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O que é violência para professores e alunos e onde ocorrem na escola

3. A PERCEPÇÃO DO CLIMA ORGANIZACIONAL POR ATORES ESCOLARES DE DUAS ESCOLAS DE ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO

3.2 Escola Estadual Professora Zita de Godoy Camargo e seu contexto

3.2.1 O que é violência para professores e alunos e onde ocorrem na escola

Fernández (2004) entende que o mau trato entre alunos é um fenômeno que implica um grande número de fatores. Eles derivam da maturidade dos protagonistas, de suas condições de vida e suas perspectivas de futuro. A violência tem lugar no campo do convívio. Ocorre entre os diferentes atores escolares e se verifica no tipo de relações afetivas que se dão no âmbito das atividades acadêmicas e nos sistemas de poder e comunicação.

Para a autora, a comunicação nas escolas, dentro dos pequenos grupos de relações inter-pessoais costumam incluir a falta de solidariedade, a competitividade, a rivalidade e às

vezes o abuso do mais forte sobre os mais fracos e influenciam a percepção do clima da organização, para muitos alunos, de forma negativa.

O comportamento violento de escolares entre si e até entre professores e alunos é um problema que sempre existiu, e a sociedade foi compassiva e pouco sensível com relação a eles, diz Fernández (2004). A temática ganhou visibilidade nos anos 1990, o que pode ser observado pelo aparecimento de publicações sobre o assunto nos meados da década. Certamente o assunto fosse preocupação anteriormente “mas é a partir desse momento que o tema desponta entre os educadores sob o timbre de ‘obstáculo’ ou ‘complicador’ do trabalho pedagógico” (AQUINO, 2002, p.10).

Os professores da Escola Zita consideram violência como falta de justiça e não acatamento a regras sociais. Explicam:

Violência é causada pelo rompimento das regras elementares da vida social. Caracteriza-se por ser manifestação que foge ao que é certo e justo e fere a individualidade do outro.

É normalmente verbal e tenta atingir a moral das pessoas.

Nesta escola atos de incivilidade ocorrem geralmente nos espaços e nos momentos em que não há adultos presentes. Os professores explicam:

Ocorre no pátio, entre alunos, ou na sala de aula entre professores e alunos. Normalmente acontece na saída, no portão.

Ocorre na frente da escola.

No corredor, no pátio, sendo possível ocorrer em qualquer lugar da escola. Os professores demonstram considerar a palavra violência inadequada para se referir aos embates que frequentemente acontecem entre alunos. Eles consideram:

Não há violência nesta escola, há incivilidade.

Há agressão que pode ser verbal, demonstrando desrespeito, descortesia para com o colega.

Em muitas instituições sociais, para Fernández (2004) existe a violência porque os sistemas de convivência o permitem, ignoram ou potencializam e toda instituição gera inevitavelmente certo abuso de poder. É caso conhecido o mau trato em prisões, manicômios, exército. Escolas geram procedimentos à margem das propostas educativas que os professores realizam de forma consciente e planificada. Entre estes está, de forma mais ou menos

encoberta, o maltrato e o abuso entre iguais nas escolas e os alunos que os vivenciam percebem o clima inseguro e arriscado.

Os alunos da Escola Zita se referiram à violência utilizando muitas palavras: vandalismo, brigas, xingamento, racismo, ameaças, assassinato, estupro, roubo, falta de respeito, assalto, furto, ciúme, espancamento, desordem, seqüestro, destruição do patrimônio público.

Eles consideram principalmente a agressão física nas suas forma mais objetiva, a dos delitos mais graves. Em suas palavras encontramos a idéia de violência física:

Violência é soco, chute, jogar alguma coisa em alguém. Nunca na violência você vai conseguir nada de bom.

Violência é briga, assassinato, estupro, roubo.

Considero que sejam brigas que podem acabar em morte. São brigas, desordem, vandalismo, destruição.

Ameaçar o outro e aquele que foi ameaçado pode se vingar de você de outras maneiras mais graves.

Violência é um ato de agredir as pessoas, bater em quem não merece. Existe também a idéia de que violência seja ameaça. O aluno explica:

Violência é não poder sair na rua. Ser ameaçado, ter medo de ir para outros lugares. Só ter segurança em casa.

