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Produção individual e transmissão do conhecimento sobre plantas medicinais em três grupos sociais distintos

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Gustavo Taboada Soldati, Nátalia Hanazaki, Marta Crivos e Ulysses Paulino de Albuquerque

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Texto a ser submetido ao periódico “Evolution and Human Behavior”, qualis A1 na área de avaliação “Biodiversidade”. As normas de publicação podem ser visualizadas em: http://www.elsevier.com/authors/home#prepare-your-paper.

Produção individual e transmissão do conhecimento sobre plantas medicinais em três grupos sociais distintos

Gustavo Taboada Soldati, Nátalia Hanazaki, Marta Crivos e Ulysses Paulino de Albuquerque

Resumo

Situações de instabilidade ambiental e social favorecem a produção individual do conhecimento, pois as inovações sempre estarão em coerência com as novas condições. Além disso, estas mesmas condições estimulam a transmissão do conhecimento do tipo horizontal, pois esta via tem a maior capacidade de difundir informações adaptadas. Estas duas premissas foram testadas utilizando dados de três comunidades distintas arranjadas em um gradiente de instabilidade ambiental e cultural, acesso aos recursos medicinais, relação de parentesco e organização social. As informações foram coletadas basicamente por entrevistas semi estruturadas e listas livres. Foram descritos “como”, “quando”, “de quem” e o “contexto” nos quais as informações sobre plantas medicinais são tranferidas. As situações de variabilidade ambiental não estimularam a produção individual do conhecimento tampouco a via de transmissão horizontal. A infância foi a fase da vida mais importante para o aprendizado sobre plantas medicinais, mas este ocorre em todas as fases da vida. A transmissão vertical é a mais importante, sendo as mães os modelos de aprendizado mais frequentes. O ensino direto com a utilização da linguagem se destacou como estratégia de transmissão do conhecimento. Mecanismos de observação também foram registrados. Os eventos de adoecimento individual são os principais estímulos e contextos que desencadeiam o aprendizado local.

Introdução

As culturas podem ser compreendidas como sistemas cibernéticos com dinâmica temporal e espacial semelhante à evolução biológica (Mesoudi et al. 2004, Mesoudi et al. 2006, Mesoudi 2007). Dois processos são fundamentais à dinâmica cultural: a produção individual de conhecimento e a transmissão destas informações (Cavalli-Sforza e Feldman 1981, Boyd e Richerson 2005, Mesoudi et al. 2004, Mesoudi et al. 2006, Mesoudi 2007). A produção individual é o processo pelo qual o indivíduo constrói, sobretudo pela experimentação com pouca ou nenhuma influência social (Heyes 1994, Laland 2004, Rendell et al. 2009), novas informações que servem como fonte de variabilidade cultural (Mesoudi et al. 2004, Mesoudi et al. 2006, Mesoudi

2007). A transmissão cultural é um sistema de herança cumulativo, pelo qual os traços, comportamentos e informações são transmitidos em um grupo social a partir da interação entre seus pares, ou destes com os produtos desta interação (Cavalli-Sforza e Feldman 1981, Heyes 1994, Boyd e Richerson 2005, Hoppitt e Laland 2008, Mesoudi e Whiten 2008). A transmissão permite que as informações sejam difundidas, selecionadas e fixadas em uma população (Mesoudi et al. 2004, Mesoudi et al. 2006, Mesoudi 2007).

Estas duas estratégias, produção e transmissão de conhecimento, não são excludentes: um indivíduo pode tanto construir ou absorver as informações dentro de um contexto social, entretanto a natureza e a frequência desses comportamentos em uma população não é aleatória, mas determinada por fatores ambientais e sociais (Hewlett e Cavali-Sforza 1986, Eyssartier et al. 2008, McElreath e Strimling 2008, Reyes-Garcia et al. 2009). Por exemplo, estudos apontam que ambientes instáveis favorecem uma maior frequência de produção individual do conhecimento, pois apesar de ser uma estratégia mais custosa, a nova informação produzida sempre será adaptada a nova condição ambiental (Cavali-Sforza e Feldman 1981, Hewlett e Cavali-Sforza 1986, Laland 2004, McElreath e Strimling 2008, Reyes-Garcia et al. 2009). Assim, copiar em ambientes imprevisíveis pode não ser proveitoso porque as informações se tornam obsoletas rapidamente (Cavali-Sforza e Feldman 1981, Laland 2004).

