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3. MODELAGEM DO CONSUMO RESIDENCIAL POR USO FINAL

4.4. RACIONAMENTO DE ENERGIA

Como descrito na referência SILVA et al (2005), no decorrer dos últimos 15 anos, o Brasil passou por dois períodos de racionamento: o primeiro, iniciado em 1o de março de 1987, afetou 5,3 milhões de consumidores dos nove estados do Nordeste, sul do Pará e norte de Goiás, encerrou-se em 18 de janeiro de 1988. O segundo racionamento aconteceu no perí- odo de 1o de junho de 2001 a 28 de fevereiro de 2002, atingindo consumidores das Regiões Sudeste, Nordeste e Centro-Oeste.

O primeiro, ocorrido no período de 1o de março de 1987 a 18 de janeiro de 1988, teve como causas determinantes:

a) Um longo período de estiagem na bacia do Rio São Francisco no verão de 1986- 1987, provocando um baixo nível (29,7%) no principal reservatório da região Nor- deste (Usina de Sobradinho);

b) O adiamento de importantes obras consideradas prioritárias como a hidrelétrica de Itaparica e o segundo circuito da linha de transmissão Tucuruí - Presidente Dutra, além do agravamento da situação pela indisponibilidade das centrais térmicas de São Luís da ELETRONORTE, Bongi e Camaçari da CHESF;

c) O crescimento do mercado de energia elétrica na região Nordeste acima dos valores previstos (5,2%).

Com base nos estudos efetuados pelo Grupo Coordenador para Operação Interligada (GCOI) e pelo Comitê Coordenador de Operações Norte-Nordeste (CCON), o Ministério das Minas e Energia baixou a Portaria 98, em 27 de janeiro de 1987, determinando a implantação do racionamento de energia a partir de 1o de março de 1987, buscando obter uma redução global de 15%. Durante o racionamento, o objetivo da operação do sistema elétrico nordestino era manter a geração hidráulica tão baixa e eficiente quanto possível. Para atingir a meta de 15% de redução global, as simulações realizadas liberaram os consumidores das classes resi- dencial, comercial e industrial para que consumissem até 80, 300 e 500 kWh, respectivamen- te. Acima desses valores, foram definidos numa fase inicial (FASE 1) os percentuais de redu- ção por classe de consumidores apresentados na Tabela 4. 2.

Tabela 4. 2 - METAS DE REDUÇÃO DO CONSUMO RACIONAMENTO 1987/1988 FONTE: Compilada de DIAS (1996)

PERCENTUAL DE REDUÇÃO CLASSE DE

CONSUMIDOR FASE 1 FASE 2

RESIDENCIAL 21% 15% INDUSTRIAL 14% 9% COMERCIAL 20% 12% RURAL 15% 0% PODER PÚBLICO 25% 25% ILUMINAÇÃO PÚBLICA 25% 25% SERVIÇO PÚBLICO 10% 5% CONSUMO PRÓPRIO 25% 25% META GLOBAL 15% 10%

Novos estudos realizados pelo GCOI e CCON, em julho de 1987, possibilitaram a revi- são das metas nos sistemas interligados das regiões Norte e Nordeste, diminuindo a meta glo- bal de 15% para 10%, estabelecendo um segundo conjunto de metas por classe de consumo,

O fim desse primeiro racionamento foi determinado pelo Ministério das Minas e Ener- gia, por meio da Portaria 34, de 15 de janeiro de 1988, tendo em vista a entrada em operação das obras previstas no Programa de Emergência para Suprimento de Energia Elétrica ao Nor- deste e a recuperação hidráulica verificada nos reservatórios das usinas hidrelétricas da bacia do Rio São Francisco.

A segunda crise de energia nos últimos 15 anos ocorreu no período compreendido entre 1o de junho de 2001 e 28 de fevereiro de 2002, atingindo as Regiões Sudeste, Nordeste e Cen- tro-Oeste. Essa crise energética pode ser atribuída aos seguintes fatos mais relevantes:

a) Falta de investimentos no setor elétrico, tanto no lado da geração quanto no lado da transmissão,

b) A ocorrência de pluviosidades muito baixas no início de 2001, durante o chamado período úmido.

Figura 4- 1 : Evolução da relação entre a capacidade de geração e o consumo no Brasil. FONTE: ELLIS, M. F. e FERREIRA, L. E. S.,2002

É importante destacar que, em 1992, registrou-se um consumo de energia de 242.755 GWh, enquanto no ano de 2000 esse consumo subiu para 360.225 GWh, ou seja, num período de oito anos, o Brasil apresentou uma elevação no seu consumo de energia elétrica de 48,4 %. Por outro lado, enquanto o consumo de energia no período subiu em 48,4%, a capacidade de

geração instalada no país passou de 49.692 MW no final de 1992 para 65.757 MW no final de 2000. Portanto, nesses oito anos, o parque gerador teve uma evolução de apenas 32,3%. A Figura 4- 1 apresenta uma curva que mostra a evolução da relação entre a capacidade instala- da e o consumo global.

No sentido de enfrentar a crise energética de 2002, o governo brasileiro criou e instalou a Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica (GCE), mediante a Medida Provisória de número 2198-5, de 24/08/2001.

O estabelecimento de metas de redução de energia para todos os consumidores residen- ciais fez parte da estratégia adotada para enfrentar ambos os períodos de racionamento. Essas decisões provocaram prejuízos, danos e muitos inconvenientes para um grande número desses consumidores. Dentre os mais prejudicados, encontravam-se:

• Consumidores que possuíam estrutura hospitalar em sua residência para paci- entes graves, pois tiveram de enfrentar todo um processo administrativo para não ter o seu fornecimento de energia interrompido;

• Consumidores que, na informalidade, possuíam seu sustento baseado em ativi- dades exercidas em suas residências;

• Consumidores que tinham viajado ou se ausentado durante o período de cálcu- lo da média de consumo para a definição da meta, pois também tiveram de en- frentar todo um processo administrativo para não ter o seu fornecimento de e- nergia interrompido;

• Consumidores que já tinham adotado medidas de eficientização de energia elé- trica nas suas residências tiveram dificuldades em atender às metas, enquanto consumidores ineficientes foram beneficiados.

Fatos como os relatados, dentre muitos outros, destacam a inadequação da política de metas globais de redução de consumo de energia elétrica em situações de racionamento, e evidenciam a necessidade de o Governo ter modelos para que o processo de decisão seja me- nos conturbado e mais eficiente.

Por outro lado, o setor residencial é o segundo setor que mais consome energia elétrica no Brasil, após a indústria, e tem um significativo impacto no período de pico do consumo de

energia elétrica global. Na cidade do Recife, a participação do setor residencial no consumo total de energia elétrica cresceu acentuadamente nos últimos anos, crescimento esse devido principalmente ao processo de urbanização do país e à melhoria da renda per capita da popu- lação, atingindo 36% do consumo global.

Nesse contexto, tanto em períodos de racionalização de energia como na busca da efici- ência no uso da energia elétrica, é estratégico para o Brasil ter cada vez mais métodos quanti- tativos, como o apresentado neste item, para o processo de tomada de decisão quanto às alter- nativas de ação em ambas as situações.