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2. MORAL E ÉTICA

2.1 Projeto de Vida

Transcender é uma característica essencialmente humana e, para Sartre (1960/1963), o comportamento mais rudimentar é tanto gerado pela condição presente como pela “relação a um determinado objeto, que ainda está por vir, que está tentando ser trazido à existência. Isto é o que chamamos de projeto. [Tradução nossa]2” (p. 91).

Piaget e Inhelder (1970/1976) referem-se a projeto de vida usando a expressão plano de vida. Por se tratarem de sinônimos, usaremos a expressão projeto de vida, evitando quaisquer confusões em relação aos termos empregados. Assim, para Piaget e Inhelder (1970/1976), projeto de vida é tanto uma escala de valores quanto uma afirmação da autonomia. Como escala de valores, o estabelecimento de projetos de vida “colocará alguns ideais como subordinados a outros e subordinará os valores meios aos fins considerados como permanentes.” (p. 260). Como afirmação da autonomia, nesse caso, autonomia moral conquistada pelo adolescente que se vê como igual aos adultos, o projeto de vida é “outro aspecto afetivo essencial da personalidade nascente que se prepara para enfrentar a vida.” (p. 260).

Considerando que o desenvolvimento cognitivo pode ser condição importante para o desenvolvimento moral, faz-se necessário tecer algumas considerações a esse respeito. Com o desenvolvimento cognitivo, as crianças passam por sucessivas construções com base na descentralização de pontos de vista, passando de um pensamento egocêntrico e imediato para coordenações amplas de noções e relações, podendo culminar no

2 Citação do trecho original: “in relation to a certain object, still to come, which it is trying to bring into

pensamento formal. Paralelamente, a afetividade pode evoluir partindo do eu para posterior submissão a uma vida social devido à reciprocidade e à coordenação de valores às leis de cooperação. Assim, pensando nas relações entre afetividade e inteligência, para Piaget (1964/1991), a primeira é a mola das ações enquanto a inteligência proporciona a técnica e os propósitos de toda conduta.

Então, pode-se começar a falar sobre a personalidade que, para Piaget (1964/1991), difere do conceito de eu, posto que o eu se define como o centro da atividade própria, característico por seu egocentrismo. Em direção contrária, a personalidade é resultado da autossubmissão do eu a uma disciplina e implica em cooperação. Há, na personalidade “um sistema ‘pessoal’ no duplo sentido de particular a um determinado indivíduo e de implicar uma coordenação autônoma.” (p. 66). Quando o adolescente forma um projeto de vida o qual é fonte de disciplina e de cooperação, pode-se falar em um aspecto da personalidade.

Em relação às ideias reformadoras que se identificam nos projetos de vida dos adolescentes, Piaget (1964/1991) observa que ao passar de reformador para realizador, o adolescente restabelece o equilíbrio, superando as crises próprias desse período e favorecendo sua inserção na vida adulta. Porém, para esse autor, os sujeitos mais produtivos conseguem aliar tais projetos vastos de sonhos reformadores com as realizações pessoais. Vimos na primeira parte do capítulo ‘Moral e ética’ que o sentimento de expansão de si próprio se articula com alguns elementos invariáveis no plano ético como a experiência subjetiva de alguma forma de bem-estar, a avaliação de que essa experiência segue o fluxo temporal da vida e a existência de sentido para a vida (La Taille, 2006). Assim, pode-se afirmar que “são as condições de vida, os problemas morais e, sobretudo, os guias e ideias de valor que cada sujeito usa que fazem com que sua conduta se conforme em um sentido ou em outro” (Puig, 1996/1998, p. 154).

Assim sendo, um projeto de vida demanda constantes reflexões e atualizações das ideias, pressupondo “que antes de tudo elas tenham sido tornadas ‘possíveis’ e a observação mostra que o nascimento de um possível geralmente provoca outros” (Piaget, 1981/1985, p. 7). Bruner (1997) observa que as nossas representações de mundo são infundidas pelas ações, sejam elas lembradas, antecipadas ou em andamento e que, portanto, “a concepção de um mundo possível inclui a concepção de procedimentos para operar sobre ele.” (p. 112).

