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1. INTRODUÇÃO

3.1 O QUE É O CUIDADO?

Para iniciarmos esta reflexão precisamos adotar um significado para a palavra cuidado. Buscando seus significados, encontramos cuidado como desvelo, zelo, atenção, preocupação, responsabilidade e inquietação de espírito. É também perceber a outra pessoa como ela é, como se mostra, seus gestos, suas falas e suas limitações (BRASIL, 2008a, p.7). Contudo adotaremos a reflexão feita por Boff (1999, p.33), que contempla todos estes significados, acrescidos da atitude do cuidar, da responsabilidade que envolve este significado, para Boff,

Cuidar é mais que um ato; é uma atitude. Portanto, abrange mais que um momento de atenção, de zelo, de desvelo. Representa uma atitude de ocupação, preocupação e de envolvimento com o outro.

Na saúde, o modelo assistencial dominante nos serviços é a hegemonia do poder médico neoliberal, que reduz o cuidado a um papel irrelevante e apenas complementar (MERHY, 2004, p.113). Contudo, as relações de trabalho e cuidado não podem se comportar nesta relação sujeito-objeto, das práticas capitalistas, mas sim a relação deve ser sujeito-sujeito, como descreve Boff,

O Cuidado não é domínio sobre, mas convivência, não é pura intervenção, mas interação e comunhão. Cuidar das coisas significa ter intimidade, senti- las dentro, acolhe-las, respeitá-las, dar-lhe sossego e repouso. Cuidar é entrar em sintonia, auscultar-lhe o ritmo e afinar-se com ele (BOFF, 1999, p. 95-96).

Hoje, a busca do cuidado é uma das principais demandas por atenção à saúde pela Sociedade Civil Brasileira (PINHEIRO; GUIZARDI, 2004, p.21). O cuidado não é tido como um nível de atenção do sistema de saúde e também não é visto como um procedimento técnico, mas como uma ação integral (PINHEIRO; GUIZARD, 2004, p. 21). “é o tratar, o respeito, o acolher, o atender o ser humano em

seu sofrimento, em grande medida fruto da fragilidade social” (LUZ, 2004). Com isso cuidado está sendo um desafio para a saúde pública, pois diverge do modelo hegemônico biomédico vigente, centrado em conhecimentos e tecnologias (MACHADO; PINHEIRO; GUIZARDI, 2004, p.57). Somado a isto, o desafio se torna maior quando agregamos os problemas sociais que a população vive, com intensos conflitos e problemas, que são identificados como problemas de saúde, pois geram sensações de ansiedade, angústia, infelicidade, solidão (idem, p.58), com impacto direto na saúde das pessoas e nos seus sofrimentos.

De acordo com Lacerda e Valla (2004, p. 92) “para conhecer a natureza do sofrimento humano e aliviá-lo, é preciso superar a dicotomia existente entre a teoria e a prática médica, entre mente-corpo e subjetividade-objetividade, centrando-se no sujeito humano sofredor e seu cuidado”. Para os mesmos autores a atitude de cuidar do outro, pode contribuir para aliviar o impacto do adoecimento e sofrimento do doente. O cuidado deve considerar além do corpo físico, as emoções, as histórias da vida e os sentimentos da pessoa cuidada (BRASIL, 2008a, p.7).

Para Cecílio (2006, p.116) que adota a indicação de Stotz (1999) e reconhece que a necessidade de saúde é social e historicamente determinada, é necessária a adoção de alguma taxonomia de necessidades de saúde. Para o autor, ele divide a necessidade de saúde em quatro conjuntos: necessidade de “boas condições de vida” funcionalista e ambiental; necessidades de acesso às tecnologias (leve, leve- dura e dura) de acordo com cada indivíduo e em cada singular momento que vive; necessidade de criação de vínculos afetivos entre usuário e profissional com relação de confiança, e por fim, o último conjunto é a necessidade própria de cada indivíduo de ter autonomia de conduzir o seu modo de levar a vida (CECÍLIO, 2006, p. 116/117).

Entendemos conforme Merhy et al. (1997) que a tecnologia compreende e abrange saberes e a materialização destes saberes na geração e utilização de produtos, mas também saberes de relações humanas. As tecnologias na área da saúde são agrupadas e divididas em categorias: 1) tecnologia dura, que é composta por máquinas, ferramentas, exames, laboratórios, medicamentos; 2) tecnologia levedura, representadas por conhecimentos e saberes profissionais, bem estruturados, como a clínica médica, o saber da enfermagem, o conhecimento do

medicamento pelo farmacêutico; 3) tecnologia leve (MERHY, 2004, p.111). Na última, nos deteremos mais minuciosamente para definir, já que o cuidado está inserido neste tipo de tecnologia, e o cuidado no contexto da doença de Alzheimer é nosso objeto de estudo.

Merhy (2004) explica muito bem a tecnologia leve quando falando sobre ela e diz,

Qualquer abordagem assistencial de um trabalhador de saúde junto a um usuário-paciente produz-se através de um trabalho vivo em ato, em um processo de relações, isto é, há um encontro entre duas pessoas, que atua uma sobre a outra, no qual opera um jogo de expectativas e produções, criando-se intersubjetivamente alguns momentos interessantes, como os seguintes: momentos de fala, escuta, interpretações, nos quais há a produção de uma acolhida(...), cumplicidade(...), responsabilidade, em torno do problema que vai ser enfrentado, momentos de confiabilidade e esperança, nos quais se produzem relações de vínculos e aceitação (MERHY, 2004, p.111).

Estas definições de cuidado, seja na sua forma simbólica e de significados das relações, seja como caracterizado nos serviços de saúde como uma tecnologia assistencial, estão diretamente envolvidas no contexto da doença de Alzheimer. Pois, neste contexto, o cuidado tem que acontecer em duas vias paralelas de atenção, o cuidado ao doente de Alzheimer pelo familiar cuidador e pela equipe de saúde, e o cuidado aos cuidadores pela equipe de saúde. Com isso, como defende Lacerda e Valla (2004, p.99), o cuidado não é mais restrito à dimensão técnica, mas a dimensão da integralidade das ações em saúde. Para Xavier e Guimarães (2008, p. 152), “a integralidade é essencialmente cuidado”. E com isso promover cuidado é promover integralidade (idem).

Para acentuar ainda mais a importância do cuidado nos serviços de saúde, de forma integral ao contexto social, não apenas o cuidado biológico da patologia, apoio a colocação de Merhy (2004, p.116) que relata que o cuidado em saúde “resulta em cura, promoção e proteção da saúde individual e coletiva”. No contexto deste estudo, poderemos cuidar do paciente de Alzheimer e deixar de lado o seu cuidador, que encontra-se em situação fragilizada? Isso é cuidado integral? É preciso urgentemente fazer valer a integralidade de acordo com sua institucionalização na Lei 8.080/90, pois integralidade não significa apenas incorporar todas as tecnologias

dura e leve-dura disponíveis no mercado, é preciso ofertar estas tecnologias de acordo com as necessidades sociais, para isto é preciso conhecer as necessidades dos pacientes e não apenas as exigências terapêuticas, por isso a tecnologia leve deve se apresentar de forma transversal durante todo processo de atenção à saúde.

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