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4 POLÍTICA, CONFLITOS E IDENTIDADES: Os empreendimentos de RAM em mira

4.1 RAM: o desvelar de uma política

4.1.3 Produção e Trabalho na RAM

Nessa pesquisa pouco pertinente seria entender melhor o processo que desencadeiam uma nova realidade territorial em uma dada porção do espaço se não procurasse compreender as relações materiais de produção e trabalho que se desenvolvem sobre esse território, pois são a partir delas que entende-se o território e suas funcionalidades, diante do intenso jogo de interesses e apropriação desse território.

Com esse entendimento busca-se identificar o que era produzido nos territórios, sendo que não só a funcionalidade denuncia a forma de apropriação desses territórios, mas também seu sentido simbólico.

Tomando com base o depoimento dos entrevistados, vinte e dois (22) deles afirmam exercer produção agrícola, sendo que quinze (15) destes não trabalham com a agricultura. Ainda houve um entrevistado que declarou não trabalhar de forma alguma em seu lote.

0 5 10 15 20 Queimadas Mariquita II Sabueiro Geral Falta de Estrutura e Desorganização Não Vê Desvantagens Taxas/Pagamentos/Endividame nto Carater Coletivo Não Opinou

Dentre os 22 (vinte e dois) 16 (dezesseis) deles, indicam o milho como principal cultivo nos empreendimentos, sendo que este é o único produto com finalidade comercial (figura 33). Os demais produtos (figura 35) são basicamente para o consumo de subsistência. Nota-se ainda que no caso do empreendimento Mariquita II o milho tem predominância quase que total.

Figura 33: Milho Armazenado no Empreendimento Sabueiro

Fonte: Pesquisa de campo – Benizário Correia de Souza Júnior – 2011.

Essa predominância do cultivo de milho deve-se em primeiro momento à aptidão edafoclimática da região a qual estão assentados os empreendimentos, em segundo lugar é um cultivo tradicional das localidades e populações circunvizinhas.

O trabalho empregado no cultivo desses produtos não é proveniente do modelo de produção familiar, como traz os clássicos da literatura camponesa. A pesquisa revela que há um distanciamento dos jovens do trabalho agrícola, justificado pela frequência escolar. As relações de trabalho se fazem de forma basicamente conjugal, entre o casal beneficiário do lote, não apresentando especificidades de funções para cada indivíduo, a não serem aqueles que a estrutura física da mulher não permita fazê-lo. Também não são apresentadas formas de

parceria entre os beneficiários ou vizinhos, porém foi relatada quase que pela totalidade dos entrevistados o pagamento de diárias a terceiros no período de maior e trabalho, ou seja, no plantio e na colheita.

Segundo os entrevistados em todos os empreendimentos existem partes de uso coletivo. Contudo não são utilizados pelos beneficiários visto que são na sua maior parte áreas de proteção permanente. Existe apenas uma área coletiva que é utilizada de fato pelos beneficiários, é um sitio no empreendimento Sabueiro onde não há restrições quanto a seu uso inclusive por pessoas não beneficiárias de empreendimento (figura 34).

Figura 34: Sitio de Uso Coletivo no Empreendimento Sabueiro

Figura 35: Produção Agrícola por Citação

Fonte: Pesquisa de campo – Benizário Correia de Souza Júnior – 2011.

Com relação ao processo de produção há uma descontinuidade temporal do modelo de suas práticas. Pode-se obsevar a utilização de instrumentos e subsídios típicos da agricultura moderna com a coexistência de práticas tradicionais ou de baixa tecnologia, tendo como base o trabalho manual (figura 36).

0 5 10 15 20 Geral Milho Feijão Maracuja Mandioca Abobora Fumo Batata Doce Fava Melancia Banana Palma 0 2 4 6 Sabueiro Milho Maracuja Mandioca Abobora Melancia 0 2 4 6 Mariquita Milho Fumo 0 5 10 Queimadas Milho Feijão Maracuja Mandioca Abobora

Figura 36: Modernização da Produção por Citação

Fonte: Pesquisa de campo – Benizário Correia de Souza Júnior – 2011.

Tais afirmações podem ser demonstradas na figura 37, onde se vê o encontro de tempos em um mesmo território, com a colheita de milho sendo efetuada totalmente manual em um lote e, em outro com o auxilio de trator e colheitadeira.

Figura 37: Múltiplos Tempos dos Empreendimentos de RAM

A B

Fonte: Pesquisa de campo – Benizário Correia de Souza Júnior – 2011.(A – Colheita totalmente manual; B –

Colheita com auxilio de trator e colheitadeira mecânica).

