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CAPÍTULO VI – EXERCÍCIO DE INVESTIGAÇÃO [Abordagem Mosaico]

3. Fases da abordagem mosaico

3.1. Recolha de informação

Para iniciar a investigação, apresentámos às crianças um saco com uma surpresa. Era a imagem da fachada do edifício do JI recortada em forma de puzzle. As crianças começaram a construi-lo e depressa concluíram que era a sua escola.

Com esta atividade tínhamos a intenção, de uma forma implícita, de fazer a ponte com a questão de partida – Qual a perspetiva da criança acerca dos espaços do Jardim de Infância?

A partir da imagem, foi realizada uma reunião/conversa com todas as crianças para que tivessem conhecimento dos objetivos da investigação e das intensões que tínhamos com a implementação desta abordagem. O nosso papel, numa pedagogia de participação, era o de começar por construir um lugar de afetos, encorajar as crianças e dar-lhes autonomia, sendo bem claro sobre o que se esperava delas.

Após informarmos as dinâmicas do exercício, perguntámos quem gostaria de participar, respeitando, desta forma, o direito ao consentimento informado, bem como o seu pleno direito de não participar (Biklen & Bogdan, 1994). Desta forma, ao considerar o consentimento da criança, expressa-se um conjunto de cuidados éticos reveladores de sensibilidade e respeito pela criança (Oliveira-Formosinho & Araújo, 2008b). De acordo com Parsons e Stephenson (2001), citado por Oliveira- Formosinho e Araújo (2008b), “todos aqueles que se encontram envolvidos na investigação têm o direito de serem tratados de forma ética e moralmente aceitável, incluindo nesta consideração as crianças” (p.25).

Este foi o primeiro contacto de escuta da criança. Depois de constituído o grupo, registaram o seu nome numa folha, como forma de compromisso e de se sentirem parte integrante da investigação. Colocámos ao seu dispor uma série de instrumentos [máquina fotográfica, folhas brancas, lápis], começando a fase de recolha da informação e tendo em consideração a criança como co-investigadora, condutora do próprio processo.

Vários foram os métodos utilizados [circuitos, a construção de mapas, registos fotográficos, desenhos, entrevistas informais] para que, num processo gradual e contínuo, as crianças percebessem a quantidade de opiniões que podem emitir a partir de múltiplas linguagens, assim lhes demos espaço, autonomia e motivação. “A

105 escuta das suas perspetivas não é um processo circunscrito à comunicação verbal, incidindo antes, sobre todos os formatos que materializam e documentam a voz das crianças” (Araújo & Andrade, 2008, p.114). Deste modo, ficámos mais atentas, não apenas à comunicação verbal das crianças, mas também à não-verbal/visual, às brincadeiras, às formas simbólicas e a todas as ações que nos permitiam escutar a criança.

Começamos as entrevistas semiestruturadas e as conversas informais que, segundo Oliveira-Formosinho e Araújo (2008b), são consideradas o formato mais adequado para entrevistar crianças. No início não foi fácil chegar a respostas muito elaboradas, porque não nos conhecíamos suficientemente bem uns aos outros. Sendo a primeira oportunidade real de ouvir as crianças fez-nos reconhecer que esta seria a melhor “forma de as conhecer e melhor identificarmos e respondermos às suas necessidades, interesses, competência e direitos” (idem/ibidem, p.27). No entanto, a entrevista revelou-se ser um recurso bastante eficaz, pois possibilitou a recolha de dados descritivos na linguagem do próprio sujeito, permitindo que o investigador desenvolvesse intuitivamente uma ideia sobre a maneira como os sujeitos interpretam aspetos do mundo (Biklen & Bogdan, 1994).

De acordo com Cruz (2008), as opiniões das crianças deveriam ser ponto de partida para se pensar a prática pedagógica nas instituições.

De igual forma, os circuitos foram métodos bastante relevantes no processo de recolha de informação. Consistiram em visitas guiadas pelas crianças ao JI onde, ao longo dos percursos, utilizaram o registo fotográfico e/ou o desenho como forma gráfica de representar o espaço que mais gostavam, que menos gostavam e que gostariam de mudar. Assim, exprimiram pensamentos e sentimentos que por vezes são difíceis de expressar verbalmente.

Numa fase seguinte, toda a informação foi compilada em mapas. Segundo Clark e Statham (2005), os mapas, consistem em representações no plano, desenvolvidas pelas crianças, onde colocam os registos que consideram importantes. As crianças escolheram as fotografias e/ou os desenhos que acharam pertinentes sobre os espaços do JI para construírem o seu mapa. Todas as escolhas foram justificadas pelas crianças e registadas por escrito pelas estagiárias.

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Com o passar do tempo, o grupo sentiu-se muito mais solto, mais autónomo, mais interventivo. À medida que o trabalho decorria, nós próprias continuámos a apostar no respeito, nos interesses e nas motivações das crianças, que íamos percebendo cada vez melhor. Tal como refere Oliveira-Formosinho e Araújo (2008a), o discurso da criança tende a ser mais extenso e claro quando ela se encontra num contexto verdadeiramente familiar. As perguntas passaram a ter uma intenção mais direcionada e as respostas iam sendo mais completas. Aos nossos olhos, a imagem da criança era a de “um ser ativo, competente, construtor de conhecimento e participante no seu próprio desenvolvimento, através da interação com os seus contextos de vida” (idem/ibidem, p.50). E foi sobre o que descobriram, que foram capazes de partilhar com todo o grupo, explicando o que tinham feito e como.

As conversas/entrevistas com a educadora e pais também foram realizadas de uma forma informal, com ênfase na perceção dos adultos sobre a experiência quotidiana das crianças.

Posteriormente, em conjunto com as crianças da outra sala, foi construído o instrumento onde foram reunidos e expostos os materiais resultantes dos diferentes métodos utilizados ao longo do processo de investigação - Manta Mágica. Assim, as crianças tiveram oportunidade de poder observar e refletir sobre os momentos mais significativos do processo como forma de expressão dos seus pontos de vista (Clark & Statham, 2005; Clark, 2007) (cf. Apêndice 50).