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Proposta de uma abordagem semiótica do projeto de design

Os aspectos teóricos da semiótica que apresentamos neste trabalho pretendemos que sejam elementos introdutórios para que se desenvolva uma metodologia semiótica em design. Da articulação de aportes de autores de várias origens, montamos uma seqüência de procedimentos com o objetivo de munir os designers de caminho facilitador de captar modos as mensagens em um produto ganham significação. Com isso, visamos que esses profissionais possam desen­ volver seus projetos de modo que os produtos resultantes cumpram com eficácia os seus propósitos comunicacionais.

Nem sempre é fácil apreender o que um cliente de fato almeja. Menos ainda é identificar os modos sutis pelos quais um indivíduo lê, interpreta um produto.

Numerosos são os modos que possibilitam atingir um objetivo comunicadonal em um projeto de design. Se nós apresentamos a seguir

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uma sistematização para o desenvolvimento da solução de projeto, não pretendemos que ela seja a única ou a melhor.

Entretanto, é importante frisar que o caminho traçado foi constru­ ído de modo consistente, já testado e com resultados bem-sucedidos.

Identificaçãodos Valores Centrais

Quando se quer comunicar algo, seja a identidade de uma empresa, uma campanha de saúde pública, um evento, temos que considerar que este algo já tem uma personalidade. Esta personalidade é um reflexo da visão e das intenções dos que são responsáveis pelo empreendimento e pode ser apontada pelo modo como este algo se mostra e se coloca nas contingências de sua ocorrência.

Algumas perguntas podem ser feitas para se delinear essa personalidade:

* Que desafios, mudanças e expectativas se pretendem enfrentar? * Quais são as medidas estratégicas necessárias para atingir aqueles objetivos? Quais são as competências necessárias?

a Que recursos (humanos, tecnológicos, informadonais) são neces­ sários? Que produtos e serviços são requeridos para atingir o intento?

As etapas da estratégia consistem geralmente de enunciados, relativamente genéricos, que devem, de início, ser decompostos em suas diferentes partes. Esta decomposição se faz segundo a técnica de brainstorming, ao longo da qual os componentes são classificados segundo a sua importância para o conceito total. Uma primeira pos­ sibilidade de controle do processo surge quando os resultados dessa sessão de brainstorming são formulados como um "re-briefing", e analisados com o cliente.

Cabe ressaltar que os elementos concernentes á identidade visual são só um aspecto de uma identidade global.

Primeira Parte:

Construindoum Personagem

O designer tem o compromisso de comunicar mensagens por meio de uma linguagem formal. Portanto, para desenvolver um projeto de design, seja de um Objeto de uso, seja de um sistema de informação, é necessário que sejam identificadas as qualidades centrais que estejam implícitas no objetivo estratégico de um em­ preendimento, aquelas três ou quatro palavras que expressem o sentimento, a combinação única de valores centrais que seja a base de sua existência, aquelas que, se forem abandonadas, tornam sem sentido aquilo que se pretende alcançar.

Qualquer que seja o conteúdo a ser comunicado por intermédio de um meio perceptivo, o designer precisa estar seguro quanto à voz que melhor representa a posição do empreendimento.

O designer deve ter muitas reservas ao receber um briefing do cliente. Este tipo de documento, muitas vezes, não corresponde a um diagnóstico consolidado de necessidade.

Um projeto se destina a um certo tipo de público, por mais geral que ele seja. O designer deve ter claro quais são as características fundamentais desse público, para tomar mais palpável, mais concreta essa entidade amorfa que é o público-alvo. O modo que Patrick Jordan (2002) propõe para tomar tangível esta entidade é a construção de um personagem que tipifique esse Interlocutor.

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Os Geradores do projeto elaboram esse perfil:

a sexo, idade, nível cultural, padrão econômico, estrutura fami­ liar, vida afetiva, perfil profissional, interesses pessoais, estilo de vida, modo de se vestir, valores morais, hábitos, metas e, por que não, um suposto retrato.

A partir desses elementos exaustivamente detalhados, será o mo­ mento de identificar como o produto em pauta poderá funcionar em relação aos tipos de prazeres que, segundo Jordan, Lionel Tiger identificou:

a Prazeres fisiológicos: dizem respeito ao corpo, às percepções

sensoriais, às primeiras impressões;

a Prazeres sociais: tratam do relacionamento entre pessoas

próximas, do status socioeconômico, do status cultural, de fatores inclusivos ou includentes;

a Prazeres psicológicos: abordam a satisfação de necessidades

emocionais e afetivas;

a Prazeres ideológicos; são aqueles que envolvem valores

morais, geracionais, de nacionalidade e crença.

