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5.2 POSICIONAMENTOS EM RELAÇÃO ÀS LÍNGUAS QUE COMPÕEM OS

5.2.1 Professores de/em inglês

Carla

Você tá o tempo inteiro falando com eles e não

necessariamente você tem esse retorno.

Carla é professora da turma inicial da Educação Infantil que atende crianças com 1 e 2 anos de idade. Esses alunos, ao ingressarem na escola, muitas vezes, ainda não falam português, o que ocorrerá ao longo do ano letivo. Carla indica um estranhamento, em sua narrativa (linha 2), que o ambiente escolar lhes causa por conta da utilização de uma língua, na grande maioria dos casos, diferente da língua utilizada na casa dos alunos:

Excerto 1

1 Eles ouviram muito português, quando eles começam a ouvir o inglês e aí tem

2 essa fase de ... tem uma adaptação, para eles há um estranhamento ... Nessa 3 compreensão, mas eles são rápidos, mas eles não produzem. Então a gente 4 percebe pelos comandos que a gente dá que eles já obedecem, que eles já 5 fazem algumas coisas relacionadas aos comandos.

6 Mas eles não produzem efetivamente para gente entender

Inicialmente, Carla explica que os alunos estão habituados a ouvir o português (linha 1). É interessante observar que Carla, por lidar com alunos tão jovens, utiliza o verbo ouvir, e não falar ou usar, uma vez que a maioria dos alunos ainda não fala. Nesse caso, as crianças, alunos de Carla, estão aprendendo a falar tanto em português quanto em inglês. Embora já demonstrem entendimento da língua portuguesa.

A seguir, a narradora predica a sensação que a experiência inicial que seus alunos têm com outra língua como um estranhamento (linha 2) e explica que há uma fase de adaptação (linha 2). Vale ressaltar que há diversos trabalhos acadêmicos

que discorrem acerca do estranhamento que a língua estrangeira suscita. A esse respeito, Serrani-Infante (1998, p.256) argumenta que o aprendizado de uma segunda língua, “talvez, seja uma das experiências mais visivelmente mobilizadoras das questões identitárias do sujeito”, uma vez que, como afirma a autora, o encontro com uma língua estrangeira faz parte de um processo. Serrani- Infante (1998, p.256) explica que “quando se toma a palavra, sabemos, toma-se um lugar que dirá respeito a relações de poder, mas, simultaneamente, “toma-se” a língua, que tem um real específico, uma ordem própria”. A partir dessa premissa, a autora ressalta que tem de ser sujeito também em língua estrangeira, movimento esse que pode conduzir ao estranhamento.

Carla, ao posicionar-se em relação ao repertório linguístico de seus alunos, coloca que, conquanto eles não produzam (linha 3), é possível identificar a adaptação de seus alunos à língua pelos comandos proferidos na escola em inglês e que os alunos já conseguem segui-los (linha 4). Em sua narrativa, Carla explica que

é possível observar o desenvolvimento linguístico de seus alunos nas séries posteriores, quando, de fato, os alunos começam a ser capazes de produções orais em língua inglesa, como enunciado no excerto 2:

Excerto 2

7Quando as crianças vão passando de uma série para outra, você vê essa

8 produção delas, porque nos pequenos você ainda não vê. Você coloca ... você 9 trabalha isso ... Você tá o tempo inteiro falando com eles e não necessariamente 10 você tem esse retorno.

Carla esclarece que, para ela, é difícil discorrer sobre o repertório linguístico de seus alunos. Ela argumenta que, quando os alunos são pequenos, mesmo com um trabalho no qual o tempo todo o inglês é utilizado, a professora parece não ter seu esforço recompensado, não tem esse retorno (linha 10), como explica em sua narrativa.

Carla, ao posicionar-se em relação ao repertório linguístico de seus alunos, parece apoiar-se em categorizações estritamente linguísticas de bilinguismo e parece, consequentemente, desconsiderar a dimensão biográfica do repertório

linguístico proposta por Busch (2015). De acordo com a autora, o que interessa no conceito de repertório linguístico não é, apenas, as habilidades linguísticas, mas as experiências emocionais e corporais que se tornam parte do repertório linguístico do sujeito. Desse modo, os alunos de Carla, que adentram pelo mundo escolar por meio de uma língua diferente da utilizada em casa, têm a possibilidade de acumularem experiências corpóreas e emocionais a partir da interação que estabelecem mediante o inglês.

