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Fluxograma 20 Parentesco em Castanhalzinho a partir de Manoel e Lucinete

3.2 A emergência da categoria quilombola

3.2.2 Quilombos no Pará

Na Amazônia Paraense o Centro de Estudos e Defesa do Negro no Pará (Cedenpa) se evidenciou como movimento organizacional articulador do mapeamento das chamadas comunidades negras rurais, importância para o reconhecimento jurídico na constituinte a partir dos encontros de comunidades negras no estado do Pará e Maranhão antes do artigo 68 da Constituição.

As associações quilombolas no Pará são representadas pela Coordenação das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Pará (Malungu) criada em março de 2004 com o objetivo de “defender os direitos e esses das associações e das comunidades remanescentes de quilombos do Estado do Pará”. Está estruturada em cinco conselhos regionais: Salgado, Nordeste Paraense, Guajarina, Baixo Amazonas e Tocantins (MALUNGU, 2008). Em nível nacional as associações são representadas pela Coordenação Nacional de Comunidades Rurais Quilombolas (Conaq), criada no ano de 1996 na Bahia.

A articulação das comunidades negras rurais no Pará providenciou o Encontro de Raízes Negras realizados em 1985 e o I Encontro de Comunidades Negras Rurais em Belém em maio de 1998. Havia entre os interessados forte mobilização e articulação política para reivindicar o direito à terra e à cidadania. Foi possível conhecer os interstícios dos antecedentes da organização social e política das comunidades, o grau dos conflitos e tensões em torno da terra e dos seus recursos (ACEVEDO MARIN; CASTRO, 1999).

O Governo do estado do Pará em julho de 1997 criou um Grupo de Trabalho formado por representantes das seguintes entidades: Secretaria Executiva de Ciência e Tecnologia e Meio Ambiente (Sectam), Instituto de Terras do Pará (Iterpa), Secretaria de Cultura do Governo do Estado de Pará (Secult) e Secretaria de Estado de Agricultura (Sagri), juntamente com lideranças do movimento negro como a Associação das Comunidades Remanescentes de Quilombo de Oriximiná (ARQMO), Cedenpa, CPT e Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Pará (Fetagri). O Grupo tinha como objetivo promover estudos e apresentar propostas de solução para as questões relacionadas com à regularização definitiva de áreas abrangidas pelas comunidades remanescentes dos antigos quilombos no Estado do Pará (ACEVEDO MARIN; CASTRO, 1999).

Ficou estipulado que um grupo de estudo, sob responsabilidade da UFPA por meio do Núcleo de Altos Estudos Amazônicos (NAEA), que seria o responsável pela continuidade do mapeamento de comunidades negras, anteriormente feito pelo Cedenpa. O nome do projeto se chamou “Mapeamento de comunidades negras rurais”, caracterizado por meio de uma visão de

estratégia a partir de uma noção cartográfica, de localização de grupos nas áreas, pontilhado por dezenas de comunidades negras rurais. Quilombos, remanescentes de quilombos e comunidade negra são termos que passam ao âmbito do universo dos grupos estudados, “produzindo ao mesmo tempo elementos de autodefinição e formas de representação, ou uma espécie de autoconhecimento para a afirmação étnica” (ACEVEDO MARIN; CASTRO, 1999, p. 75).

Na Amazônia, o avanço da agroindústria por meio da compra e venda de terras tem ameaçado os territórios tradicionalmente ocupados por comunidades quilombolas. Essa disputa tem gerado conflitos variados, sejam eles agrários, ambientais, sociais, o que coloca a questão dos direitos quilombolas em debate.

As pesquisas desenvolvidas por Rosa Acevedo e Edna Castro destacam a existência de comunidades negras em diferentes partes da Amazônia e da importância social do saber tradicional dessas comunidades para o equilíbrio dos recursos ambientais. Trazem à tona relação com o espaço natural que construíram ao longo dos anos, destacando não só os conhecimentos tradicionais em lidar com a terra e com os recursos naturais, mas a luta desses povos pelo direito do território oficialmente reconhecido (ACEVEDO; CASTRO, 1998).

A resistência no território marca a história das comunidades quilombolas ao longo do tempo. A pesquisa realizada sobre os quilombolas de Abacatal, no município de Ananindeua, em plena região metropolitana de Belém, discute a legitimidade do direito ao território por meio da herança. “Dessa forma, a herança corresponde a um corpus que compreende as terras, os objetos e as posições das famílias e do grupo ampliado, mais do que indivíduos” (ACEVEDO; CASTRO, 2004, p. 39).

A pesquisa produzida sobre os negros do Trombetas, no município de Oriximiná evidencia a formação do território quilombola naquele espaço, desde a formação dos primeiros quilombos, a importância dos castanhais, o modo de vida e o conflito territorial com a chegada de empresas privadas e a criação de reservas. Para Acevedo e Castro, a chegada de empresas mineradoras naquele espaço se fazem por duas dimensões,

A primeira, negação da ocupação anterior do território, o que chamamos de invisibilidade expropriadora; segunda, a inversão da concepção de direito pois a empresa subverte regras e estatuto da presença étnica ou socialmente definida como cabocla na área, impondo outra relação social e do homem com a natureza (ACEVEDO; CASTRO, 1998, p. 221).

Em um trabalho mais recente, Acevedo discute o processo de resistência quilombola perante o avanço de fazendeiros e grandes empresas, como no caso do conflito fundiário entre

quilombolas da comunidade de Jambuaçu e a empresa Vale no município de Moju, em que a autora explica:

Diante situações históricas novas, os agentes sociais reinterpretam no substrato desse forte enraizamento territorial, as formas de garantir a permanência e integridade do território, associado à construção da identidade quilombola e o reconhecimento de uma maneira distinta pelos outros (ACEVEDO, 2011, p. 52).

Para a compreensão do universo social dos quilombolas é necessário levar em consideração os arranjos culturais e organizacionais que os constituem enquanto sujeitos de direitos. A posse do território, o acesso à políticas públicas e sobretudo o reconhecimento de sua etnicidade se apresentam neste momento como instrumento de luta frente aos agentes hegemônicos e suas formas de expropriação e subordinação.

A titulação e manutenção das terras com títulos quilombolas continua sendo principal reivindicação dessas comunidades na Amazônia. No segundo Encontro Estadual de Quilombos no Pará, em 2008, identificou-se problemas enfrentados pelos encontristas como: falta de titulação, falta de documentação necessária para o processo de regularização, falta de ação e morosidade dos órgãos fundiários e ambientais, falta de antropólogos, excesso de burocracia (SANTANA, 2010).

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