Nesta escola ela é também entendida como um desrespeito. Note-se a afirmação deste aluno:

É uma falta de respeito, você ser roubado, violentado.

A violência também é entendida nesta escola de maneira moralista. Alunos declaram:

Violência é uma pouca vergonha porque tem umas pessoas que não têm o que fazer e vão arrumar confusão.

É um ato sem pensar que muitas pessoas cometem e é muito feio. A pessoa que faz isso não é humana. É muito ruim.

A violência para os alunos desta escola é considerada não apenas nos aspectos físicos. Os alunos esclarecem:

Violência é não só o que machuca por fora, mas também o que mexe com os sentimentos de alguém.

Não apenas física, mas também moral.

Muitas pessoas agridem a gente com palavras grosseiras e estúpidas.

Note-se que na resposta de um aluno ficou evidenciado um fato comum à sociedade, e também em bairros desassistidos e socialmente desvalorizados, onde pais e irmãos mais velhos submetem crianças à violência ao presenciarem ocorrências com as quais são obrigadas a conviver. A observação do aluno é uma denúncia:

Acho que a maior violência é homem bater em mulher.

As ocorrências de incivilidade e violência nesta escola se dão em momentos e espaços que estão sem a supervisão de adultos. Os alunos explicam:

Na hora da saída, porque quando bate o sinal para ir embora todos saem apressados e vão empurrando todo mundo.

Na quadra por causa de futebol, no recreio, mas acontece mesmo é na saída porque eles sabem que se brigar no recreio a diretora toma atitudes.

Depois da saída, na rua, na hora do recreio e na saída porque tem muita gente junta no portão da escola.

Na rua, porque eu acho que eles têm medo de serem pegos por alguma pessoa responsável da escola.

No intervalo e no pátio, pois os alunos ficam à vontade e faltam profissionais para olhar-nos.

Atrás das arquibancadas, pois é um lugar alto e esconde as pessoas. No pátio e no corredor durante a troca de aulas.

É na hora da saída, quando chegam alunos do outro período e de outras escolas.

Na entrada da escola, no ponto de ônibus e na troca de aula.

Mesmo com supervisão de adultos ocorrem atos de incivilidade. O aluno explica: Ás vezes na sala de aula tem discussão, mas no caso de violência é quase sempre na saída, na rua.

A ocorrência de atos de incivilidade existe nesta escola, forma parte no seu dia a dia e ajuda a caracterizar o clima, já que estes atos de incivilidade estão nele inseridos.

Neste trabalho organizamos os dados obtidos com relação à percepção do clima e à violência nele inserido pelos diferentes atores escolares em três categorias: inter-relação pessoal, estrutura física, funcionamento organizacional. Pela multidimensionalidade do clima, é possível que elementos de uma categoria convivam com os de outra. Os que estão

relacionados à percepção de vitimização, intimidação, agressão, compõem uma categoria aqui denominada inter-relação pessoal que será discutida a seguir.

3.2.2 Categoria de análise: inter-relação pessoal

Os professores da Escola Zita sentem-se bem no espaço escolar, como foi possível observar em minha permanência na escola. São coesos, trabalham num clima de participação, buscam resolver os problemas de forma coletiva. A percepção de clima pelos indivíduos se apóia em variadas características presentes na organização, explica Brunet (1987) e as declarações abaixo atestam:

O clima é de companheirismo e colaboração, a equipe escolar é composta pela maioria de efetivos que realizam um trabalho muito sério e com os mesmos objetivos.

As pessoas buscam trabalhar em harmonia

Todos mantêm uma relação profissional, amigável e são muito comprometidos com a escola.

Trabalho aqui há dez anos e já presenciei muitas atitudes de companheirismo e solidariedade.

O corpo docente é coeso em suas ações e juntos buscam resolver todo tipo de desconforto

Sente-se muito bem. Apesar dos problemas com a disciplina dos alunos, temos conseguido solucionar e administrar tudo isso.

O ambiente é acolhedor, agradável, de muitas amizades.

