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Proporção entre linha e estrutura, dimensão e equilíbrio

Capítulo 1 Os Estudos Pedagógicos de Paul Klee

1.6 Proporção entre linha e estrutura, dimensão e equilíbrio

A partir da partitura da Sonata de J. S. Bach, Klee construiu um gráfico que abrange a tessitura de três oitavas. Nesse estudo, ele formulou um sistema, associando agrupamentos qualitativos para estabelecer padrões rítmicos e dinâmicas, e quantitativos, para organizar medições de valores rítmicos a partir das estruturas dos compassos musicais.

Dessa forma, Klee conduz o observador na visualização dos movimentos, que ele chamou de “variações entre as dinâmicas dominantes e passivas”, classificadas a partir das linhas melódicas graficamente representadas. Nas figuras 11 e 13, verificamos o movimento cíclico de estruturas regulares atuantes de acordo com a representação gráfica da partitura de Bach.

Fig. 12: Continuação do processo adotado a partir das notas em amarelo. Adagio da Sonata No. 6 para violino e cembalo, de J. S. Bach (comp. 1-2).

Fig. 13: Representação gráfica da notação musical por Paul Klee na segunda parte do processo de permutação no Adagio da Sonata No. 6 para violino e cembalo, de J. S. Bach (comp. 1-2).

No trecho final da permutação realizada por Klee, nota-se a omissão de seis notas durante o procedimento de transformação da notação musical em desenho gráfico: Ré#, Fá#, Mi#, Sol#, Dó# e Mi#.

Fig. 14: Adagio da Sonata No. 6 para violino e cembalo, de J. S. Bach (comp. 1-4).

Fig. 15: Representação plástica da notação musical por Paul Klee no terceiro segmento do Adagio da Sonata n. 6 para violino e cembalo, de J. S. Bach (comp. 1-4).

De acordo com essa análise, pudemos verificar o procedimento realizado pelo artista para representar graficamente a notação musical dos três primeiros compassos da seção do Adagio da Sonata No. 6, BWV 1019 de J.S. Bach.

Conforme comentário de Düchting sobre essa representação gráfica, veremos que o exemplo apresentado é de extrema importância para entendermos os conceitos trabalhados por Klee no que se refere aos elementos “individual” e “estrutural”, associados aos estudos da pintura e da música.

Tomando Bach como exemplo, Paul Klee explicou a diferença entre "individual" e "estrutural". O que ele chamou de "individual" são componentes pertencentes ao campo da composição musical, conceito que, em seguida, ele aplica no campo da pintura. O elemento "estrutural" ou "dividual" é parte de uma unidade maior caracterizada por repetições rítmicas sem variações e, portanto, divisível – pode ser dividida em unidades menores da mesma estrutura fundamental. Os componentes do "individual", por outro lado, são definidos como ritmicamente independentes, unidades não repetíveis, irregulares na composição, que permanecem essencialmente indivisíveis e podem ser facilmente combinadas com o ritmo estrutural. Uma terceira possibilidade seria a fusão de ambas as características rítmicas, a qual ele apontou em um trecho da sonata de Bach. Mesmo num trecho tão curto como esse, a função de cada parte “individual” muda continuamente para que não predomine a voz da melodia. Também o "estrutural" da peça às vezes pode assumir momentaneamente o papel de um elemento "individual", acima da linha melódica (DÜCHTING, 2002: 34-34). 28

Sobre o conceito estrutural na natureza, Paul Klee observa um dos menores agrupamentos reconhecíveis na matéria, exemplificando, o osso humano. Ele destaca sua constituição celular e tubular, os ligamentos e as fibras sinuosas de seu tecido. Também exemplifica as conexões entre os tendões e o tecido conjuntivo do músculo, reforçando o cruzamento desses órgãos. Dessa forma, ele introduz a relação entre estruturas na natureza humana.

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Using Bach as an example, Paul Klee explained the difference between “individual” and “structural”, or what he termed “dividual” components of musical composition, concepts that he then applied to the field of painting. The “structural” or “dividual” element is part of a larger unit characterized by rhythmic repetitions without variations and hence divisible – it can be divided up into smaller units of the same fundamental structure. The “individual” components, on the other hand, are defined as a superior, rhythmically independent, unrepeatable an irregular unit of composition, which remains essentially indivisible and can be easily combined with a structural rhythm. A third possibility would be the fusing of both rhythmic characteristics, a feature he pointed out in his excerpt from Bach’s sonata. Even in an excerpt as short as this, the function of each individual part changes continually so that no one voice dominates the melody and the “structural” parts sometimes rise above the melody line and take on the role of an “individual” element (DÜCHTING, 2002: 35-36, tradução nossa).

Podemos também fazer uma analogia do conceito estrutural de Paul Klee com a mineralogia: quando ocorre a formação de um cristal pelo arranjo de átomos, ou moléculas. Uma unidade agrupa outras unidades idênticas (ou não), constituindo agrupamentos maiores: uma rede cristalina. Essa estrutura é disposta de modo a formar uma determinada geometria, como por exemplo, um octaedro, um cubo, entre outros. Essa é uma propriedade física dos cristais, que em certos corpos minerais se apresentam de acordo com os planos de sua unidade estrutural, independendo de sua dimensão.

De acordo com as considerações de Düchting, veremos que a combinação dos elementos “individual” e “estrutural” constrói a plasticidade do desenho e, por assim dizer, a dinâmica e a fluidez do discurso do artista.

O gestual do maestro também foi outro tema explorado por Paul Klee, que identificou a interpretação da grafia musical no movimento da batuta. De acordo com as variações do gestual e as amplitudes dos movimentos desenhados no espaço, Klee foi estimulado a refletir sobre os pontos de encontro das linhas estabelecidas no ar.

Klee então passou a discutir as diferentes possibilidades de combinação do elemento “individual” com o “estrutural”. A partir dos movimentos produzidos por um maestro, ele desenhou uma representação gráfica para ilustrar o aspecto “individual” do seu movimento. Para adicionar um "elemento estrutural" a essa figura, Paul Klee escolheu uma linha qualitativamente não diferenciada que divide a linha "individual" em seções menores, produzindo assim uma "melodia, com acompanhamento estrutural". Figuras gráficas similares aparecem em vários dos desenhos de Klee desta época, como pode ser vista em “Desenhando com a Fermata” (DÜCHTING, 2002: 36-37). 29