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No ano 2000, antes ainda da lei de criação dos Institutos Federais, nascia o Programa de Educação, Tecnologia e Profissionalização para Pessoas com

125 Necessidades Educacionais Especiais (Tecnep) 95 , considerado a primeira

experiência de educação profissional e tecnológica direcionada a pessoas com deficiência na instituição (NASCIMENTO; FARIA, 2013).

Esse programa era dedicado a “pessoas com necessidades específicas96”,

termo até hoje adotado e referente ao mesmo público-alvo da educação especial atendido pela nossa LDB, ou seja, pessoas com deficiência, altas habilidades e superdotação ou com Transtornos Globais do Desenvolvimento.

Nesse período (meados no ano 2000) conforme abordado por Isa Regina dos Santos Anjos (2006), a Coordenação Geral de Desenvolvimento da Educação Especial buscou identificar na rede federal as instituições que já desenvolviam algum tipo de trabalho com pessoas com “necessidades educacionais especiais”97

(ANJOS, 2006, p. 39).

Também nessa época, segundo a pesquisadora (ANJOS, 2006), constatou-se o seguinte quadro, embora não se saiba exatamente como foi realizado o levantamento:

[…] havia 153 alunos matriculados nas Escolas Agrotécnicas, 17 nas Escolas Técnicas e 97 nos Centros Federais de Educação Tecnológica. Das escolas da Rede Federal de Educação Tecnológica, que perfaziam um total de 135, sendo na época 29 Escolas Técnicas vinculadas a Universidades, 20 Centros Federais de Educação Tecnológica (CEFET), 5 Escolas Técnicas Federais (ETF), 45 Escolas Agrotécnicas Federais (EAF) e 36 Unidades de Ensino Descentralizadas (UNEDs) (ANJOS, 2006, p. 39). Diante da necessidade de favorecer a relação entre a educação especial e a educação profissional, os técnicos da Secretaria de Educação Média e Tecnológica (Semtec)98 e da Secretaria de Educação Especial (Seesp) realizaram reuniões com

entidades representativas, escolas da rede federal, secretarias estaduais e municipais de educação e posteriormente passaram a sistematizar tais discussões, _________

95 A sigla aparece em diferentes formatos ao longo das publicações localizadas: Tec Nep, TECNEP, TEC NEP. Decidiu-se adotar Tecnep seguindo as recomendações de estilo mais recentes com relação ao uso de siglas.

96 Não foram localizadas informações a respeito de quando surgiu esse termo. No texto de ANJOS (2006) é mencionado o termo necessidades educacionais especiais, já os autores Nascimento, Franclin e Faria (2013) utilizam o termo necessidades educacionais específicas, em suas produções. Este termo é adotado pelo IFRS e IFSP, conforme consulta realizado nos sites institucionais.

97 Esse era o termo comumente adotado nos documentos e referencial teórico adotado no Brasil e também pela autora (Isa Regina dos Santos Anjos) na época.

126 o que culminou com a programa Tecnep, em junho de 2000 (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2009).

De acordo com o documento do programa, na época, havia três concepções gerais:

1) a educação profissional enquanto necessidade para o desenvolvimento do país – compreende a educação profissional como preparação para o trabalho e inserção produtiva no meio social;

2) a promessa de igualdade de oportunidades como fator de desenvolvimento da cidadania – discorre sobre a inclusão no sentido de transformação dos processos educativos e inserção produtiva numa perspectiva de redimensionamento do contexto social;

3) a educação profissional e inserção no mercado de trabalho como efetivação de direitos – apresenta uma compilação de outros documentos e legislações no sentido de respaldar a ideia de educação profissional e inserção produtiva como um direito das pessoas que apresentam necessidades educacionais especiais (MEC, 2000).

Nota-se então que a proposta tinha foco na profissionalização de pessoas com deficiência, não sendo voltada para inclusão nas salas de aula de ensino comum. Nesse aspecto é preciso resgatar o histórico da rede EPT, lembrando que nesse período, até 2004, o ensino técnico estava desvinculado do ensino médio e as diretrizes priorizavam apenas a empregabilidade, não somente para as pessoas com deficiência, conforme mencionado nas seções 3.1 e 3.2.