No excerto 3, Carla finaliza sua narrativa quanto ao repertório linguístico de seus alunos. Inicialmente, ela lança mão de uma pergunta que pretende responder em sua narrativa:

Excerto 3

11 Mas como é que você sabe que ele deu conta dessa língua, como é que você

12 sabe que ele tá te entendendo, você tá se fazendo entender e ele tá 13 compreendendo isso?

14 Vendo o processo todo, em outras séries, quando a criança é capaz de 15 produzir mais, você consegue avaliar isso melhor e dizer: Nossa, nesse 16 contexto pra ele tá fazendo sentido.

Carla questiona-se como é possível, uma vez que os alunos não falam, entender que o inglês passa a fazer parte do repertório linguístico deles. A essa pergunta, a narradora, mais uma vez, reafirma que é necessário observar os alunos em outras séries (linha 14-15). Com isso, Carla posiciona-se como alguém que tem pouco acesso epistêmico a essas personagens, que são seus alunos, pois considera como indício principal, e talvez único, a produção oral dos alunos. Dessa forma, a narradora considera que não tem elementos suficientes para discorrer sobre o repertório linguístico de seus alunos, visto que eles, ainda, não têm uma produção oral significativa.

Eu acho que os professores questionam se não é exigir demais das crianças o fato de mantê-las com tantos estímulos em uma segunda língua.

Paula, diferentemente dos demais professores participantes deste estudo, não faz alusão direta ao repertório linguístico de seus alunos. Todavia narra algumas impressões dos professores que trabalham com ela na mesma instituição e de algumas práticas realizadas em seu contexto que permitiram algumas inferências sobre seu posicionamento em relação ao repertório linguístico de seus alunos.

No primeiro excerto, é interessante notar como Paula evita posicionar-se diretamente utilizando eu como sujeito de seus enunciados. De outra feita, Paula narra como os professores de sua escola posicionam-se em relação ao repertório linguístico de seus alunos e posiciona-se em relação à forma como esses professores usam as línguas com seus alunos.

Excerto 1

1 Eu acho que os professores questionam se não é exigir demais das crianças o

2 fato de mantê-las com tantos estímulos em uma segunda língua.

3 Os professores tendem a usar a língua portuguesa em situações do dia a dia 4 quando se deparam com uma situação difícil ou problemática ou quando eles 5 estão com pouca paciência naquele momento. Eu acho que eles tendem a usar 6 a língua portuguesa como uma ferramenta para fazer com que a mensagem que 7 eles querem passar seja compreendida o mais rápido possível.

Inicialmente, Paula explica que os professores se questionam se não é uma exigência muito grande para os alunos que eles recebam instrução por meio de uma segunda língua. Pode-se inferir que Paula utiliza o sujeito “professores” quando ela não concorda com o que enuncia. Isso ocorre por duas vezes nesse excerto: (I) na linha 1, ao vozear o questionamento dos professores em relação ao uso do inglês com os alunos; e (II) na linha 3, quando explica que os professores tendem a utilizar o português e não o inglês com os alunos em situações difíceis ou quando estão sem paciência.

Nesse momento, é importante lembrar que Paula trabalha em uma EBB com a educação infantil. Essa EBB adota um programa de imersão, que, como Hamers e Blanc (2000) explicam, é um programa no qual toda a instrução escolar é ministrada

por meio de uma segunda língua, no caso deste estudo, o inglês. Dessa forma, o uso do português, devido às hipóteses que sustentam esse tipo de programa, não é estimulado, pois se acredita que a segunda língua é aprendida de forma natural ao expor a criança a essa língua por todo o período de aula.

Ao enunciar que os professores brasileiros utilizam o português com seus alunos, na maioria brasileiros, em situações que predica como difíceis ou problemáticas (linha 4) ou quando estão com pouca paciência (linha 5), Paula traz à tona uma crença de que é preciso fazer uso da língua materna para lidar com situações que envolvam tensões emocionais. Desse modo, parece corroborar a ideia difundida no senso comum de que a língua estrangeira não ocupa um lugar de afeto no repertório do sujeito. A esse respeito, Busch (2015) esclarece que, para além das divisões e separações tradicionais de primeira e segunda língua ou de língua materna e língua estrangeira, deve-se focalizar no conceito de repertório linguístico que apresenta uma dimensão biográfica e, desse modo, entende-se as línguas que compõem o repertório linguístico do sujeito como um fenômeno corpóreo e emocional.