Muitos professores estão juntos há mais de dez anos e têm compromisso com a escola. Foi constatado pela pesquisadora que abarcam a profissão com segurança e profissionalismo. Têm uma visão longitudinal do ensino. Sabem-se realizando um trabalho competente porque conhecem o de outras escolas. São respeitados pela comunidade e envolvidos com alunos e escola. As relações entre os atores escolares são compreensivas e solidárias e conforme Brunet (1987) o clima resultante tem um efeito positivo no ambiente de trabalho. Há muito espaço para trocas interpessoais. É possível constatar pelo que afirmam:

Convergências e divergências sempre existiram em qualquer lugar, e aqui sempre fazemos delas pontes para nosso crescimento pessoal e profissional. Somos unidos e o clima é o melhor possível.

Embora haja contratempos que nos deixam chateados, me sinto bem aqui. Brunet (1987, p.70) explica que “nos estudos atuais sobre liderança, o administrador eficaz é aquele que adapta, geralmente, seu estilo de liderança ao ambiente e à sua situação de

trabalho” e nesta escola, a equipe gestora é estimada e vista como muito competente. Isto fica patente observando o funcionamento apropriado da escola em todos os seus aspectos. Há disputa entre as famílias para que seus filhos ali estudem. A diretora está nesta escola praticamente desde a inauguração e se faz sempre presente. Considera, no bom sentido, a escola como sua. Age rápida e eficazmente, embora às vezes provocando algum atrito pessoal, porém todos já se acostumaram a sua forma resoluta de tratar as questões, com certeza um dos pontos altos da escola. Nas afirmações dos professores é possível constatar:

A equipe gestora acompanha e apóia o trabalho realizado conquistando o respeito da comunidade.

Apesar de problemas de indisciplina, a gestão administrativa forte e a autoridade respeitada e presente no dia a dia, fazem com que a escola ofereça segurança e solucione seus problemas num ambiente agradável de aprendizagem e amizade.

Há muito diálogo e participação coletiva em muitas decisões.

A equipe gestora e os professores buscam estratégias para um bom relacionamento.

Entretanto, há reclamações com relação à maneira como são tratados alguns assuntos pessoais de forma coletiva. A fala abaixo evidencia:

A equipe gestora é competente embora eu acredite que muitas situações devessem ser resolvidas pessoalmente com os envolvidos e não de maneira geral no grande grupo.

A diretora considera a percepção positiva do clima, ser decorrente do bom trabalho e seriedade da equipe gestora, professores e funcionários. Sua fala é testemunha:

Os professores ‘tiram leite de pedra’ pelo tipo de dificuldades apresentadas pelos alunos que recebem na 5ª série. A equipe, embora tenha problemas, demonstra, pelo progresso dos alunos após algum tempo, que realiza um trabalho bem feito.

Um dos aspectos do clima, para Brunet (1987, p.19), chama a atenção para o fato de que “o clima emerge dos sistemas e dos procedimentos como o estilo de gestão, as políticas organizacionais” e nesta escola a boa reputação de direção exigente, combinada à de boa escola, atravessa suas fronteiras. Professores da cidade alardeiam isto quando há atribuição de aulas remanescentes na Diretoria de Ensino. Prova disto vem na fala da coordenadora:

Os professores que conseguem aulas nesta escola chegam comentando que ouviram: ‘Você quer aprender a trabalhar, vá para a Escola Zita’.

Para Brunet (1987, p.20), o “administrador pode exercer um controle sobre a determinação do clima de maneira que possa administrar o mais eficazmente possível sua organização”. A direção desta escola se considera competente e atuante e também conhece a fama que goza entre outros professores e outras escolas. Suas palavras confirmam:

É um cuidar diário, de tudo, sem desanimar. Dia e noite. Se isto acontecer perde-se o controle. O que torna a escola vencedora é não desistir nunca. Acreditar que os alunos da escola pública merecem o melhor.

Para Brunet (1987, p. 78), “o clima organizacional tem um efeito direto sobre a satisfação e o rendimento dos indivíduos no trabalho”. Mais de vinte professores são profissionais nesta escola há mais de dez anos. Seu trabalho é respeitado e não pedem remoção. Sentem-se bem na escola. As considerações abaixo atestam:

Sente-se bem estar. Se não fosse assim já não estaria nesta escola. Teria entrado em remoção.

Estou aqui há catorze anos e compactuo com os princípios desta unidade de ensino.

É possível sentir um enorme bem estar, embora haja contratempos que nos deixam chateado.