A maneira como percebemos a nossa vida determina, de acordo com Habermas (1996/2002), o modo como nos entendemos e, por essa razão, “os discernimentos éticos sobre a interpretação dessa autocompreensão intervêm na orientação da nossa vida” (p. 39). Trata-se de um movimento dialético de reflexão ética sobre si e sobre a vida que se quer viver. Novamente, reportamo-nos à ideia de busca da felicidade que, conforme atesta Comte-Sponville (2001/2010), é “a coisa mais bem distribuída do mundo” (p. 3).

Se a busca da felicidade é o objeto de todos os homens, estaríamos em busca de algo que não possuímos? Para ser feliz, observa o filósofo, não basta ter tudo, pois sem uma sabedoria de como viver, a felicidade torna-se malograda. Buscar eternamente algo que não possuímos seria, em si, uma atitude desoladora, pois nunca atingiríamos a felicidade por estar relacionada àquilo de que sentimos falta, sempre colocada no porvir.

Comte-Sponville (2001/2010) defende a ideia de se vivenciar uma felicidade desesperada, em outros termos, uma felicidade que não espera nada, uma felicidade em ato: “desejar o que temos, o que fazemos, o que é – o que não falta” (p. 19). A esperança sempre se refere a um futuro desconhecido e, assim, conhecimento e esperança nunca se encontram, pois “ninguém espera aquilo de que se sabe capaz” (p. 21).

Consideramos úteis as reflexões de Comte-Sponville (2001/2010), ao diferenciar esperança de vontade, para o estudo sobre projetos de vida em uma perspectiva ética, uma vez que esses projetos podem revelar conteúdos da identidade de um sujeito, como também de sua realidade, ou podem ser apenas projeções imaginárias, desejáveis, oníricas, mas não passíveis de se concretizarem. Em assim sendo, consideramos que o sujeito autônomo pode ter consciência da própria potencialidade ao projetar-se; o heterônomo pode ser aquele que, ao projetar-se, coloca no desconhecido a capacidade de realização dos seus sonhos por ter esperança.

A esperança é, para Comte-Sponville (2001/2010), um “desejo que se refere ao que

não temos (uma falta), que ignoramos se foi ou será satisfeito, enfim cuja satisfação não depende de nós: esperar é desejar sem gozar, sem saber, sem poder” (p. 22). A vontade,

por outro lado, está relacionada ao desejo daquilo que depende de nós realizar, do que já gozamos, do que conhecemos e do que fazemos. Se houver alegria no reconhecimento de nossas capacidades e em algumas de nossas realizações, então o futuro pode envolver projetos de manutenção do presente. Se, todavia, o presente revela uma realidade indesejável, a vontade humana mobilizará recursos para transformação do real, o que

estaria de acordo com o pressuposto por Sartre (1960/1963) ao anunciar que “o homem é caracterizado, sobretudo pela sua ida além de uma situação, e por aquilo que ele consegue fazer com o que tem sido feito dele. [Tradução nossa]3” (p. 91). Comte-Sponville (2001/2010) substitui a falta da esperança pela concretude do saber, da potência e do regozijar-se. Assim sendo,

só esperamos o que não depende de nós; só queremos o que depende de nós. Só esperamos o que não é; só amamos o que é. Trata-se de operar, portanto, uma conversão do desejo: [...] trata-se de aprender a desejar o que depende de nós (isto é, aprender a querer e a agir), trata-se de aprender a desejar o que é (isto é, a amar) em vez de desejar sempre o que não é (esperar ou lamentar) (p. 32).

Comte-Sponville (2001/2010) propõe a tomada de consciência da nossa potência de agir, o que, conforme pudemos verificar sobre o desenvolvimento do raciocínio moral (Kohlberg, 1992; Piaget, 1932/1994) e das dimensões intelectuais e afetivas (La Taille, 2006), é uma conquista do sujeito autônomo; o heterônomo, por depositar no outro a responsabilidade pelas ordens morais, tem esperança, mas não vontade como a definida pelo filósofo.

