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Capítulo 3 – IMPROVISAÇÕES E ENSAIOS: O ENSINO DE TEATRO NA

3.1 O QUE PERGUNTAR QUANDO JÁ SE ASSISTIU AO ESPETÁCULO

Para elaborar as questões e poder organizar os depoimentos, fiz uma entrevista piloto com um professor que se adequasse ao perfil dos que participariam da pesquisa. Esse professor (como a maioria dos entrevistados) tem formação em Artes Cênicas pela UDESC e leciona nas escolas públicas municipais de Florianópolis. A entrevista piloto focalizou a questão central desta pesquisa, que se consolidou no decorrer do processo: Como ele planeja o ensino de teatro na educação escolar? Essa questão apontou para outras que ajudaram a traçar um perfil do professor com habilitação em Artes Cênicas na rede de ensino pública estadual, em Florianópolis.

Tais questões abordavam a trajetória profissional dos entrevistados e suas perspectivas educacionais:

1 – Descreva como foi seu caminho (sua trajetória) da universidade até a sala de aula. 2 – Como foi seu ingresso na escola? Que dificuldades você encontrou? Como foi a recepção da comunidade escolar? Como foi a relação com a direção, com os colegas, com os alunos, com os pais?

3 – Como você trabalhava no início da profissão? O que você fazia de forma diferente da que faz hoje? O que mudou?

4 – Como você pensa que a escola vê o ensino de teatro?

5 – Como você planeja, organiza as aulas? Como escolhe a metodologia e os conteúdos?

6 – Você usa livro didático? Qual? Como? 7 – Você usa materiais didáticos? Quais? 8 – Como você percebe que o aluno aprendeu?

9 – Quais as maiores dificuldades que você encontra em seu trabalho?

10 – Na sua trajetória profissional, você fez cursos que auxiliaram no trabalho?

11 – Continua atuando como ator? É possível conciliar a atividade na escola com a profissão?

12 – Por que continua na escola? O que faz com que fique na escola?

13 – Como você vê hoje a formação que teve? O que faltou? O que contribui para o trabalho hoje?

Essas treze questões nortearam as entrevistas e apontaram outros focos de pesquisa no campo do ensino da arte, em geral, no âmbito da sala de aula.

Dos doze professores com habilitação em Artes Cênicas em atividade no quadro de professores, três não participaram da pesquisa, por não terem tempo disponível.

Coletei nove depoimentos gravados em fitas magnéticas formato K7, sendo que um não foi transcrito para esta pesquisa e dois não se enquadraram nos critérios escolhidos: ser licenciado e efetivo.

O critério ‘licenciado em Artes Cênicas’ corresponde intrinsecamente ao objeto desta pesquisa, ou seja, o ensino de teatro na sala de aula. Já o critério ‘efetivo’ teve como fundamento a hipótese de que a estabilidade profissional seria referência para um trabalho planejado a médio e longo prazo, característica que não é própria somente do professor efetivo, mas também do professor admitido em caráter temporário (ACT). Portanto, o critério ‘efetivo’ perdeu o sentido no desenvolvimento desta pesquisa.

Todos os professores entrevistados são licenciados em Artes Cênicas pela UDESC. A pesquisa apóia-se nos depoimentos desses seis professores, dos quais um estava afastado da sala de aula, ocupando o cargo de direção de escola, e os demais atuando em sala de aula.

As entrevistas aconteceram no período de 29/09/2003 a 24/10/2003. Das seis entrevistas, duas foram colhidas na residência dos depoentes, uma na biblioteca da SEDI e três nas escolas. Dados pessoais, como idade, filhos, estado civil não foram coletados em momento algum da pesquisa, sendo que eles apareceram informalmente em alguns depoimentos. Antes de começar o diálogo entre os capítulos anteriores e os depoimentos transcritos, penso ser necessário mostrar quem são os atores da pesquisa, para isso, utilizo ordem numérica para preservar a identidade dos professores e professoras.

Professor 1: Diretora da escola eleita pelo voto da comunidade escolar. Começou a carreira como professora das séries iniciais. Cursou o magistério e graduou-se em Artes Cênicas. É licenciada em Dança. É atriz e militante de movimentos sociais, em particular, do Movimento Negro. Tem 22 anos de atuação profissional. É mãe de um menino.

