• Nenhum resultado encontrado

Rebatimentos da produção anterior “PAGE”

5. OS FÓRUNS DE JUSTIÇA “MODULARES DOP” A PARTIR DOS ANOS DE

5.1. DOP: ascendências históricas

5.1.4 Rebatimentos da produção anterior “PAGE”

Ainda que a produção do DOP tivesse conhecido uma inlexão, com a reor- ganização dirigida por Francisco Whitaker, (num momento anterior ao das obras

74 Em recente conversa telefônica, em 2012, Vaccari relatou que a identidade formal era uma pretensão

de Meirelles, questão que não pode ser comprovada.

133

acima comentadas), o seu ritmo não se adequava aos objetivos e prazos do plano. Para Plínio de Arruda Sampaio que dialogava com vários arquitetos mo- dernos, seus amigos, (conforme observação da nota 128) os “projetos padrão” desenvolvidos pelo DOP, sobretudo, não atendiam as qualidades pretendidas, em termos de aproveitamento, desempenho e funcionalidade:

(...) O que se gasta para preencher o terreno ou tirar o terreno, você gasta num bom projeto que rompia o padrão, aproveita o terreno e faz algo muito melhor, com a insolação bem feita, etc.75

Observa-se, porém que, no caso dos fóruns, os padrões a que Sampaio se re- fere foram os projetos tipos A, B, C e D (divisões as quais obedeciam à capacida- de de acomodação do número de cartórios e varas no edifício), elaborados pela DOP, após o desmembramento da função cadeia e fórum, provavelmente, a partir da segunda década do século XX76. Esses edifícios seguiam os padrões tradicio-

nalistas para o programa de necessidades dos edifícios da justiça, acomodado no andar superior estão os serviços mais restritos e no térreo de acesso menos restrito. De padrão eclético foram construídos (ou terminados) até os meados dos anos de 1960. Foram elaborados com aproximação ao simbolismo da justiça. Carregados dessa simbologia solicitavam uma correspondência na organização espacial, como instituição social que formula uma liturgia própria. Assim, foram materializados em uma hierarquia espacial com volumetria distribuída em dois pavimentos e com elementos ‘historicistas’, em geral neoclássicos77.

A decisão do PAGE de contratar projetos elaborados por arquitetos não-fun- cionários trouxe grandes questionamentos por parte dos proissionais do DOP. Assim, essa opção atendia aos aspectos de renovação e enfrentamento simbóli- co, permitindo aos arquitetos, ou pelo menos parte deles, explorarem “invenções de soluções” dos equipamentos, como agentes políticos, nos termos expostos no início desse Plano.

Para Fábio Penteado, autor do Fórum de Araras, essa solução se assentava em romper as tradicionais hierarquias desse edifício, transformando e ajustando sua realidade:

O Fórum foi o seguinte. Eu tenho uma linha de projetos, todos são da mesma linha. Também como professor que fui. O que é um Fórum? Você pode pegar a história para enriquecer, aumentar o livro, história antiga, etc. Aí vem a realidade se aproximando da realidade, onde ele é: para quem que ele vai atender? Então, Araras deveria ter... Não tinha trinta mil habitantes de jeito algum, vinte mil, quinze mil... Também fui dentro do limite

75 SAMPAIO, op.cit.

76 Não foram encontradas na pesquisa fontes documentais que comprovassem a data de criação dos

projetos padrões “ecléticos”. Sendo possível fazer somente uma aproximação temporal através de cruzamentos de dados e relatos.

134

precário, ver o que era um Fórum e tinha um padrão geral, assim era descrição que vi na época. Um padrão dentro daquela linha dos juízes, do comando não sabe da onde um pré- dio Vetusto. E acomodava no terreno, conforme vinha uma escada, com pé direito duplo na entrada na porta, uma réplica de salas dos passos perdidos que as pessoas se dirigiam. Como eu coloquei na época você pega uma cidade parada, população rural, pouca coisa fulminante que escapa ao arquiteto porque ele é obrigado a seguir uma linha ditada pelo programa daquele juiz, daquele promotor. O Fórum não é Fórum de Justiça, ele tem lá o re- gistro imobiliário, os cartórios, então o cidadão nasce um ilho vai registrar, morreu alguém ele tem que fazer inventário. Ai entra todo o aspecto da realidade. O cidadão comum ao se aproximar já tem dúvida, já tem medo é ancestral. Na porta daquele prédio tem um cidadão que é guarda ele pode não fazer nada, está lá relaxado já maltratando pelo princípio de ser autoridade. E ele indica ao cidadão que veio a pé da terra, tem um cartório, tem um garoto que atende no cartório que carimba o papel que também não está. Manda-oele vir no dia seguinte que já vai fechar de tarde. Essa é a visão de Fórum. Então eu propus um Fórum que não tivesse porta, a área era uma praça, grande tinha espaço. Então a ideia em prin- cípio foi de usar um espaço onde chamaria de Fórum, ele gerava uma sombra na pracinha onde o cidadão aguardava na sombra (...) 78.