Vimos, em La Taille (2006), que a sensação de se estar vivendo uma vida boa está relacionada à possibilidade de “ver a si próprio como pessoa de valor, capaz de afirmar-se enquanto tal, e de enxergar perspectivas de alcançar um grau satisfatório da tendência de elevar-se, de se desenvolver” (p. 48). Nesse sentido, o reconhecimento de si é um aspecto necessário para a vida boa e, para Ricoeur (2004/2006), esse aspecto se vincula à noção de identidade. Assim, o reconhecimento de si pode tanto ocorrer ao atestar as próprias capacidades individuais ou ao referir-se a habilidades de si necessárias à instauração de um vínculo social. Para o filósofo, o reconhecimento dessas características se verifica por poder dizer que nos permite ter noção de toda a extensão da obra humana. Para se atingir o reconhecimento mútuo, inserindo o outro nas considerações de si, Ricoeur (2004/2006) observa que conquistar o poder dizer, o poder agir e, especialmente, o poder narrar-se é crucial. Considera-se, desse modo, que a vida, para ser boa, precisa ser concentrada em um relato. Do contrário, “como, em efeito, um sujeito de ação poderia dar a sua própria vida

3 Citação do trecho original: “man is characterized above all by his going beyond a situation and by what

uma qualificação ética, se essa vida não pudesse agrupar-se em forma de relato? [Tradução nossa]4” (p. 136).

Agrupar a vida em um relato requer consideração pela memória e pela promessa. A memória é, para Ricoeur (2004/2006) uma tentativa de evitar que certos acontecimentos fiquem relegados ao esquecimento. No que tange ao reconhecimento de si, a memória, por ser retrospectiva, possibilita o acesso a uma história de vida; a promessa, por mirar o futuro, permite ao sujeito estabelecer compromissos vindouros de longa duração. Assim, “poder prometer pressupõe poder dizer, poder atuar sobre o mundo, poder contar e formar a ideia da unidade narrativa de uma vida, enfim, poder imputar-se a si mesmo a origem de seus atos. [Tradução nossa]5”. Nota-se, portanto, que o reconhecimento de si implica aspectos que podem interessar a uma reflexão sobre a perspectiva ética, já que poder dizer, poder agir sobre o mundo e poder narrar-se gera consequências, sobretudo quando Ricoeur (2004/2006) ressalta o sujeito do reconhecimento de si como um ser imputável, logo responsável pelos seus atos.

Para Sartre (1954), viver em um mundo repleto do outro não significa simplesmente encontrá-lo em cada volta do caminho, mas se comprometer com um mundo no qual se encontram recursos complexos passíveis de terem significações que não tenham sido inicialmente atribuídas pelo próprio projeto de um sujeito. Para que a situação concreta se configure, são necessários os utensílios já significantes, como a estação, uma obra de arte, um semáforo, a significação que o sujeito descobre como sendo dele e que participa da construção de sua identidade, a exemplo de sua nacionalidade, seu aspecto físico e, por fim, “o outro como centro de referência ao que essas significações remetem. [Tradução nossa]6” (p. 313).

Tanto Sartre (1954) quanto Ricoeur (2004/2006) mencionam o reconhecimento do outro como posterior ao reconhecimento de si. Complementamos a discussão sobre o reconhecimento de si como necessário ao reconhecimento mútuo, reportando-nos a Foucault (1984/2004) que considera ser necessário ao homem o desenvolvimento de um

4 Citação do trecho original: “¿Cómo, en efecto, un sujeto de acción podría dar a su propia vida una

calificación ética, si esa vida no pudiese agruparse en forma de relato?” (Ricoeur, 2004/2006, p. 136)

5 Citação do trecho original: “poder prometer presupone poder decir, poder actuar sobre el mundo, poder

contar y formar la idea de la unidad narrativa de una vida, en fin, poder imputarse a sí mismo el origen de sus actos.” (Ricoeur, 2004/2006, p. 165).

6 Citação do trecho original: “el otro como centro de referencia al que esas significaciones remiten”. (Sartre,

conhecimento privilegiado de si, reportando-se à temática do cuidado de si. Para o filósofo, um trabalho voltado à autoformação por meio de um exercício sobre si mesmo que permita ao indivíduo conquistar um determinado modo de ser é necessário para as práticas de liberdade. Esse é um tema relativo à ética, entendida por Foucault (1984/2004) como a “prática refletida da liberdade” (p. 268).