Cada tipo de indivíduo guarda algumas expectativas em relação ao produto. Ao se obter a síntese de três, quatro ou cinco palavras que particularizem este estado, pode-se começar a buscar os elementos ma­ teriais que o expressem. Passa-se, então, à segunda parte do método.

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Segunda Parte:

Encontrandouma Voz Visual

O procedimento que apresentamos (Bonnici: 1999) foi elabora­ do para ser feito em equipe, por todos os interessados no projeto de

design. Essa equipe pode incluir investidores, fornecedores, clientes, empregados, membros da comunidade, assim como aqueles que são responsáveis por definir um rumo e por transmitir a imagem obje­ tivada, sejam publicitários, profissionais de marketing, todos sob a orientação do designer.

O objetivo da atividade, como dissemos, é a compreensão dos valores essenciais do empreendimento. Deve ser feita uma listagem de todas as palavras que podem expressar valores rela­ cionados a este empreendimento. Este rol precisa ser feito de modo intuitivo e espontâneo.

A seguir, os termos selecionados serão analisados e a equipe faz sucessivas eliminações até chegar a uma síntese: três ou quatro palavras, que então serão escritas em cartões. Sobre uma mesa coberta com papel em branco são espalhados recortes de imagens. São cerca de 150 pedaços de páginas de revistas, rasgados sem maior cuida­ do. Deve haver a precaução de garantir que seja reduzido o caráter figurativo dos recortes: imagens em que haja predomínio de cores, texturas, linhas, formas abstratas.

Os componentes do grupo retiram as imagens que não evo­ carem simultaneamente todas as qualidades desejadas. E também separaram aquelas que particularmente evoquem o conjunto das três ou quatro palavras.

O objetivo desse procedimento é captar como o conjunto de atributos sintetizados se expressa perceptualmente para os integrantes do grupo. Não se trata de uma tarefa simples nem rápida, com duração entre uma a duas horas.

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À medida que o grupo for reduzindo o número de recortes que se ajustam ao conjunto de qualidades definidas, deve ser retirada a imagem que se destaque, atraindo para si o olhar. A meta é fazer com que o olho perceba os recortes restantes como um todo e não fique se movendo de um para outro. A posição das imagens deve ser alterada durante o processo, pois não se quer fazer uma colagem. As escolhas vão se fazendo de modo cada vez mais espontâneo, ancorado

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na memória, na cultura perceptiva dos integrantes do grupo Ao se chegar a um consenso a respeito de cerca de dez recortes restantes do universo inicial, o designer tem em mãos um briefing formal do empreendimento. Ao analisar esse material, o designer deve identificar elementos recorrentes na amostragem, como

a características das cores;

* o nível de luminosidade dominante;

* se as cores são saturadas, paracromáticas ou acromáticas, claras ou escuras; '

± se as cores são análogas, contrastantes, complementares; ± se os acordes são consoantes ou dissonantes;

a se há repetição de motivos, formando padrões;

* os tipos de texturas presentes;

± a dominância das espessuras e das formas de linhas e de áreas.

De posse da síntese feita, o designer tem um balizamento para a construção do enunciado a que se propõe, dando, assim, a "voz" formal à "personalidade" do produto, seja ele de que natureza for.

Fluxograma / Enunciados da estratégia de comunicação / nAoc Análise e hierarquização dos componentes do enunciado ▼ sim Tabulaçà o dos elementos do enunciado ► T ▼ NÃO Diferenciação segundo os tipos de signoProdução de associaçõesElaboração de esboços ▼ ► compreensãoTestes de ▼ ▼ <9 K> > 0 3 Fmalização

Figura 12 - 0 fluxograma mostra a sistematização do processo, por meio das etapas da estratégia. Parte-se do princípio que a solução do problema é elaborada por um trabalho em equipe, envolvendo designei; clientes e fornecedores.

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Cabe ao designer decidir quais serão os enunciados que devem ser transpostos sob uma configuração imagética, seja figurativa ou tematizada, e quais os que convêm transpor verbalmente. As duas transposições podem, em geral, ter uma expressão materializada, pois existem vários elementos que podem ser ligados, formando uma rede de associações a partir da qual se construirá um conceito formal.

