante ressaltar que determinados professores afirmaram que, mesmo percebendo existir um desnível no desempenho dos atuais ingressantes, não realizaram mudanças em suas disciplinas, pois acreditam que a UFLA não pode diminuir o nível de cobrança dos alunos, uma vez que assim poderá prejudicar o perfil do profissional que estará formando. Na visão desses entrevistados, a universidade proporciona condições e recursos para os alunos que querem se dedicar, então os professores devem primar pela qualidade e pelo aprendizado, assim, o aluno que não obtiver o rendimento desejado, realmente, deve ser retido.

Indagados se havia algum reflexo da implementação do “novo Enem” em mudanças recentes nas estruturas curriculares dos cursos de graduação, os entrevistados foram reticentes. Muitos asseguraram não existir esse efeito,

outros falaram que notam certa relação entre o “núcleo fundamental comum”5e a mudança do processo seletivo, pois entendem que, em parte, o “núcleo” foi criado para sanar a base deficitária do ensino médio e fundamental de alguns ingressantes.

A mudança do processo seletivo também acarretou para a instituição um ganho financeiro, pois minimizou custos comparativamente a realização do vestibular próprio. Além disso, os pró-reitores e diretores entrevistados ressaltaram que o vestibular também era um processo dispendioso em termos operacionais, tendo em vista que consumia uma energia muito grande da universidade ao mobilizar todo um corpo técnico para fazer a aplicação e elaboração das provas. Então, para a UFLA, de imediato, a implementação do “novo Enem” trouxe uma vantagem financeira, mas também uma vantagem operacional, na medida em que não precisou mais empregar os servidores da instituição para fazer um processo seletivo, pois ele já é aplicado em âmbito nacional.

Nesse sentido, a universidade pôde direcionar a sua força de trabalho, principalmente do setor diretamente envolvido com os processos seletivos, para outras ações. Todavia, diferentemente do vestibular que, apesar da demanda semestral, possuía um plano com início, meio e fim, as novas atuações da Diretoria de Processos Seletivos, por serem diversificadas e muitas vezes imprevisíveis, dificultam a realização de um planejamento das atividades do setor.

A impossibilidade de planejar as ações também foi um efeito observado na Diretoria de Registro e Controle Acadêmico, setor responsável pela matrícula dos ingressantes. Segundo os entrevistados, como todo processo do Sistema de

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Conteúdos curriculares, comuns a todos os cursos, de formação geral para melhorar o conhecimento dos estudantes de graduação da UFLA em áreas como ética e cidadania, comunicação e expressão, língua estrangeira, fundamentos essenciais nas áreas das Ciências Exatas e da Terra e das Ciências da Vida (UFLA, 2008). 

Seleção Unificada conta com período de inscrições, divulgação dos resultados (primeira e segunda chamadas) e da lista de espera, cujo cronograma é de responsabilidade do MEC, o período para matrícula acaba sendo definido mais em função das datas determinadas para o Sisu, do que em função do calendário escolar da instituição. Essa relativa “falta de autonomia” somada a fácil mobilidade que o sistema proporciona ao candidato, faz com que o processo de matrícula se estenda por um grande período, impedindo que a DRCA planeje outras atividades.

A universidade fica o tempo todo fazendo matrícula. (...) O candidato tem a opção de escolher uma instituição, cancelar e ir pra outra. (...) A desistência é muito grande, com isso há muitas chamadas e o processo de matrícula dura o semestre inteiro, parece não ter fim (Entrevistado 7).

O relato descrito acima evidencia ainda outro efeito do “novo Enem” na universidade. O número de vagas não preenchidas nas primeiras convocações para matrícula aumentou muito e, com isso, o número de chamadas também. Alguns entrevistados mencionaram que os candidatos parecem “brincar no sistema”, pois muitas vezes já foram aprovados e estão matriculados em universidades públicas, mas desistem de suas vagas e se inscrevem novamente no processo seletivo.

De acordo com os depoimentos obtidos, esse comportamento dos universitários não ocorre apenas na UFLA, é uma percepção nacional dos gestores envolvidos com o ensino de graduação e causa dois problemas principais: aumenta o número de inscritos, fazendo com que a universidade tenha que realizar diversas chamadas para preencher as vagas, e origina vagas ociosas em outras universidades ou em cursos da própria instituição.

Destarte, percebe-se, pela análise do conteúdo das entrevistas, que a modificação da forma de ingresso nos cursos de graduação da Universidade

Federal de Lavras causou mudanças em elementos ambientais e em aspectos culturais da instituição, tendo em vista que motivou novas formas de condução das atividades, sejam elas acadêmicas ou administrativas.

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