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CAPÍTULO I – NA ORDEM DO DIA AÇÃO AFIRMATIVA NO

1.1 Origens e conceitos de ação afirmativa

1.1.1 A que servem tais políticas?

A adoção de ações afirmativas como política pública, importante para o desenvolvimento do Brasil, teve seus pontos nevrálgicos. Tomo por base, de maneira breve, as pressões dos movimentos sociais e raciais negros na tarefa de convencer o Estado brasileiro a reconhecer suas desigualdades e tomar alguma atitude produtiva com relação a esse problema.

É válido salientar e adotar como referência que, sem as pressões dos referidos movimentos, possivelmente o nosso País ainda estaria em sua frequente inércia política com relação às desigualdades. Abreviando, a atuação da sociedade civil, junto ao poder público, foi grande impulsionadora da aplicação das ações afirmativas brasileiras. (MUNANGA, 2004; BARRETO, 2008; MEDEIROS, 2005)

Para Gomes (2003, p.22), a ação afirmativa infere-se como um mecanismo sociojurídico, com o intuito de intermediar a ordem social, através da paz e harmonia que “são seriamente perturbadas quando um grupo social expressivo se vê à margem do processo produtivo dos benefícios do progresso”.

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Para o autor, tal atividade política auxilia no robustecimento da própria extensão econômica do País, na medida em que o acesso à educação e ao mercado de trabalho de modo universalizado não garante o nosso crescimento macroeconômico como um todo, haja vista os resultados já obtidos com políticas universalistas anteriores às ações afirmativas. Essas que têm como objetivo facilitar o acesso a certos bens jurídicos, de natureza material ou simbólica, por parte de indivíduos pertencentes a grupos vulgarmente definidos como “minoritários” ou “vulneráveis”, de acordo com Araújo (2009, p.18).

As ações afirmativas podem ser definidas como um conjunto de políticas públicas e privadas de caráter compulsório, facultativo ou voluntário, concebidas com vistas ao combate à discriminação racial, de gênero, por deficiência física e de origem nacional, bem como para corrigir ou mitigar os efeitos presentes da discriminação praticada no passado, tendo por objetivo a concretização do ideal de efetiva igualdade de acesso a bens fundamentais como a educação e o emprego. (GOMES, 2003, p.27)

Kaufmann acrescenta:

Ação afirmativa é um instrumento temporário de política social, praticado por entidades privadas ou pelo governo, nos diferentes poderes e nos diversos níveis, por meio do qual se visa a integrar certo grupo de pessoas à sociedade, objetivando aumentar a participação desses indivíduos sub-representados em determinadas esferas, nas quais tradicionalmente permaneceriam alijados por razões de raça, sexo, etnia, deficiências física e mental ou classe social. (KAUFMANN, 2007, p.220)

Outra concepção de ação afirmativa, a mais usual no Brasil, pelo menos, é a de que:

Abrange políticas públicas que visam combater o racismo existente na sociedade e corrigir efeitos de racismo históricos, idealizando a igualdade de acesso a bens fundamentais em uma democracia contemporânea, como educação e emprego. (SANTOS, 2005, p.46)

A adoção de medidas afirmativas visa fomentar a participação dos entes discriminados em áreas que dificilmente conseguiriam ter acesso, argumenta Kaufmann (2007). Caso a estratégia de combate à discriminação se limitasse à adoção de normas meramente proibitivas do preconceito, os objetivos poderiam não ser alcançados em relativo espaço de tempo.

Dessa maneira, é necessário frisar que a adoção de políticas afirmativas deve ter um prazo de duração, e esse prazo deve ser estipulado para serem sanados ou minimizados os efeitos do preconceito e da discriminação sofridos pela parcela desfavorecida.

É quase impossível dissociar o conceito de classe e de raça da conceituação de ação afirmativa. Todavia, como aponta Santos (2005, p.24), a adoção de ações afirmativas não significa que serão alcançados resultados que demonstrem a eliminação da pobreza.

Entretanto, Lopes (2004) apresenta uma opinião totalmente diferenciada da de Santos (2005), e designa que:

Ação afirmativa é política pública de preferência destinada a promover o acesso ao poder, ao prestígio e à riqueza a membros de um grupo social historicamente discriminado. Expressa-se, por exemplo, aos negros na garimpagem de talentos afro-descendentes e na destinação, a eles, de parte das vagas disponíveis, ou universidades ou empresas, bem como de bolsas de estudo, treinamentos especiais e outras formas propiciatórias de ascensão social, como compensação pelas dificuldades encontradas em um contexto social notoriamente adverso. (LOPES, 2004, p.28)

Até o momento, comungo melhor com as afirmações de Santos (2005), por entender que, para a superação das desigualdades, é necessário que as políticas afirmativas estejam também associadas a tipos de manutenção e garantia de direitos, através de medidas mais práticas de redução das disparidades, principalmente no que tange à melhor distribuição de renda entre as populações de qualquer país.

As políticas de ação afirmativa podem ser entendidas como um instrumento para fomentar a cidadania se concordarmos que, historicamente, a percepção da cidadania tem-se dado como sendo o exercício dos direitos civis, e contempla a história das lutas pelos direitos humanos, as lutas pela afirmação de direitos éticos, como a igualdade, a dignidade de todos, sem exceção, bem como a proteção legal desses direitos. (ANDRÉ, 2008, p.175)

No Brasil, há uma tradição em pensar que os programas sociais beneficiam de maneira igualitária todas as pessoas, independente da cor da pele. Mas, as pesquisas mostram que isso é um engodo, garante Domingues (2008). “Políticas públicas de cunho social, isoladamente, não atacam o

racismo, pelo contrário, contribuem para reproduzir a separação existente entre negros e brancos na estrutura de classes”. (p.166)

Os indivíduos discriminados, em virtude de um atributo que os mesmos compartilham, são a principal preocupação das ações afirmativas. Essas dívidas estão em avultadas escalas sobrepostas pelo Estado e precisarão ser resolvidas. As ações afirmativas são políticas não simplesmente voltadas para a intervenção posterior, mas com caráter múltiplo e de ação, tanto sobre os efeitos do racismo histórico quanto sobre o racismo atual. Atuariam, ainda, por tanto, como acautelamento a uma progressão do racismo.