As características do processo organizacional que se referem ao estilo de gestão, modos de comunicação (BRUNET, 1992) têm como efeitos a coesão do grupo, a satisfação pessoal, e colaboram para a percepção de um clima positivo. As declarações abaixo exemplificam:

O ponto alto da escola, que leva à satisfação em se trabalhar aqui, é facilmente observado: gestão administrativa organizada, coerente, forte em suas decisões, autoridade presente, que reforçam o bem estar.

Espírito de colaboração e companheirismo são as principais características desta escola, o que torna o ambiente agradável e acolhedor, facilitando o trabalho educativo.

Pode-se perceber, por suas declarações, que os professores da Escola Zita se sentem seguros no trabalho. A equipe diretiva inspira segurança e participa de todas as ações que ali ocorrem. A comunidade protege a escola pelo respeito que sentem por ela e lhe dá fiança, pois, o bairro ao redor, que goza de fama de violento, a respeita. Há acolhimento dentro dela.

O trabalho dos professores e equipe gestora é a proteção da escola. As suas explicações atestam:

O trabalho que a escola realiza conquistou o respeito da comunidade. A escola recebe atenção especial por parte da diretora.

O trabalho realizado na escola a preserva. Não nos sentimos ameaçados. Os professores já conquistaram seu espaço e investem em sua capacidade profissional.

Não temos problemas de violência. Não há motivo para me sentir amedrontada.

Essa comunidade escolar, mesmo de periferia, não apresenta problemas de violência. Há apenas indisciplina.

O trabalho conjunto dos professores, a coesão do grupo (BRUNET, 1992) ao conseguir gerenciar conflitos, são fatores de satisfação que refletem na percepção do clima. É possível ser evidenciado nas afirmações dos professores:

Sempre me senti seguro dentro dessa escola, embora saiba que a violência ronda algumas escolas públicas ou particulares. Aqui não sofro com isso porque buscamos sempre soluções coletivas e criativas para esse problema. Segura. Apesar da localização da escola, ela oferece muita segurança, pois a qualquer suspeita a escola se reúne e neutraliza atos que possam vir a dar medo ou confusão.

As questões disciplinares são resolvidas dentro de seus muros, sem chamar a ronda, ou fazer boletins de ocorrência, comuns em outras e incomuns nela, embora já tenham ocorrido. O que a diretora explicou atesta esta afirmação:

Chamar pais, discutir os problemas são funções nossas. Tudo que é da escola é possível resolver na escola. É preciso sentir a sensação de que tentamos tudo. Alunos que mudam de escola querem voltar, porque sabem que a escola oferece segurança.

A dificuldade financeira das famílias deste reduto de imigrantes, com características culturais de outras regiões do país de onde são originários, os distingue com relação aos habitantes de outros bairros. Entretanto, a diferença que poderia ser também evidenciada na indumentária ou materiais, foi dissimulada pela oferta de materiais oferecidos pelos programas de assistência ao escolar, homogeneizando suas aparências. Isto é constatado pelos professores:

Dentro da escola o problema de diferença de renda entre os alunos foi resolvido, na aparência, pelo governo, que encaminha a eles material necessário e desnecessário, homogeneizando seu aspecto.

Alguns professores sentem que trabalhando com alunos de bairros populares, participam como cidadãos e contribuem para a transformação social de suas famílias. O que dizem dão testemunho:

Essa população necessita do nosso envolvimento. Tem-se obrigação para com ela, pois tivemos oportunidades que eles não tiveram.

Estou aqui para ajudar esta população. Estes alunos são cidadãos que têm espaço na sociedade e devem ocupá-lo.

Pessoas são pessoas, não importa de onde tenham vindo.

Há professores com família melhor estruturada, que não sentem dificuldade financeira. Alguns, entretanto, sentem-se enquadrados na população de baixa renda. É possível constatá-lo, pois, muitos não são efetivos e lecionam as aulas que sobram em várias escolas, o que eles chamam de “rabicho”, não conseguindo, muitas vezes, um montante para seu sustento digno. Há entre as professoras, algumas arrimo de família, com filhos em idade escolar, necessitando vários tipos de atenção, não possuindo casa própria, o mesmo considerando em relação aos funcionários. O que explicam testemunha este fato:

Eu também sou migrante e de classe trabalhadora.

