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1.5 Revisão da literatura

1.5.3 Proposições teóricas

Percebe-se, então, que a terceira onda de democratização trouxe inovações para a justiça de transição, devido ao punir ou perdoar. Os países optaram pelo perdão e instituíram leis de anistias. Como consequência foram realizadas transições pacíficas. Várias vítimas e parentes de vítimas sentiram-se injustiçados, contudo, e passaram a recorrer a cortes internacionais, formando-se uma jurisprudência internacional sobre direitos humanos. Além disso, foram criados o Tribunal Penal Internacional, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos, e foi reconhecida a existência de crimes internacionais e a impossibilidade de leis de anistias nacionais deixaram violadores de direitos humanos impunes.

Assim, alguns consensos foram alcançados sobre anistias no cenário internacional, que valem ser condensados. Em primeiro lugar, a regra é a perseguição de criminosos, tanto no âmbito nacional quanto no internacional. Anistias são uma exceção, sejam elas gerais, políticas ou internacionalmente legítimas. Excepcionalmente podem ser instituídas anistias políticas, em transições políticas, mas apenas para as pessoas menos responsáveis, os violadores mais responsáveis devem ser perseguidos e punidos. E, mais excepcionalmente

ainda, podem-se instituir anistias gerais, em caso de barganhas políticas quando os líderes do regime predecessor não aceitam entregar o poder e serem punidos.

Em qualquer caso, contudo, elas devem ser sempre permitidas ou legítimas, ou seja, devem ser estabelecidas por meios democráticos e ter seu conteúdo restrito. O cuidado com leis de anistias é fundamental já que a sua instituição leva, a longo prazo, ao aumento de crimes violentos contra a humanidade devido a um sentimento de impunidade que se estabelece no país (PAYNE et al., 2008).

Diante de todo o exposto, foi possível o desenvolvimento das seguintes proposições teóricas:

P 1 – A lei de anistia brasileira é uma anistia geral;

2. Do Golpe à Anistia – uma análise política

Entre os anos de 1960 e 1970, diversos países na América do Sul enfrentaram disputas entre nacionalistas, defensores do desenvolvimento interno do país, e internacionalistas, alinhados à política externa norte-americana. Nos países onde o nacionalismo ascendeu, golpes militares promovidos pelos internacionalistas instalaram ditaduras. Assim, Chile (1973-1990), Uruguai (1973-1985), Argentina (1976-1983) e Brasil (1964-1985) passaram a viver sob regimes autoritários. Cada um com características próprias.

Sob o comando do general Augusto Pinochet, em 11 de setembro de 1973, as forças armadas chilenas tomaram o poder, e o então presidente, Salvador Allende, suicidou-se. A ditadura chilena foi marcada pelo personalismo, pois durante todo o regime militar o general Pinochet governou. E seu fim deu-se em 1990 quando, por meio de um plebiscito, ele foi destituído do poder. Estima-se que 03 mil pessoas foram assassinadas e 30 mil torturadas (ARGENTINA e Chile..., 2005).

Além disso, Pinochet era o líder da operação Condor, um plano de cooperação militar entre Argentina, Brasil, Chile, Paraguai e Uruguai destinado à prática de terrorismo de estado. Segundo Cezar Mariano (1998), a operação Condor teve seu nome inspirado no condor, uma ave de rapina que voa a seis mil metros de alturas e é comum na América do Sul, e funcionava como um MERCOSUL para o terror. Este acordo propunha que as barreiras geográficas e políticas desses países fossem derrubadas, formando-se um grande banco de dados sobre inimigos políticos, uma central de informação e apoio administrativo a fim de persegui-los e eliminá-los. Não se sabe se todas essas medidas foram alcançadas, mas é indiscutível a existência de ações integradas.

No Uruguai, a ditadura também teve inicio em 1973 e terminou em 1985. Durante esse período, O Uruguai sofreu fortes influências de seus países vizinhos. Segundo Martínez (2006), a ditadura uruguaia foi influenciada tanta pela brasileira, inspiradora de seu modelo econômico, como pela chilena, fonte de seu modelo repressivo. O regime uruguaio iniciou-se em 1973 e logo dissolveu o parlamento com o apoio do presidente Juan María Bordaberry, iniciando-se um período de eliminação dos possíveis inimigos. Em 1976, o presidente Bordaberry foi deposto e o regime, visando sua institucionalização, realizou um plebiscito.

Iniciou-se, então, o período chamado “ditadura fundacional”, quando o regime tentou explicar seus princípio e justificar suas ações por meio da edição de livros didáticos (MARTÍNEZ, 2006), uma doutrinação pode-se dizer. Estima-se em 400 o número de mortos e desaparecidos no Uruguai ainda hoje (BRASIL, 2007).

Na Argentina, houve um primeiro momento de ditadura militar entre 1966 e 1973. Em seguida houve um período de três anos de governo civil e, em 1976, os militares voltaram ao poder de onde só saíram em 1983, ficando conhecidos como os anos de “Guerra Suja”. Diz-se que a ditadura argentina foi a mais sanguinária das ditaduras da América do Sul. Houve entre 16 e 21 mil pessoas mortas, entre os quais crianças e idosos. Sabe-se que cerca de 09 mil pessoas identificadas estão desaparecidas; 1.898 cadáveres foram localizados e identificados, e entre 05 e 09 mil pessoas, cujo desaparecimento não foi denunciado ainda, não foram localizadas (SAIN, 2000). Houve também o seqüestro de bebês de desaparecidas políticas, o que gerou o movimento das avós da Praça de Maio, que exigia esclarecimento sobre cerca de 30 mil desaparecimentos (ARANTES, 2009). Entre as modalidades de morte, costumava-se jogar pessoas vivas de aviões que sobrevoavam o rio Prata ou o Oceano Atlântico, amarravam-se prisioneiros uns aos outros para dinamitá-los, praticava-se fuzilamentos e torturas cruéis (as quais incluíam desde afogamentos até a introdução de ratos famintos dentro da vagina das torturadas).

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