Decerto que o cuidado de si, pela influência da moral cristã, foi compreendido em nossa sociedade com ressalvas, associado ao “amor a si mesmo, uma forma de egoísmo ou de interesse individual em contradição com o interesse que é necessário ter em relação aos outros ou com o necessário sacrifício de si mesmo” (p. 269). Todavia, Foucault (1984/2004) baseia-se nos filósofos gregos para observar que o cuidado de si associa-se às práticas adequadas de liberdade e dependem que o indivíduo promova o seu autoconhecimento e sua autoformação, supere as suas próprias dificuldades e tenha a capacidade de “dominar em si os apetites que poderiam arrebatá-lo” (p. 269). Certamente, esse é um trabalho árduo que em muito se assemelha com à ética aristotélica de viver uma vida reta e virtuosa.

Cuidar de si implica conhecer-se, como também conhecer as regras e os princípios necessários a uma vida em comum e, assim, com base na filosofia greco-romana, Foucault (1984/2004) complementa:

o cuidado de si é ético em si mesmo; porém implica relações complexas com os outros, uma vez que esse êthos da liberdade é também uma maneira de cuidar dos outros. [...] Assim, o problema das relações com os outros está presente ao longo desse desenvolvimento do cuidado de si (pp. 271-272).

Para o filósofo, o cuidado de si não corre o risco de se tornar absoluto, em detrimento do cuidado do outro, pois uma pessoa que se conhece, que sabe de suas capacidades e do que é necessário para ser um cidadão, se tem o zelo pela verdade e a consciência das coisas com as quais ela deve ser indiferente, “não pode, a partir deste momento, abusar do seu poder sobre os outros” (p. 273). Essa pessoa, portanto, conquistou o conhecimento sobre como viver.

Esse aspecto interessa à reflexão sobre a importância do sentido para a vida e da expansão de si próprio. Saber viver não apenas depende de aspectos cognitivos sobre a moral, mas também de se encontrar uma razão para viver. La Taille (2006) reporta-se aos altos índices de suicídio no mundo atual para ilustrar como a temática do sentido da vida é

existencial. Anualmente um milhão de pessoas cometem suicídio e, de acordo com um relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS) (WHO, 2001), cerca de 20 milhões atentam contra a própria vida ao redor do mundo. Esse dado adquire status de problema de saúde pública da maior importância por referir-se à principal causa de morte de jovens adultos, sendo predominante na idade entre 15 e 34 anos nos países desenvolvidos e em desenvolvimento. Bertolote e Fleischman (2002) atentam para a estimativa da OMS de que, em 2020, aproximadamente 1,53 milhões de pessoas se suicidarão e as tentativas de suicídio serão de 10 a 20 vezes superiores ao redor do mundo. Em outras palavras, “isto representa em média uma morte a cada 20 segundos e uma tentativa a cada 1-2 segundos. [Tradução nossa]7” (p. 6).

Frankl (1946/1991) relata que, durante o período em que esteve prisioneiro nos campos de concentração, a pergunta pelo sentido da vida tornou-se crucial, pois “na realidade não importa que não esperemos nada da vida, mas se a vida espera algo de nós. [Tradução nossa]8” (p. 46). O vazio existencial acomete o homem quando esse vive um estado de tédio; o sentido da vida, por sua vez, se revela na capacidade humana de responsabilizar-se por quem é e por quem virá a ser. Ao fazer essa declaração, Frankl (1946/1991) atribui ao homem a potência de sua vida cujo sentido não se encerra na própria autorrealização, que nunca está completa, mas na transcendência que envolve tanto o próprio sujeito quanto o outro com quem se compartilha uma cultura.

Savater (1993/2004) ressalta que “a vida é feita de tempo e de relações, de vínculos

que fazem você se tornar quem você é” (p. 71). São as relações interpessoais que

caracterizam a nossa humanidade, logo, “dar-se uma vida boa não pode ser muito diferente, afinal, de dar uma vida boa” (p. 75). Embora se entenda por projeto de vida “a razão por trás das metas e dos motivos imediatos que comandam o comportamento diário” (Araújo, 2009, p. 14), nosso interesse está em estudar os projetos que de alguma maneira incluem o outro. Para Damon (2009), “projeto vital é uma intenção estável e generalizada

de alcançar algo que é ao mesmo tempo significativo para o eu e gera consequências no mundo além do eu” (p. 53). Nessa definição, a perspectiva do outro está claramente

anunciada, quando se abordam as consequências das próprias ações no mundo.

