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Processos Químicos e Biológicos

CAPÍTULO 2 – ESTADO DA ARTE

2.3 Contaminação por elementos maiores e traços em aterros de RSU

2.3.4 Mecanismos de transporte e atenuação em meios porosos

2.3.4.2 Processos Químicos e Biológicos

Tão importante quanto os vários mecanismos físicos que regem o transporte de contaminantes em solução em águas subterrâneas são os processos de transferência de solutos do fluido intersticial para as partículas sólidas do solo. Diversos processos químicos podem ocorrer, dependendo dos constituintes e características do solo e da constituição química do soluto. Geralmente, essas reações causam um retardamento do fenômeno de transporte de poluentes em solos, sendo que, em geral, as transferências para a fase sólida não são permanentes, pois alterações no ambiente do solo podem aumentar a mobilidade desses poluentes transferidos para a fase sólida (Nobre 1987).

Dentre os processos químicos mais estudados, as reações de adsorção/desorção e precipitação/dissolução são as que podem causar expressiva transferência do contaminante da fase liquida para a fase sólida e vice versa. Já outros processos, como a oxidação/redução, complexação e quelação, podem afetar a disponibilidade dos contaminantes para os processos de transferência já citados ou alterar a forma do mesmo, aumentando ou diminuindo seus efeitos (Alloway 1995). As atividades biológicas também podem atuar em processos de transferência ou em processos de óxido- redução. Os mecanismos de adsorção são as mais determinantes no controle da disponibilidade e solubilidade de elementos-traço no solo (Ford et al., 2001). Além disso, as reações químicas mais estudadas nos problemas relativos à disposição de resíduos são as de adsorção e desorção de íons e moléculas na superfície das partículas de solo.

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Adsorção

Adsorção é o mecanismo do tipo sólido-fluido, no qual o soluto adere às superfícies dos sólidos devido às forças de atração ali existentes, sendo elas decorrentes de cargas desequilibradas nas superfícies desses sólidos, resultantes de imperfeições ou substituições iônicas na estrutura cristalina dos minerais ou de quebra de ligações nas estruturas moleculares (Freeze & Cherry 1979). Uma vez que os compostos adsorvidos concentram-se sobre a superfície livre do sólido, quanto maior for esta superfície por unidade de peso sólido, tanto mais favorável será a adsorção (Alloway 1995).

A adsorção constitui o mecanismo de retenção mais importante para moléculas polares e íons, sendo o principal mecanismo de retenção de elementos-traço em solução, e apenas um dos mecanismos de retenção de substancias orgânicas (LaGrega et al., 1994). Pode ser reversível, implicando na dessorção de cátions e ânions em função, por exemplo, de mudanças de pH e Eh.

As forças de atração que ocorrem entre o sólido e o soluto podem ser de natureza física ou química. A adsorção física ocorre geralmente em razão de forças eletrostáticas, como atração e repulsão eletrostática, interações dipolo-dipolo, forças de van der Waals e pontes de hidrogênio, enquanto que a adsorção química é geralmente uma ligação química covalente, entre uma molécula e átomos superficiais, formando novos compostos (Volesky 1990). A adsorção física envolve energias de ligação mais fracas e é mais reversível do que a adsorção química.

A capacidade de um solo reter substâncias é limitada. Assim, se a fonte de contaminação tiver alimentação continua, a taxa de retenção diminuirá com o tempo e em certos casos chega até a se anular, e o contaminante que permanece dissolvido na água aumenta. Neste ponto o solo atinge a sua capacidade máxima de retenção (Yong et al., 1996).

Para entender o movimento dos elementos químicos nos solos e na água subterrânea é preciso modelar quantitativamente os processos de adsorção (Drever, 1997). Para isso, são usadas as isotermas de sorção, que são equações matemáticas que descrevem as relações entre a quantidade de determinado elemento químico adsorvido e sua quantidade remanescente na solução de equilíbrio. Estas relações podem assumir formas diversas – linear, côncava ou convexa, ou qualquer combinação destas (Reddi et al. 2000). O ajuste dos dados por modelos matemáticos empíricos relativamente simples, como Freundlich e Langmuir, fornece coeficientes que quantificam a fase sorvida do elemento, assim como o grau de linearidade desta reação (Pignatello, 2000). A sorção de químicos no solo tem sido mais bem descrita pela isoterma de sorção de Freundlich, a mais comumente utilizada em problemas de contaminação de águas subterrâneas. Ao se plotar os valores de sorção (S) como função das concentrações de equilíbrio (ceq) tem-se a base para construção das isotermas de adsorção (Figura 2.5). A obtenção da quantidade de elemento químico sorvido por unidade de massa de solo (S) se dá através da seguinte expressão:

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S = (C0– Ce) V/M

Onde C0 é a concentração inicial da solução utilizada nos testes de equilíbrio em lote, Ce é a concentração de equilíbrio após o teste, V é o volume de solução utilizado e M a massa de solo sem umidade utilizada no teste.

Figura 2.5: Gráficos de isoterma linear, Langmuir e Freundlich (Ferraz, 2006)

Fator de Retardamento

A transferência do contaminante para a fase sólida durante o fluxo da água provoca a redução da frente de contaminação em relação à velocidade do fluido, resultando em um fenômeno chamado de retardamento da frente de contaminação. O mesmo é ilustrado na Curva Característica do Transporte ou Breakthrough Curve (Figura 2.6), que é um gráfico de concentração relativa de dois traçadores, ilustrando a defasagem que ocorre no avanço das frentes dos dois solutos (Feitosa et al., 2008). A grandeza que o quantifica é o fator de retardamento (R), que é a razão entre a velocidade do fluido percolante e a velocidade da frente de contaminação (Nobre, 1987). Seu valor pode ser obtido a partir de ensaios de coluna realizados em laboratório, injetando-se dois traçadores, um sofrendo adsorção e o outro não. É calculada pela equação:

V C C

V R V( 0,5 0)

Onde: V(C=0,5Co) = volume de fluido lixiviado quando a concentração do contaminante no efluente atinge 50% da concentração inicial [L3] e V

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Figura 2.6: Curva Breakthrough (Moncada, 2004).