A figura 38 ilustra os instrumentos de baixa tecnologia empregados no cultivo. À esquerda pode-se observar uma adaptação de carro de mão que facilita e minimiza o tempo de

0 5 10 15 20 25 Queimadas Mariquita II Sabueiro Geral Tratores Fertilizantes

Trabalho Apenas Manual Agrótoxico

trabalho de fertilização artificial da lavoura. Já a direita vê-se o trabalho com uma matraca, instrumento de plantio para terras aradas que dispensa o uso da enxada e agiliza o processo.

Figura 38: Instrumentos de Baixa Tecnologia

A B

Fonte: Pesquisa de campo – Benizário Correia de Souza Júnior – 2011. (A – Trabalho de fertilização artificial do

solo com instrumento de baixa tecnologia; B – Plantio do milho com instrumento de Baixa tecnologia).

Sendo assim, a produção agrícola nos empreendimentos apresenta um volume considerável. Com isso, questiona-se sobre o processo de escoamento, levando em consideração tanto o transporte dos produtos quanto seus receptores. Nessa perspectiva foi respondido que todo transporte é feito de forma individual. Já o destino de vendas dos produtos na sua maior parte é incerto, sendo que normalmente quem faz essas compras são atravessadores. O consumo próprio também é apresentado como destinação, entretanto a maior parte dos entrevistados não quiseram responder que destinação davam aos seus produtos, mas não foi detectado nenhuma outra relação comercial que as citadas (Figura 39).

Figura 39: Mercado de Venda da Produção Agrícola

Fonte: Pesquisa de campo – Benizário Correia de Souza Júnior – 2011.

No tocante a pecuária, apenas um beneficiário não trabalham com a mesma, ambos são do empreendimento Mariquita II e também não produzem nenhum cultivo. Suas justificativas são que seus lotes não oferecem condição de trabalho por possuírem solos muito rasos e acidentados, estando seus lotes em situação de semiabandono.

Em relação a qualidade da terra os beneficiários as consideram de boa qualidade visto que é uma característica essencial para a produtividade. A grande maioria respondeu que suas terras são boas (figura 41), excluindo o empreendimento Mariquita II que já era previsto esse problema, visto que não foram seguidas as recomendações do laudo técnico da EMDAGRO para a aquisição do imóvel como já foi visto anteriormente. São colocados vários problemas para produção oriundos das grandes declividades do relevo dos empreendimentos, como pode ser visto nas imagens da figura 40, visto que todos estão na borda da Serra da Miaba e seu relevo influencia seu entorno.

0 2 4 6 8 10 12 14 16 Queimadas Mariquita II Sabueiro Geral Qulaquer Pessoa Consumo Próprio Granjas Feira Livre Cooperativa Não Optou

Figura 40: Relevo dos Empreendimentos

A B

C

Fonte: Pesquisa de campo – Benizário Correia de Souza Júnior – 2011.(A – Vista panorâmica da Serra da Miaba

a partir do empreendimento Sabueiro; B – Vista panorâmica da Serra da Miaba a partir do empreendimento

Mariquita II;C –Vista panorâmica da Serra da Miaba a partir do empreendimento Queimadas).

Figura 41: Qualidade da Terra

Fonte: Pesquisa de campo – Benizário Correia de Souza Júnior – 2011.

0 5 10 15 20 25 30 Queimadas Mariquita Sabueiro Geral Boa Rasoável Ruim Não Opitou

A predominância na pecuária deve-se a função atribuída ao território pelo Programa de Credito Fundiário e a predisposição cultural dos beneficiários e as características físicas e climáticas da região.

Em sua maior parte cria-se o gado bovino acompanhado principalmente dos equinos e ovinos, mas também pode-se observar a criação de galináceos (figura 42). A forma com que são criados os animais é o manejo extensivo sem melhoria genética do rebanho, sendo que este é destinado na sua maioria à produção de carne, o que vai de encontro ao projeto inicial de inserção dos beneficiados a cadeia do leite.

Figura 42: Atividade Pecuarista

A B

C D

Fonte: Pesquisa de campo – Benizário Correia de Souza Júnior – 2011. (A – Criação de Bovinos; B – Criação de

equinos; C – Criação de ovinos; D – criação de galináceos).

Diante do exposto observa-se que as relações funcionais do território sofreram grandes transformações com a implantação das políticas de RAM, sobretudo no processo de apropriação funcional, atribuindo ao território uma intensa produção agropecuária. Tal território também passa a produzir relações com múltiplas escalas temporais onde se observa

a concomitância de tecnologia de ponta com práticas tradicionais de trabalho o que nos revela um riquíssimo espaço para comparar essas relações temporais àquelas apresentada por Saquet (2009), que apresentam tais processos como o resultado do encontro de varias territorialidades21.