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4.3 ANÁLISE DA OBRA

4.3.4 A proclamação da Independência como última medida perante a intransigência das

No dia 14 de agosto, D. Pedro parte para São Paulo para acabar com a revolta (de insatisfação contra os Andradas que lá estavam governando) irrompida no dia 23 de maio. No dia 28 de Agosto chegam notícias de Lisboa dizendo que as Cortes estavam mandando mais tropas para o Brasil. Diante dessa notícia, D. Leopoldina, na condição de Presidente do Conselho de Ministros e do Estado, em virtude da ausência do Príncipe Regente, convoca o Conselho que se apressa em por o Príncipe a par dos novos acontecimentos. Recebendo esses comunicados, no dia 7 de setembro, brada as margens do Ipiranga: “Independência ou Morte”.

Apesar disso, a primeira declaração de independência acontece em uma sessão maçônica. Essa sessão se realizou no dia 9 de setembro de 1822, foi a 14ª sessão do Grande Oriente, tendo os trabalhos sido dirigidos por Joaquim Gonçalves Ledo (lembrando que o Grão Mestres, José Bonifácio, raramente comparecia as sessões), que, segundo a própria ata

“(...) no sólio, que ocupava, dirigiu à Aug:. Assembléia um enérgico, nervoso e fundado discursos, ornado daquela eloqüência e veemência oratória, que são peculiares a seu estilo sublime, inimitável e nunca assaz louvado, e havendo nele com as mais solidas razoes demonstrado que as atuais políticas circunstancias de nossa pátria, o rico, fértil e poderoso Brasil, demandavam e exigiam imperiosamente que a sua categoria fosse inabalavelmente firmada com a proclamação de nossa Independência e da Realeza Constitucional na pessoa do Aug:. Príncipe Perpetuo Defensor Constitucional do Reino do Brasil. Foi a moção aprovada por unanime e simultânea aclamação, expressada com o ardor do mais puro e cordial entusiasmo patriótico.

(...) os IIr:. Apolonio Mollon, Camarão, Picanço, Esdras, Democrito e Caramuru e posto que todos aprovavam a moção, reconhecendo a necessidade imperiosa de se fazer reconhecida a Independência do Brasil e ser aclamado Rei dele o Príncipe D. Pedro de Alcântara, seu Defensor Perpetuo Constitucional, contudo, como alguns dos mesmos opinantes mostrassem desejos que fossem convidadas as outras Províncias coligadas para aderirem a nossos votos e efetuar-se em todas simultaneamente a desejada aclamação, ficou reservada a discussão para outra Assembléia Geral, sendo todos os IIr:. presentes encarregados de disseminar e propagar a persuasão de tão necessária medida política...” (apud ASLAN, 1975, p. 230-231).

Essa passagem demonstra claramente o caráter político, onde a Maçonaria passa a funcionar praticamente como um partido rígido e organizado, as expensas de se proclamar sem fins políticos e religiosos. (BARRETO et al., 2003)

Nessa mesma sessão, encontra-se mais um elemento de discórdia entre o parido liberal e o partido conservador. Após as deliberações políticas, aconselhou-se aos Irmãos que parassem de assinar o periódico O Regulador Brasileiro, por apresentar manifestações contrárias aos princípios que a instituição defendia. Como o redator do periódico era também maçom, fizeram na sessão seguinte, no dia 12 de setembro, uma repreensão ao Irmão Sampaio por estar propagando esses princípios contrários aos jurados pela instituição. Ao que é respondido pelo Irmão acusado que apenas havia transcrito aquelas opiniões e que não eram aquelas as suas intimas convicções. Sendo então, novamente, repreendido energicamente por ter deslizado dos seus deveres de bom Maçom e brasileiro, entretanto, como havia se defendido de forma adequada, ao se comprometer a abandonar a “pérfida correspondência” e passar a escrever segundo seus verdadeiros sentimentos em defesa da causa do Brasil, o Presidente da sessão (Joaquim Gonçalves Ledo) convidada a todos os demais irmãos a congraçarem com o acusado, festejando a desejada e estimável reconciliação. Essa contenda apimentou as relações entre liberais e conservadores, uma vez que a “pérfida correspondência” é atribuída a José Bonifacio e segundo Lustosa (2000) tratava da questão da defesa do veto absoluto por parte do Príncipe Regente.