Na linha 5, Paula passa a usar o eu como sujeito de seus enunciados e explica que acredita que os professores utilizam o português com as crianças para que elas compreendam a mensagem mais rapidamente.

No excerto 2, Paula distancia-se de elementos estritamente linguísticos, para discorrer sobre como a escola na qual trabalha pensa o papel da cultura em suas práticas cotidianas:

Excerto 2

8 A escola bilíngue é uma escola em que a criança entra em contato com outras

9 culturas. Eu acho que em nossa escola isso é mais marcado, mais facilmente 10 marcado, por que isso vem só do Canada. Nas escolas anteriores que eu 11 trabalhei, a gente não se relacionava com nenhum país, era só a

12 língua. Ficava mais difícil marcar isso. O que a gente está fazendo que a gente 13 pode dizer que é colocar a criança em contato com outra cultura, tirando o 14 simplesmente falar a língua. Aqui o que a gente tenta fazer é isso, pensar o 15 jeito como a gente vai ser chamada, a maneira como armazenamos os

16 trabalhos.

Paula, na linha 8, predica a escola bilíngue como um local no qual a criança entra em contato com outras culturas. A esse respeito, diferencia sua escola de outras escolas em que trabalhou e que não tinham uma relação direta com nenhum país (linha11). É importante ressaltar que a escola na qual a narradora é professora

é uma franquia de uma rede internacional de ensino. Desse modo, Paula parece demonstrar que é uma preocupação da escola na qual leciona o trabalho com a matriz cultural de origem. E explica, nas linhas 15 e 16, que a escola tenta fazer com que o aluno entre em contato com aspectos relativos à cultura, fornecendo dois exemplos: o modo como as professoras são chamadas pelos alunos, que mais adiante, Paula explica seguir o mesmo padrão internacional de tratamento, e a forma como os trabalhos dos alunos são armazenados, diferentemente de escolas brasileiras.

Paula, ainda que de forma indireta, posiciona-se acerca do repertório linguístico de seus alunos a partir de divisões clássicas de primeira e segunda língua. No entanto, em consonância ao proposto por Rymes (2014), Paula parece compreender que o repertório do aluno não é formado apenas pela língua e coloca ênfase nos elementos não linguísticos que compõem a trajetória de um aluno de uma EBB.

5.2.2 Professores de/em português

Lucas

Até você entender como chegar nesses alunos. O quanto eu posso deixar a outra língua entrar em sala de aula ou não? Isso, para mim, é uma questão. Me obrigou a estudar bastante. Eu não acho que é um problema, por exemplo, eles falarem inglês. Mas o quanto de inglês? Em que momento?

Lucas inicia sua narrativa acerca do repertório linguístico de seus alunos criticando o critério, baseado em conhecimento linguístico, dos agrupamentos das aulas de português da EI na qual trabalha. O narrador posiciona-se a favor da

separação de brasileiros e estrangeiros nas aulas de língua portuguesa da escola internacional na qual leciona, como se pode perceber no excerto a seguir:

Excerto 1

1 Qual que foi minha briga aí? Na verdade duas. De cara eu senti duas coisas: 2 A gente não pode ter os brasileiros que têm o português como língua de 3 herança. Aliás, isso foi um termo que eu descobri nas minhas pesquisas. 4 Português – língua de herança, a língua de herança, na mesma sala que os

5 estrangeiros. São demandas distintas, não demandas linguísticas cognitivas. 6 Talvez não cognitivas, mas certamente culturais. São demandas distintas.

