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1. INTRODUÇÃO

1.3 Resíduos sólidos urbanos: um problema ambiental emergente

1.3.2 Reciclagem

A reciclagem pode ser considerada um dos elos fundamentais para as políticas de gerenciamento de resíduos sólidos, sendo parte integrante fundamental da PNRS. Utilizando dados da CEMPRE o Ipea (2013) aponta no Relatório “Situação Social das Catadoras e dos Catadores de Material Reciclável e Reutilizável” que apesar de no Brasil o percentual de municípios atendidos pelos programas municipais de coleta seletiva ser baixo, o país destaca-se na indústria de reciclagem e este panorama tende a se intensificar com a formalização do processo de reciclagem como parte integrante dos processos de gerenciamento de resíduos sólidos, conforme instituído pela PNRS.

Nesse sentido, existe no país uma cadeia de reciclagem que movimenta volumes crescentes de resíduos sólidos que voltam para o processo produtivo. Certos resíduos que são reciclados no Brasil equiparam-se ou mesmo superam, a exemplo do alumínio, os valores registrados nos Estados Unidos da América (EUA), União Europeia (EU) e América Latina (Demajorovic e col., 2014).

Quanto à consolidação do mercado de reciclagem no Brasil, diversos estudos indicam que esse setor, desde o seu início, teve como base de sustentação o trabalho dos catadores de material reciclável, em razão primordial desta ser a solução mais barata de recolhimento e seleção destes materiais. Para que a reciclagem pudesse se estabelecer sem a presença desses trabalhadores, teria sido necessário que a separação de resíduos fosse realizada por meio de uma coleta seletiva em ampla escala, o que está longe de representar a realidade do país (Bosi, 2008).

Apesar de baseado na “informalidade”, o trabalho de catação no Brasil assume posição de destaque tanto em relação à quantidade do material reciclado, como em relação ao volume do faturamento atingido nesse negócio. No caso de plásticos, principalmente PET, em 2003, a quantidade consumida no Brasil que foi reciclada correspondeu a (16,5%), valor que só foi menor do que os apresentados pela Alemanha (31,1%) e pela Áustria (19,1%). Ainda no ano de 2003, o faturamento atingido com os plásticos girou em torno de 1,22 bilhão de reais. Deve-se destacar, entretanto, que a reciclagem no Brasil está voltada para a lógica do mercado, sendo que resíduos menos rentáveis apresentam índices muito baixos, a exemplo da reciclagem de resíduos orgânicos, cujo faturamento gira em torno de 1,5% (Bosi, 2008).

Em um estudo de campo, Magera (2003) observou que a estrutura e o funcionamento do mercado de reciclagem encontra-se baseada em três elementos (ou agentes): o catador autônomo, que participa ou não de associações e que realiza a primeira etapa do processo, recolhendo e separando os resíduos em um cenário bastante competitivo; os sucateiros, que, informal ou formalmente, compram os produtos reciclados pelos catadores ou cooperativas e os revendem às indústrias ou os compradores internacionais; e as indústrias de reciclagem, que representam o terceiro elemento dessa cadeia de reutilização dos resíduos.

Para o autor, os grandes beneficiários de todo o processo de reciclagem no Brasil e no mundo são as indústrias, exatamente por permanecerem altamente concentradas (Magera, 2003). Os integrantes da cadeia de reciclagem que menos se beneficiam com essa atividade são os catadores, porque as indústrias que compram materiais recicláveis são escassas constituindo um mercado que pode ser denominado oligopsônico6, ou seja, em que alguns poucos compradores determinam o preço (Aquino e col., 2014).

Desde 1994, a associação Compromisso Empresarial para a Reciclagem (CEMPRE) reuniu informações sobre os programas de coleta seletiva, desenvolvidos por prefeituras, apresentando dados sobre composição do lixo, custos de operação, participação de cooperativas de catadores e parcela de população atendida, através da pesquisa Ciclosoft, que tem abrangência geográfica em escala nacional e possui periodicidade bianual de coleta de dados (CEMPRE, 2014). Essas informações, embora não representem todo o universo do mercado de reciclagem no país, fornecem um panorama aproximado dessa atividade.