7 Citação do trecho original: “This represents on average one death every 20 seconds and one attempt every

1-2 seconds” (Bertolote & Fleishman, 2002, p. 6)

8 Citação do trecho original: “en realidad no importa que no esperemos nada de la vida, sino si la vida espera

Com o intuito de verificar como o tema de projetos de vida tem sido considerado nas pesquisas realizadas no Brasil, verificamos a produção registrada no Banco de Teses e Dissertações da Capes publicadas no período entre 1999 e 2009. Foram listadas 346 entradas válidas de resumos de teses e/ou dissertações. Embora não estivesse presente nominalmente nos títulos de todas as teses e/ou dissertações encontradas, projeto de vida foi mencionado nas discussões de resultados. As principais áreas foram Educação (26%) e Psicologia (22%).

No que concerne aos estudos em Psicologia, verificamos que os principais temas relacionados a projeto de vida versam sobre: a) histórias de vida; b) maternidade e/ou paternidade na adolescência; c) projeto de vida como forma de proteção ao suicídio, estratégia de enfrentamento e promoção de saúde psicológica; d) elaboração de projetos de vida a partir da maturidade e/ou aposentadoria; e) influência da família e/ou da educação na elaboração de projetos de vida; f) violência como ameaça ao estabelecimento ou realização dos projetos de vida; g) contextos de privação da liberdade como espaços para elaboração de projetos de vida; h) projeto de vida em uma perspectiva ética; i) elaboração de projeto de vida por pessoas com deficiência física e mental.

Embora tenhamos destacado algumas referências em Psicologia, sem, no entanto, mencionar resumos de outras áreas, notamos poucos estudos que se referem à perspectiva ética na construção de projetos de vida (D’Áurea-Tardeli, 2005; Maia, 2007; Miranda, 2007). A essa revisão, acrescentamos o recente estudo de doutorado realizado por Abreu (2012) sobre os projetos de vida de universitários.

Os estudos identificados como relativos a projetos de vida em uma perspectiva ética foram assim categorizados por revelarem conteúdos autorreferenciais, desconsiderando o outro, ou por conterem aspectos éticos de inclusão de outrem nas projeções de si. A autorreferência, sem consideração pelo outro, foi encontrada por Maia (2007) que entrevistou jovens de classe média e média alta, estagiários em empresas privadas, e verificou que os sentidos atribuídos pelos participantes ao trabalho revelavam a ideia de flexibilidade, de mudança e aceleração, com poucas certezas quanto ao futuro. Esses aspectos se verificam nos projetos de vida desses jovens, totalmente comprometidos consigo próprios. De acordo com Maia (2007), os projetos tinham caráter individualista, sem qualquer interesse coletivo, dado coerente ao refletido por Bauman (2001/2008) sobre a sociedade individualizada contemporânea. Lembramos que, de acordo com o sociólogo, a

individualização dificulta o estabelecimento de projetos que incluem o outro de forma ética.

Quanto aos demais estudos (Abreu, 2012, D’Áurea-Tardeli, 2005; Miranda, 2007), antes é necessário mencionar uma pesquisa realizada por La Taille e Madeira (2004), que apresentaram dados a respeito de projetos de vida de jovens com o claro intuito de investigação baseada na perspectiva ética. Vejamos a seguir algumas considerações sobre essa pesquisa para, em seguida, destacar alguns dados apresentados por D’Áurea-Tardeli (2005), Miranda (2007) e Abreu (2012) em seus estudos.

A fim de investigar a relação entre moralidade e legitimação de atos violentos, La Taille e Madeira (2004) propuseram-se uma análise de projetos de vida de adolescentes do ensino médio de uma escola pública de São Paulo. Uma das hipóteses dos autores era

a de que pessoas que, no plano ético, escolhem projetos de vida com forte grau de individualismo (projetos não coletivos, ou nos quais outrem não é visto como parceiro), inspirados na posse de bens materiais e glória, são mais inclinadas a legitimarem moralmente atos de violência do que pessoas que escolhem projetos de vida mais relacionados aos valores humanistas, às virtudes e à cooperação. (p. 12).

A pesquisa foi realizada em duas fases. Na primeira, os autores solicitaram que os adolescentes redigissem um texto respondendo à questão: “Imagine você mesmo daqui dez anos, do jeito que você desejaria que estivesse a sua vida” (La Taille & Madeira, 2004, p.

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