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Realidade transgênero no contexto midiático brasileiro

2. DOCUMENTÁRIO, ESTÉTICA E POÉTICA DAS REPRESENTAÇÕES DAS

2.2. Realidade transgênero no contexto midiático brasileiro

Diversas produções cinematográficas ganharam a atenção da população por trazerem às telas imagens de corpos marginalizados, minoritários e desalinhados. Talvez sejam elas consideradas transgressoras para uma determinada geração, região ou sociedade consumidora, ou sejam elas normativas quando comparadas ao circuito independente de cinema, este que se dedica a uma maior exploração política e autoral destes corpos.

Existiram, e ainda existem, diversas produções midiáticas - sejam elas impressas, musicais, digitais ou audiovisuais - que abordam a temática transgênero das mais variadas formas. Desde personagens coadjuvantes em novelas de horário nobre, manchetes de assassinatos no jornal matutino, documentários e livros sobre personalidades influentes, álbuns de música de artistas trans, filmes com atuações e produções por parte de sujeitos transgêneros, até mesmo uma série de alta repercussão mundial sobre o período do ballroom 2 e a vivência LGBT nos EUA. Para contextualizar o documentário ​Meu corpo é político

(2017) entre as produções midiáticas dos últimos anos, realizo um movimento de retomada de um breve resumo das obras mais importantes para este trabalho.

Inicio essa lista de referências revelando um pouco mais do contexto de produção de documentários no Brasil sobre a temática. A obra ​Bixa Travesty​(2018), escrita e dirigida por Kiko Goifman e Claudia Priscilla, é descrita como um filme performativo sobre as “novas” possibilidades de identidades de gênero. Produzido em parceria com Linn da Quebrada, que auxiliou e esteve presente em todo o processo criativo, ​Bixa Travesty ​(2018) traz a aparição de personalidades como Jup do Bairro e Liniker, de grande influência como sujeitos assumidamente transgêneros. O filme participou de diversos festivais ao redor do Brasil e no mundo, ganhando reconhecimento ao vencer o prêmio ​Teddy​, dedicado a filmes com temática LGBT, no Festival Internacional de Berlim (VERAS, 2018).

Outro filme documentário lançado nos últimos anos e que repercutiu no contexto midiático brasileiro foi a obra ​Laerte-se ​(2017​)​, filme sobre a artista e cartunista Laerte Coutinho, com produção da Tru3Lab e direção de Lygia Barbosa da Silva e da jornalista Eliane Brum. O documentário, distribuído em formato ​streaming​pela Netflix, conta a vida de uma das artistas mais influentes na área das charges e ilustrações no Brasil e no mundo, abordando como ponto central a experiência de reconhecer-se publicamente como mulher, aos 57 anos. Eleito o primeiro documentário original brasileiro da Netflix, ​Laerte-se ​(2017) participou no festival ​É tudo verdade​ no ano de 2017 (GENESTRETI, 2017).

Apresento a produção de mais duas obras documentárias que abordam a temática no contexto dos últimos anos no país: a primeira delas é o documentário desenvolvido pelo canal Globo News, roteirizado e editado por Renata Baldi, chamado ​trans ​(2016). A obra possui uma grande semelhança com o documentário que está sendo analisado neste trabalho, principalmente por abordar as vivências de quatro personagens transgêneros no território brasileiro, a diferença é que neste caso os personagens possuem uma classe e status social mais elevado, além de serem brancos e moradores de zonas centrais do Rio de Janeiro. O recorte de classe aponta muita diferença entre a obra realizada pelo canal televisivo e o documentário ​Meu corpo é político ​(2017) de Alice Riff. Há ainda mais uma obra que não possui grande reconhecimento midiático como as outras, porém, chamou atenção por abordar a vivência de uma personagem trans em um contexto extremamente normativo. O filme

Maria Luiza ​(2019), dirigido por Marcelo Diaz, conta a história da vida de Maria Luiza da Silva, a primeira mulher transexual a ser reconhecida - depois de diversas batalhas judiciais - dentro das Forças Armadas Brasileiras (FAB).

No contexto televisivo, cito algumas das poucas participações de atores e atrizes transgêneros em telenovelas brasileiras, salientando uma crítica forte para a inserção de personagens transgêneros interpretados por atrizes e atores cisgêneros. Cito o trabalho e participação dos atores e atrizes brasileiros: Glamour Garcia, Thammy Miranda, Gabrielle Joie, Roberta Close, Rogéria, Tarso Brant, e no contexto mundial, os atores e atrizes: Laverne Cox, Elliot Fletcher, Hunter Schafer, Brian Michael Smith, Angélica Ross, Jamie Clayton, Mj Rodriguez, Indya Moore, Ian Harvei, Alexandra Billings, Erika Ervin e Chaz Bono. Ainda, desejo mencionar artistas do mundo da moda, da arte, da música e personalidades influentes na mídia mundial como Caitlyn Jenner, Lea T, Liniker, Lana Wachowski, Mel Gonçalves, Erica Malunguinho e Valentina Sampaio. Trago ainda duas iniciativas interessantes, a primeira é do ​Canal Brasil​: um ​talk show apresentado por Linn da Quebrada e Jup do Bairro que tem o nome de ​TransMissão ​(2019), e como proposta entrevistar determinadas personalidades midiáticas em conversas sobre sexualidade, gênero e raça. E a segunda iniciativa, é a participação de Linn da Quebrada na série de televisão da Rede Globo, ​Segunda

Chamada ​(2019)​, ​uma ficção ​sobre a resistência de alguns professores da rede pública estadual a uma péssima infraestrutura escolar e a dificuldade do acesso à educação para alunos jovens e adultos.

Entre as notícias e reportagens sobre a temática trans no Brasil, um dos pontos que ainda mais circulam são manchetes sobre assassinatos a sangue frio pelos quatro cantos do país, notícias sobre a dificuldade de empregabilidade, polêmicas envolvendo transfobia e casos de suicídio. Um dos pontos positivos e que tiveram grandes alterações durante os últimos anos foram relacionados às oportunidades para sujeitos transgêneros: mesmo que sejam mínimas, houve um considerável aumento de iniciativas voltadas para inserção no mercado de trabalho, reconhecimento no mundo dos esportes ou em espaços conservadores, além de uma melhoria na legislação. Por mais que os casos de assassinatos a sujeitos transexuais e travestis ainda são frequentes, posso notar um certo movimento dos veículos midiáticos em iniciativas e oportunidades que envolvem uma maior inclusão.

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