• Nenhum resultado encontrado

3. A SISTEMATIZAÇÃO DOS DADOS E O DEBATE TEÓRICO

3.3. A organização do trabalho pedagógico na formação dos professores do

3.3.1. O projeto e suas indicações: questões

Propomos-nos a analisar o projeto considerando as seguintes questões norteadoras: Quais os parâmetros teórico-metodológicos da proposta e as indicações para o trato com o conhecimento, os objetivos e avaliação e tempo e espaço? Quais as articulações indicadas para a materialização do projeto?

Um dos primeiros aspectos que nos chama a atenção ao analisarmos o Curso são as parcerias que estão envolvidas para viabilizar sua realização. O Curso de Pedagogia da Terra que serve de base às reflexões da formação dos professores do MST é um curso vinculado à Universidade do Estado da Bahia, integrando o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária – PRONERA. O Curso foi planejado para atender 120 estudantes divididos em duas turmas, vinculados a seis diferentes movimentos sociais e sindicais do campo, a saber: Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, MST; Coordenação Estadual dos Trabalhadores Acampados e Assentados, CETA; Federação dos Trabalhadores na Agricultura, FETAG; Movimento de Luta pela Terra, MLT; Fundação de Apoio aos Trabalhadores Rurais da Região do Sisal, FATRES; Pólo

de Unidade Campesina, Puc. Uma das turmas seria composta por 58 estudantes vinculados ao MST e dois vinculados ao Puc, e a outra turma receberia 33 estudantes vinculados à CETA, 20 à FETAG, 04 à FATRES e 03 ao MLT. A deliberação desta distribuição ocorreu em reunião do Colegiado Estadual do PRONERA, com a participação de todos os movimentos envolvidos.

Por ser um Curso financiado pelo PRONERA, segue o modelo de parcerias dos cursos deste Programa, sendo que os parceiros são a União, através do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, órgão do Ministério de Desenvolvimento Agrário - INCRA/MDA, responsável pelo financiamento e acompanhamento da execução do projeto; uma universidade pública ou comunitária, no caso a UNEB, responsável por acolher o curso, dando respaldo legal, e desenvolver a gestão dos recursos financeiros a ela repassados e a co-gestão pedagógica, sobretudo em relação aos docentes necessários para o desenvolvimento do curso; e os Movimentos Sociais, responsáveis pela mobilização do público e pela participação no acompanhamento pedagógico.

Um dos pontos centrais a destacar em relação a estas parcerias é que como os Cursos devem ser vinculados a uma Universidade para que haja o reconhecimento, devem estar adequados à legislação que regula os cursos oferecidos por estas instituições, e, portanto, inscrevem-se no quadro dos cursos formais da instituição, por maiores que sejam as peculiaridades que possam apresentar. No momento da elaboração de tais projetos, há uma forte disputa entre posições antagônicas dos diferentes movimentos sociais, entre estes e a universidade, enfim, entre os parceiros, que representam instâncias e interesses sociais muitas vezes opostos. Parece-nos que a questão das parcerias merece

maior aprofundamento, pois as instâncias nela envolvidas representam mecanismos de manutenção do status quo.

As determinações gerais do capital afetam profundamente cada

âmbito particular com alguma influência na educação, e de forma

nenhuma apenas as instituições educacionais formais. Estas estão estritamente integradas na totalidade dos processos sociais. Não podem funcionar adequadamente exceto se estiverem em sintonia com as determinações educacionais gerais

da sociedade como um todo. (MÉSZÁROS, 2005:43)

Reconhecemos, portanto, que mesmo com o Movimento Social apresentando uma concepção pedagógica progressista, já no processo de formulação do projeto dos cursos, passa por um processo de “adequação legal” para que possam ser aceitos em tais instituições, ou seja, passam a uma adequação para não romper com as determinações que o capital impõe para a formação, já que o papel central das instituições do estado burguês é a reprodução do próprio regime burguês.

Obviamente, este processo não se dá de forma linear. Há contradições que se apresentam mesmo nestes momentos, mas novamente MÉSZÁROS (2005) nos alerta que as instituições formais de educação são uma parte importante do processo de internalização, mas não são as únicas, e que a possibilidade de romper com esta lógica por elas imposta está apenas na mais consciente das ações coletivas.

Segundo o autor, fica bastante evidente que a educação formal não é a força ideologicamente primária que consolida o sistema do capital, e tampouco pode oferecer por si só uma alternativa emancipadora radical.

Acreditamos, portanto, que este aspecto, que muitas vezes tem passado desapercebido, joga um importante papel em evitar que as propostas em

gestação no seio de movimentos sociais confrontacionais à ordem do capital rompam com a lógica do capital imperante na educação atual.

Ao tempo que para superar o capital é necessário acessar os bens culturais e o conhecimento, historicamente construídos e acumulados pela humanidade, para que se possa compreender a realidade concreta e sobre ela intervir de forma consciente para transformá-la – e hoje, estes bens sob a lógica do capital transformam-se em força produtiva e como tal, sob o regime da propriedade privada, devem ser apropriados privadamente, e, portanto, confinam- se em espaços determinados, o que significa que poucos são os que podem acessá-los – não teríamos saídas. Entretanto, novamente é necessário compreender que a realidade sendo contraditória, há possibilidades inscritas nestas contradições de fortalecer uma perspectiva progressista de educação, desde que se tenha claro que é necessário uma transformação que não se limita a uma reforma das instituições do capital.

Limitar uma mudança educacional radical às margens corretivas interesseiras do capital significa abandonar de uma só vez, conscientemente ou não, o objetivo de uma transformação social qualitativa. (MÉSZÁROS, 2005:27)

Outro aspecto que nos parece importante atentar referente às parcerias é que muitas vezes quem se responsabiliza pela fundamentação dos projetos dos cursos desenvolvidos através deste tipo de parceria (PRONERA, Saberes da Terra, etc.) são pessoas ligadas às instituições parceiras, que nem sempre dominam e/ou concordam com a proposta pedagógica do Movimento. Entretanto, com isto não estamos afirmando que não se deva realizar os cursos devido a empecilhos deste porte. O que afirmamos é a necessidade de dar maior atenção à formulação destes projetos, podendo assegurar-se uma proposta de formação

mais avançada14 na direção do interesse dos que lutam pela superação do capital e suas determinações no processo de formação.

Pensar, portanto, uma proposta de formação em meio à complexidade das relações sociais de produção e de reprodução da vida dos homens e mulheres imersos no processo de luta pela terra, que ao tempo que buscam romper com as determinações históricas que os submetem à situação de sem terra, tendo a possibilidade de articular o processo de formação à prática concreta da luta pela terra e à alteração da base material de produção da vida, exige clareza da materialidade das relações sociais de produção e de reprodução da vida. Neste aspecto, é imprescindível apropriar-se de uma teoria que possibilite apreender o real enquanto concreto pensado, possibilitando com isso identificar os rumos da ação humana para a transformação desejada.

3.3.2. Indicações da prática: os parâmetros teórico-metodológicos

Documentos relacionados