O processo de transmissão não é homogêneo, mas ocorre a partir de diferentes modelos de aprendizado (Cavali-Sforza e Feldman 1981, Hewlett e Cavali- Sforza 1986, Heyes 1994, Hoppitt e Laland 2008). Hewlett e Cavali-Sforza (1986) categorizam as possíveis vias de transferência de informações em um grupo em: a) vertical, de uma geração parental para os filhos, b) horizontal, entre pares não familiares; c) um para muitos, quando os modelos são líderes, especialistas locais ou meios de comunicação e d) muitos para um, quando as pessoas mais antigas são referência para o aprendizado. Da mesma forma que ocorre a frequência de produção individual e transmissão, as frequências destas vias de transferência dependem do contexto ambiental e social. Ambientes estáveis favorecem a transmissão vertical, conservativa (McElreath e Strimling 2008, Reyes-Garcia et al. 2009). Esta via ainda é favorecida quando o conhecimento transmitido é altamente adaptativo, vinculado à sobrevivência ou fertilidade das pessoas. De outra forma, as outras três possibilidades de transmissão, menos conservativas e mais propagativa, são estimuladas em ambientes variáveis (McElreath e Strimling 2008, Reyes-Garcia et al. 2009). Neste sentido, a

frequência em que os eventos de produção e transmissão (e seus diferentes mecanismos) ocorrem em uma população refletem estratégias adaptativas.

Apesar de existirem estudos sobre a transmissão do conhecimento ecológico local (Luna 1984, Hewllet e Cavalli-Sforza 1986, Lancy 1996, Frazão-moreira 1997, Ohmagari e Berkes 1997, Zent 2001, Geissler et al. 2002, Hunn 2002, Ross et al. 2003, Ladio e Lozada 2004, Zarger e Stepp 2004, Lozada et al. 2006, Garcia 2006, McDade et al. 2007, Setalaphruk e Price 2007, Eyssartier et al. 2008, Reyes-Garcia et al. 2009, Srithi et al. 2009, Tehrani e Collard 2009, Wyndham 2009, Jauregui et al. 2011, Hewlett et al. 2011, Leonti 2011), poucos esforços foram feitos para, além de caracterizar os processos, compreende-los sob uma ótica adaptativa.

Neste sentido o presente estudo investigou a produção e transmissão do conhecimento local sobre plantas medicinais em três comunidades com características distintas, respresentando diferentes níveis de instabilidade ambiental e social, para testar a) se a produção de novas informações é favorecida em situações com alta variabilidade; e b) se a transmissão do tipo vertical é mais frequente em ambientes estáveis. Espera-se que a frequência de eventos de construção individual do conhecimento seja mais expressiva em ambientes com maior instabilidade e a transmissão vertical mais expressiva em situações de estabilidade. O presente trabalho também descreve “como”, “quando” e “em qual contexto” as pessoas aprendem sobre os remédios do mato e discute os achados numa perspectiva evolutiva.

Materiais e Métodos

Caracterização do local de trabalho

O presente estudo foi conduzido em uma zona semiárida no norte do estado de Minas Gerais, Brasil, área inserida no “Polígono das Secas”, onde a longa estiagem anual é um fator limitante para a atividade agrícola (Ab’Sáber 2003). Como resultado da diversidade de solos e da situação climática, a área é reconhecida como um mosaico vegetacional, onde formações características de três grandes biomas: cerrado, mata atlântica e caatinga (Ab’Sáber 2003). Neste sentido, a região apresenta formações vegetais de difícil caracterização (Brandão 2000). Ainda compõe esta zona ecotonal, um grande leque de identidades tradicionais, por exemplo, indígenas, quilombolas,

sertanejos, catingueiros, vazanteiros (Costa 2006), todos baseados na agricultura familiar, criação de gado e outros animais, bem como extração de recursos naturais. Portanto é uma zona semiárida com uma complexidade sociobiocultural.