Na sessão de aparente reconciliação de Frei Sampaio com a maçonaria (visto que as ligações daquele continuavam fortes com o parido conservador de José Bonifácio), Ledo propõe que a instituição leve a cabo todas as medidas necessária para a realização da aclamação do Augusto Defensor Rei Constitucional do Brasil. Para tanto, pede que sejam enviados emissários para as Províncias do Brasil a fim de propagar a opinião e dispor os ânimos do povo em prol da grande e gloriosa obra. Além dos emissários, o Grande Oriente manda instruções ao Presidente do Senado e Câmara do Rio de Janeiro, José Clemente Pereira, para enviar circulares onde se comunicava a realização do Ato de Aclamação no dia 12 de outubro, aniversário de D. Pedro, e que, seriam introduzidas cláusulas de juramento

prévio que o Imperador deveria prestar a Constituição que a Assembléia Constituinte fizesse (Anexo 10). Declaração esta que motivavam ainda mais a disputa contra o partido conservador.

No Revérbero, o número 16, do dia 10 de setembro é mais um ponto de inflexão, e novamente motivado pelas determinações emanadas das Cortes, visto que somente nessa publicação os redatores conseguiram comentar a notícia do envio de tropas. As “Reflexões” iniciam-se com as declarações do Correio Brasiliense que critica a posição dos Deputados de Lisboa com relação aos assuntos do Brasil. Além disso, ressalta o latente despotismo que se afigura em Portugal, uma vez que as Cortes começam a se alinhar com o Exército e com os generais que tanto mal fizeram ao Brasil (em referência nominal ao General Luiz do Rego que tomara medidas despóticas em Pernambuco, quando da Revolução em 1817) no pretexto de abafar conspirações contra a Constituição.

Continuam os redatores indignados com as ideias que os portugueses fazem do Brasil, visto que justificam o envio de tropas para cá por conta de uma provável sublevação de escravos, a exemplo do que ocorrera na Ilha de São Domingos, ou seja, Haiti. Os redatores argumentam a delicada situação de Portugal, uma vez que não descartam a ameaça que a Espanha possa representar a esse país, caso realmente empenhe suas tropas na conservação do Brasil, onde a medida de união com a Espanha (manifestada por alguns Deputados) ou domínio espanhol só traria uma guerra civil que assolaria o país. Questiona ainda a intransigência das Cortes, advogando que não podem ser condenados aqueles que estão pedindo justiça. Nessa seara, destacam ainda o modo inadequado com que os Deputados portugueses trataram a figura do Herói Nacional, D. Pedro, chamando-o de inexperiente, desobediente, traidor e perjuro. Resumem as demandas dos brasileiros da seguinte forma:

Liberdade regulada pela Lei; igualdade da Lei marcada pela rasão: huma Monarquia Representativa: divisão de Poderes bem assignalada: Representação electiva, e não vitalícia, e menos hereditária: Religião de nossos Paes, Santa Religião Catholica fundada no amor, e na charidade a mais analoga (quando não fosse a unica Santa) aos Brasileiros: a por nós escolhida e deffendida Dynastia de Bragança: o Principe, que adoramos e por quem, ou morreremos, ou seremos felices (RCF II, Nº 16, 10 de setembro de 1822, p. 203).

Diante desses argumentos, os autores se questionam o que mais poderiam fazer para comprovar suas opiniões pautadas em razão e justiça. Convocam os portugueses que residem no Brasil a juntarem-se a causa brasileira e não conseguem compreender como os militares da Divisão Auxiliadora, na visão dos redatores, responsável pela morte de D. João da Beira, foram condecorados como Beneméritos da Pátria. Argumentam ainda que o Brasil não se deixaria regredir a condição de colônia, e que lutaria contra os generais que as Cortes insistissem em enviar ao país. Dizem que é chegada a hora do Brasil, pedem a todos os

brasileiros que se juntem ao Príncipe e que se cessem discórdias e intrigas. Atesta ainda a esperança de que a Independência Brasileira seja bem vista no cenário internacional, visto que

nenhuma Potencia do Mundo deixará de abençoar os nossos esforços, porque nós honramos os Reis; nenhuma Republica deixará de aplaudir o nosso enthusiasmo, porque nós amamos a Liberdade; nenhuma Nação deixará de coadjuvar-nos em nossos trabalhos, porque nós queremos a paz com todas, respeitamos os seus direitos, para que respeitem os nossos (RCF, 1822, p. 206).

