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4 AGÊNCIAS MULTILATERAIS DE FOMENTO AO DESENVOLVIMENTO: O BANCO

4.2 Propostas do Banco Mundial para o desenvolvimento rural

4.2.2 Reaching the Rural Poor (2003)

O relatório que seguiu ao From Vision to Action foi chamado de “Reaching the Rural Poor – A Renewed Strategy for Rural Development”48, publicado em 2003. Também elaborado pela equipe de desenvolvimento rural do Banco Mundial, contou com extensiva contribuição das equipes regionais da instituição e de consultores externos, oriundos de empresas privadas, universidades, organismos bi ou multilateriais e governos49, tendo sido apoiado financeiramente pelos governos da Holanda, Reino Unido, França, Alemanha e Grécia.

Segundo o Banco Mundial (2003), as estratégias de desenvolvimento rural lançadas no relatório anterior, de 1997, tiveram ―influência decisiva sobre o pensamento global, mas resultados práticos decepcionantes‖ (WORLD BANK, 2003, p. xiv, tradução da autora), reforçando que o Banco encontra ancoragem na legitimidade dos sistemas peritos, ao mesmo tempo que tem consciência de suas limitações. Segundo a instituição, o insucesso decorreria de deficiências ligadas aos países clientes e falhas internas ao Banco, o que aloca a responsabilidade aos clientes ou, no máximo, a executores do quadro do Banco Mundial, eximindo o projeto, em si mesmo, de falhas.

Em 2001, os empréstimos para projetos da agricultura teriam sido os mais baixos da história da instituição. Por isso, a nova estratégia seria orientada para resultados, destacando ―a prática, implementação, monitoramento e empoderamento das pessoas que ela se designa a ajudar‖ (WORLD BANK, 2003, p. xiv, tradução da autora).

A comparação entre os documentos indica apenas o reforço de estratégias cujas bases conceituais se fundamentam no relatório anterior, por vezes abordando de modo mais incisivo pontos que antes foram mencionados superficialmente – como o tocante à economia rural não-agrícola. No relatório Reaching the Rural Poor, há uma seção específica para designar as ações que deveriam ser implementadas pelo Banco para fomentar esse segmento, tais quais: fortalecer habilidades e o capital organizacional; promover desenvolvimento econômico local e suas relações intersetoriais; remover barreiras legislativas, regulatórias, tarifárias e outras; promover o desenvolvimento de pequenos negócios, sobretudo através do investimento em serviços de infraestrutura rural (transporte, comunicação, etc). Porém, o documento ressalta que na maioria dos países, o conhecimento sobre o setor privado rural não-agrícola era

48 Alcançando os Pobres Rurais – Uma Estratégia Renovada para o Desenvolvimento Rural.

49 Segundo o Banco Mundial, mais de 2.000 pessoas estiveram envolvidas neste processo (WORLD BANK, 2003, p. 98).

insuficiente para o efetivo desenvolvimento de intervenções, de modo que pesquisas e trabalhos setoriais seriam realizados para obter mais informações (WORLD BANK, 2003).

As propostas ―renovadas‖ do Banco sugerem cinco aspectos principais: a) maior enfoque à pobreza, incluindo questões de gênero, raciais e étnicas, que o Banco chama de ―desenvolvimento rural holístico pró-pobre‖; b) promoção de um crescimento de base ampla, reafirmando a agricultura como motor da economia agrícola e, ao mesmo tempo, reconhecendo a importância de economias rurais não-agrícolas; c) enfoque do espaço rural em sua totalidade, numa abordagem intersetorial de longo prazo; d) fomento de alianças com todos os atores, impulsionando a participação e descentralização; e) atenção ao impacto de alterações no contexto global (políticas comerciais internacionais, subsídios à agricultura, mudanças climáticas e outros) sobre os países clientes (WORLD BANK, 2003).

Esses cinco componentes, porém, não seriam trabalhados com a mesma intensidade em todos os países. O Banco propõe planos de ação diferenciados por região geográfica50, os quais estabelecem as ações prioritárias e respectivas formas de abordagem. Esses planos regionais, segundo o Banco, foram resultado de intensivas consultas com uma ampla gama de atores, incluindo organizações locais, governos nacionais, empresas privadas, ONGs, acadêmicos e agências financiadoras (WORLD BANK, 2003).

Este documento também traz a visão do Banco Mundial sobre suas próprias ―vantagens comparativas‖ para liderar um processo global de desenvolvimento rural, visando proceder com a rarefação dos sujeitos que falam (FOUCAULT, 2009) ao delimitar as regras e as qualificações necessárias para discursar sobre o tema, bem como fixar a eficácia suposta das suas palavras e o efeito sobre os quais elas se dirigem. Além de se classificar como a maior provedora mundial de empréstimos para o desenvolvimento rural, com 60% de todos os empréstimos agrícolas feitos por instituições financeiras internacionais, o Banco delega a si mesmo um ―poder de convocação‖. Com este poder, articula em torno de si uma rede de atores peritos e garante a eficácia no controle do discurso sobre desenvolvimento:

O Banco é a única instituição global capaz de reunir todos os atores e financiadores, incluindo o setor privado, para discutir assuntos importantes e traçar estratégias. Este ‗poder de convocação‘ possibilita que o Banco desempenhe papel catalítico na definição de novas direções e agendas de desenvolvimento rural em termos globais, regionais e para países individualmente. [...] A diversidade de instrumentos disponíveis permite ao Banco oferecer assistência técnica politicamente orientada e dar suporte à implementação de políticas por ele endossadas através de programas de investimento. [...] Sendo uma instituição multisetorial, o Banco está apto a fornecer uma perspectiva transversional e holística para a verdadeira natureza

50 África; Ásia Ocidental e Pacífico; Europa e Ásia Central; América Latina e Caribe; Oriente Médio e Norte da África; Sul da Ásia.

multidimensional do desenvolvimento rural. (WORLD BANK, 2003, p. 20, tradução da autora).

Ademais, o Banco afirma ser uma instituição internacional de propriedade coletiva não dirigida por objetivos estreitos de maximização de lucros, o que permitiria a ele prover seus clientes com suporte imparcial e plurianual para o desenvolvimento rural, ―mesmo quando as condições políticas ou econômicas, ou os conflitos em dado país, não oferecem oportunidades de negócios imediatas e atrativas para instituições financeiras privadas‖ (WORLD BANK, 2003, p. 21, tradução da autora). A argumentação apresentada neste trabalho revela a falácia desta suposta neutralidade.

4.2.3 World Development Report 2008: Agriculture for Development (2007)