O estudo foi executado no município de Capitão Enéas (16°42’08’’S, 43°42’39’’), que dista cerca 50 km ao norte de Montes Claros, a maior cidade do norte mineiro, reconhecida pela integração econômica, social e cultural da região. A maior parte das terras do município pertence a grandes fazendeiros que, com seus rebanhos de corte, dominam o poder econômico do município. As poucas áreas não ocupadas por latifúndios são habitadas por pequenos produtores, sertanejos/vaqueiros, empenhados na bovinocultura leiteira e monocultivos de feijão, milho e sorgo.

Foram selecionados três grupos com características sociais distintas, uma comunidade rural, conhecida como Bico da Pedra, e dois assentamentos rurais, Darcy Ribeiro e Renascer. O Bico da Pedra é formado por 80 moradores, 38 mulheres e 42 homens, com uma forte relação de parentesco. Os moradores ocupam-se basicamente da agricultura familiar, cultivando milho, feijão, abóbora e hortas. Entretanto, outras atividades econômicas têm destaque, como a venda diária da força de trabalho para os pares ou grandes fazendeiros e a criação de pequenos rebanhos de leite. Os quintais do Bico da Pedra são antigos, alguns estruturados há mais de quarenta anos, e, portanto, oferecem uma vasta riqueza de recursos vegetais importantes para a soberania da família, tanto alimentar como medicinal (Duque-Brasil et al. 2007). Não há na comunidade saneamento básico, a água para beber e cozinhas é oriunda das chuvas, captada e conservada em cisternas. O ensino fundamental e médio, bem como os serviços da biomedicina são oferecidos no distrito rural de Santana da Serra, distante cerca de três quilômetros. Os moradores são organizados na Associação Comunitária do Bico da Pedra.

O primeiro assentamento rural, Darcy Ribeiro, localizado próximo ao Bico da Pedra, é composto por 25 lotes, habitados por 27 famílias, totalizando 76 pessoas, 30 mulheres e 46 homens. Vinte famílias são oriundas de fora da região, não raro, grandes centros urbanos, e chegaram à região em 2009, após muitos eventos de migração, quando ocuparam a atual fazenda e iniciaram o processo de conquista da terra. Para completarem o número total de lotes, sete famílias da região, as quais compartilhavam o mesmo contexto ambiental e social dos moradores do Bico da Pedra, foram convidadas a integrar o grupo. Atualmente, as famílias já detém o direito da terra e recebem créditos do governo federal relativos à reforma agrária. Colhem milho, feijão, abóbora e

mandioca referentes ao segundo ano de trabalho rural. Diferente do Bico da Pedra, há uma baixa relação de parentesco entre os assentados que não contam com quintais desenvolvidos, ou seja, lhes faltam os recursos desta zona de coleta. Estão sob orientação política do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), contando com uma organização interna específica e uma forte representação política.

O Renascer, segundo assentamento investigado, é formado por 25 famílias, 73 pessoas, das quais 26 mulheres e 47 homens, e apresentam basicamente as mesmas características do Darcy Ribeiro, salvo por não responderem a nenhuma organização social de nível nacional. Também se encontra na zona rural do município de Capitão Enéas, mas distante dos outros dois grupos. Em comparação ao Darcy Ribeiro, os assentados do Renascer participaram de mais eventos de migração regional, tiveram baixa inserção de famílias locais, tem baixíssima relação de parentesco e uma fraca expressão política.

Diante do exposto, as três comunidades parceiras da pesquisa, Bico da Pedra, Darcy Ribeiro e Renascer, apresentam um gradiente de estabilidade ambiental e social, considerando as características compiladas na tabela 1. Assume-se que a primeira comunidade representa uma situação ambiental e social estável, em oposição ao Renascer que se configura como um contexto mutável. O Darcy Ribeiro é compreendido como uma realidade intermediária.