7 Acho que são formas distintas de pensar. Minha primeira proposta foi que a 8 gente tivesse um português como língua de herança para os brasileiros que 9 estão lá e aí talvez um PAL, um PFL, alguma outra coisa, para esses alunos 10 mais avançados estrangeiros. Que é muito improdutiva, misturar brasileiros e 11 estrangeiros na aula de português. Acho que tinha que funcionar de uma outra 12 forma. Por quê? Por conta dessa questão, da ideia de língua de herança que 13 tem uma questão afetiva e cultural com o idioma que eu acho que é justamente

14 o caso desses alunos, quer dizer, o português faz parte da vida deles dentro de

15 casa. As vezes até no ambiente social, mas não é a língua que eles 16 aprenderam a falar primeiro, não é a língua que eles foram alfabetizados. 17 Então eles apresentam algumas deficiências no processo de alfabetização. 18 Mas eles tem toda a bagagem cultural de um brasileiro, as vezes até os

19 preconceitos, é muito curioso isso ... Então, uma abordagem que não fosse só 20 uma questão .. é político sempre, mas não fosse só uma questão linguística, 21 sabe, de nível. Acho que uma abordagem que fosse mais também cultural e 22 afetiva seria mais produtiva para os alunos.

Uma das justificativas que Lucas utiliza para defender a separação de brasileiros e estrangeiros nas aulas de língua portuguesa é introduzida por meio da citação do termo “língua de herança”, que o narrador alega ter descoberto por meio de pesquisas. De acordo com Soares (2012, p.11):

Língua de Herança tem sido sinônimo de: língua dos imigrantes; língua dos refugiados, língua dos indígenas, língua ancestral (Kondo-Brown 2005; Van DeusenScholl2003; He 2010), língua familiar, língua primitiva, língua nativa, língua da comunidade (Shin 2010), língua colonial (Fishman 2001; Carreira 2004), língua étnica, língua minoritária, língua não-social (Valdés, 2005). Nesse sentido, Lucas posiciona-se de modo contrário a ter brasileiros que têm o português como língua de herança juntamente com estrangeiros em uma mesma sala de aula de português. Lucas predica as demandas de alunos brasileiros e estrangeiros na aula de português como distintas (linhas 5 – 6) e explica que não se refere a demandas culturais ou cognitivas, mas a demandas culturais. Nesse sentido, a sugestão de Lucas foi de que os brasileiros fossem designados a uma aula denominada Português como Língua de Herança; e os estrangeiros que tenham conhecimentos de português semelhantes aos dos brasileiros fossem designados a aulas denominadas Portuguese as an additional language (PAL) ou Portuguese as a foreign language (PFL)55 (linha 7-9). Essas nomenclaturas PAL e PFL são os nomes que as aulas de português recebem na escola na qual Lucas trabalha. A proposta de Lucas é a abertura de mais uma classe para o ensino de português que seria denominada Português como Língua de Herança apenas para alunos brasileiros.

Lucas predica como improdutiva (linha 10) a mistura de alunos brasileiros e estrangeiros na aula de português. Vale ressaltar que as aulas de português, na EI na qual Lucas trabalha, são organizadas por níveis de conhecimento linguístico. Desse modo, o que Lucas considera improdutivo não é o fato de estrangeiros terem um conhecimento menor de português do que os brasileiros, uma vez que isso não ocorre nessa EI. Quando há brasileiros e estrangeiros em um mesmo grupo que tem aula de português, isso ocorre porque o conhecimento da língua é semelhante entre esses alunos. O que Lucas considera improdutivo é a diferença de relações afetivas e culturais com o idioma (linha 12-15) estabelecidas por brasileiros que falam português em casa (linhas 14-15) e por estrangeiros que, como posicionados por Lucas, não teriam relações afetivas e culturais com o português.

Para enfatizar que sua sugestão de uma nova organização de níveis para o agrupamento de alunos nas aulas de português não é uma demanda de cunho linguístico, Lucas explica que muitos dos brasileiros dessa EI não foram alfabetizados em português (linha 16) e que, com isso, podem apresentar

55Português como língua adicional e português como língua estrangeira,

deficiências (linha 17) no processo de alfabetização, mas que têm toda bagagem cultural de um brasileiro (linha 18). Desse modo, Lucas sintetiza sua sugestão de uma nova organização de níveis para o português em sua escola não apenas a partir de elementos linguísticos, mas mediante uma abordagem mais cultural e afetiva, que predica como mais produtiva.

