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CAPÍTULO 2. DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS – OBJETO DE IMPUGNAÇÃO DO

2.1 Pronunciamentos do juiz

Anteriormente, no Código revogado de 1973, ao definir decisão interlocutória, bem como sentenças e despachos, o legislador equivocadamente enquadrou referidos pronunciamentos como espécies de atos judiciais. Da forma como previa o Código de 1973, os atos judiciais pareciam estar limitados apenas aos pronunciamos judiciais (sentença, decisão interlocutória e despacho)30, o que não é verdade. Muitos outros são os atos praticados pelos juízes, por exemplo, oitiva de testemunha, inspeção judicial, o que já era sinalizado pela doutrina31 e também jurisprudência.

O Código de 2015, por sua vez, ao tratar das decisões interlocutórias, sentenças, despacho e acórdão (art. 203) tentou sanar alguns vícios terminológicos32 da lei processual revogada e andou bem o legislador em alguns

30 José Carlos Barbosa Moreira já reconhecia o equívoco terminológico: “Em verdade, dentre os atos

que o juiz pratica no processo, há muitos outros – alguns de superlativa importância – que não consistem nem em sentenças, nem em decisões interlocutórias, nem em despachos: por exemplo, a inquirição de testemunha (art. 416) ou da parte (art. 344), a inspeção de pessoa ou coisa (art. 440), a tentativa de conciliação das partes (arts. 331 e 448).” (MOREIRA, Jose Carlos Barbosa. Comentários

ao Código de Processo Civil: arts. 476 a 565. 15. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010, p. 241), assim como Teresa Arruda Alvim (PINTO, Teresa Celina Arruda Alvim. Despachos, pronunciamentos recorríveis. In: Revista de Processo, vol. 58, São Paulo: Revista dos Tribunais,1990, p. 45-61).

31 Cf. WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. 4. ed. rev., atual. e ampl. São

Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 105.

32 Os vícios terminológicos estão na maioria das vezes relacionados à interpretação gramatical dos

dispositivos legais. Muito embora não possamos nos limitar apenas à interpretação gramatical, ela também é necessária e, consequentemente, a preocupação com as palavras e seus significados para

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aspectos, especialmente quando os qualificou como espécies do gênero “pronunciamentos judiciais”.

E não foi apenas quanto à substituição da expressão “atos do juiz” por “pronunciamentos do juiz” que acertou o Código. Também ao conceituar cada um dos pronunciamentos trouxe redação mais requintada e mais adequada, especialmente porque considera tanto finalidade quanto conteúdo, além de critério topográfico. Claro que deixou ainda muitas lacunas e incoerências33, mas, por outro lado, sanou alguns problemas da antiga redação adotada pelo Código de 1973.

Da forma como prevista no Código vigente, sentença foi definida como o pronunciamento que põe fim a fase cognitiva (finalidade)34, com fundamento nas matérias enumeradas nos artigos 485 e 487, do Código de Processo Civil (conteúdo).

Decisão interlocutória, por sua vez, é o pronunciamento judicial de natureza decisória (conteúdo) que não seja sentença (finalidade).

Já os despachos, por exclusão, são todos os demais pronunciamentos que não tenham finalidade nem conteúdo de sentença, ou decisão interlocutória, ou seja, não se revestem de conteúdo decisório que possa causar prejuízo a alguma das partes, por essa razão os despachos são irrecorríveis. A propósito, havendo prejuízo, naturalmente terá conteúdo decisório e consequentemente se enquadrará como decisão interlocutório e, portanto, recorrível.

É evidente, portanto, que os pronunciamentos judiciais podem ser divididos em duas categorias: com conteúdo decisório e sem conteúdo decisório. Aquelas

definir a abrangência de aplicação de uma norma é também de muita importância. Carlos Maximiliano já alertava que: “O processo gramatical exige a posse dos seguintes requisitos: 1) conhecimento perfeito da língua empregada no texto, isto é, das palavras e frases usadas em determinado tempo e lugar; propriedades e acepções várias de cada uma delas; leis de composição; gramática; 2) informação relativamente segura, e minuciosa quanto possível, sobre a vida, profissão, hábitos pelo menos intelectuais e estilo do autor; orientação do seu espírito, leituras prediletas, abreviaturas adotadas; 3) notícia completa do seu assunto de que se trata, inclusive a história respectiva; 4) certeza da autenticidade do texto, tanto em conjunto como em cada uma das suas partes.” (MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 88).

33 Por exemplo, ao estabelecer que a extinção do processo dar-se-á por sentença, no art. 316, do

Código de 2015.

34 Arruda Alvim, ainda acrescenta que também é por sentença que o juiz põe fim à fase de

cumprimento de sentença e da ação de execução (ALVIM, José Manoel de Arruda. Manual de Direito

Processual Civil. 17 ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2017, item 27.1).

sem conteúdo decisório correspondem aos despachos que, como já sinalizamos, não causam prejuízo e apenas se prestam para dar andamento, movimento ao processo.

A propósito, os despachos podem ou não ser apenas de mero expediente (ordinatórios). Quando meramente ordinatórios, que são aqueles que decorrem do impulso oficial do processo, que independem de qualquer juízo de valor e contribuem única e exclusivamente para dar andamento ao processo, podem ser praticados pelos servidores, podendo ser revisados pelo magistrado (art. 203, § 4º).

Sobre esse ponto, importante relembrar que nem sempre o sistema processual permitia que o processo caminhasse sem expressa determinação da autoridade competente. Nessa época, os despachos eram compreendidos como pronunciamentos sem conteúdo decisório, cujo conteúdo era apenas determinar a prática de atos que possibilitavam a marcha processual.

Apenas após a reforma do Código de Processo Civil de 1973, pela Lei nº 8.952, de 13 de dezembro de 1994, que os despachos deixaram de ser compreendidos como atos meramente ordinatórios, para serem compreendidos de forma mais abrangente.

Para exemplificar, pode ser considerado despacho o pronunciamento do juiz que recebe a inicial e determina a citação do réu, como esclarece Teresa Arruda Alvim35. Nesse exemplo, o pronunciamento ilustrado não poderia ser praticado de oficio pelo servidor e, por outro lado, também não se enquadra no conceito de decisão interlocutória, pela ausência de conteúdo decisório.

Na verdade, não é exatamente ausência de conteúdo decisório que diferencia os despachos proferidos pelo juiz das decisões interlocutórias, mas sim o prejuízo que causa à parte.

Outro exemplo que podemos mencionar é o pronunciamento do juiz que determina a realização de audiência de conciliação ou mediação. O conteúdo da decisão versa sobre realizar ou não audiência de conciliação e mediação, que não

35 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. 4. ed. rev., atual. e ampl. São

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diz respeito o mérito da causa, mas demanda um exercício discricionário quanto ao procedimento além de não causar prejuízo.

Já os pronunciamentos com conteúdo decisório, que obviamente podem causar prejuízo a uma das partes, são todas as decisões, em sentido lato36, que são justamente as sentenças e decisões interlocutórias, as quais serão melhor diferenciadas no tópico seguinte.