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3.5 R EATORES UASB E SISTEMAS DE APLICAÇÃO SUPERFICIAL NO SOLO

3.5.1 Reatores UASB

Embora com várias denominações no Brasil (RAFA, DAFA, RAFAALL, RALF etc.), este se consagrou no mundo todo como reator UASB (Upflow Anaerobic Sludge Blanket Reactor), nomenclatura original em inglês atribuída por um de seus pioneiros na Holanda, o Prof. Gatze Lettinga da Universidade de Wageningen. Essa nomenclatura passou a ser adotada também no Brasil (CHERNICHARO, 1997; CAMPOS, 1999).

Os reatores UASB não possuem qualquer material de enchimento para servir de suporte para o crescimento da biomassa. A imobilização dos microrganismos ocorre por meio de auto- adesão, formando flocos ou grânulos densos suspensos, que se dispõem em camadas de lodo. No fundo do reator localiza-se o lodo mais denso com partículas granulares de elevada capacidade de sedimentação (leito de lodo) e nas regiões próximas ao topo do compartimento de digestão localiza-se o lodo menos denso e mais leve (manta de lodo). O processo consiste na passagem de um fluxo ascendente de esgotos através do leito e da manta de lodo, que apresentam elevada atividade (CASSEB, 1996; CHERNICHARO, 1997; MACHADO, 1997, citados por ARAÚJO, 1998).

A estabilização da matéria orgânica ocorre em todas as camadas de lodo ao longo da altura do reator, sendo a mistura, responsável pela garantia do maior contato entre a biomassa e o substrato, conseguida pelo fluxo ascensional do esgoto e pelas bolhas de biogás formadas pela decomposição anaeróbia da matéria orgânica. Não se utiliza qualquer dispositivo mecânico de mistura, uma vez que esses dificultam a formação dos grânulos (CHERNICHARO, 1997).

A saída do esgoto se dá por um compartimento de decantação interno, localizado na parte mais alta do reator. O compartimento de decantação permite que os sólidos desgarrados da manta de lodo retornem ao compartimento de digestão. O líquido decantado sai do reator como efluente final (CHERNICHARO, 1997).

O reator UASB desempenha simultaneamente várias funções que, em outras estações de tratamento aeróbio convencional, são usualmente efetuadas em tanques separados. No reator UASB ocorre a retenção de uma parcela significativa dos sólidos suspensos presentes no

hidráulico ascendente, ficam retidos no leito de lodo biológico espesso. Além dessa retenção de sólidos na parte inferior do reator, ocorre também a sedimentação do lodo biológico que eventualmente escapa do compartimento de digestão, mas para isso é essencial a instalação de um separador de sólidos na parte superior do tanque (ver Figura 3.1).

Coleta do efluente Compartimento de decantação Compartimento de digestão Abertura para o decantador Defletor de gases Separador trifásico Afluente Bolhas de gás Leito de Lodo Manta de Lodo Saída de biogás Partículas de lodo

Figura 3.1 - Representação esquemática de um reator UASB

O reator UASB desempenha, portanto, o papel de digestor dos sólidos retidos, como também de parte da própria biomassa presente, daí resultando um lodo bastante estabilizado. Quando do descarte do lodo de excesso, torna-se necessário somente a sua desidratação e, eventualmente, a sua higienização (no caso de reúso agrícola do lodo). Além da digestão dos sólidos, ocorrem ainda reações de conversão da matéria orgânica presente nos esgotos. Portanto, o reator UASB desempenha, ao mesmo tempo, as funções de um decantador primário, de um reator biológico propriamente dito, de um decantador secundário e de um digestor de lodo.

Além do separador de sólidos, que funciona também como separador de gases que ascendem juntamente com o líquido, é essencial que o reator UASB tenha uma distribuição bem uniforme e adequada do esgoto afluente junto ao fundo. Isso para evitar os problemas de mau contato entre biomassa e esgoto, devido ao possível surgimento de zonas mortas, curtos- circuitos hidráulicos e caminhos preferenciais no interior do reator. Isso pode ocorrer porque

o lodo se mantém no interior do reator em camadas de espessura e densidade distintas. Apesar da configuração se aproximar mais daquelas com lodo em suspensão, com mobilidade vertical, as camadas mais próximas do fundo podem permanecer quase estacionárias, por se constituírem de lodo mais denso e com alta concentração de sólidos, ao passo que as superiores se constituem de lodo menos denso e com menor concentração de sólidos, devido à sua maior expansão.

• Fundamentos da digestão anaeróbia

O processo metabólico pelo qual as bactérias anaeróbias e facultativas produzem metano e gás carbônico a partir da degradação de compostos orgânicos complexos é denominado digestão anaeróbia. A digestão anaeróbia da matéria orgânica segue uma seqüência mais complexa do que o processo aeróbio. A ocorrência desse processo é muito comum em vários tipos de ecossistemas naturais, como áreas pantanosas, órgãos digestivos dos ruminantes e sedimentos de rios, lagos e mares (VAN HAANDEL & LETTINGA, 1994).

A digestão anaeróbia, de uma maneira mais simplificada, pode ser dividida em quatro estágios (CHERNICHARO, 1997):

1. O primeiro estágio é conhecido como hidrólise. Tal processo é considerado muito lento e é realizado por um grupo de bactérias facultativas e anaeróbias (aproximadamente 99% são anaeróbias e 1% facultativas) denominadas bactérias hidrolíticas, cuja função é quebrar as ligações dos compostos orgânicos complexos como carboidratos, proteínas e lipídeos.

2. O segundo estágio é conhecido como acidogênese. Com a presença das substâncias dissolvidas no interior da célula bacteriana, inicia-se a produção de ácidos. O principal ácido produzido nessa Fase é o ácido acético, pois a reação de formação desse ácido gera uma maior quantidade de energia para a célula.

3. O terceiro estágio é conhecido como acetogênese. É caracterizado pela formação de acetato, carbonato e hidrogênio a partir dos ácidos graxos voláteis e dos demais produtos da acidogênese. Tais compostos formados servirão como substrato para a formação de metano.

4. É no quarto estágio da digestão anaeróbia que ocorre a verdadeira estabilização da matéria orgânica. Os ácidos orgânicos e o hidrogênio são convertidos em produtos finais gasosos como metano e gás carbônico, que são removidos da Fase líquida. Esta etapa é realizada por bactérias estritamente anaeróbias formadoras de metano.

É importante notar que não ocorre qualquer estabilização do resíduo durante os três primeiros estágios da digestão anaeróbia. Entretanto esses três estágios têm um caráter fundamental, pois convertem a matéria orgânica em uma forma mais apropriada para a utilização na quarta Fase da digestão anaeróbia.

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