O fator de retardamento é uma característica do solo em relação a uma determinada substancia e depende da atividade do solo, da concentração inicial da substancia na solução contaminada, do pH da solução, da temperatura e da velocidade de percolação, entre outros fatores.

Precipitação/Dissolução

Os processos de precipitação e dissolução acontecem simultaneamente no meio poroso, sendo um o inverso do outro. A precipitação consiste no desprendimento de substâncias inicialmente em solução, quando a sua concentração excede o seu grau de solubilidade. Se a concentração chegar a valores menores que o grau de solubilidade, pode ocorrer dissolução da substância precipitada (Alloway 1995). Estes processos são fortemente afetados pela temperatura, pH e Eh. A presença de uma espécie dissolvida tem influência significativa sobre a solubilidade de outra espécie, especialmente quando existe um íon comum a ambas. Assim, a solubilidade diminui devido ao efeito do íon comum ou aumenta com a força iônica da solução.

Acredita-se que a precipitação seja um mecanismo significante para a imobilização de elementos-traço. Em condições metanogênicas, elementos-traço solúveis podem se precipitar como sulfetos, carbonatos, hidróxidos e em menor intensidade com fosfatos, em áreas de aterros de RSU. (Pohland, 1991).

A solubilidade de muitos elementos-traço associados a sulfetos e carbonatos são pequenas, sendo que esses ânions são típicos de aterros de RSU. O sulfeto é formado pela redução de sulfato durante a decomposição dos resíduos e a precipitação do mesmo é citada como a explicação de baixa

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concentração de elementos-traço (Christensen et al., 2000; Christensen et al., 1994). Segundo Pohland & Kim (2000), na presença de sulfetos a maioria dos elementos, exceto o cromo, formam sais extremamente insolúveis.

Sulfetos e carbonatos são capazes de formar precipitados com Ba, Cd, Ni, Zn, Cu e Pb. Carbonatos também podem precipitar elementos maiores, tais como Ca, Mg, Fe, Mn e Sr. Contudo, a solubilidade de carbonatos metálicos é geralmente maior do que dos sulfetos metálicos (Christensen et

al., 2000). Além disso, os ânions OH-, SO

42 e Cl- nas águas naturais e residuais também formam precipitados com os elementos maiores e traços, sendo que o Cl- precipita os elementos-traço Ag, Hg, Pb e Tl, o sulfato SO4- precipita o Ba, Ca, Pb e Sr.

Complexação/Quelação

A complexação consiste na formação de uma ligação entre um cátion metálico e um ânion ou molécula (doadores de elétrons), de natureza orgânica ou inorgânica, chamado de ligante (Feitosa et

al., 2008). O arranjo metal-ligante é neutro e é denominado complexo, no qual os ligantes envolvem o metal (Fetter 1993, LaGrega et al., 1994). A ligação formada pode ser covalente ou eletrostática (Fetter 1993). A reação de complexação é expressa por:

aM Z+ + bL –Y  MaLb Az – b

Onde, M é um cátion metálico com carga Z+, L um ligante com carga Y- e a e b são coeficientes estequiométricos.

Os ligantes encontrados nas águas subterrâneas (SO4-2, Cl-, HCO3- e OH-) podem formar complexos com os cátions mais abundantes, tais como Mg+, Ca+2, Mn+2, Fe+3, Cu+2, Zn+2, dentre outros. Substâncias húmicas presentes na água e no solo também são bons agentes complexantes. Ligantes quelantes (aqueles que conseguem contribuir com mais de um par de elétrons ao átomo ou íon complexado) estão presentes em diversas fontes de poluentes, inclusive em aterros de resíduos sólidos urbanos. Segundo Alloway (1995), o lixiviado de aterros sanitários tem alta concentração de cloreto (Cl-), e muitos elementos-traço podem formar complexos com os mesmos.

A formação de complexos tem papel importante na química da água, pois aumenta a mobilidade do metal e, consequentemente, influencia sua concentração livre na água (Feitosa et al., 2008). O complexo formado é mais solúvel que o cátion metálico, além do complexo envolver o que seriam íons metálicos livres, diminuindo assim as possibilidades de adsorção e precipitação destes

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(LaGrega et al., 1994). Elementos-traço tóxicos, na forma de íons complexos podem ser transportados durante o fluxo subterrâneo (Hypólito & Esaki 2006).

Oxidação/Redução

Reações de oxidação/redução resultam na mudança da valência dos elementos através de ganho (redução) ou perda (oxidação) de elétrons. Toda oxidação é acompanhada de uma redução ou vice-versa, de maneira que o equilíbrio é sempre mantido. Para que este tipo de reação ocorra, são necessários receptores de elétrons, que em condições aeróbias podem ser o oxigênio e, em condições anaeróbias, os nitratos, sulfatos e dióxido de carbono (Freeze & Cherry 1979, Fetter 1993).

As reações de oxidação/redução podem afetar a solubilidade dos poluentes. Elementos estão presentes na água em vários estados de oxidação, que determinam propriedades, tais como toxicidade, hidrólise, tendência de formar compostos insolúveis, dentre outros (Fetter 1993).