Terceira Parte:

Associaçõesnas Classes Sígnicas

A etapa seguinte consiste em organizar sob a forma de ta­ bela as representações alfapictóricas de todos os componentes dos enunciados, tendo em vista as suas relações possíveis com o Objeto (indiciai, icônica e simbólica).

componente 1 do enunciado componente 2 do enunciado componente 3 do enunciado ICONICA representação gráfica

categoria 1 do componente 1, de relação segundo a categoria 1 comoÓbjeto da relação com o Objeto

representação gráfica do-componente 2, segundo a categoria 1 da relação com o Objeto

representação gráfica do componente 3, segundo a categoria 1 da relação com o Objeto INDIC1AL representação gráfica

categoria 2 do componente 1, de relação segundo a categoria 2 com o Óbjeto da relação com o Objeto

representação gráfica do componente 2, segundo a categoria 2 da relação com o Objeto

representação gráfica do componente 3, segundo a categoria 2 da relação com o Objeto SIMBOUCA categoria 3 de relação com o Óbjeto representação gráfica do componente 1, segundo a categoria 3 da relação com o Objeto

representação gráfica do componente 2, segundo a categoria 3 da relação com o Objeto

representação gráfica do componente 3, segundo a categoria 3 da relação como Objeto

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Cada célula da tabela corresponde a um princípio de represen­ tação para o componente do enunciado visado.

Cada item da tabela é analisado por seus elementos imagéticos, isto é, decompostos em Qualisignos, Sinsignos, Legisignos. Não é difícil perceber que o número de possibilidades se multiplica neste

estágio, porque cada unidade é, muitas vezes, composta de uma série de signos dos três tipos. O processo de seleção é muito intenso nesta fase, pois como dito anteriormente, existem vários elementos que po­ dem ser ligados, formando uma rede de associações que irá construir um conceito formal.

O número de conexões possíveis é, em princípio, infinito, pois estamos perante uma verdadeira gramática que permite um infinito de enunciados. São várias as formas de expressar um conceito. Porém, o caminho a ser escolhido será fundamentado na análise dos componentes do enunciado visado, podendo propiciar mais facilmente um sentido para o Interpretador.

Na prática, a tabela completa é usada só como um apoio ao planejamento, porque, na base da hipótese empiricamente verificada, há claras conexões entre a natureza e o conteúdo dos enunciados visados e as suas expressões sígnicas.

Algumas importantes decisões projetuais são tomadas na fase analítica dos componentes do enunciado, quando o designer esboça uma gama de modos de representação dos atributos propostos no projeto.

Geraçãode Alternativas

É neste ponto do processo de design que são feitos os esboços. Assim, a seleção ulterior tem uma função determinante. A seleção se fará melhor por meio de um outro brainstorming, em que o enunciado de cada esboço seja discutido. Este tipo de discussão permite confrontar as diferentes propostas, levar à concretização das abordagens preliminares e passar à etapa seguinte da elaboração.

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teoria semiótica, com a diferenciação dos vários tipos de signos nas diferentes dimensões.

As alternativas resultantes são submetidas a uma avaliação em­ pírica por meio de testes comparativos, para se fazer a seleção. Com isso, pretende-se verificar se a solução adotada veicula os conceitos inicialmen­ te definidos. O resultado final cumpre, assim, o objetivo da metodologia adotada: dar expressão formal ao propósito comunicacional.

A decisão final e a realização do projeto são, então, feitas com base sobre este último controle e seleção. Se até neste ponto se chegou a uma única solução, os benefícios da sistematização podem ser usados no desenvolvimento de um amplo projeto. A consistência, nesses casos, existe não só numa recorrência superficial de fatores constantes, mas resulta da aplicação uniforme de princípios de design, que ao mesmo tempo abrem um amplo espectro de possibilidades.

O designer, ao utilizar elementos de linguagem, em princípio denotativos, do repertório presumido do Interpretador do produto, considera como definida a sua dimensão pragmática. Do mesmo modo, os enunciados elaborados dentro do quadro dessa estratégia são consi­ derados como dotados de características tais que propiciem o tipo de comunicação almejada.

Avaliaçãoda Comunicaçãodo Produto

a definição dos requisitos a serem testados;

a possibilidade de isolar os aspectos a serem testados;

a consistência dos requisitos a serem testados; a possibilidade de reavaliação dos testes;

a avaliação de imagens semelhantes e concorrentes;

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