Assim, o programa foi efetivado em três momentos (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO, 2009; NASCIMENTO; FARIA, 2013) denominados da seguinte forma: Momento I – de sensibilização e mobilização; Momento II - consolidação dos Grupos Gestores, dos Napnes e a estratégia de implantação da Ação Tecnep; Momento III - Formação de recursos humanos, uso e desenvolvimento de tecnologia assistiva.

No momento I, de sensibilização e mobilização, ocorrido de 2000 a 2003, foram realizados encontros, oficinas e debates envolvendo o Ministério da Educação, as instituições da rede federal e o terceiro setor. Já se discutia a importância de expandir a oferta de vagas e a alocação de pessoas com necessidades específicas ao mundo produtivo, bem como a necessidade de formar profissionais da educação. Nesse momento as parcerias eram feitas com instituições não governamentais que já manifestavam essa preocupação (NASCIMENTO; FARIA, 2013).

127 Nota-se então o envolvimento também do terceiro setor e a priorização das necessidades do mercado de trabalho, aspectos que correspondiam à política da época. O foco da política era favorecer a empregabilidade de pessoas com deficiência. Da mesma forma, cabe reiterar que a empregabilidade por meio de formação técnica era o foco estabelecido para a educação profissional.

Além disso, também para a educação profissional, a partir de 1994 já estava estabelecido que os investimentos em expansão e mesmo a gestão poderiam ficar a cargo do terceiro setor. Somados a isso, cabe reconhecer a forte atuação das ONGs no que se referia à empregabilidade de pessoas com deficiência.

Gil (2012) cita diversas organizações que passaram a atuar na década de 30 na profissionalização de pessoas com deficiência visual, entre elas: Instituto Padre Chico, (1929), Federação dos Cegos Laboriosos (1932), Instituto Profissional para moças cegas (1943), Fundação para o Livro do Cego no Brasil/Dorina Norwill (1946). Além disso, em 1945, o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) passou a atuar na qualificação profissional para a indústria de pessoas com deficiência.

O momento II, de 2003 a 2006, foi responsável pela consolidação dos Grupos Gestores, dos Napnes e da estratégia de implantação da Ação Tecnep. Cabe notar que nesse período houve uma mudança de governo, quando entrou, a partir de 2004, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que manteve o nome do programa.

No cenário nacional, no contexto educacional, o MEC implementava o Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade, com foco na formação de gestores para garantia da escolarização dos estudantes com deficiência. Já previa também a oferta do Atendimento Educacional Especializado (AEE) e a garantia de Acessibilidade, estabelecidas pelo Decreto 5.296/04.

Com relação ao Tecnep, surgem então os Núcleos de Atendimento a Pessoas com Necessidades Específicas (Napnes), nomenclatura adotada até agora, e os Núcleos Gestores.

De acordo com Nascimento e Faria (2013), essa era uma estratégia para descentralizar a gestão e o processo de expansão da oferta de vagas às pessoas com necessidades específicas. Dessa forma, constituiu-se um Grupo Gestor Central, com representantes técnicos da então Semtec e da Seesp e os cinco primeiros

128 polos com gestores regionais em cada uma das regiões do país: Cefet-PA (Norte), Cefet-RN (Nordeste), Cefet-MG (Sudeste), Cefet-MT (Centro-oeste) e Cefet-SC (Sul).

Os Napnes foram criados para o atendimento direto internamente, tendo um coordenador designado por portaria do diretor geral (responsável por todos os câmpus, quando não havia reitoria). Além disso, podia ter como apoio psicólogos, pais de estudantes, docentes, técnicos e os próprios estudantes que buscavam possibilidades para ingresso, permanência e saída com sucesso da instituição.