Coleta dos dados etnobotânicos

O primeiro conjunto de informações etnobotânicas foi coletado a partir de uma lista livre (Albuquerque et al. 2010a) (Anexo I), quando os parceiros da pesquisa foram estimulados a citar as plantas medicinais conhecidas. Para esta etapa inicial, foram entrevistados todos os moradores de ambas as comunidades maiores de cinco anos e que se disponibilizaram a contribuir com a presente pesquisa, totalizando 176 listas, 64 moradores (86,5%), 36 homens e 28 mulheres, no Bico da Pedra, 57 parceiros (81,4%), 35 homens e 22 mulheres, no Darcy Ribeiro e, finalmente, 55 informantes (82,1%), 35 homens e 20 mulheres, no Renascer.

Tabela 16 - Características sociais que distinguem a comunidade rural do Bico da Pedra e os assentamentos Darcy Ribeiro e Renascer, Capitão Enéas, Minas Gerais.

Bico da Pedra Darcy Ribeiro Renascer Formação social e histórica antiga recente recente

Relação de parentesco muito alta baixa baixa

Eventos de migração baixo alta muito alta

Diversidade de tradições e

culturas baixa alta muito alta

Força política baixa muito alta alta

Desenvolvimento dos quintais antigo incipiente incipiente

O segundo encontro com os informantes foi mediado por uma entrevista semi- estruturada (Albuquerque et al. 2010a) composta para avaliar com detalhes o processo de produção individual e transmissão do conhecimento (Anexo II). Diferentemente de Reyes Garcia et al. (2009) que avaliaram os processos de aprendizado em relação a todo o conhecimento do grupo social investigado, selecionou-se aleatoriamente cinco plantas dentre o conjunto citado por cada informante na lista livre. Esta opção metodológica se justifica pelo objetivo principal foi compreender somente os processos de aprendizagem e não a habilidade do entrevistado em conhecer os recursos conhecidos em sua cultura. A aleatorização das plantas se deu para não enviesar os dados coletados, ou seja, para não favorecer um determinado grupo de plantas e possivelmente algum tipo de estratégia de aprendizado.

Para cada uma destas espécies, foi questionado as seguintes perguntas geradoras: “O senhor recorda como aprendeu sobre a (nome da planta)? Você poderia me contar como foi?”. A partir das informações iniciais, o informante foi incentivado a relatar “quando” aprendeu, “de quem” e o “contexto de aprendizado”, ou seja, qual foi a situação em que as informações foram produzidas ou copiadas. Além destas categorias, típicas dos estudos de evolução cultural (Cavalli-Sforza e Feldman 1981, Hewlett e Cavali-Sforza 1986, Laland 2004) a entrevista foi formulada utilizando o conceito de memória episódica (Tulving 2002, Tulving 2005), partindo do pressuposto que o conhecimento local sobre plantas medicinais é baseado em episódios concretos vividos pelos informantes (Crivos 2004).

Para esta entrevista relativa ao aprendizado foram considerados apenas um chefe de família, homem ou mulher, que participou da lista livre, totalizando 58 entrevistas, 19 (95%), 19 (71%) e 20 (77%), respectivamente no Bico da Pedra, Darcy Ribeiro e Renascer. Esta entrevista permitiu reunir informações detalhadas sobre os eventos de produção e transmissão do conhecimento. Quando o informante mencionou algum evento de produção do conhecimento, lhe foi perguntado as justificativas que

sustentavam esta inovação, por exemplo, por que escolheu a planta para experimentar um novo uso terapêutico, se existiram características morfológicas ou organolépticas que nortearam a construção de um novo conhecimento. Finalmente, as citações de aprendizado permitiram reconhecer quais foram os estímulos e/ ou os contextos que desencadearam o processo de aprendizagem (Tabela 2).