Para o arquiteto, o signiicado do espaço franqueado no projeto também ope- racionalizava a relação espacial desejada para o Fórum:

Não tinha porta. Embaixo você teria uma galeria aberta que seriam os cartórios etc. Coloquei sanitário público. Aí tinha uma escada que levava a esta galeria que também era

78 PENTEADO, Fábio, Fábio Penteado: Ensaio de Arquitetura. São Paulo: Empresa das Artes, 1998.

Figura 33: Fórum de Dracena “padrão DOP – Eclético”, segundo processo, “Tipo - A” em construção, concluído em 1957. Fonte: IPESP

135

aberta onde tinha as salas dos juízes, dos promotores, dos advogados, sempre visível. E para a sala de espetáculo, que eu apresentei um painel do pintor Mário Gruber, nós convi- víamos juntos, tinha conseguido a autorização de uso na Secretaria da Justiça, porque o júri não era muito usado. Era para julgar pessoas, mas era uma média de uma vez por ano porque não havia muitos julgamentos. Então eu a pedi para uma pequena sala de música para a comunidade ou de reunião pequena. Essa foi a ideia. Uma coisa absolutamente contrária a visão que era dos fóruns que eu conhecia 79.

Questionado ainda se pretendia ir contra a hierarquia processual com o pro- jeto, Penteado concordou ratiicando: era contra mesmo. Ainda que retiradas de um único projeto, essas questões reletiam uma postura arquitetônica muito cara à formação da arquitetura moderna brasileira, passível de ser estendida a outros projetos daquele período.

Os projetos padrão formulados pelo DOP, após a produção PAGE, guardada a dimensão formal em que se reformularam, pouco absorveram da produção anterior. Pode-se airmar que os torreões que comportam as escadas de aces- so de nível dos padrões “F” e presente no projeto de Araras é uma dessas. Na sua distribuição interna estritamente funcionalizada em relação ao programa dos equipamentos da justiça, conservaram a mesma composição dos edifícios ante- riores ao PAGE, quando suas funções eram hierarquizadas através de valores simbólicos tradicionalistas para esses equipamentos, neste caso substituídos por funcionalidade estrita.

Outra questão que também não foi contemplada pelos edifícios-padrões pre- sentes em Araras e em Avaré, obras de Paulo Mendes da Rocha, foi o resultado obtido com articulação de seus acessos através de uma “praça coberta”, criada pela elevação do corpo principal do edifício. Condição que ao mesmo tempo em

79 Entrevista Fábio Moura Penteado ao Grupo de Pesquisa: Arte e Arquitetura Brasil: Diálogos na Cidade

Moderna e Contemporânea, em 09 de abril de 2007, em São Paulo.

Figura 34: Fórum de Araras (1959). Arquiteto Fábio Penteado. Perspectiva do pátio coberto, onde se observa o torreão de escada, painel de azulejo na parede do júri e espelho d’ água com cascata. Fonte: PENTEADO, Fábio, Fábio Penteado: Ensaio de Arquitetura. São Paulo: Empresa das Artes, 1998.

136

que desembaraçou a relação entre o interior e o exterior do edifício, disponibili- zou mais prontamente os serviços gerais do fórum tais como protocolo e cartó- rios localizados no nível da praça.

A coniguração utilizada nos “F”, blocos fechados arrematados por brises (ele- mentos vazados de concreto), se aproximam formalmente das soluções de Botti e Rubin, em Porto Feliz, e de Oswaldo Arthur Bratke, em Amparo. Os edifícios F não utilizaram elementos pré-moldados e não se organizaram em torno de um pátio central por onde se distribui os acessos, como foi utilizado por esses arqui- tetos para os fóruns do PAGE. 80

Figura 35: Fórum de Porto Feliz. Imagem da autora.

80 Bratke, segundo Segawa, tinha na sua formação uma aproximação intensa com as novas possibilidades

construtivas que se revelavam através da introdução de novas técnicas e novos materiais. Esse campo experimental levou o arquiteto a ser permanentemente procurado por indústrias da área da construção civil para avaliar seus novos produtos oferecidos ao mercado. Era profundamente aberto às novas experiência: “Em sua vida proissional, Bratke acompanhou a introdução e o desenvolvimento das novas técnicas e dos novos matérias de construção no país.” SEGAWA, op. cit., p. 31. Entretanto, longe de limitá-lo a um proissional de mercado sua atuação no campo social, distante de uma amplitude “revolucionária”, é profundamente experimentada com os projetos urbanísticos para a Vila Serra do Navio e Vila Amazonas, ambas contratadas em 1955 e projeto inalizado em 1960. O Fórum de Amparo relete esse modo de produção recorrente pelo arquiteto, onde seu resultado formal se compõe com os demais edifícios residenciais produzidos por ele no período. Aliás, isto é uma formulação moderna que se repete também em outros edifícios forenses por seus autores, mas, no caso de Bratke, ica mais evidente por sua adesão ao sistema de pré-fabricação, no qual a semelhança é intrínseca a esse sistema construtivo.

137

Figura 36: Fórum de Amparo. Imagem da autora.

A articulação da distribuição de acessos em torno de um pátio também foi uti- lizada por Vilanova Artigas em Promissão, e Joaquim Guedes em Itapira, substi- tuindo, porém o pátio por um jardim aberto, mantendo a permeabilidade e quebra da hierarquia tradicional do edifício.

Documentos relacionados