A estratégia de implantação expressa por Nascimento e Faria (2013) considerava a necessidade de implantar uma política de educação profissional para pessoas com necessidades específicas considerando a experiência da Rede Federal na formação profissional.

Entretanto, consideravam ainda necessária e relevante a parceria com instituições que, na visão desses autores (NASCIMENTO, FARIA, 2013), possuíam “experiência acumulada” nessa área, como as instituições sem fins lucrativos ligadas às pessoas com deficiência, o sistema S, empresas e cooperativas.

Além desses aspectos, a proposta previa a “criação de espaços para intercâmbio entre a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica e os demais atores do segmento social pertinente (NASCIMENTO; FARIA, 2013, p. 19).

Nota-se, portanto, uma continuidade da proposta inicial, com o intuito de favorecer a inserção de pessoas com deficiência no mercado de trabalho em parceria com diferentes instituições, não se constituindo ainda em uma política que favorecesse a inclusão dessas pessoas no ensino comum, nem mesmo a formação continuada dos profissionais da rede EPT.

O terceiro momento, de 2007 a 2009, foi o que passou a prever a formação de recursos humanos, uso e desenvolvimento de TA. Foi então ofertado o curso de Especialização “Educação Profissional Tecnológica Inclusiva” (NASCIMENTO; FARIA, 2013, p. 19), como resultado de uma parceria entre a Setec (MEC), o Cefet do Mato Grosso, o Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines) e o Instituto Benjamin Constant (IBC).

129 Nota-se ainda forte influência do terceiro setor na concepção da proposta e ausência da Secretaria ligada à Educação Especial. Nascimento e Faria (2013) consideraram ainda que havia dificuldades ligadas ainda ao referencial teórico, preocupação com os responsáveis por ministrar disciplinas para estudantes com deficiência.

De acordo com Silva (2014, p. 47), ocorreram além disso cursos de formação “inicial e continuada abrangendo áreas de atendimento especializado e confecção de materiais adaptados, além de cursos de Língua Brasileira de Sinais (Libras) e Braille”.

Em 2009, pouco após a Lei no 11.892/08, o Ministério da Educação em parceria com a Secretaria de Educação Média e Tecnológica e também com a Secretaria de Educação Especial estabeleceu diretrizes para o programa. As justificativas relacionadas ao programa (MEC, 2009) eram pautadas em aspectos baseados na equidade, equiparação de oportunidades e direitos humanos sobrepondo-se aos aspectos econômicos. A seguir alguns aspectos destacados do documento norteador da época:

 “Igualdade de oportunidades educacionais na preparação para o trabalho e da inserção produtiva no meio social” (p.4), reconhecidas no documento como um direito de todos;

 Demanda pelo esforço de compreender e avançar para além da “inserção competitiva de indivíduos, empresas e países, que pode até incrementar a qualidade do desenvolvimento, mas não assegura, por si só, a equidade” (p. 4);

 A necessidade de “prevalência dos Direitos Humanos, mediante a não discriminação, a solidariedade, a ampliação de oportunidades para os segmentos hoje excluídos.”(p. 4).

Nesse período, foram adotadas as primeiras ações ligadas à TA, além de cursos sobre Braille, Libras e outros aspectos que contribuíram com a formação e “instrumentalização” da rede federal (NASCIMENTO, FARIA; 2013, p. 21).

130 Bem como as primeiras experiências de desenvolvimento tecnológico de recursos de TA já eram citadas por Nascimento e Faria (2013) como fruto de ações do Napne:

1. Construção e execução da “habitação universal”, que, a partir da proposta de desenho universal, foi desenvolvida com acessibilidade para todos, independentemente de sua condição pessoal. Experiência-piloto do Câmpus Bento Gonçalves/RS – IFRS;

2. Criação do protótipo do “Mouse Ocular”, permitindo que pessoas tetraplégicas possam usar o computador. Experiência-piloto do Câmpus Charqueadas – IF Sulriograndense;

3. Desenvolvimento do PROTA – Programa de TA que conserta bengalas, reglete, punção e outros apoios ao Deficiente Visual. Experiência da UTFPR – Câmpus Curitiba.