Professor 2: Professora com dois anos de atuação profissional. Leciona de 1ª a 8ª série e Ensino Médio. Trabalha com produção teatral. Mãe de um filho.

Professor 3: Ingressou na licenciatura de Artes Cênicas com a intenção de ser professora e, no período em que estudou, defendeu a manutenção do curso como licenciatura, sempre que se promovia a possibilidade do bacharelado. Começou a carreira como professora licenciada em Artes Cênicas na rede pública municipal e tem pós-graduação não concluída em Formação do Ator, pela UDESC. É professora concursada para a disciplina de Arte, na rede pública estadual de ensino há três anos. Leciona de 5ª a 8ª série, Ensino Médio e Magistério. É casada e mãe de um filho.

Professor 4: Professor licenciado em Artes Cênicas pela UDESC e com três anos de atuação profissional na rede estadual de ensino. Leciona de 5ª a 8ª série. Teve longa carreira universitária, sendo aluno da licenciatura por sete anos. Vivenciou a história da formação do curso de licenciatura, que iniciou querendo ser ator e concluiu já com desejo de ser professor. Deu pouca atenção para as cadeiras voltadas para a educação e dedicou-se às cadeiras de atuação. É casado e pai de um filho.

Professor 5: Professor com duas licenciaturas, uma em Artes Plásticas e outra em Artes Cênicas. Começou a carreira como professor concursado somente após a licenciatura em Artes Cênicas. Leciona de 1ª a 8ª série. É ator de teatro, cenógrafo e atuou como bolsista na direção de ensino da UDESC, monitor das disciplinas de Sociologia, Metodologia de encenação 2 e Teatro. Retornou como professor efetivo há três anos. É solteiro.

Professor 6: Começou a carreira no ensino público municipal em Lages, como professor licenciado em Artes Cênicas. Tem 12 anos de atuação profissional, dos quais os setes últimos foram na rede pública estadual de ensino. Leciona de 1ª a 8ª série. Trabalhou como ator de TV, cinema e teatro. É solteiro.

Dos entrevistados, três são mulheres e três, homens, o que, na profissão de professor, torna-se situação peculiar, pois o magistério é composto em sua maioria por mulheres. Na condição de professores de Arte, o índice feminino é também hegemônico, no entanto, no caso da arte cênica, houve equilíbrio com relação ao gênero.

Houve diferenças nas manifestações dos entrevistados quanto a exercer as profissões ator e professor. Quatro deles referiram-se a serem bons atores, sendo que um sente ser um desperdício estar em sala de aula, enquanto poderia estar atuando, porém, ressalta que a profissão de professor lhe oferece estabilidade financeira e vínculo a um plano de saúde, coisa de que não dispunha no período em que se dedicava à profissão de ator. Outros dois referem-

se a ter optado pela profissão professor, em detrimento de uma carreira de sucesso como atores.

Somente um dos entrevistados era professor antes da graduação, os outros todos se tornaram professores depois de terem se licenciado. Somente um deles atua em duas redes de ensino público, municipal e estadual.

O campo pesquisado apresentou riqueza de possibilidades de pesquisa. Ao perguntar sobre o ensino de teatro no âmbito da sala de aula, abriu-se um leque acerca do ensino de arte, das condições de trabalho, das relações com a direção escolar, com os alunos, com o conteúdo, com a aprendizagem, com avaliação. Os referenciais teóricos da arte e da aprendizagem, advindos da formação universitária, defrontaram-se com as necessidades e possibilidades dos alunos e dos educadores.

Como esta dissertação tem por foco o ensino de teatro em sala de aula, destaquei do resultado das entrevistas três categorias de análise para problematizar:

1 – Arte e contexto educacional: polivalência e linguagem específica; 2 – Ser ator e ser professor: um é reflexo do outro.

3 – Prática de teatro na sala de aula: ensinando com os exercícios aprendidos na licenciatura.

Essas três categorias não estão separadas entre si, mas se apresentam ligadas constantemente, não só por suas aproximações, mas em suas contradições, entendendo que as contradições tiram as pessoas dos eixos preconcebidos da certeza e desvelam novas possibilidades. A partir disso, o intento deste capítulo é estabelecer os pontos de encontro entre essas contradições e aproximações, no que elas aproximam o ensino de teatro como ensino de arte no contexto escolar.

3.2 ARTE E CONTEXTO EDUCACIONAL – POLIVALÊNCIA E LINGUAGEM