Este trabalho segue a legislação brasileira que norma as pesquisas junto à comunidades tradicionais ou populações humanas, sendo aprovado no Comitê de Ética da Universidade Federal de Viçosa e tendo o consentimento de todos os entrevistados. As plantas citadas durante as listas livres e durante as entrevistas disponíveis na região foram coletadas, identificadas e estão disponíveis no herbário Vasconcelos Sobrinho (PEUFR) na Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Análise dos dados

Para a caracterização dos processos de produção e transmissão do conhecimento as informações obtidas pela segunda entrevista foram categorizadas em relação a: a) quando se aprendeu ou se produziu o conhecimento; b) como ocorreu o aprendizado; c) qual foi o estímulo ou o contexto no qual o aprendizado se deu; d) de quem se aprendeu; e e) tipo de transmissão (tabela 2). Toda esta categorização, também seguiu a base teórica dos estudos de evolução cultural e da psicologia cognitiva (Cavalli-Sforza e Feldman 1981, Hewlett e Cavali-Sforza 1986, Tulving 2002, Laland 2004, Tulving 2005). Quando os informantes relataram que aprenderam o conhecimento da planta de mais de uma pessoa, foi questionado qual o primeiro modelo de aprendizado, sendo considerado somente este modelo primário. Quando os parceiros afirmaram categoricamente que aprenderam com mais de um indivíduo, por exemplo, do “pai” e “mãe”, ou diferentes informações em momentos distintos da vida, essas informações foram consideradas independentes e incorporadas como modelos primários do aprendizado.

Para testar a primeira hipótese, ou seja, o favorecimento da produção individual do conhecimento em situações instáveis comparou-se a frequência de citações deste processo de aprendizado com os eventos de transmissão do conhecimento entre as três comunidades (matriz três por dois), utilizando se o teste do Qui-Quadrado com aleatorizações de Monte Carlo para corrigir o valor da probabilidade “p”, pois alguns dos valores foram menores que do cinco (Ayres et al. 2007). Para este teste foi

utilizado o programa “R”. A segunda hipótese, o estímulo à transmissão vertical em ambientes estáveis, foi testada comparando as frequências das estratégias de aprendizado entre as três comunidades (matriz três por quatro), utilizando-se também o mesmo teste estatístico. Caso alguma diferença estatística fosse detectada, testes de Qui- Quadrado (dois por dois) foram executados para determinar quais categorias diferiam estatisticamente.

As frequências das categorias “quando”, “como”, “de quem” e “estímulo- contexto” foram comparadas entre as comunidades utilizando-se o teste G pelo o programa Biostat, versão 5.0 (Ayres et al. 2007). Da mesma forma, caso diferenças fossem detectadas, testes 2 x 2 foram executados para identificar tais diferenças utilizando-se o teste do Qui-Quadrado ou Teste G, quando alguma frequência se apresentasse menor que cinco.

Resultados

Quando se aprende?

Nas três comunidades a ordenação de importância foi a mesma, infância, fase adulta e adolescência, entretanto, a distribuição das referências, quando comparadas dois a dois, diferiu em todas as realidades (Bico da Pedra x Darcy Ribeiro, G = 10.2055, p =0.0061; Bico da Pedra x Renascer, G = 2.3974, p = 0.3016; Darcy Ribeiro x Renascer, G = 20.3134, p = < 0.0001) (tabela 3). A maior diferença ocorreu entre o Darcy Ribeiro e o assentamento Renascer, pois nesta última realidade o aprendizado na adolescência foi significativa maior. O aprendizado na adolescência também justifica a diferença encontrada entre Bico da Pedra e Darcy Ribeiro (tabela 3).

Em todos os três grupos investigados, a infância foi o momento da vida que recebeu o maior número de referências de aprendizado em relação às plantas medicinais, entretanto, somente para o Bico da Pedra (x2 = 5.582; p = 0.0181) e Darcy Ribeiro (x2 = 9.043; p = 0.0026) as diferenças foram significativas (tabela 3). Os moradores do Darcy Ribeiro relataram poucos eventos de aprendizado na adolescência, concentrando a absorção de informações prioritariamente na infância e depois concentrando a absorção de informações prioritariamente na infância e depois na fase adulta (tabela 3.)

Tabela 27- Compilação das categorias utilizadas nas análises dos dados, suas respectivas subcategorias e argumentos, apresentados quando necessário.