Cabe notar que o IFRS, alguns anos depois, consolidou além do Napne um Núcleo Tecnológico de Acessibilidade (NTA) que se tornou a partir de 2016 um Centro Tecnológico de Acessibilidade (CTA) e em todo esse período atuou no desenvolvimento de recursos de TA envolvendo professores, bolsistas e profissionais técnico-administrativos.

Em 2011, segundo Silva (2014) houve uma reestruturação no MEC e o programa passou a ser alocado na Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secadi) e deixou de ter uma gestão central própria, de modo que foi extinta a Seesp e criada uma diretoria de educação especial.

De acordo com Silva (2014, p. 48):

A mudança gerou inquietação e insatisfação na comunidade que compõe a Ação Tecnep, pois a desarticulação da gestão central trouxe grande insegurança acerca da continuidade dos trabalhos dessa Ação. Diante do exposto, os Gestores Estaduais, Regionais e Coordenadores dos Napnes locais elaboraram um documento, encaminhado à Setec e à Secadi evidenciando essa preocupação e solicitando a manutenção da Ação Tecnep na Rede e na Setec.

Consequentemente, após essa manifestação foi designada uma servidora que deveria responder por diversas ações como: Educação das Relações Étnico-

131 raciais, Educação Escolar Indígena, Direitos Humanos e inclusive a Ação Tecnep (SILVA, 2014). Portanto, não houve mais novidades em relação às suas diretrizes e acompanhamento por parte do MEC, uma vez que a ação já não possuía um grupo gestor específico e estava lotada em uma diretoria com diversas outras demandas.

Era esperado também um quarto momento que seria dedicado à instrumentalização dos Napnes com recursos multifuncionais e formação continuada, seguindo a Política Nacional (BRASIL, 1996a, 2008a). Entretanto, não chegou a ocorrer e, antes disso, a Setec extinguiu a coordenação de ações inclusivas, dedicada também a essa finalidade (NASCMENTO, FARIA; 2013).

Cabe mencionar que o programa não foi extinto, porém deixou de ter responsáveis junto ao MEC, sendo a sua continuidade dependente de política institucional local em cada IF, como no caso do IFSP e IFRS que inclusive regulamentaram as atividades de seus Napnes (IFRS, 2014a; IFSP, 2014a).

Feitas essas considerações, conclui-se aqui o referencial teórico e legal que fundamenta esta tese. No próximo capítulo são abordados os aspectos relacionados à metodologia.

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4 PERCURSO METODOLÓGICO

Esta tese utiliza-se de abordagem qualitativa como metodologia de pesquisa (LÜDKE; ANDRÉ, 1986; CHIZZOTTI, 1995) que, entre suas características, envolve a “obtenção de dados descritivos, obtidos no contato direto do pesquisador com a situação estudada, enfatiza mais o processo do que o produto e se preocupa em retratar a perspectiva dos participantes” (LÜDKE; ANDRÉ, 1986, p. 13).

Recomenda-se também o enfoque qualitativo quando o tema da pesquisa é pouco explorado ou ainda se não tiver sido realizada sobre um grupo social específico (SAMPIERI; COLLADO; LUCIO, 2013). Neste caso, o tema pouco explorado é o desenvolvimento de recursos em TA e o grupo social específico são os IF. Essa abordagem fez-se necessária para atender ao propósito desta tese, uma vez que foram contemplados os seguintes aspectos, nos procedimentos realizados: a) contato direto com os responsáveis por atuar diretamente no desenvolvimento de recursos na área de TA; b) considerar o processo de desenvolvimento dos recursos mais relevante do que os resultados das produções por estes desenvolvidas; c) obter a partir de suas recomendações e dados gerados pelas entrevistas, documentos e referências importantes para a compreensão da realidade estudada.

A seguir, são relatados como ocorreram os processos de escolha das instituições e, posteriormente dos participantes da pesquisa, bem como a produção e análise dos dados.