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Capítulo III. Apresentação e discussão dos resultados

2. Razões para levar o/os filho/os para reclusão

Conhecer as razões na base da tomada de decisão de levarem consigo os filhos para o EPT, constituía-se outra das nossas preocupações. Segundo Robertson (2007) esta é uma decisão difícil para as mães, devendo fazer-se um balanço entre vantagens e/ou desvantagens. Nas narrativas das nossas entrevistadas são apontadas várias justificações. As reclusas que não dão entrada grávidas, justificam a sua decisão com a tenra idade dos filhos, considerando, independentemente de o contexto ser apropriado ou não, melhor e

66 mais benéfico permanecer junto dos mesmos, sentindo-se assim mais seguras, como nos diz Isabel:

―...ponderámos efetivamente a F ficar com os avós, a… por questões logísticas não foi possível e tendo a F também com 13 meses, achei, achamos todos aliás que seria muito brusco tirá-la da mãe e então decidimos ok... não é o melhor sítio para a F estar, mas acabo por poder cuidar dela e cuidar bem não há nada como a mãe e também pela questão laboral de que o meu marido nunca poderia adquirir estas funções.‖ (Isabel, E01, p. 2);

A amamentação é outro dos aspetos com particular significado nesta decisão, como refere Pilar:

―…trouxe-os, pois a k ainda era muito pequenina, o A era bebezinho ainda estava a amamentá-lo, não sei se foi egoísmo da minha parte, mas eu sou a mãe, eu sei como é que vou tratar deles, eu não estou lá, eu podia confiar os meus filhos a outra pessoa…‖ (Pilar, E09, p. 47);

Como sabemos, ―em contexto prisional, a gestão da relação mãe-criança fica submetida às regras que regem a dinâmica prisional, podendo condicionar os cuidados prestados às criançasque, por conseguinte, pode influenciar a qualidade de interação entre as mães com as crianças‖ (Serras e Pires, 2004, p. 414). Por outro lado, como referimos anteriormente, existe quem defenda que a criança não se deve desvincular da figura materna―mesmo que isso signifique que a criança permaneça na prisão, cuja relação afetiva com a mãe é fulcral para o seu desenvolvimento, tanto motor como psicológico‖ (Serras e Pires, 2004, p. 414).

Importante também referir que as reclusas que criam os seus filhos dentro da prisão têm assim muitas vezes a possibilidade de o fazer num ambiente mais seguro do que aquele em que estariam no exterior. Pilar refere, precisamente, esta situação de incerteza em relação à vida fora dos muros do EPT: ―...poder ver os meus filhos a crescer aqui também, mas eu prefiro estar aqui do que lá fora, eu não sei se estivesse lá fora o que já me podia ter acontecido...‖ (Pilar, E09, p. 47).

São também reforçadas as referências ao suporte dado pelas crianças na reclusão das mães, afirmando a maioria que não suportaria a cadeia se não tivesse os filhos consigo. Salomé é uma delas, tendo feito várias vezes referências ao filho como alento para enfrentar a sua reclusão:

―...eu não sei na verdade não sei como reagiria se não tivesse aqui o C, pelo menos eu agora, sabe eu gosto de ler eu gosto de me informar e agora sinto que tenho uma depressão, não tenho vontade para essas coisas, sabe quando estou com o C tudo passa... ―(Salomé, E02, pp. 10 a 11).

Há ainda outro aspeto a referir enquanto fator decisivo para a ida das crianças para o EPT. Tendo em conta que, na generalidade, como tivemos oportunidade de referir anteriormente, as mães são as principais provedoras de cuidados aos filhos, aquando da

67 reclusão dá-se uma reorganização da dinâmica familiar, sendo que a principal preocupação são os filhos, e as questões ligadas à maternidade. Esta preocupação relaciona-se não só com os filhos que levam para dentro do EP, como também com aqueles que deixam à guarda da família, por não terem idade para entrar no EP aquando da detenção das suas mães (Granja, 2015). Perante esta situação, as famílias são muitas vezes confrontadas com uma realidade económica, laboral, financeira e até de distância em termos territoriais que não permite suportar a educação destas crianças.

Carmo, para além dos dois filhos que tem consigo no EPT, partilha a sua cela na Casa das Mães com a irmã, ambas detidas pelo mesmo processo. Aquando da detenção, a irmã deixou ao cuidado da avó materna a sua filha de 8 anos:

―...O D e o G nasceram cá... Nunca pensei mandá-los lá para fora visto serem gémeos, a minha mãe não tinha condições, sozinha com duas crianças, ainda por cima a minha mãe já tinha a minha sobrinha, a minha sobrinha quando nós fomos presas já tinha 8 anos portanto já era uma criança se lhe desse mais duas…‖ (Carmo, E10, p. 54).

Granja (2015) refere que a maioria das mães não pode deixar os filhos ao cuidado dos pais, muitas vezes já ausentes da vida das crianças ou também eles em situação de reclusão, pelo que, em alternativa a levar os filhos para a prisão ou quando, por razões de idade dos mesmos, tal não é possível, são mobilizadas redes informais de cuidados infantis sendo sobretudo outras mulheres da família a assegurar os cuidados das crianças filhas de mães reclusas. Contudo,

―A assistência familiar é por vezes insuficiente e limitada, especialmente entre as redes informais de apoio com escassos recursos económicos, materiais e sociais e com vários elementos presos (Cunha, 2008a). Quando as redes informais não são capazes de assumir os cuidado de filhos de pais e mães reclusos, as crianças podem ser institucionalizadas (…) e/ou entrar num complexo circuito no qual os irmãos são distribuídos entre parentes, vizinhos e/ou instituições‖ (Granja, 2015, p. 162)

Em síntese, podemos considerar os seguintes fatores principais na base da decisão destas mulheres em levarem os filhos consigo para o EP aquando da sua detenção: estarem grávidas e os mesmos terem nascido e permanecido em contexto prisional; a tenra idade dos filhos e o facto de ainda os amamentarem; a importância que a presença dos filhos tem no amenizar da situação de reclusão; a incapacidade quer de tempo, quer financeira por parte das famílias para assegurar as necessidades de uma ou mais crianças, uma vez que as que não têm idade para permanecer no EPT na generalidade já ficam à sua guarda. A par disto referem ainda sentirem-se mais seguras com o fato de terem os filhos por perto e continuarem a ser as suas principais cuidadoras independentemente de acharem que o EPT podia ter melhores condições para as crianças.

De referir que, dos seus discursos, fica claro que o facto de poderem manter os filhos junto de si representa a possibilidade de desenvolverem as suas responsabilidades

68 maternas, fazendo com que estas mulheres sintam que não se demitiram, apesar dos atos cometidos, do seu papel de mãe e que lhes é possível, ainda assim, exercerem a sua maternidade.

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