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Em se tratando de enunciado de situações-problema, identificamos que esse tipo de gênero textual possui traços linguísticos e estéticos particulares. Polya (2006) apresentou em seu artigo algumas considerações pedagógicas sobre a resolução de problemas, tomando como base o ato de resolver como a abstração da linguística, e ele propõe que tal processo ocorre em quatro fases: i) compreensão do problema; ii) estabelecimento de um plano; iii) execução de um plano; e iv) retrospecto.

Em primeiro lugar, vemos números que se destacam dentre as palavras. Existe uma tendência em relação aos números se destacarem ao olhar do aluno, pois sabem que precisam fazer algo com eles, por isso pensamos que experimentos sobre o modo de leitura seriam bem-vindos, principalmente com o dispositivo eye tracker (DUCHOWSKI, 2007). Após o destaque dos números, outros componentes também são salientes, como verbos específicos que indicam as operações, como gastar, comprar, ganhar, dividir, dobrar etc., ou até mesmo formas nominais como metade, dobro, dúzia, entre outros. Com base nisso, Braguil et al. (2017) apontam que o aluno não interpreta o enunciado, pois só lê buscando por dados relevantes que auxiliarão na resolução do problema, vê-se os passos determinados por Polya (2006), no entanto, essa leitura seletiva não garante que os dados coletados sejam estabelecidos e executados de forma coerente, já que não há o processo interpretativo, somente o de compreensão, ou seja, o aluno não interpreta, não relaciona o que está escrito com seu conhecimento, mas só compreende o que está escrito. Isso faz com que não ocorra uma leitura aprofundada e crítica, mas superficial, dado que evita uma conexão com suas necessidades. Tal ação potencializa a falta de indagações e leitura crítica. O que estamos tomando como leitura crítica é aquela que considera variáveis e entende que nem sempre “somar” implica em adicionar coisas, mas pode ter, em determinado contexto, a implicação de “subtrair”.

50 A estrutura do problema é integrada por contexto + situação + comando. A combinação desses três blocos de informação resulta no desafio e na transposição do que foi dito em línguas naturais à linguagem matemática.

Em relação ao plano composicional, podemos dizer que a situação- problema possui determinada estrutura sem muitas modificações de um enunciado para outro. Ela é composta por um conteúdo temático, geralmente com situações do cotidiano, como ações comerciais que envolvem dinheiro, momentos escolares, compras, circunstâncias comuns em aniversários, entre outros momentos. Seguido do contexto, temos as proposições que serão importantes para a solução do problema. Elas são as situações relacionadas ao contexto descrito. Para facilitar a ilustração, trataremos das partes do problema de forma separada, como podemos ver abaixo a partir do exemplo de Dante (2015, p. 162):

(27) (i)Em um dia, Rosângela gastou 20% do seu dinheiro em uma loja, 30% no supermercado e 10% na farmácia. (ii)Ainda ficou com R$ 24,00. (iii)Quanto Rosângela possuía inicialmente?

Com base no exemplo (27), iniciaremos a análise das partes da estrutura do problema com (i), o conteúdo temático. Ele é a apresentação do sujeito do problema, no caso do nosso exemplo é Rosângela, e a descrição das ações que desencadearão uma circunstância para depois haver a resolução de tal situação. Geralmente, pelo fato de os problemas tratarem de assuntos comuns e pertencentes à rotina, é comum utilizar-se nomes populares com o intuito de proporcionar identificação no leitor. Junto ao sujeito do problema, é feita a narração da temática que abordará a “SP” que, no caso do nosso exemplo, trata de compras que a Rosângela fez, descrevendo como e quanto ela gastou num dia. Podemos ver que é uma experiência corriqueira que envolve compras em locais comerciais.

A situação (ii) é explícita logo depois do contexto (i), quando descreve o valor em reais que sobrou das compras de Rosângela. Ou seja, há contextualização da história do problema para depois criar uma circunstância para que, a partir dela, seja dado o comando que pode ser em forma de pergunta ou estrutura imperativa (iii).

O comando pode ser dado por meio de uma sentença interrogativa iniciada por um WH ou uma sentença no imperativo, a qual indica, pelo menos, a ação que deve ser desenvolvida.

Para que comprovemos que existe uma estrutura bastante recursiva, iremos expor mais dois exemplos também retirados de livros didáticos de matemática trabalhados na rede

51 pública do nosso país, lembrando que o livro em questão, Coleção Teláris, compõe a lista de livros indicados pelo Ministério da Educação. Vamos aos exemplos de Dante:

(28) O professor Roberto está tentando abrir a porta de sua nova sala de aula com um chaveiro de cinco chaves. Ele já errou a primeira tentativa. Qual é a probabilidade de ele acertar a chave que abrirá a porta na próxima tentativa? (DANTE, 2015, p. 288)

(29) Certa quantia foi repartida em três partes proporcionais a 6, 7 e 11, nessa ordem. A primeira parte vale R$ 80,00 a menos do que a segunda; e a terceira parte vale R$ 320,00 a mais do que a segunda. Qual foi a quantia repartida? (DANTE, 2015, p. 257)

Comparando os exemplos (28) e (29), vemos a similaridade com o (27), devido à estrutura seguir a mesma composição de blocos de informação, lembrando que são exemplos de livros diferentes, porém escritos pelo mesmo autor. Um aspecto diferente entre os exemplos (27) e (29) é o fato de em (28) não haver um sujeito e sim um contexto sem alguém explicitamente estar fazendo uma ação. Isso demonstra que nem sempre teremos a explicitação da situação.

Ao analisarmos alguns tipos de “SP”, notamos que, independentemente de algumas “SPs” conterem informações diferentes umas das outras, como nomes de pessoas, detalhes de ação ou objeto, a estrutura se mantém. Todas contêm contexto, uma circunstância a ser desenvolvida e algo para resolver, o qual pode estar representado por uma pergunta ou estrutura imperativa.

Enfim, as “SPs”, geralmente, aparecem com verbos imperativos que indicam o que fazer, como calcule, indique, descubra, entre outros termos recorrentes. Esse processo de conhecimento textual também ocorre com as “SPs”. Ao nos depararmos com problemas, já sabemos que não se trata de um simples enunciado matemático, mas sim um texto particular, devido às características apresentadas acima. Embora existam vários tipos de textos, estruturas, sentido, objetivo e público-alvo, quando há algo em comum entre eles, podemos dividi-los em grandes grupos por similaridade. Em outras palavras, principalmente tratando de termos linguísticos, eles são definidos e separados por gêneros.

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