Ao propor um agrupamento para as aulas de português que vá além dos conhecimentos de cunho estritamente linguísticos, Lucas parece entender que o repertório linguístico não é, como Busch (2015) explica, um conjunto de competências. É como que se, para Lucas, a experiência vivida da língua (BUSCH, 2015) fosse diferente para esses dois grupos: brasileiros e estrangeiros falantes de português. Para tanto, Lucas apoia-se na ideia de que o fato de nascer em um território específico faria com que fosse desenvolvida uma relação mais afetiva com a língua daquele território. Somando-se a isso, Lucas parece acreditar que todos os brasileiros possuem a mesma bagagem cultural (linha 18), desconsiderando as diferentes historicidades e subjetividades constituídas em território nacional.

A proposta de Lucas para a organização brasileiros e estrangeiros em grupos separados nas aulas de língua portuguesa possibilitaria a criação de uma fronteira entre brasileiros e estrangeiros nas aulas de português. Andersen, Klatt e Sanberg (2012) alertam que a fronteira não existe em si e por si mesma, mas é criada por meio do significado ligado a ela, por isso, a necessidade de pensar no termo de heteronomia para se entender a multiplicidade da fronteira. Nesse sentido, van Houtum (2005, p.675) esclarece que “as fronteiras são construídas em termos de símbolos, signos, identificações, representações, performances e histórias”. Desse modo, Lucas propõe a criação de uma fronteira que distinguiria nós (brasileiros) e eles (estrangeiros) nas aulas de português. Essa separação estaria baseada na representação de que os brasileiros – todos eles –, independentemente de sua história pessoal, possuem uma bagagem cultural que tem implicações diretas no desenvolvimento das aulas de português que merecem ser consideradas e, dessa maneira, agrupados separadamente dos estrangeiros, mesmo que os conhecimentos linguísticos dos dois grupos – brasileiros e estrangeiros – sejam semelhantes.

Van Houtum (2011) propõe três dimensões analíticas no processo de produção de fronteiras, as quais podem ser identificadas na narrativa de Lucas:

(I) legitimidade da fronteira: brasileiros têm toda bagagem cultural (linha 18) que legitima a separação desses dos estrangeiros nas aulas de português. Van Houtum (2011) explica que o processo de legitimação da fronteira pode levar a uma tentativa de silenciamento das diferenças internas de uma comunidade, ou nação, específica. Isso corrobora a tentativa de Lucas de agrupar todos brasileiros, independentemente de sua história de vida, em um mesmo grupo;

(II) normalização da fronteira: Lucas inventa uma narrativa comum que seria compartilhado entre todos os brasileiros e exige a ação de uma política linguística, interna a escola, que separe brasileiros e estrangeiros nas aulas de português;

(III) estabelecimento da alteridade: Lucas sugere a produção de categorias de diferenças entre alunos brasileiros e estrangeiros que justificam a separação desses para o aprendizado de língua portuguesa.

A perspectiva defendida por Lucas, de separação de brasileiros e estrangeiros nas aulas de língua portuguesa, aproxima-se da visão de multiculturalismo diferencialista, explicada por Candau (2008). Isso significa que a diversidade é passível de existência em um espaço específico. No entanto há espaços próprios para a expressão das diferentes identidades culturais presentes em determinado contexto. Não há, como Maher (2007 a) explica ao defender o conceito de interculturalidade, o diálogo entre as culturas e, com isso, a negociação de poder e, consequentemente, a possibilidade de criação de relações mais equânimes.

Após descrever a organização do português na EI na qual trabalha e sugerir uma nova organização, Lucas explica, no excerto 2, a produção de português por parte dos alunos em suas aulas:

Excerto 2

24 Então, eu comecei, me preocupava muito no primeiro mês, segundo mês que

25 eles ficassem falando inglês. Depois eu mesmo comecei falar algumas coisas 26 em inglês com eles e voltar para o português. E tem funcionado. Eles sabem

28 oral. Eu consegui sentir um avanço no domínio da língua, não gramatical,

29 propriamente dito, mas aquele domínio cultural, pragmático, vamos dizer 30 assim. De dizer: eu escrevo assim, não escrevo assim.

31 Não vou colocar a preposição no final da sentença. Esse tipo de coisa, Então 32 funcionou. Deixar o inglês entrar mais, funcionou para essa turma mais