A figura abaixo demonstra a evolução da coleta seletiva no Brasil, apontando que em 2014, 927 municípios (cerca de 17% do total), contavam com esse serviço.

Figura 3: Municípios com coleta seletiva no Brasil

Fonte: CEMPRE, 2014.

6Em economia, oligopsônio ou oligopsónio é uma forma de mercado com poucos compradores, chamados de oligopsonistas, e

inúmeros vendedores. É um tipo de competição imperfeita, inverso ao caso do oligopólio, em que existem apenas alguns vendedores e vários compradores.

De acordo com o levantamento realizado em 2014 pela CEMPRE, os programas municipais de coleta seletiva concentram-se nas regiões Sudeste e Sul do País. Do total de municípios brasileiros que realizam esse serviço, 81% encontram-se situados nessas regiões. Cerca de 28 milhões de brasileiros (13%) têm acesso a programas municipais de coleta seletiva (CEMPRE, 2014).

Ainda pelos dados da CEMPRE a coleta seletiva dos resíduos sólidos municipais é feita pela própria Prefeitura em 43% das cidades pesquisadas; empresas particulares são contratadas para executar a coleta em 37%; praticamente metade (51%) apoia ou mantém cooperativas de catadores como agentes executores da coleta seletiva municipal. O apoio às cooperativas está baseado em: maquinários, galpões de triagem, ajudas de custos com água e energia elétrica, caminhões, capacitações e investimento em divulgação e educação ambiental (CEMPRE, 2014).

Aparas de papel/papelão continuam sendo os tipos de materiais recicláveis mais coletados por sistemas municipais de coleta seletiva (em peso), seguidos dos plásticos em geral, vidros, metais e embalagens longa vida. A porcentagem de rejeito ainda é elevada, conforme demonstra a figura 4 abaixo:

Figura 4: Composição gavimétrica da coleta seletiva 2014

Fonte: CEMPRE, 2014

Na cidade de São Paulo, o levantamento aponta que a coleta seletiva passou de 120 ton/mês, no ano de 2002, para 5.000 ton/mês em 2014. Ainda pelos mesmos dados, atualmente, 42% da população é atendida por esse serviço.

Outros avanços importantes em relação à reciclagem no país referem-se a projetos que têm por finalidade capacitar catadores de lixo para a realização da coleta segura e o processamento adequado de alguns tipos de materiais, incluindo os resíduos de equipamentos eletrônicos.

Um dos exemplos nesse sentido consiste no projeto ECO-ELETRO. Nascido de uma iniciativa do LASSU (Laboratório de Sustentabilidade em TIC- Tecnologia da Informação e Comunicação), do Departamento de Engenharia de Computação e Sistemas Digitais (PCS) da Escola Politécnica (POLI) da Universidade de São Paulo (USP), em parceria com o Instituto GEA, uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), sua finalidade principal é desenvolver a cidadania e a educação ambiental, assim como assessorar a população a implantar programas de coleta seletiva de lixo e reciclagem. Esse projeto iniciou suas atividades em 2010 e, desde então, procura capacitar catadores de material reciclável. Em 2014, cerca de 170 catadores que participaram do curso de reciclagem realizado pelo projeto receberam certificação (LASSU, 2010).

Os principais objetivos desse projeto consistem em aumentar a renda dos catadores de materiais recicláveis da Capital e de municípios da região metropolitana (Diadema, Guarulhos, Mauá, Ribeirão Pires, São Bernardo do Campo, São Paulo), além de evitar que o lixo eletrônico seja descartado em locais inadequados, prejudicando o meio ambiente (LASSU, 2010).

Deve-se aqui ressaltar que, além do aumento na renda dos catadores, já que separar e classificar o lixo eletrônico por tipo de material e encaminhá-lo para diferentes empresas de reciclagem especializadas pode render um valor muito superior, comparado ao que recebe sem o tratamento de algumas peças, esse tipo de iniciativa auxilia na proteção à saúde desses trabalhadores.

Estas iniciativas vão ao encontro das propostas da PNRS, que pressupõem a inclusão dos catadores de material reciclável no gerenciamento dos resíduos sólidos urbanos.