Finalizando, rogam pela união das Províncias e pela formação da Assembléia, que junto ao Príncipe, formando um Governo Constitucional, conseguiram resguardar o futuro brilhante que o Brasil tem pela frente.

Importante destaque deve-se dar ao post escriptum dessa “Reflexão”, visto manifestar as opiniões da Província de Pernambuco, que sob a tutela de um Governo Provincial despótico, a exemplo do que estava acontecendo na Bahia, estavam anuindo as medidas do Príncipe Regente, principalmente a convocação da Assembléia Brasileira, acusando a intriga por semear a discórdia e fazer combalir a unidade nacional do Reino do Brasil, dando indícios irreais de que as Províncias do Norte se ligariam a distante Portugal em detrimento do centro natural do Augusto e liberal Príncipe. Da mesma forma, chegam aos redatores noticias de apoio a causa brasileira oriundas de Alagoas, Pará e Maranhão, mostrando que a união das Províncias do Brasil em torno da defesa da liberdade já estava assegurada.

Se, como visto anteriormente, os maçons somente não oficializaram a Independência por buscarem a anuência das demais Províncias para esta causa, não havia mais o que temer. Desta forma, os últimos exemplares do periódico buscam apresentar as formas adequadas de se realizar tal empresa, além de continuar justificando os argumentos previamente citados para reforçar o ponto de vista de que a Independência do Brasil era justa e natural. Neste momento, as declarações de rompimento se avultam, mas permanece um discurso Monarquista, sob a égide da Dinastia de Bragança, sendo os brasileiros continuadores da integridade da Monarquia, visto que aclamar o Príncipe é idêntico a aclamar o próprio Rei. Além disso, asseveram que

(...) huma grande vantagem da Monarquia Constitucional no Brasil, e he, que este systhema há de consolidar-se mais facilmente por isso que a passagem para elle he menos violenta, do que para a Liberdade absoluta, e principalmente deixando-nos a Providencia em nossos braços o Herdeiro do throno Portugues, o Principe, que tão digno se tem mostrado do nosso amor e dos nossos sacrifícios (RCF II, Nº 17, 17 de setembro de 1822, p. 216).

No final de setembro, aparece, no Revérbero, pela primeira vez referência direta ao celebre grito

- Independencia ou morte, - tem soado felizmente do Norte ao Sul da America, - Independencia ou morte – he também o gritto das Provincias colligadas do Brasil,

respondendo á declaração e rompimento de guerra que de Portugal se nos faz, e já soffremos na Bahia (RCF II, Nº 18, 24 de setembro de 1822, p. 229).

Destaca-se, no entanto, a atenção dada ao embate nesses últimos números do Revérbero.

Os Hespanhoes e os Portuguezes são barbaros na guerra: a America, e a India o sabe: que nos acontecerá, que temos a esperar delles, se formos vencidos, e conciderados escravos revoltozos? (...)

Se Portugal não desejasse sómente accender a guerra Civil, na qual nada pode fazer se não sacrificar alguns centos de Soldados aos Caprixos, e as mais ridiculas etiquetas, teria já reconhecido nossos indeleveis direitos lançado mão dos laços commerciaes, e assentado as bazes de tratados uteis a ambos os emisferios. (...) Portugal recebe o Decreto de 3 de Junho [convocação da Assembléia Brasileira], conhece, que lhe escapou a preza, e em vez de conformar-se com os Decretos da Providencia, envia expedições de seis centos homens (RCF II, Nº 20, 8 de outrubro de 1822, p. 251-254).

A iminência do conflito era tão evidente que os redatores não ficaram somente no campo ideológico, partiram para a prática. Como responsável pela Contadoria do Arsenal de Guerra, Joaquim Gonçalves Ledo, ao lado do Ministro de Guerra, Luiz Pereira da Nóbrega de Souza Coutinho, organizam um plano para organizar a Armada Brasileira, onde cada cidadão poderia contribuir espontaneamente para a preparação dos recursos bélicos diante da iminente deflagração do conflito com Portugal. Documento esse, enviado ao Príncipe e também publicado na edição de número 19 do Revérbero (do dia 1 de outubro de 1822).