Categoria Subcategorias e argumentos

Quando "adolescente", "adulto" e "criança"

Como "aprendizagem individual" [produção do conhecimento], "ensino" [quando existe a modificação de todo o ambiente para estimular a transmissão das informações. Esta categoria ainda foi subdividida em: a) "coleta de recurso acompanhado", quando a pessoa obteve a planta em companhia, b) "explicação ou indicação", ensino direto através da linguagem", c) "fizeram para a pessoa", quando alguém confeccionou o remédio para o informante", d) "livro", e) "mandava fazer o remédio", quando algum dos pares pedia para que o informante confeccionasse o remédio, f) "mandava coletar", quando alguém pedia para o informante coletar um determinado recurso, g) "ouvia falar", quando se aprendia através da fala, mas em casos que o ensino não foi destinado ao informante, h) "rádio" e i) "televisão"], "facilitação" [aprendizado indireto pelas modificações ambientais que a interação social produziu], "não se lembra", "observação" [aprendizado indireto pela observação. Esta categoria ainda foi subdividida ema) "fazendo remédio pra outros", quando o informante acompanhou a confecção de remédio para terceiros,b) "pessoas coletando o recurso", quando observou pares coletando plantas medicinais e c) "pessoas pedindo remédio", quando o informante observou terceiros pedindo indicações a terceiros]

Estímulo-

contexto "conversas e discussões sobre plantas medicinais", "cursos", "evento de adoecimento ou necessidade", "exposição ao recurso" [quando o informante sem objetivo aparente entrava em contato com o recurso], "livro", "local de coleta" [quando o informante esteve em uma determinada zona de obtenção de recursos], "rádio", e "televisão" De quem? "mais velhos" [generalização do discurso em referência às pessoas

mais antigas, como avós, bisavós ou vizinhos de maior idade], "o povo" [generalização do discurso em referência a todas as pessoas da comunidade], "amigos ou conhecidos", "avós", "bisavós", "desconhecidos", "esposa (o)", "genro", "irmã (ão)", "livro", "madrinha", "mãe", "meios de comunicação" [televisão ou rádio], "padrinho", "pai", "patrão", "primos", "profissionais da biomedicina" [médicos, enfermeiros ou assistentes de saúde familiar], "profissionais da medicina tradicional" [benzedeiras, garrafeiros, rezadeiras], "si próprio", "sogra (o)", "tios" e "vizinhos" [esta categoria se diferencia da categoria "amigos ou conhecidos" por explicitar ainda uma relação espacial de proximidade]

Transmissão "vertical" [de pais, avós e bisavós para os filhos, netos e bisnetos, respectivamente: Avós, bisavós, filhos, irmã (ão), padrinho ou madrinha, pais e tios], "horizontal" [pares de mesma idade sem necessariamente uma relação de parentesco: amigos ou conhecidos, comadre, cunhada (o), desconhecidos, esposa (o), genro, irmã (ão), patrão, primos, sogra (o) e vizinhos], "um para muitos" [professores, conhecedores ou líderes locais: Livros, meios de comunicação,

Categoria Subcategorias e argumentos

profissionais da biomedicina e profissionais da medicina tradicional], "muitos para um" [membros mais antigos do grupo social sem uma relação de parentesco: "mais velhos", "o povo" e vizinhos]

Os eventos de aprendizado das plantas medicinais são distribuídos de forma mais uniforme no Renascer, entretanto as duas fases da vida mais salientes, infantil e adulta, diferiram do aprendizado jovial (x2 = 20.821; p = 0.004). O aprendizado, apesar de concentrado em alguns momentos, ocorre em todas as fases da vida.

Em quatro situações na comunidade do Bico da Pedra e no Darcy Ribeiro e três no Renascer todo o conhecimento atual sobre plantas medicinais foi obtido em mais de uma fase da vida. Neste caso, a pessoa apreende diferentes informações sobre o mesmo recurso, como formas de uso e indicações terapêuticas em distintos eventos, que podem ocorrer em grandes intervalos temporais. Portanto, o aprendizado sobre plantas medicinais não necessariamente ocorre em apenas uma situação pontual.

O conhecimento atual de quatro plantas medicinais na comunidade do Bico da Pedra e no Darcy Ribeiro e três no Renascer foram obtidos em mais de uma fase da

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