O professor também se enquadra na chamada população de baixa renda. Sinto-me bem com eles, pois fazem parte do meu mundo.

Sobre esta questão Fukui (2004) afirma que a pauperização dos alunos, que sem uniforme ficou patente, ocorre também entre professores, elimina os traços que antigamente eram identificativos de papéis sociais dentro do espaço escolar, pois nada distingue professor de inspetor de alunos, em muitas unidades escolares.

Não foram presenciadas pela pesquisadora ações ou falas preconceituosas com relação à origem ou classe social dos alunos. A diversidade cultural é apreciada, embora percebam que a aculturação dos mais jovens esteja fazendo desaparecer as características culturais de seus pais, os verdadeiros migrantes. O que explicam constata esta observação:

Na verdade esta população já está mudando sua característica.

A baixa renda do aluno não interfere no trabalho do professor desde que cumpram com seus deveres.

Gosto de interagir com pessoas, independente de sua renda. A diretora concorda com os professores quando explica:

Não existe na escola preconceito com relação ao fato dos alunos serem originários de outras regiões do Brasil, com outros costumes e linguajar diferenciado. Os professores os aceitam bem, sabem que vão encontrá-los e conviver com eles quando escolhem esta escola. Acham seus sotaques bonitos e verbalizam isto.

Com relação às atitudes anti-sociais contra professores, existe descortesia, caçoada, discussões, falta de amabilidade, que influenciam o clima da escola. Alguns professores justificam este comportamento, embora não concordem com ele, argumentando que muitos alunos vivem em lugares sem conforto, levam vida muito difícil, convivem com problemas sociais. É possível constatar pelas suas explicações:

A descortesia é mecanismo de defesa ao se sentirem acuados, escape do sufoco social, familiar.

Sim e a causa é os alunos serem criados sem limites, sem cuidados e sem amor.

Tive discussões devido ao mau comportamento em sala. E as causas são a falta de educação e limites em casa.

Já fui alvo de descortesia. Causa: tensões e maus tratos no dia a dia. A violência que há fora da escola reflete aqui dentro.

Uma das professoras encara as dificuldades de relacionamento de forma muito positiva:

Minha profissão é lutar contra a ignorância. É luta árdua, sem trégua e a incivilidade é ignorância.

O testemunho de uma das funcionárias que os atende há 14 anos e conhece suas famílias é esclarecedor da violência que acomete alguns alunos dentro de suas casas:

90% dos nossos alunos não têm um bom lar. Moram com avós, madrastas, madrinhas. Outro dia uma menina chegou chorando porque a mãe a acordou com um chute. Eles não são violentos. São confusos. Não sabem conversar. Conversam aos gritos. Eu digo para eles ‘eu estou falando alto com você? Não? Então fale baixo comigo’.

Muitas vezes a maneira que encontram para se livrar da família envolve muitos riscos. Na lousa da sala dos professores em determinada ocasião foi possível ler a relação de garotas grávidas que entrariam em período de licença gestante, avisando aos professores com relação às suas faltas. Eram sete nomes. O comentário de um professor é significativo:

Ficar grávida, para elas dá status. Vão para a casa do namorado onde têm um quarto só para os dois. Livra-se de uma família complicada, ou pensa que vai livrar-se.

Dos professores entrevistados apenas um, sugeriu ser ele próprio e sua atuação o que levou a originar desavença e dificultar o clima.

Num universo de setecentos alunos dois ou três não foram amáveis. A causa talvez tenha sido minha exigência que provocou a situação e o aluno foi incapaz de autocontrole.

San Martín (2003) explica que os conflitos são frequentemente entendidos como algo negativo, a ser evitado, pois demanda muita energia e tempo seu enfrentamento e faz passar por momentos maus e desagradáveis. Apresentam-se como ameaçadores, associados à ansiedade, destruição, enfrentamento e não se costuma perceber seu lado positivo. Apresentam-se como ameaça, e desta maneira dificultam o entendimento de que possam oportunizar crescimento pessoal ou grupal. Para o autor, as relações entre as pessoas podem apresentar conflitos, porém são positivos, porque é dentro da diversidade que se pode crescer.

Conflito foi historicamente considerado negativo, a ser evitado, escondido do mundo e reprimido. Era considerado tema tabu e prejudicial. Atualmente, é considerado como